terça-feira, 3 de outubro de 2017

Primaveras (de Alma Welt)

Queria ter minha nova primavera,
Levantar em esperanças da minha cama,
Não triste como um fado da Severa, *
Nem como os de ainda hoje na Alfama.

Também não como baladas da Irlanda,
Por mais belas que elas sejam e dolentes,
Nem serestas brasileiras de varanda,
De serenos e ventinhos de repentes...

Também não de bosques de Viena
Ou de róseas cerejeiras japonesas,
Ou de um acordeão de beira-Sena...

Primaverona dos amantes, cotovia,
Sem noturnos rouxinóis das incertezas,
Mas com flores a explodir, pura alegria...

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03/10/2017
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Notas
*Não triste como um fado da Severa
- Severa foi a primeira grande fadista de Portugal, célebre, ainda no século XIX, que teria lançado as bases do estilo das fadistas de ainda hoje, passando por Amália Rodrigues, que consolidou o modo peculiar de modular mouriscamente os versos finais nas letras, quase sempre tristes, de fatalidade, de destino...

*Nem serestas brasileiras de varanda/
De serenos e ventinhos de repentes. - Alma faz alusão à canção folclórica brasileira, "Fiz a cama na varanda"...

* Primaverona dos amantes, cotovia/
Sem noturnos rouxinóis das incertezas
- (primavera grande de Verona) Alma alude à famosa cena de Romeu e Julieta, os amantes de Verona, de Shakespeare, em que o casal passa a primeira noite juntos, após se casarem em segredo, e Julieta desperta alarmada com o canto da cotovia e eles devaneiam incertos se ainda é o canto noturno do rouxinol ou a cotovia da manhã, pois ele não pode ser encontrado no quarto dela, em sua casa paterna, ou será morto.

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