"Todos somos um resumo do Universo
Cada um contendo o Início e o Fim,
Mas a memória nos trai, é controverso,
E é claro que não falo só por mim..."
"Esquecemos de quem já fomos antes,
Das pirâmides também já não sabemos,
E das grandes muralhas de gigantes
O sentido e a origem já perdemos..."
Assim falava o meu pai e eu sonhava
Viajando com ele em suas palavras,
Urdindo de poemas minhas lavras.
E ao contrário do que se esperava,
Tirando pedra por pedra do tinteiro
Eu falaria só por mim do mundo inteiro...
.
30/01/2017
Este espaço é destinado às diversas séries de sonetos da poetisa gaúcha Alma Welt, que, mais genéricas, não se enquadrem nos outros blogs da poetisa, de séries mais específicas, como os eróticos, os metafísicos, etc. (vide lista de seus blogs)
segunda-feira, 30 de janeiro de 2017
O Hóspede (de Alma Welt)
Não tinha a menor noção de nada
Aquele moço que hospedamos na fazenda.
Vinha perdido andando pela estrada
Como um jovem ser de antiga lenda.
Seu rosto tão puro, olhar distante
Mas que pousava em nós por um instante,
A fala pausada e intermitente,
Numa linguagem doce e diferente...
Nossa Matilde a princípio só temendo,
Depois lágrimas vertendo por um triz
Já se ajoelhava à porta do seu quarto...
"Alma, ele é um anjo, não estás vendo?
De suas asas mostrou-me a cicatriz,
Se ele partir, com ele também parto..."
.
30/01/2017
Aquele moço que hospedamos na fazenda.
Vinha perdido andando pela estrada
Como um jovem ser de antiga lenda.
Seu rosto tão puro, olhar distante
Mas que pousava em nós por um instante,
A fala pausada e intermitente,
Numa linguagem doce e diferente...
Nossa Matilde a princípio só temendo,
Depois lágrimas vertendo por um triz
Já se ajoelhava à porta do seu quarto...
"Alma, ele é um anjo, não estás vendo?
De suas asas mostrou-me a cicatriz,
Se ele partir, com ele também parto..."
.
30/01/2017
sábado, 28 de janeiro de 2017
Sonhos maus ou A Ilha do Medo (de Alma Welt)
Meus sonhos são tão constrangedores,
Cheios de ânsias de caminhos e de abrigos,
Que não ouso contar nem pros doutores,
Finais patéticos, ausência dos amigos...
Será isso, no final, o que me espera?
Por quê neles eu acabo sempre só?
Porquê não é nunca primavera
E eu caminho do barro para o pó?
Alma, és boa, não temes a vigília
Mas também reconcilies com teu sono,
O Medo é só o nome de uma ilha.
Tens amor, tens tudo ou quase tudo,
Apenas te falta entrega ao Dono
Que é tão cuidadoso embora mudo...
.
28/01/2017
Cheios de ânsias de caminhos e de abrigos,
Que não ouso contar nem pros doutores,
Finais patéticos, ausência dos amigos...
Será isso, no final, o que me espera?
Por quê neles eu acabo sempre só?
Porquê não é nunca primavera
E eu caminho do barro para o pó?
Alma, és boa, não temes a vigília
Mas também reconcilies com teu sono,
O Medo é só o nome de uma ilha.
Tens amor, tens tudo ou quase tudo,
Apenas te falta entrega ao Dono
Que é tão cuidadoso embora mudo...
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28/01/2017
sexta-feira, 27 de janeiro de 2017
A esteira (de Alma Welt)
O homem vaga pelo mundo, peregrino,
Ou lançará raízes poderosas
Sempre temeroso do destino
Que a vida nos reserva, que não rosas?
Uma coisa e outra, duplo rosto
Têm todas as coisas, como Jano.
Uns temem a loucura só em Agosto
Outros consideram o mundo insano.
Todos procuramos nosso rio...
Haverá só, de viver, uma maneira
E tudo o mais na vida é desvario?
Não mais perguntes, cala-te, razão!
Segue teu coração em sua esteira
Qual gaivotas atrás da embarcação...
.
27/01/2017
Ou lançará raízes poderosas
Sempre temeroso do destino
Que a vida nos reserva, que não rosas?
Uma coisa e outra, duplo rosto
Têm todas as coisas, como Jano.
Uns temem a loucura só em Agosto
Outros consideram o mundo insano.
Todos procuramos nosso rio...
Haverá só, de viver, uma maneira
E tudo o mais na vida é desvario?
Não mais perguntes, cala-te, razão!
Segue teu coração em sua esteira
Qual gaivotas atrás da embarcação...
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27/01/2017
quinta-feira, 26 de janeiro de 2017
Resumo da Ópera (de Alma Welt)
Sei que tenho imenso amor à vida
Na medida mesma dela horror...
A maldade do mundo, percebida,
É apenas, de somenos, um fator.
O que me causa dor e estranheza
É o fato desta vida se acabar,
A Morte, como carta sobre a mesa
No jogo da cigana, sem parar... *
É tão difícil perdoar esse malfeito
De nosso grande Deus, chefão sinistro
Que tem um anjo negro por ministro.
Mas quem sou eu, mera atrevida,
Talvez mimada, sim, é o meu jeito,
Pra tal resumo da ópera da vida...
.
25/01/2017
Nota
* A Morte, como carta sobre a mesa
No jogo da cigana, sem parar... - Alusão à ária do destino da ópera Carmen de Bizet, em que a cigana bota cartas para ler a sorte e sai sempre a carta da Morte ( La mort, la mort... toujours la mort)
Na medida mesma dela horror...
A maldade do mundo, percebida,
É apenas, de somenos, um fator.
O que me causa dor e estranheza
É o fato desta vida se acabar,
A Morte, como carta sobre a mesa
No jogo da cigana, sem parar... *
É tão difícil perdoar esse malfeito
De nosso grande Deus, chefão sinistro
Que tem um anjo negro por ministro.
Mas quem sou eu, mera atrevida,
Talvez mimada, sim, é o meu jeito,
Pra tal resumo da ópera da vida...
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25/01/2017
Nota
* A Morte, como carta sobre a mesa
No jogo da cigana, sem parar... - Alusão à ária do destino da ópera Carmen de Bizet, em que a cigana bota cartas para ler a sorte e sai sempre a carta da Morte ( La mort, la mort... toujours la mort)
O Grão (de Alma Welt)
Entender a vida toda num segundo
É possível, e inefável, na verdade.
Numa casca de noz repousa o mundo
Embora também sua ambiguidade.
O supremo mistério é haver o Mal
Que não podemos realmente compreender.
Se voltasse o Paraíso original
O tal fruto evitaríamos comer?
Não, bem o sabemos, não tem jeito:
O ser humano é rebelde ou suicida
Ou repleto de rancor e de despeito.
Mas o Amor, eis um só grão de poeira
De uma concentração despercebida
Que ilumina a nossa vida inteira...
.
25/01/2017
É possível, e inefável, na verdade.
Numa casca de noz repousa o mundo
Embora também sua ambiguidade.
O supremo mistério é haver o Mal
Que não podemos realmente compreender.
Se voltasse o Paraíso original
O tal fruto evitaríamos comer?
Não, bem o sabemos, não tem jeito:
O ser humano é rebelde ou suicida
Ou repleto de rancor e de despeito.
Mas o Amor, eis um só grão de poeira
De uma concentração despercebida
Que ilumina a nossa vida inteira...
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25/01/2017
terça-feira, 24 de janeiro de 2017
Vão se os anéis (de Alma Welt)
"Vão-se o anéis e vão-se os dedos,
Restam as lembranças mais infaustas
Das memórias escavadas e exaustas
Ficam os ódios, permanecem medos..."
Assim dizia, bem me lembro, minha tia
Que gostava de chocar a gurizada
Com seu catastrofismo de poesia
Que é o que nos ficou de sua estada.
E eu confesso que gostava desse approche
Pessimista ao extremo e engraçado,
Que do poeta é a raiz do lado gauche.
Já que o barco está fadado a naufragar
Se tornaria o mundo mais amado
E a suprema aventura é só amar...
.
24/01/2017
Restam as lembranças mais infaustas
Das memórias escavadas e exaustas
Ficam os ódios, permanecem medos..."
Assim dizia, bem me lembro, minha tia
Que gostava de chocar a gurizada
Com seu catastrofismo de poesia
Que é o que nos ficou de sua estada.
E eu confesso que gostava desse approche
Pessimista ao extremo e engraçado,
Que do poeta é a raiz do lado gauche.
Já que o barco está fadado a naufragar
Se tornaria o mundo mais amado
E a suprema aventura é só amar...
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24/01/2017
segunda-feira, 23 de janeiro de 2017
Confirmação (de Alma Welt)
Escrevo versos para ter o que fazer,
A mim não me foi dado outro recurso.
Sou grácil, fraca, branca, sem poder,
Às vezes durmo tanto quanto um urso.
Tenho uma certa vergonha de ser bela
Por poder ser confundida com ser fútil,
Como aquelas de moldura de janela
Só feitas para o lar, modelo inútil...
Mas quando escrevo um verso que me agrada
Sinto que tudo faz sentido num momento
Como se por alguém de novo amada...
E sei que é o bastante pra estar viva
E ter a espécie de trono em que me sento
Como Florbela ou Safo rediviva...
.
23/01/2017
A mim não me foi dado outro recurso.
Sou grácil, fraca, branca, sem poder,
Às vezes durmo tanto quanto um urso.
Tenho uma certa vergonha de ser bela
Por poder ser confundida com ser fútil,
Como aquelas de moldura de janela
Só feitas para o lar, modelo inútil...
Mas quando escrevo um verso que me agrada
Sinto que tudo faz sentido num momento
Como se por alguém de novo amada...
E sei que é o bastante pra estar viva
E ter a espécie de trono em que me sento
Como Florbela ou Safo rediviva...
.
23/01/2017
domingo, 22 de janeiro de 2017
Palavras ao Bom Deus (de Alma Welt)
Senhor Deus, poupai-me da amargura
Que é coisa que nunca experimentei.
De amargo só o mate: tudo cura
E não tenho queixas do meu Rei...
Sofrimentos? Só os conheço de viés...
É certo que perdi a Mutti e o Vati,
Fiquei abúlica, a arrastar os pés,
Levei dez anos dos males pro arremate.
Mas o que é isso, ante a dor dos desvalidos?
Meus problemas sempre foram de fartura,
Se fraquejo, não me dai, Senhor, ouvidos...
Ficai pois, Senhor, bem descansado:
Só escreverei sonetos de candura,
Perdoai se vos ousei ter criticado...
.
22/01/2017
Que é coisa que nunca experimentei.
De amargo só o mate: tudo cura
E não tenho queixas do meu Rei...
Sofrimentos? Só os conheço de viés...
É certo que perdi a Mutti e o Vati,
Fiquei abúlica, a arrastar os pés,
Levei dez anos dos males pro arremate.
Mas o que é isso, ante a dor dos desvalidos?
Meus problemas sempre foram de fartura,
Se fraquejo, não me dai, Senhor, ouvidos...
Ficai pois, Senhor, bem descansado:
Só escreverei sonetos de candura,
Perdoai se vos ousei ter criticado...
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22/01/2017
quarta-feira, 18 de janeiro de 2017
A Travessia II (de Alma Welt)
Atravessar de nós o centro e o fundo, *
Eis aí o que de fato nos liberta,
Grande porta de fogo semi-aberta
Nossa única passagem para o mundo.
Não há como voltar do labirinto
Com os seus meandros sucessivos.
Na entrada ficam os medos que ainda sinto
Mas que devo superar, embora vivos.
Mas estando na metade do caminho,
Ai de quem de seu medo não der cabo,
As moscas no esperam, se voltarmos.
Enfrentemos um diabo não mesquinho,
E passemos por debaixo do seu rabo
Para as nossas estrelas avistarmos...
.
18/01/2017
Nota
*Este soneto faz uma síntese da travessia de Dante, do Inferno, na verdade a trajetória nossa da própria vida.
Eis aí o que de fato nos liberta,
Grande porta de fogo semi-aberta
Nossa única passagem para o mundo.
Não há como voltar do labirinto
Com os seus meandros sucessivos.
Na entrada ficam os medos que ainda sinto
Mas que devo superar, embora vivos.
Mas estando na metade do caminho,
Ai de quem de seu medo não der cabo,
As moscas no esperam, se voltarmos.
Enfrentemos um diabo não mesquinho,
E passemos por debaixo do seu rabo
Para as nossas estrelas avistarmos...
.
18/01/2017
Nota
*Este soneto faz uma síntese da travessia de Dante, do Inferno, na verdade a trajetória nossa da própria vida.
terça-feira, 17 de janeiro de 2017
Harmonia (de Alma Welt)
Viver como se o mundo fosse bom
E nossa vida fosse sempre bela,
Eis o melhor timbre, cor e tom
De nossa letra, música, aquarela...
E que isso não seja engano ledo,
Mas vontade de ser, proposital,
Como quem primeiro acorda cedo
E planta belas flores no quintal...
Tudo começa no navio que é tua casa,
E se nele não lograres harmonia
Tudo o mais se corrompe, gora, atrasa.
Sim, vá para o trabalho assoviando,
Bem fechada a torneira da tua pia,
Pra voltares ao navio do teu comando...
.
17/01/2017
E nossa vida fosse sempre bela,
Eis o melhor timbre, cor e tom
De nossa letra, música, aquarela...
E que isso não seja engano ledo,
Mas vontade de ser, proposital,
Como quem primeiro acorda cedo
E planta belas flores no quintal...
Tudo começa no navio que é tua casa,
E se nele não lograres harmonia
Tudo o mais se corrompe, gora, atrasa.
Sim, vá para o trabalho assoviando,
Bem fechada a torneira da tua pia,
Pra voltares ao navio do teu comando...
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17/01/2017
segunda-feira, 16 de janeiro de 2017
Ó Espelho (de Alma Welt)
Vejam, nossa imagem é inconstante,
Pois os anos a procuram destruir,
Lentamente rumo ao Nada ali adiante,
Arquitetura sempre prestes a ruir...
É somente o espelho que segura
Nossos traços que o Tempo desintegra
E a memória restaura, cola e cura
Nossa imagem que já pouco nos alegra.
Lago sutil e diabólico cristal
Que a um primeiro Narciso foi fatal,
Ó espelho, instrumento de ironia,
Não me tentes com respostas lisonjeiras
Pois teu lago para mim são corredeiras
Aos meus olhos argutos de poesia...
.
16/01/2017
Pois os anos a procuram destruir,
Lentamente rumo ao Nada ali adiante,
Arquitetura sempre prestes a ruir...
É somente o espelho que segura
Nossos traços que o Tempo desintegra
E a memória restaura, cola e cura
Nossa imagem que já pouco nos alegra.
Lago sutil e diabólico cristal
Que a um primeiro Narciso foi fatal,
Ó espelho, instrumento de ironia,
Não me tentes com respostas lisonjeiras
Pois teu lago para mim são corredeiras
Aos meus olhos argutos de poesia...
.
16/01/2017
domingo, 15 de janeiro de 2017
Diálogo platônico (de Alma Welt)
"Só sabemos o que nossa alma recorda.
Nada de novo apreendemos, na verdade,
Pois a mente viciosa só aborda
O que está no lado oculto da saudade."
Assim dizia meu professor platônico,
Antes que o meu olhar candente e fixo
Começasse a pô-lo meio afônico
E a acariciar seu crucifixo...
Até que um dia após a aula me abordou:
"Amei-te, Alma, em vida já passada,
Minha amada és tu, não esquecida...
E eu: "Querido professor, se ainda sou
Aquela que tu amavas e ainda amada,
A alma não se recordou, talvez ferida"...
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15/01/2017
Nada de novo apreendemos, na verdade,
Pois a mente viciosa só aborda
O que está no lado oculto da saudade."
Assim dizia meu professor platônico,
Antes que o meu olhar candente e fixo
Começasse a pô-lo meio afônico
E a acariciar seu crucifixo...
Até que um dia após a aula me abordou:
"Amei-te, Alma, em vida já passada,
Minha amada és tu, não esquecida...
E eu: "Querido professor, se ainda sou
Aquela que tu amavas e ainda amada,
A alma não se recordou, talvez ferida"...
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15/01/2017
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