terça-feira, 2 de agosto de 2016

Cartas de Amor (de Alma Welt)

Prometi nunca escrever cartas de amor,
Que são só o ridículo dos poetas.
As da Ofelinha do Pessoa causam dor,*
Me perdoe o mestre as minhas setas...

Podia bem passar o Fernandinho
Sem escrever em cartas tais pieguices *
Que fariam corar mestre Alvarinho,
O Campos, das odes como mísseis...

Modesto, não sabia o grande Vate
Que o mundo iria ler aquilo tudo?
Báh! Pobre coração que bate bate...

Dorme, meu poeta, e não me leves
A sério, já que em parte estás mudo,
E teu amor de antanho, como as neves... *

.
29/07/2016


Notas
* As da Ofelinha do Pessoa... - alusão as cartas de amor que Fernando Pessoa escreveu para sua namorada Ofélia, cartas terrivelmente piegas, às raias do ridículo, de tal maneira que manchariam sua reputação de grande poeta se elas fossem mais divulgadas. Entretanto o próprio poeta escreveu mais tarde um conhecido poema sobre "cartas de amor ridículas", talvez como autocrítica. Entretando não devemos esquecer que cartas de amor não são necessariamente ridículas se nos lembrarmos dos grandes exemplos como as Cartas de Heloisa para Abelardo (Helois de Argenteuil e Pierre Abélard, amantes reais, da Idade Média) grandiosas e comoventes às raias do heroísmo, e também as chamadas "Cartas Portuguesas de Sóror Mariana Alcoforado, uma freira da cidade do Porto, para o seu amante, um oficial francês.

*Que fariam corar o Alvarinho - Alma chama assim ( no estilo piegas das cartas do Pessoa à Ofélia) o poeta Álvaro de Campos, o maior heterônimo de Pessoa e poeta fortíssimo.

* teu amor de antanho, como as neves - alusão ao célebre verso da "Balada das Damas dos Tempos Idos", do poeta francês medieval, François Villon: "Mais où sont les neiges d'antan"" (" Mas onde estão as neves de antanho?")

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