Este espaço é destinado às diversas séries de sonetos da poetisa gaúcha Alma Welt, que, mais genéricas, não se enquadrem nos outros blogs da poetisa, de séries mais específicas, como os eróticos, os metafísicos, etc. (vide lista de seus blogs)
quinta-feira, 23 de abril de 2009
Sonetos delirantes da Alma (de Alma Welt)
pintura de autoria de Alma Welt
Sonetos delirantes da Alma (de Alma Welt)
O gaucho triste (de Alma Welt)
1
Vinha o gaucho ereto em sua sela,
Montado no vento e sem cavalo.
A noite carecia de uma vela
Que a lua era negra e sem um halo.
“Vai-te”, disse eu, “por quem me tomas?”
“Sou a prenda fiel de pai e irmão,
E não deixarei que escuras formas
Venham entrever meu coração!”
E o gaucho espectral continuava
Ali, com a face branca e triste,
E o zum de seu silêncio se arrastava.
Longos bigodes, chapéu de barbicacho,
No seu punho uma lâmina em riste,
A outra mão a conter o rubro facho...
05/02/2004
Sob a figueira (de Alma Welt)
2
Sob a figueira em sonho estava ela,
A branca peregrina de uma noite,
Sentada de viés em sua sela
Os olhos a pedir que não me afoite.
E eu me aproximei arrepanhando
Minha longa saia de cetim
Com meus pés inseguros caminhando
Numa espécie sedosa de capim
Dourado, como a bruma que luzia
E envolvia tudo em doce flama
Que por si apaziguava e seduzia.
E eu ouvi a voz que se me canta,
E o coração, ao recordar, ainda inflama:
"Virás comigo em breve, Alma, Infanta."
A Cavalhada (de Alma Welt)
3
A cavalhada vem durante o sono
E passa por mim em sobressalto,
Que desperto então em pleno Outono
Com as folhas varridas para o alto.
E corro, bah! eu corro desde então
Das minhas horas em fluxo contrário
Que buscam varrer-me para o chão
Com seu vento forte e arbitrário,
O Minuano, sim, que se diz dono,
E me quer não como às folhas, mas mulher,
Eu que prefiro os cavalos do meu sono
Que brancos como ondas me seduzem
E no abismal galope me conduzem
Aos páramos profundos do meu ser...
10/03/2005
Noites abrasadas (de Alma Welt)
4
Noites abrasadas, tão freqüentes
De minha grande dor transfigurada,
Quando o vão clamor pelos ausentes
Deixava o meu rastro pela escada.
Madrugadas doridas entre os galos
E os latidos longínquos na estrada;
Os minutos escorrendo pelos ralos,
Dedos e passos percorrendo o nada.
Depois o som há muito ausente do piano
Negro e mudo, a vir do tétrico Steinway
Que o mestre dedilhava e outrora amei,
Agora que só tons graves se ouvem
Tangidos pelo intruso Minuano
Como arremedo surdo de um Beethoven...
06/01/2007
Nota
Acabo de descobrir um novo tesouro na Arca da Alma: um grosso maço de papel contendo sonetos manuscritos que pelo seu timbre e conteúdo resolvi entitular "Sonetos Delirantes da Alma".
A grande poetisa cultivava também uma vertente obscura e misteriosa, por vezes assustadora, na sua imaginação tão rica de mundos e timbres.
À medida que os for compilando e digitando, irei publicando numerados. Talvez tome a liberdade de entitulá-los, para efeito de melhor divulgação no Google, pois Alma não fez, nem sequer os numerou.
(Lucia Welt)
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