terça-feira, 15 de abril de 2014

A Razão do Soneto (de Alma Welt)

                          O Pampa de Alma Welt - de Guilherme de Faria, 2002

 
A Razão do Soneto (de Alma Welt)

Fiz o que pude embora fosse pouco
Pra deixar algo de belo e também bom
Neste mundo, convenhamos, meio louco,
Sem precisar mudar o timbre e o tom.

Fluidos versos, catorze, e mais a rima,
Doze sílabas por puro e vão capricho;
Uma canção, uma festa, uma vindima,
Onde encontrei meu verdadeiro nicho.

Mas por quê ?- me perguntas- quê diabo
Te fez querer esse esdrúxulo formato
Como se fora a baba do quiabo?

Manter minha rédea curta, isto sim,
Não pra evitar a disparada pelo mato,
Mas porque a terra é plana e não tem fim...

domingo, 13 de abril de 2014

Propósito (de Alma Welt)


                         John Keats ouvindo o rouxinol- de Joseph Severn  1845

Propósito (de Alma Welt)

Que Deus me guarde de toda fealdade,
Sobretudo da que possa haver em mim.
Mas se é da alma a responsabilidade,
Toda maldade, por grotesca, terá fim.

A Verdade e a Beleza andam quites,
De guardá-las trata enquanto podes.
A Beleza é a Verdade disse Keats
Na mais pura e bela de suas odes.*

Cantemos e dancemos entre as flores
Mas não deixemos de o solo nu pisar
Onde brotam as mágoas e as dores.

Se ao carente for capaz de dar beleza
Pelo pão que não me sobra para dar,
Possa ao menos enfeitar nossa pobreza...

______________________________

Nota
* A Beleza é a Verdade disse Keats
Na mais pura e bela de suas odes.* - Alma alude à "Ode a uma Urna Grega", um dos mais famosos poemas de John Keats.
Os dois últimos versos são assim:

 "Beauty is truth, truth beauty,"
that is all Ye know on earth, and all ye need to know.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

O espelho e o eco (de Alma Welt)



                                                       Imagem de Parablev

 
O espelho e o eco (de Alma Welt)

O espelho é um amigo lisonjeiro
Mas não devemos nele tanto confiar.
Narciso não o tem só no banheiro
Pois gosta de em si mesmo se banhar.

Como podes confiar nesse chalaça
Que te mostra como flor enfeitiçada
Se tornando amiúde tua cachaça,
E deixar tua ninfa abandonada?

Báh! Quebrei os meus espelhos, não confio,
Tenho medo demais do seu fascínio,
Abismo onde ando sobre um fio...

Antes ouvir meu Eco que me adora
Mas tornou-se pedra e não escrínio
Que ao abrir liberta minha pandora...

segunda-feira, 7 de abril de 2014

Forçando a rima (de Alma Welt)


Não vim para brigar, não sou de briga,
Sou mulher demais, no bom sentido,
Desaforo me magoa, faço figa,
Resistirá o meu coração partido.

Minha luta é com a palavra no meu verso
Somente pra expressar o que mais sinto
Até quando em mim algo perverso

Insiste em acordar o velho instinto.

Mas se alguém me fizer a vã pergunta:
Para quê então a rima ao versejar?

Digo: é graxa que o eixo velho unta...

E se a alguns posso mesmo melindrar
E rubores levantar ao rubicundo,
Falei de tudo o que é humano neste mundo...

O peixe ensaboado (de Alma Welt)

Aquarela de Guilherme de Faria
 

O peixe ensaboado (de Alma Welt)

Se não cri também não blasfemei
E mantive o meu decoro ante o sagrado
Dom da Vida, que esta tanto amei
Quanto a Morte me tem horrorizado.

Até aqui fui comum, nada de novo;
Certamente não fui muito original
Nesse medo que mal inibe o povo
Mas que atormenta tanto o Ser mental.

Jamais estarei pronta para ir-me,
Mas deixa que eu aqui me desabafe,
E como peixe ensaboado fique firme.


Não renego um só passo do percurso,
"Rien de rien" como cantou Piaf,
Que à vida me agarro como um urso...

quarta-feira, 2 de abril de 2014

Chorar (de Alma Welt)

O Pranto de Alma Welt - óleo s/ tela de Guilherme de Faria
 
 
Chorar (de Alma Welt)

Se vierem a ti em busca de consolo,
Báh! Não te eximas conquanto seja vão!
Aproveita que te ouvem, embora seja tolo
Dar conselhos em vez de uma canção.

Então canta, dança, começa a palhaçada
Pois mais vale um riso, ao menos um esgar,
Que melhor foras ridículo que nada!
O ser humano é infantil e quer brincar...

Mas, conselhos? Evita o quanto podes,
Pois certamente hão de voltar-se contra ti
No momento que produzam novos “bodes”.

Pensando bem, faça tu o que quiseres
Somente a vida e cada um sabe de si.
Mas chorar? Antiga arma das mulheres...