domingo, 22 de julho de 2018

A melhor rosa (de Alma Welt)

Estamos vivendo a Kali Yuga,
Um velho indiano o disse a mim.
Eis que hoje a Razão está em fuga
E no princípio estamos, mas do Fim.

Visto isso, fiz as malas, fui de volta
Ao pampa e ao meu velho casarão
Onde caminho alegre e sem escolta
Ao compasso de meu próprio coração.

Quantas vezes o mundo se acabou
E renasceu de suas cinzas fumegantes
Como a Fênix que o grego imaginou...

Então voltei ao jardim da avó Frida,
Colhi a melhor rosa, como antes,
E meu mundo reiterou sua acolhida...

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22/07/2018

Nota
Tanto Oswald Spengler (1880 – 1936) em "A Decadência do Ocidente", quanto o filósofo italiano setecentista Giambattista Vico (1668 — 1744) , em "La Scienza Nuova", expuseram um ciclo da História em quatro fases (Teocracia, Aristocracia, Democracia, Caos). O ciclo quadripartido de Spengler é derivado de Goethe, como o de James Joyce provém de Vico. Tanto Goethe como Vico desenvolveram a ideia a partir da sequência das quatro Idades da mitologia grega (Idade de Ouro, de Prata, de Bronze , de Ferro), que por sua vez é a contraparte do Círculo hindu dos Quatro Yugas (Krita, Treta, Dvapara, Kali),
(Augusto e Haroldo de Campos em Panaroma do Finnegans Wake, Editora Perspectiva, 1971)

Historicamente estaríamos vivendo a Kali Yuga, ou o Caos.

sexta-feira, 20 de julho de 2018

Viver bem (de Alma Welt)

Viver bem é difícil, é complicado,
Mas viver mal qualquer um pode viver.
Assim, a maioria aceita o fado,
De quem não planta pra colher.

De biquinho aberto só esperando
Que a mamãe-estado traga o lanche
E já de bucho cheio protestando,
Querendo decolar baixando o manche.

Sem liberdade não há nenhuma vida,
Só um arremedo de existência,
Tampouco se terá casa e comida.

Eis tudo o que meu pai, por experiência,
Me dizia: Jamais creia nos vermelhos.
São vampiros, nem refletem nos espelhos...

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20/07/2018

Estou triste (de Alma Welt)

Estou triste, meu amor, eu sinto tanto
Não poder ostentar o meu sorriso...
Tudo vai mal no meu país e não diviso
Uma luz, nem a saída por encanto.

"Tudo vai ficar bem", repete o gringo
À exaustão em seus filmes idiotas
Tentando impingir suas lorotas
Em que não acredito nem um pingo...

Eles estão esperando ainda o Elvis
Com seu tradicional jogo de pelvis,
E os Ets, de preferência maus e feios.

Quanto a mim, espero Mozart, Beethoven
E Chopin... E de dentro dos meus seios
Um Van Gogh que agora todos louvem.

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20/07/2018

quinta-feira, 19 de julho de 2018

O Labirinto (de Alma Welt)

No labirinto do mundo das idéias
Transcorre nossa vida atarantada,
Tateando as paredes e as teias
Buscando uma saída ou escapada.

Olhar pra cima é preciso, no entanto:
A tenda azul sobre nós se estende
E nos dá asas para fuga, por encanto,
De penas que com cera a gente emende.

Sem olhar para o céu não há saída
Aprendamos a fluência com as nuvens
Que em chuva transformam sua descida.

Que o orgulho nossas asas não dissolva,
Ó Sol, que a nós, só por clemência vens
Mas não toleras o falso que te louva...

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19/07/2018

quarta-feira, 18 de julho de 2018

Era uma vez (de Alma Welt)

Meus amores, quanto amor fico devendo
Neste meu egotismo empedernido,
Voltada para mim, eu mesma sendo
O centro de todo o meu sentido...

Mas que posso eu fazer, me perseguindo
Cada dia para mais me conhecer
Se me creio ao mundo todo pertencer
E estar tudo, com todos, compartindo?

Era uma vez uma pequena ninfa ruiva
Deslumbrada pelo senso de beleza
Que via ao seu redor, na natureza...

Mas Narciso com tal ninfa se encanta
E nela coube ou entrou como uma luva
E olhando pra si mesmo, o mundo canta...

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18/07/2018

terça-feira, 17 de julho de 2018

O Portal do poeta (de Alma Welt)

Viver no limiar de alguma porta,
Uma iluminação ou um portal,
A revelação que mais importa,
Como a ideal extinção de todo mal...

Eis o timbre ou tom de minha vida
Conquanto só pareça presunção
Já que sou pequena e atrevida,
Muito mais teoria e sonho, pouca ação...

Mas a Poesia é isso, reino à parte,
Onde pode o poeta quase tudo
Desde que, hábil, domine sua arte

Com o direito de chorar, também sagrado,
Nem que seja aquele pranto mudo
Que perpassa o bom poema, disfarçado...

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17/07/2018

segunda-feira, 16 de julho de 2018

Esperando a Boda (de Alma Welt)

Uns querem construir uma casinha
E outros tantos uma torre de Babel.
A humanidade não quer estar sozinha *
Sendo só sete bilhões, aí ao léu...

Queremos nosso Cosmos povoado
Tão absurda é a nossa solidão,
Mas não da nossa espécie, o mesmo quadro,
Já que mal suportamos nosso irmão.

A vida é um Teatro do Absurdo,
Certo estava Ionesco ao encená-lo,
Nesta Tróia estamos todos no cavalo. *

Não adianta MacDonald ou MacMurdo, *
Acabaremos explodindo a coisa toda
Quando de Urânio chegar a nossa Boda...*

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16/07/2018
Notas
*A humanidade não quer estar sozinha - Alma se refere ao fato de não querermos estar "sozinhos" (!!!) no Universo, esperando a vinda dos ETs, esquecendo que somos sete bilhões de humanos e um sem número de espécies de animais sobre a nossa Terra...

*A vida é um Teatro do Absurdo/
Certo estava Ionesco ao encená-lo - Alma se refere ao dramaturgo franco-romeno Eugene Ionesco, que criou o Teatro do Absurdo, com peças como "Os Rinocerontes", "A Cantora Careca" e outras, que enfatizam a falta de sentido intrínseco da vida humana, isto é, o absurdo cotidiano que vivemos sem perceber...

*Nesta Tróia estamos todos no cavalo - com este engenhoso verso, Alma sugere que Tróia é o nosso planeta sitiado, e nós, humanidade, estamos dentro do traiçoeiro cavalo de madeira que o destruirá por dentro.

* MacMurdo
Early Origins of the McMurdo family
The ancient Dalriadan kingdom consisted of the Hebrides islands, and the rugged mountains of Scotland west coast. The name McMurdo began in this region; it was a nickname for a seagoing warrior. The Gaelic form of the name is Mac Mhurchaidh, which means son of the sea warrior.
The surname McMurdo was first found in Argyllshire (Gaelic erra Ghaidheal), the region of western Scotland corresponding roughly with the ancient Kingdom of Dál Riata, in the Strathclyde region of Scotland, now part of the Council Area of Argyll and Bute, where they held a family seat from early times and their first records appeared on the early census rolls taken by the early Kings of Britain to determine the rate of taxation of their subjects.

* Na verdade o nome deste clã escocês está no soneto da Alma somente para rimar com "absurdo" e enfatizá-lo. Já o MacDonald sugere a globalização que popularizou o nome de um clã escocês através de uma rede mundial de fastfood, o que por si só é também absurdo... rrrrrrsss

*Quando de Urânio chegar a nossa Boda - Alma, com este verso, dado que existem as bodas de prata, ouro, diamante, etc, sugere que quando passar um determinado tempo do nosso casamento com a bomba atômica, isto é, da nossa convivência pacífica com ela adormecida após Hiroshima, nós a explodiremos fatal e comemorativamente.

Meditação sobre o Fruto (de Alma Welt)

Um direito foi dado à Adão e Eva:
Da Vida um comodato ou usufruto
Desde aquela manhã triste e primeva
Pois o Senhor não recobrou o Fruto.

Já o tínhamos digerido mal e mal
(a bronca nos deu certa indigestão)
Mas jamais achamos que é normal
Tanta ira, desatino e confusão.

Senhor, que Ciência é essa, Bem e Mal,
Se escolher bem ainda não sabemos,
Já que não nos vem com o manual?

Mas agradeço eu, por minha conta,
O agridoce ainda que mal dele lembremos,
Pois nossa Arte a tal sabor remonta...

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16/07/2018

Jonas, Jó e eu (de Alma Welt)

Um retorno é o que busquei na minha vida.
Não à simples infância de inocência
Mas à felicidade plena, concebida
Em momentos puros de existência

Que ainda são a base do meu canto:
Flores colhidas no jardim de minha avó
Escutando com delícia e espanto
Incríveis fábulas de Jonas e de Jó.

Nada mais apreendi, vida ou ciência,
Que não se referisse àqueles mitos
Fundadores de moral e consciência.

Não vi o ventre da baleia como Jonas,
Nem como Jó vivi no Vale dos Aflitos,
Mas meus próprios caminhos foram Romas...

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16/07/2018

domingo, 15 de julho de 2018

Aferição (depoimento) (de Alma Welt)

Quantos erros cometi na juventude!
Quantas dores inúteis, mágoas, quanta...
Causadas pela mera incompletude,
Solidão essa que a gente mesma planta.

Nasci velha e pra ser jovem demorei;
Sofria a dor da morte antecipada,
Que no pacote parecia vir, que herdei,
Meras lousas na colina, hoje nada.

Um dia afinal olhei no espelho
E vi a minha face destinada,
Além do meu cabelo tão vermelho,..

E então iria aferir, dia por dia,
Se não o sentido da jornada,
Beleza que nos passos se escondia...

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15/07/2018

sábado, 14 de julho de 2018

O ovo do poeta (de Alma Welt)

Ser poeta é pensar tudo de novo,
A história do mundo a cada verso,
É refazer o sentido do universo,
Como quem bota de pé um novo ovo.

É preciso que inventes novas flores
E até máquinas se isso, a ti, te apraz,
Mas que, inúteis, produzam novas cores
Não metáforas de guerra, mas de paz.

Como um lavrador em suas lavras
Mas no âmbito infinito das palavras
Não como faz-de-conta ou um bem-me-quer.

Pois tudo nasce primeiro de um projeto
Que vê num ovo o ser puro e completo
Acalentado num ventre de mulher...

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14/07/2018

A espada louca (de Alma Welt)

De estar no mundo, a dor imensa
Que a muitos não ocorre como a mim
Tornou a minha vida muito densa
Como se cada instante fosse o fim.

Bem, Alma... isso cheira à lenda
De Damocles, o daquela espada louca.
Mas se não tens nos olhos uma venda
Também não dormes como ele, nem de touca.

Vida e Poesia para ti é uma mistura
E já não manténs nítida a fronteira,
Estás mesmo a um passo da loucura.

E há pessoas que pensam que os versos,
No mais ingênuo e feliz dos universos
São pura e inocente brincadeira...

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14/07/2018

Sob a lua e as estrelas (de Alma Welt)

Eu vivo sob a égide da lua
Mas também das estrelas imortais,
No compasso de uma dança lenta e nua,
Ao som do coração e nada mais...

"Ora, Alma, és uma delirante antiga,
Estás fora de moda e não atinas.
Não pareces jovem, minha amiga,
Tens as maneiras demasiado finas."

E eu, poeta, eterna deslocada
Mas semi-consciente do ridículo
De me querer a sério ser levada,

Quisera andar de novo sob estrelas
Qual piá, mantendo o mesmo vínculo,
Do jeitinho que eu costumava vê-las...

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14/07/2018

Entre o amor e a ciência (de Alma Welt)

"O futuro é projeção de nossa mente,
Mero fruto da imaginação nossa,
Que modificamos lentamente
Ou nos obsessiona até a fossa..."

Assim dizia a analista, minha doutora,
Olhando o seu pulso com olhos bravos
Como quem meu tempo monitora
Em tempo real e de centavos.

"Está à tua espera um grande amor",
Dizia minha cigana impagável
Que belamente me mentia sem pudor...

E entre uma e outra eu alternava,
Já que o destino era mutável,
E eu amava tudo... e nada amava.

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14/07/2018

sexta-feira, 13 de julho de 2018

Inferno, Purgatório, Paraíso (de Alma Welt)

"Inferno, Purgatório e Paraíso,
Alguns sabem: são aqui mesmo na Terra."
Assim dizia minha avó em bom juízo
E acho que a Verdade isto encerra...

O Inferno é muito fácil de encontrar,
Tanto que podemos nós mesmos fazê-lo:
Basta somente não saíres do lugar
Assistindo o injusto, ou mesmo sê-lo...

De imensas manadas território,
O Purgatório é ainda mais comum,
O encontras no lar e no escritório.

Já o Paraíso, quer pouco das retinas
Mas demanda de tua alma o modo zum
Para o veres nas coisas pequeninas...

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13/07/2018

sábado, 7 de julho de 2018

Resumo da Ópera (de Alma Welt)

Caminhar como se houvesse rota,
Uma trilha aprazível na floresta,
Eis aí o bom recurso que nos resta
Ante os males que formam nossa quota.

Boa providência é não queixar-se
Dos destinos mais duros entre nós.
Mas é comum ao homem lamentar-se
Ou rebelar-se em versos logo após...

Se tudo é em vão e a Morte é certa,
A nós cabe viver como imortais
Tal é o sonho que a vida nos desperta.

A vida é no Eterno um só mergulho
Mas que nos leva a perpetuar os ais
De nossas dores, nos versos, com orgulho...

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07/07/2018

quinta-feira, 5 de julho de 2018

O Mundo da Alma (de Alma Welt)

"Alma, não sejas, do mundo palmatória..."
(me lembro de meu pai me aconselhar)
"Afasta-te do maus e toda escória,
E não fica a lhes morder o calcanhar."

"Em polêmicas também tempo não percas.
A vida é curta para discussões mesquinhas
Mas cuida teus mourões, linhas e cercas;
Pelo cercado também zela... das galinhas."

Mas eu achava até aquilo deprimente...
Que me importava do mundo a mesquinhez,
Quem ligava pra lentilhas, se era lente?

Em disputas eu jamais iria entrar. *
A emenda de um soneto... sim, talvez,
Isso era tudo o que eu iria reformar...

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05/07/2018

Nota
Na verdade, Alma iria se meter numa imensa disputa com sua irmã mais velha Solange, pela herança de seu pai, isto é, a estância, o vinhedo e o casarão. Este é o tema do grande romance da Alma Welt intitulado A Herança, uma verdadeira saga de família, que aconselho os amigos a lerem. Está publicado em e book pela Amazon e está inteiro num dos blogs da Alma. (vide Google: romance A Herança, de Alma Welt).

terça-feira, 3 de julho de 2018

Ressurreição (de Alma Welt)

Não tinha mais por quê e nem por onde,
Não sabia mais o quando e o como,
Sem atinar por trás o que se esconde,
Enfiava a carapuça, o gorro e o domo.

As perguntas terminavam sem respostas,
E via tudo se acabar antes do fim;
Meus navios naufragavam em minhas costas,
Não encontrava mais despojos nem de mim...

Então puxei-me pela ruiva cabeleira
Como aquele barão mestre das mentiras,
Alçando-me da movediça areia.

Como milagre tudo então se refazia:
Eu que estava com o coração em tiras,
Eis que amava como quando era guria...

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03/07/2018

segunda-feira, 2 de julho de 2018

O Mistério de Caim (de Alma Welt)

Abel era pastor, Caim plantava;
Deus acolheu o sangue de um cordeiro
Mas não o que os ares perfumava:
Boas ervas e o trigo do celeiro.

Ninguém perguntou a razão disso
Já que Deus não tem o comum senso,
Co'a lógica nunca teve compromisso,
Pairando bem acima, vago, imenso...

Mas meditando encontrei a solução:
O Senhor nunca vê o ato em si,
E enxerga o profundo coração.

Deus é um cozinheiro da pesada:
A inveja de Caim, eu compreendi,
Junto com suas ervas foi plantada...

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02/07/2018