quinta-feira, 7 de setembro de 2017

O anátema de um dia (de Alma Welt)

Ser o que sou e viver para a poesia
Foi meu dom e privilégio relativo,
Pois formada de tudo o que eu lia,
Quanta dor deixei passar pelo meu crivo.

Dor do mundo, eu a conheço em empatia,
Mas conheci de fato uma expulsão,
O flagrante e o anátema de um dia, *
Uma injustiça de Deus... Peço perdão.

Passei a vida com quem flores colheu
No jardim de minha avó (que mais fiz eu?)
A olhar de longe o mundo e seus clamores.

Me perdoe, outrossim, leitor amigo,
Acaso olhe demais pro meu umbigo,
Referencial talvez de poucas dores...

.
07/09/2017

Nota
*Mas conheci de fato uma expulsão,
O flagrante e o anátema de um dia - Alma se refere ao trauma fundamental de sua infância: a guria Alma, de oito anos, foi flagrada em inocente brincadeira sexual com seu irmãozinho Rodo (irmão adotivo), debaixo da macieira do pomar do casarão, por sua mãe, Ana Morgado, que fez um escândalo e os puniu com uma separação que durou anos, enviando o menino para um colégio interno. Alma se refere a este episódio arquetípico (o "pecado original" e a expulsão do Éden) em inúmeros textos e sonetos, como sendo o fundamento primal de sua poesia.

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