segunda-feira, 25 de setembro de 2017

Há quem pense... (de Alma Welt)

Há quem pense que poesia é abstração,
Que ela requer viver em devaneio.
Mas garanto que é o contrário: é pura ação
Do real sujeito nosso sobre o meio...

E é pegar quase tudo no concreto
Como fazem as crianças e é tão belo,
Pois permite o ilimitado ao objeto
Como as vozes de um coral de violoncelo.

Como Gump, esperar o bus do filho, *
E a tarde toda aguardar o seu retorno
No banco, como trem não sai do trilho.

O poder do poeta é seu pimpolho
Que sabe que o cavalo oculta o corno
E que mesmo a noite escura tem um olho...

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25/09/2017
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Nota
* Como as vozes de um coral de violoncelo - Alusão ao conceito musicológico que se tornou popular, de que o violoncelo é o instrumento que mais se aproxima do timbre da voz humana. Se você diz isso a uma criança ela provavelmente imaginará um violoncelo com boca, cantando.

*Como Gump, esperar o bus do filho - cena final do belíssimo filme americano, "Forrester Gump, o Contador de Histórias", em que o personagem ( atuação magnífica de Tom Hanks) espera o ônibus escolar no banco, à beira da estrada em frente de sua casa, e quando ônibus chega ele diz ao menino: "Quando você voltar estarei aqui esperando por você". O menino sobe, o ônibus parte, e Gump permanece sentado, quase duro, na mesma posição, dando a entender que esperará mesmo, sem sair dali um minuto sequer, a volta de seu filho. Uma penugem aos pés dele é focalizada pela câmera, e sobe brincando, levada pelo vento, como a alma brinca no ar, como o pó brinca infinitamente na luz...

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