sábado, 17 de dezembro de 2016

A Caixa de Descartes (de Alma Welt)


            O filósofo René Descartes 1596 – 1650                        |Pandora- de John William Waterhouse
     
A Caixa de Descartes (de Alma Welt)

Tenho medo deste meu tanto pensar,
Não do espontâneo que há em mim.
Pois se penso, já na hora de acordar,
Afugento de mim meu querubim...

"Ora, Alma, só sonhar no dia a dia,
É isso que querias, sonhadora?
A doce Eva perdeu a fantasia,
Aquele fruto era a caixa de Pandora." *

Dizem que louras e ruivas burras são...
Antes tivéssemos fechado aquela tampa,
Produzem monstros os sonhos da razão... *

Pensa, logo existe, a humanidade,
E descartadas as lajes de sua campa, *
As tampas já não fecham, na verdade...

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17/12/2016

Notas
"Aquele fruto era a caixa de Pandora - Alma associa dois mitos análogos: o fruto bíblico da ciência do Bem e do Mal ( a Razão) e o mito grego da Caixa de Pandora, que, aberta, soltou o Mal no mundo.

*Dizem que louras e ruivas burras são /Antes tivéssemos fechado aquela tampa - Ao mesmo tempo que alude ao mito popular da burrice das loiras (e ruivas por extensão), Alma faz uma alusão velada à expressão "fechar a burra" , e ao suposto fato das loiras e ruivas gastarem muito dinheiro...

*Produzem monstros os sonhos da razão - citação da famosa frase inscrita numa gravura de Goya da série dos "Caprichos" : "El sueño de la razón produces monstruos".

*E descartadas as lajes de sua campa - Alma, em trocadilho, alude com a palavra "descartadas" ao filósofo do século XVII, René Descartes, que escreveu a famosa frase: "Penso, logo existo", fundadora do racionalismo como corrente filosófica que chegaria ao século XX tendo pequena e inefetiva reação por parte dos surrealistas, que abominavam o racionalismo francês, vitorioso nos seus acadêmicos.

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