Este espaço é destinado às diversas séries de sonetos da poetisa gaúcha Alma Welt, que, mais genéricas, não se enquadrem nos outros blogs da poetisa, de séries mais específicas, como os eróticos, os metafísicos, etc. (vide lista de seus blogs)
segunda-feira, 30 de maio de 2011
Para Onde? (de Alma Welt)
Para Onde? (de Alma Welt)
Para onde terá ido o realejo
Que nostalgizava minhas ruas?
Já faz tanto tempo... não o vejo
E isso envelhece minhas luas...
E o firinfimfim do amolador?
A gaitinha de pã tão pobrezinha,
Cujo som, por si só encantador,
Afiava as facas todas da cozinha...
E o rententém, então, do paneleiro
Que chamava nossos apegados tachos
E panelas já tão gastas no braseiro?
O tequetéque dos bijus, estranho solo,
Matraca que atraía até os machos
E tirados de um latão a tiracolo...
quarta-feira, 25 de maio de 2011
Entre a lápide e as cinzas (de Alma Welt)
Crepúsculo no Pampa (cemitério na colina) -óleo s/ tela de Guilherme de Faria 20x50cm, coleção Giovanni Meirelles, São Paulo
Entre a lápide e as cinzas (de Alma Welt)
Meus queridos já dormem na coxilha
À sombra de um umbu também querido,
E eu hesito entre o que é pequena ilha
E o nosso vasto mar do olhar perdido,
Que é, sim, esta planura ondulada
Onde a poeira de meu corpo voaria
Fecundando a vastidão amada
Como o próprio pólen da Poesia.
E entre as flores da lápide sombria
E aquelas do meu campo em primavera
Meu coração balança em agonia.
Tão belo o epitáfio que me fiz!
Eu que tive palmas, quero bis
Para o último verso que me espera...
12/01/2007
sexta-feira, 20 de maio de 2011
Traum * (de Alma Welt)
Não levantei meu punho contra a vida
Por um certo momento de desgraça
Que não revelarei, por comovida,
Ou porque até mesmo um trauma passa.
Traum, essa palavra é só um sonho
Na língua de meu avô germânico
Que um olhar legou-me assim bisonho
Que me tem evitado maior pânico.
Então sonharei, eis minha proposta,
Tudo é sonho mesmo... O que é real?
Meu próprio corpo branco é a resposta
Malgrado dores e roxa e triste mancha
Que também se apagará, creio, afinal,
Coberta d’ouro e prata, dona Sancha... *
Nota
* Traum- "sonho" em alemão e "trauma" em português, ambos os termos derivam do grego Traûma= ferida
Suponho que Alma se refere, com esse soneto, a um estupro que sofreu...
* Coberta d’ouro e prata, dona Sancha...- Alusão à antiga cantiga de roda infantil: Senhora dona Sancha, coberta de ouro e prata / Descubra seu rosto, queremos ver sua cara...
Por um certo momento de desgraça
Que não revelarei, por comovida,
Ou porque até mesmo um trauma passa.
Traum, essa palavra é só um sonho
Na língua de meu avô germânico
Que um olhar legou-me assim bisonho
Que me tem evitado maior pânico.
Então sonharei, eis minha proposta,
Tudo é sonho mesmo... O que é real?
Meu próprio corpo branco é a resposta
Malgrado dores e roxa e triste mancha
Que também se apagará, creio, afinal,
Coberta d’ouro e prata, dona Sancha... *
Nota
* Traum- "sonho" em alemão e "trauma" em português, ambos os termos derivam do grego Traûma= ferida
Suponho que Alma se refere, com esse soneto, a um estupro que sofreu...
* Coberta d’ouro e prata, dona Sancha...- Alusão à antiga cantiga de roda infantil: Senhora dona Sancha, coberta de ouro e prata / Descubra seu rosto, queremos ver sua cara...
domingo, 15 de maio de 2011
O Último Verão (de Alma Welt)
Não pedirei mais que este verão
Às forças que decretam meu destino
Mas pretendo estar a postos no portão
Quando ouvir o som do violino
Aquele de soluços, de Verlaine
Que anuncia a chegada do Outono,
Já pedindo à alma que hiberne,
Quase pedindo já meu abandono.
Mas muitos me verão cantar, dançar,
Subir à mesa e pôr a saia na cabeça,
Tão certo que me venha a envergonhar...
E se não tomar um porre santo
É para que a alma não se esqueça
Do quanto amei a vida... quanto, quanto!
Nota
"Aquele de soluços de Verlaine"- Alma se refere ao poema de Paul Verlaine que começa assim: "Les sanglots longs des violons de l'automne / Blessent mon coeur d'une langueur monotone..."
Às forças que decretam meu destino
Mas pretendo estar a postos no portão
Quando ouvir o som do violino
Aquele de soluços, de Verlaine
Que anuncia a chegada do Outono,
Já pedindo à alma que hiberne,
Quase pedindo já meu abandono.
Mas muitos me verão cantar, dançar,
Subir à mesa e pôr a saia na cabeça,
Tão certo que me venha a envergonhar...
E se não tomar um porre santo
É para que a alma não se esqueça
Do quanto amei a vida... quanto, quanto!
Nota
"Aquele de soluços de Verlaine"- Alma se refere ao poema de Paul Verlaine que começa assim: "Les sanglots longs des violons de l'automne / Blessent mon coeur d'une langueur monotone..."
segunda-feira, 9 de maio de 2011
Póstuma (de Alma Welt)
Não saber o que será feito de mim
É uma dúvida voraz que me consome,
Pois em arte não vivi senão na fome,
Saciada serei eu depois do fim?
Dizem que a poesia em si se basta,
Que mais quer o jogral ou menestrel?
Manter a alma jovem e sempre casta,
Cantar como cigarra... no papel.
Mas bá! vaidade, orgulho, natureza!
Queria olhar um povo de leitores
Suspirando de pena ou de beleza
Pela musa fiel que houvera sido,
Patética, febril, cheia de dores
Por votada ao Verso ter nascido...
É uma dúvida voraz que me consome,
Pois em arte não vivi senão na fome,
Saciada serei eu depois do fim?
Dizem que a poesia em si se basta,
Que mais quer o jogral ou menestrel?
Manter a alma jovem e sempre casta,
Cantar como cigarra... no papel.
Mas bá! vaidade, orgulho, natureza!
Queria olhar um povo de leitores
Suspirando de pena ou de beleza
Pela musa fiel que houvera sido,
Patética, febril, cheia de dores
Por votada ao Verso ter nascido...
domingo, 1 de maio de 2011
A Mendiga (de Alma Welt)
Quero morrer encostada num barranco
Feito a mendiga de uma estória,
Com o olho arregalado muito branco,
O constelado céu olhando, em glória.
Se tiver neve, melhor, se não, lama.
Melhor relva e flores pequeninas;
O barranco, espaldar da minha cama,
E a colcha só de cardos e boninas.
Incorrigível fantasista do singelo,
No fundo espero só o merecido:
Um horizonte de livros meus no prelo.
E o sonho de que ao divisar meu rosto
Um viandante se ponha comovido
Antes que o nosso sol se tenha posto...
Feito a mendiga de uma estória,
Com o olho arregalado muito branco,
O constelado céu olhando, em glória.
Se tiver neve, melhor, se não, lama.
Melhor relva e flores pequeninas;
O barranco, espaldar da minha cama,
E a colcha só de cardos e boninas.
Incorrigível fantasista do singelo,
No fundo espero só o merecido:
Um horizonte de livros meus no prelo.
E o sonho de que ao divisar meu rosto
Um viandante se ponha comovido
Antes que o nosso sol se tenha posto...
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