sexta-feira, 27 de junho de 2014

Anjo no Balanço (de Alma Welt)

                         Anjo no Balanço - óleo s/ tela de Guilherme de Faria, 2014, 100x100cm

Anjo no Balanço (de Alma Welt)

Naquela árvore rubra do meu horto
De que eu nunca ousei comer o fruto
Mas deixo meu balanço em ponto morto
Para os puros devaneios que desfruto,

Vislumbrei numa tarde o anjo branco,
Jovem ruiva ocupada em balançar
Enquanto entoava um acalanto
Como quem a si mesma quer ninar.

“O sonhado só remete ao sonhador”,
Diz do “código dos sonhos” o axioma
Que desmente em nós o expectador...

Então soube: era eu mesma que eu via,
Que dos meus caminhos todos era Roma
Mas que balançava e não escolhia...
 

sexta-feira, 20 de junho de 2014

A Calafate (de Alma Welt)


                           Barco na Tempestade - óleo s/ tela de Guilherme de Faria, 2001, 20x20cm
 
A Calafate (de Alma Welt)

Guria eu tinha tudo pra dar certo:
Beleza, inteligência e coração;
Tinha caráter e um olhar esperto,
“Tenía angel” e poesia por condão.

Quem diria eu dar com os burros n’água!
Embora ouvisse minha avó Frida dizer
Que “poesia boa é a que tem mágoa”,
Eu não tinha bons motivos pra sofrer...

Báh! A vida sempre dói, é nossa sina,
E o fracasso vigia os nossos passos
Como agourenta ave de rapina...

Mas agora que a maré sobe e inunda,
Sou a calafate que enche espaços,
Enquanto o meu pobre barco afunda...

terça-feira, 3 de junho de 2014

Alma (de Alma Welt)

 
 
                               La Liseuse-  Jean-Jaques Henner - (1829 – 1905) 

Alma (de Alma Welt)

Houve tempo em que eu prezava ir à missa
Com um lenço na cabeça e um breviário.

Na verdade era guria, em Rosário,
E devia ser ingênua, por premissa.

Eis então que o padre interpelou-me
Para, curioso, investigar a minha fé
Por um gritinho fino que escapou-me
Durante um sermão em que fui ré.

Mas logo o bom padre percebeu,
Pousando minha mão em sua palma,
Que o centro era sempre e mesmo eu.

E disse: “Filha, não és nada devota,
Ou estás a venerar tua própria alma,
E isso, por princípio, me derrota”...
 


segunda-feira, 2 de junho de 2014

A Vida e a Morte (de Alma Welt)

                                       Morte e Vida - pintura de Gustav Klint

A Vida e a Morte (de Alma Welt)

Temos tudo que a Vida necessita
Para que a desfrutemos plenamente,
Com cinco ou seis sentidos (como a fita)
E um mistério imensurável pela frente.

As perdas e fracassos fazem parte
Para que as vitórias celebremos;
Nossa morte, da vida a contraparte,
É pra mais valorizar o que vivemos...

Mas quê estou dizendo? Uma maçada!
(para usar um termo antigo e brando)
A Morte é horrenda e desgraçada!

E pior: não faz sentido, ninguém quer
Nem se cogita o como e o quando,
E vivemos qual se Morte não houver...