domingo, 30 de abril de 2017

Da natureza do Destino ( e Alma Welt)

Não há maior mistério que o Destino,
Talvez por sua infinita variedade
Embora seu perfil seja tão fino
Que não podemos vê-lo, na verdade.

Mas de frente é sempre surpreendente
E tantas vezes mesmo apavorante
Por ser quase sempre concludente
Ao proibir-nos de avançar, de ir avante...

Sua natureza é contra o Tempo
E avessa ao Infinito e aos deuses
Que o veem como simples contratempo.

Mas nós, passageiros da Agonia
Preferimos repetir nossos adeuses
A chegar onde afinal a gente ia...

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30/04/2017

Equilíbrio (de Alma Welt)

O equilíbrio entre o coração e a mente
Busquei para efeito de harmonia.
Minha repulsa ao coração demente
Está em minha prosa e na poesia.

Os doidos não suporto, eis a verdade,
Nem aqueles loucos contra o vento
Dos moinhos da nossa sociedade,
E nunca contra o cerne do momento.

"Seja mais clara, Alma"- alguém me diz-_
"Tu te pões dentro de um círculo de giz
Porque tratas de coisas obscuras."

Mas se lido com a natureza humana
Não posso ser o farol que tu procuras
Pois o Mistério amo... e dela emana.

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29/04/2017

sexta-feira, 28 de abril de 2017

A Alquimista (de Alma Welt)

Sei que me esforço para ser universal,
Não chorona de um perpétuo mimimi
De quem pouco se conhece ou muito mal
Na persistência em só falar de si.

"És pretensiosa, isso sim!"- alguém me disse-
Ou não disse, na verdade, e imagino...
Comigo dialogo, esquisitice,
Pois nos sinos que dobram ouço meu sino.

Mas pra falar assim de todos, ser ouvida
Fervo minha retorta ao quase estouro,
Tenho toda vã matéria dissolvida.

Ali, onde, alquimista, busco a Pedra
Filosofal, e que não se torna ouro
Mas de onde o saber profundo medra.

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28/04/2017

Questões da guria do pampa (de Alma Welt)

Retornaremos um dia à Inocência?
Qual será nosso Juízo no Final?
Os justos herdarão a permanência,
E os ímpios perderão o seu quintal?

Tais perguntas eu fazia de guria,
Dos sermões do padre atenta ouvinte,
Que a justiça final nos prometia
Sem dizer como ficava o dia seguinte.

E eu só queria restar no casarão
Mas com a coxilha até o horizonte
E o vinhedo dos avós como razão...

Acolhido foi do Éden o nosso leste,
Meu pampa é a chegada e não a ponte,
Senhor, sou apegada ao que me deste...

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28/04/2017

Considerações sobre a vingança (de Alma Welt)

Separarmos a justiça da vingança
Seria um estágio mais acima,
Que é quando a humanidade avança,
Ou coisa que o bom senso nos ensina.

Entretanto Hamlet em nós persiste
Com essa fabulosa confusão.
A vingança infelizmente existe
Qual fundamento ou só básica paixão.

Queremos mesmo vingar nossos fantasmas
Ou somente aliviar as nossas asmas
Pois o nosso próprio rei é que está nu.

Como prato que se deve comer frio,
Continua a preferencia do menu
Enquanto o Tempo corre como um rio...

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28/04/2017

A advogada (de Alma Welt)

Viver neste mundo é a premissa
Da pena que nos coube, ou maldição.
Não estou convencida da justiça
Da nossa triste e malfadada expulsão.

Senhor, perdão, por quê tanto rigor,
E não punir o casalzinho com um pito,
Pois só quis conhecer o teu sabor
No formato de um fruto tão bonito?

Fostes Vós quem criou a Tentação,
Convenhamos, isso é um tanto desleal!
Cartas marcadas no jogo da Razão.

E foi Vosso o próprio fruto, de repente,
Que me fez a advogada do casal
E não do tal diabo da Serpente...

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28/04/207

quarta-feira, 26 de abril de 2017

Estrela da Poesia (de Alma Welt)

A poesia me salvou de quase tudo
Embora não criada para isso.
Orfeu olhou pra traz insubmisso
E perdeu a sua amada: lex ludo.

Depois, o nosso herói dilacerado
Teve a cabeça com a lira preservada
Em memória e honra do coitado,
E só a lira no fim foi estrelada...

Ser estrela a alma minha aceita,
Constelação já minha mente não delira,
É demais... pra tanto brilho não fui feita.

A arte vale bem mais que o artista.
Somos meros portadores de sua lira
Se não perdemos o nosso amor de vista...

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26/04/2017

O Hexaedro da Colmeia (de Alma Welt).

Ocorreram quase todos meus receios
E o que aconteceu de bom não esperava.
Mas o destino encontrou modos e meios
Quando eu, desastrada, me afogava...

Não temos mesmo o controle desta vida
E então somos levados na corrente,
Mas Deus lança uma boia salva-vida
Se a gente não se entrega simplesmente.

"Bah! É tão fácil assim, Alma inocente?"
-Me disse uma professora ateia-
"Tudo isso a simples Física desmente."

Mas Deus criou a física e a geometria
Basta ver o hexaedro da colmeia...
Estava lá, e, desgarrada, me acolhia.

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26/04/2017

sexta-feira, 21 de abril de 2017

Conselho a mim mesma (de Alma Welt)

Escolhido o verso alexandrino,
Quatorze para ser mais específico,
Dirigi-me a um público mais fino
Que iria fruir meu dom prolífico...

Ora, Alma, este soneto está pedante!
Começaste muito mal, vamos convir.
Não precisas explicar o elefante,
Sete cegos apalpando hão de vir.

Se tens algo a dizer solte uma pomba
Com a mensagem do coração e mente
De um cego que reconheceu a tromba...

Lançado o elefante em pleno ar,
Então deixe-o seguir pela corrente
Ao sabor do vento, leve, a flutuar...

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21/ 04/2017

quinta-feira, 20 de abril de 2017

Livros (de Alma Welt)

Nasci num mundo de abundância
Pois meu pai tinha quase dez mil livros,
Encanto e mistério meu da infância
Já que pra mim estavam todos vivos.

Bastava abri-los e começar a ler
Que o mundo todo se encantava...
Não "faz de conta", muito mais um "vir a ser"
Mais real que o real que me cercava.

Era Aab mas também a Moby Dick,
E o narrador agarrado num caixote
Previsível, do navio que foi a pique.

Mas quanto ao impagável Dom Quixote
Eu não queria sê-lo nem um pouco,
Que almejava ser Cervantes, não o louco...

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20/04/2017

Pequena crônica (de Alma Welt)

"Em que mundo vives, minha Alma? "
Disse o meu amigo Serafim
Quando o convidei na tarde calma
A comigo colher flores no jardim.

"De que lado estás?" perguntou outro
Quando o convidei numa manhã
A laçar e trazer do pasto um potro,
Que tachou de "suprema coisa vã".

Então os despedi em tarde fria,
Pensando: Esgotei meus atrativos.
Vai-se o bebê com a água da bacia...

E na plataforma os vi partir
No trem, humilhados, pensativos,
Porque nada tinha a lhes servir...

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20/04/2017

quarta-feira, 19 de abril de 2017

Depoimento (de Alma Welt)

Escrevendo tudo posso e tudo sou
Embora no final esteja atada
À minha alma, psichê, anima, "soul"
Com seu núcleo resistente, não fachada.

Mas não gosto de dizer sou isto e aquilo,
Evidência, a meu ver, de má poesia.
Ninguém me ouviu dizer que sou o Nilo,
Nem vento minuano ou maresia...

Entretanto viajo em quase tudo
E por vezes mesmo até "na maionese"
Com estes ruivos cabelos que não mudo.

E quando finalmente esteja dura,
Procurem minha alma em sua ascese
E verão que a mantive sempre pura...

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19/04/2017

Viagens (de Alma Welt)

Viajei pelo mundo e pelas eras
Através dos muitos livros de romances
E de contos e novelas nas estantes,
Sem passagens, sem filas, sem esperas.

Com os clássicos cresci, desabrochando
Em aventuras nas maiores capitais;
Paris me viu nas torres badalando
Da Notre Dame, em lances imortais.

Num salto, noutra peça, em outro ato
Me vi na pista do salão do Moulin Rouge
Onde fui um anão mestre e desenhei...

Porém, desapontada, a alma indulge
Quando me acontece estar de fato
Nas cidades que em leitura imaginei...

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19/04/2017

terça-feira, 18 de abril de 2017

Para que serve a Poesia (de Alma Welt)

Interpretar o mundo é o que me cabe
Pois a poesia não passa senão disso:
Uma janela num muro que se abre,
Uma lunática luneta, um compromisso

Com toda presença morta ou viva,
E a ciência de descrever as almas
(um tanto empírica e instintiva)
Como cigana a ler as nossas palmas.

Pouco levada a sério é esta Poesia,
Como se fora brinquedo de criança
Ou recurso de quem já se enfastia.

Mas olha, um bom verso descortina
A tua mesma alma em confiança
Respeitando teu silêncio e tua sina...

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18/04/2017

Nobreza (de Alma Welt)

Uma parte de mim é o meu afeto
Pelas coisas desprezadas por juízo:
Não só falhas, fraqueza, um pobre teto
De vidro sob a chuva de granizo,

Mas segredos guardados por pudor
Que fornecem um tom meio indeciso,
Uma tristeza amena ou mesmo dor,
Um ligeiro desconforto no sorriso...

Não os filhos mais diletos da beleza,
Triunfantes ostentando o privilégio
(que estes não precisam minha defesa),

Mas aqueles marcados com um "Não",
Por manterem misterioso traço régio,
Uma nobreza sem jeito e sem razão...

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18/04/2017

terça-feira, 11 de abril de 2017

O show deve continuar (de Alma Welt)

Chegamos ao mundo sem propósito
E não com uma bula para usar.
Nem estávamos empilhados num depósito
Aguardando a etiqueta pra embarcar.

Deus quer nossa inspiração, encantamentos
E diz: "Surpreendam-me, meus filhos, quero ver!
Livre arbítrio é isso: experimentos!
Cada um se esforçando a Me entreter!"

Quanto a mim, sapateio noite e dia
Qual Fred Astaire e seu chapéu-palheta
Ou Carlitos com a sua bengalinha

Mas só no papel com minha poesia,
Na vida: moça tímida, quietinha...
É mentira! Não sou tão assim careta...
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11/04/2017







Eu e meu Anjo (de Alma Welt)

Há um anjo que comigo perambula
Como fosse meu piloto dedicado.
Ele diz que em suas asas acumula
Outras milhas que farão o meu traslado.

No começo o pensava meu capanga
E cheguei a dar-lhe ordens duvidosas
Como alguém que só quer soltar a franga
Naqueles dias de vinhos e de rosas...

Mas assentei, afinal, minha cabeça
Porque um dia me deixou na mão, partiu,
Eu a gritar: "Perdão, meu anjo, desça!"

Agora estou bem mais comportada
Embora com a cabeça ainda a mil,
Com metade da alma amordaçada...

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11/04/2017

O peso das palavras (de Alma Welt)

Acorrentados estamos às palavras
Que pensávamos voláteis, inconstantes.
O seu peso relevamos, suas travas
E suas fundas pegadas de elefantes.

Queres desdizer-te? Agora é tarde!
Falaste mais que a boca, certamente...
Com boas intenções no inferno arde
Toda a vã palavra inconsequente.

Não podes apagar-te com borracha
Assim como desfazer o mal que fazes
Pois logo no seu nicho ele se encaixa.

De coelho as palavras não são coitos,
Reflitamos duas vezes, ó afoitos,
Bocas grandes, boquirrotos contumazes!

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11/04/2017

sábado, 8 de abril de 2017

La Bele au Bois Dormant (de Alma Welt)

"Nossos piores pesadelos somos nós,
Tanto quanto o melhor dos nossos sonhos.
Nossa alma administra os contra e os prós,
Nossos floridos campos e os medonhos..."

Dizia minha doutora predileta
Enquanto eu a olhava embevecida,
Como se fosse ela a minha meta
E eu a sua bela adormecida

Que sonhava estar dormindo nos seus braços,
Nós cercadas à distância pelo bosque
De espinhos invejosos dos abraços...

A vida é sonho, caldeirão ou uma barca; *
Nosso castelo não passa de um quiosque
Que erguemos onde nosso barco atraca...

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08/04/2017

Nota
* A vida é sonho, caldeirão ou uma barca - alusão à famosa peça
" La vida es sueño", de Pedro Calderón de La Barca.

terça-feira, 4 de abril de 2017

Dois reinos ( de Alma Welt)

Vem, amor, eu te conduzo ao meu jardim
E serei teu guia em meio às rosas.
Lá fora, no mundo, sei que posas
Mas aqui nada é mistério para mim.

Que posso te dizer, que ainda não saibas
Se nós nos vemos somente num café?
Talvez aqui no meu jardim, menor me caibas,
Aqui podemos caminhar juntos e a pé.

És um homem decidido, de gravata
E de pasta na mão com documentos,
Nada posso com teus muitos argumentos...

Vem para o meu mundo, onde governo
Meu pequeno reino, e sem bravata
As rosas que não minhas, mas do Eterno...

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04/04/2017

A Comédia (de Alma Welt)

Também eu em meio à vida me perdi
Por quatro anos numa selva escura,
Num tipo de auto-exílio em que me vi
Só por ser, talvez, ingênua e pura.

Era morto meu pai e o nosso mundo...
Começaria a guerra de família *
Pela herança, o casarão, e mais ao fundo,
Pelo vinhedo em torno e a coxilha.

Então, tola, enojada, me afastei
Para não me envolver em ninharias
Que de meu pai, isso herdar considerei.

Na Paulicéia transformei-me ou aprendi,
E vim lutar por um mundo que escolhi,
Com novas sábias e cruéis patifarias...

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04/04/2017

Nota
*Começaria a guerra de família - Para conhecerem essa saga de família, a luta da Alma pela Herança de seu pai e avós, leiam o romance A Herança, de Alma Welt. disponível em e.book pela amazon.

segunda-feira, 3 de abril de 2017

O labirinto e os sinos (de Alma Welt)

Nós pensamos dirigir as nossas vidas,
Determinando nosso tom e os destinos...
Pobres de nós em meio às nossas lidas,
Perguntando por quem tocam o sinos!

Na verdade, já não tocam velhos sinos,
E também não temos tempo para isso,
Atrasados para um certo compromisso
Em frente ao labirinto do rei Minos.

Na verdade já entramos sem dar conta
E também nos dirigimos para o centro
Embora a gente nunca esteja pronta.

É sempre a velha história: falta o fio,
Que nos permitiria ir mais para dentro
A fluir infinito o nosso rio...

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03/04/2017