Não te mistures muito, minha guria,
Se acaso fores às vilas e cidades;
O povo necessita de poesia
Mas tem muito mais necessidades.
Se não és uma enfermeira pouco podes,
Ou uma médica, vocação sublime...
Mas não pedirei que te acomodes
Se és somente alguém que tudo rime.
Vai como menestrel por entre as gentes
E virás a conhecer o Bem e o Mal
Nos humanos corações e suas mentes.
Finda a função, declina dos convites,
Pra com eles dividir o pão e o sal
Porque o vinho que então vem não tem limites...
.
17/05/2018
Este espaço é destinado às diversas séries de sonetos da poetisa gaúcha Alma Welt, que, mais genéricas, não se enquadrem nos outros blogs da poetisa, de séries mais específicas, como os eróticos, os metafísicos, etc. (vide lista de seus blogs)
quinta-feira, 17 de maio de 2018
terça-feira, 15 de maio de 2018
Diogenes (de Alma Welt)
Diogenes - pintura de Jean-Léon Gerôme, 1860
Diogenes (de Alma Welt)
A vida é permanente luta interna
Ou ao menos procura obstinada
Como a daquele louco da lanterna,
Por oculta hombridade ou disfarçada,
Passeando com seu galo depenado,
Diogenes, de Sinope para o mundo,
Ao sol, no seu tonel sem fundo,
Pediu sair da frente um potentado.
De nossa procura verdadeira
Os políticos somente nos desviam,
Querendo nossa atenção a vida inteira...
Mas aqueles cujas sombras promoviam,
Da frente do meu sol eu expulsei...
Pleno de vinho é meu tonel, então, bebei!
.
15/05/2018
A Banalidade do Mal (de Alma Welt)
"O grande problema da existência
É sabermos separar o Bem do Mal,
Pois estão misturados, com frequência,
E mesmo os tens bem aí no teu quintal..."
Meu pai dizia, fumando o seu cachimbo,
Ou num gesto banal para limpá-lo,
E o fazia somente no domingo
Com toda a semana de intervalo.
"Mas o perigo é uma fatal banalidade
Na qual o Mal entre nós se transfigura
Pra com ele nos sentirmos à vontade..."
Assim, meu pai me pôs bem alertada
Pois o Mal já se propôs imagem pura,
Que afirmava existir, não misturada...
.
15/05/2018
Nota
Sobre "a banalidade do mal"
Por Felipe Tessarolo em 19/01/2016
Hannah Arendt (1906-1975) foi uma teórica política alemã, de origem judaica, que atuou também como jornalista e professora universitária. Escreveu livros como As origens do totalitarismo (1951), A condição humana (1958), Homens em tempos sombrios (1968) e Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal (1963) e é considerada uma das pessoas mais influentes do século 20.
Este artigo pretende fazer uma analogia entre as ideias expressas por Hannah Arendt em Eichmann em Jerusalém, o conceito sobre a banalidade do mal e o comportamento dos indivíduos nas redes sociais, que de certa forma replicam as análises desenvolvidas pela autora.
Adolf Eichmann foi um oficial da Gestapo nazista responsabilizado pela logística de extermínio de milhões de pessoas. Foi capturado na Argentina e julgado em Jerusalém no ano de 1961. Hannah Arendt foi enviada como correspondente pela revista The New Yorker para cobrir as sessões do julgamento tornadas públicas pelo governo israelense. Em 1963, com base nos artigos publicados pela The New Yorker, a autora publicou um livro sobre o julgamento e nele desenvolveu uma análise sobre Eichmann.
Um dos pontos polêmicos do livro é a maneira como a autora interpreta o comportamento de Eichmann, pois além de cobrir todo o processo do julgamento, ela ainda entrevistou pessoalmente o acusado. Segundo Hannah Arendt, Adolf Eichmann não era um monstro, alguém com um espírito demoníaco e antissemita. Ela o identificou como um burocrata, um sujeito medíocre, que de certa forma renunciou a pensar nas consequências que os seus atos poderiam ter. “Embora as atrocidades por ele conduzidas tivessem sido de uma crueldade inimaginável, ‘o executante era ordinário, comum, nem demoníaco, nem monstruoso’. Eichmann revelou-se, durante todo o processo, até os dias que antecederam sua morte por enforcamento, como uma pessoa incapaz de exercer a atividade de pensar e elaborar um juízo critico e reflexivo” (SIQUEIRA, 2011).
Mas é preciso dizer que os judeus no mundo todo ficaram indignados com a tese de Hannah Arendt, que consideraram uma judia renegada, e que ela, sim, é que estava banalizando o Mal. O Mal para os judeus é torpe e demoníaco ao extremo, e os nazistas estão associados a Satã sobre a Terra. Eu também assim acredito. A aparente banalidade do Mal no nosso cotidiano, é justamente uma das maiores perfídias do demônio.
(Guilherme de Faria)
É sabermos separar o Bem do Mal,
Pois estão misturados, com frequência,
E mesmo os tens bem aí no teu quintal..."
Meu pai dizia, fumando o seu cachimbo,
Ou num gesto banal para limpá-lo,
E o fazia somente no domingo
Com toda a semana de intervalo.
"Mas o perigo é uma fatal banalidade
Na qual o Mal entre nós se transfigura
Pra com ele nos sentirmos à vontade..."
Assim, meu pai me pôs bem alertada
Pois o Mal já se propôs imagem pura,
Que afirmava existir, não misturada...
.
15/05/2018
Nota
Sobre "a banalidade do mal"
Por Felipe Tessarolo em 19/01/2016
Hannah Arendt (1906-1975) foi uma teórica política alemã, de origem judaica, que atuou também como jornalista e professora universitária. Escreveu livros como As origens do totalitarismo (1951), A condição humana (1958), Homens em tempos sombrios (1968) e Eichmann em Jerusalém – um relato sobre a banalidade do mal (1963) e é considerada uma das pessoas mais influentes do século 20.
Este artigo pretende fazer uma analogia entre as ideias expressas por Hannah Arendt em Eichmann em Jerusalém, o conceito sobre a banalidade do mal e o comportamento dos indivíduos nas redes sociais, que de certa forma replicam as análises desenvolvidas pela autora.
Adolf Eichmann foi um oficial da Gestapo nazista responsabilizado pela logística de extermínio de milhões de pessoas. Foi capturado na Argentina e julgado em Jerusalém no ano de 1961. Hannah Arendt foi enviada como correspondente pela revista The New Yorker para cobrir as sessões do julgamento tornadas públicas pelo governo israelense. Em 1963, com base nos artigos publicados pela The New Yorker, a autora publicou um livro sobre o julgamento e nele desenvolveu uma análise sobre Eichmann.
Um dos pontos polêmicos do livro é a maneira como a autora interpreta o comportamento de Eichmann, pois além de cobrir todo o processo do julgamento, ela ainda entrevistou pessoalmente o acusado. Segundo Hannah Arendt, Adolf Eichmann não era um monstro, alguém com um espírito demoníaco e antissemita. Ela o identificou como um burocrata, um sujeito medíocre, que de certa forma renunciou a pensar nas consequências que os seus atos poderiam ter. “Embora as atrocidades por ele conduzidas tivessem sido de uma crueldade inimaginável, ‘o executante era ordinário, comum, nem demoníaco, nem monstruoso’. Eichmann revelou-se, durante todo o processo, até os dias que antecederam sua morte por enforcamento, como uma pessoa incapaz de exercer a atividade de pensar e elaborar um juízo critico e reflexivo” (SIQUEIRA, 2011).
Mas é preciso dizer que os judeus no mundo todo ficaram indignados com a tese de Hannah Arendt, que consideraram uma judia renegada, e que ela, sim, é que estava banalizando o Mal. O Mal para os judeus é torpe e demoníaco ao extremo, e os nazistas estão associados a Satã sobre a Terra. Eu também assim acredito. A aparente banalidade do Mal no nosso cotidiano, é justamente uma das maiores perfídias do demônio.
(Guilherme de Faria)
Ervas Daninhas (de Alma Welt)
"Nesta vida, somente Amor e Arte
Têm algum sentido transcendente
Pois a Fé deles deriva ou faz parte
Que sem ela o Ser vive mas não sente."
Minha avó assim dizia em seu jardim
Protegendo suas flores de umas ervas
Que com o dedo apontava para mim:
"Daninhas e mortais se as conservas..."
Mas nenhuma diferença eu via, ou pouca,
De outras ervas com que fazia os chás,
E eu achava minha avó um pouco louca.
"As pessoas ervas são, minha querida,
E tu precisas distinguir quando são más,
Entre as boas no Jardim de tua vida..."
.
15/05/2018
Têm algum sentido transcendente
Pois a Fé deles deriva ou faz parte
Que sem ela o Ser vive mas não sente."
Minha avó assim dizia em seu jardim
Protegendo suas flores de umas ervas
Que com o dedo apontava para mim:
"Daninhas e mortais se as conservas..."
Mas nenhuma diferença eu via, ou pouca,
De outras ervas com que fazia os chás,
E eu achava minha avó um pouco louca.
"As pessoas ervas são, minha querida,
E tu precisas distinguir quando são más,
Entre as boas no Jardim de tua vida..."
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15/05/2018
segunda-feira, 14 de maio de 2018
A Poesia e a Pintura (de Alma Welt)
A Poesia é irmã gêmea da Pintura
Mas não univitelina, na verdade;
E suas diferenças de estrutura
Têm a mesma meta e liberdade.
Por isso tantos poetas são pintores
(não só como Rimbaud com suas vogais)*
E encontram nas palavras suas cores
Buscando uma fusão que as liquefaz.
Dante, se não o Alighieri, mas Rosseti,
Logrou exercer magistralmente
Esse duplo mister que nos compete:
Plasmar do mundo o dom poético na tela
Assim como as cores de sua mente
Colorem cada palavra que a revela...
.
14/05/2018
Notas
*não só como Rimbaud com suas vogais- O grande poeta Arthur Rimbaud
tem um famoso poeminha denominado "Les couleurs des voyelles".
*Dante, se não o Alighieri, mas Rosseti - Dante Gabriel Rossetti (Londres, 12 de maio de 1828 — Birchington-on-Sea, 10 de abril de 1882), originalmente Gabriel Charles Dante Rossetti, foi um poeta, ilustrador e pintor inglês de origem italiana. Devido à sua preferência pela poesia medieval e em especial pela obra de Dante, Rossetti muda a ordem dos seus nomes e passa a usar Dante em primeiro lugar. Fundou, juntamente com John Everett Millais e William Holman Hunt, em 1848, a Irmandade Pré-Rafaelita, um grupo artístico entre o espírito revivalista do romantismo e as novas vanguardas do século XX. Rosseti era tão grande poeta quanto pintor.
Mas não univitelina, na verdade;
E suas diferenças de estrutura
Têm a mesma meta e liberdade.
Por isso tantos poetas são pintores
(não só como Rimbaud com suas vogais)*
E encontram nas palavras suas cores
Buscando uma fusão que as liquefaz.
Dante, se não o Alighieri, mas Rosseti,
Logrou exercer magistralmente
Esse duplo mister que nos compete:
Plasmar do mundo o dom poético na tela
Assim como as cores de sua mente
Colorem cada palavra que a revela...
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14/05/2018
Notas
*não só como Rimbaud com suas vogais- O grande poeta Arthur Rimbaud
tem um famoso poeminha denominado "Les couleurs des voyelles".
*Dante, se não o Alighieri, mas Rosseti - Dante Gabriel Rossetti (Londres, 12 de maio de 1828 — Birchington-on-Sea, 10 de abril de 1882), originalmente Gabriel Charles Dante Rossetti, foi um poeta, ilustrador e pintor inglês de origem italiana. Devido à sua preferência pela poesia medieval e em especial pela obra de Dante, Rossetti muda a ordem dos seus nomes e passa a usar Dante em primeiro lugar. Fundou, juntamente com John Everett Millais e William Holman Hunt, em 1848, a Irmandade Pré-Rafaelita, um grupo artístico entre o espírito revivalista do romantismo e as novas vanguardas do século XX. Rosseti era tão grande poeta quanto pintor.
domingo, 13 de maio de 2018
O segredo do Humor (de Alma Welt)
"Sobretudo é necessário ter humor
Para viver, amar e fazer arte.
Humor não é algo pronto a se dispor,
É colocar-se a si acima e à parte..."
E contestei meu pai: "Como? O que dizes?
Quando íamos caçar naqueles dias
Comparaste-nos ao voo das perdizes,
Pobres humanos que voamos raso, e rias..".
E respondeu meu pai: "Vencer o medo
Para olhar-nos um pouco lá de cima:
Tolos, agachados, mãos na carabina..."
"Enxergar-nos do alto de um rochedo
Como talvez Deus nos veja: aparvalhados,
Ainda "gauches" nos sentindo, e pelados..."
.
13/05/2018
Para viver, amar e fazer arte.
Humor não é algo pronto a se dispor,
É colocar-se a si acima e à parte..."
E contestei meu pai: "Como? O que dizes?
Quando íamos caçar naqueles dias
Comparaste-nos ao voo das perdizes,
Pobres humanos que voamos raso, e rias..".
E respondeu meu pai: "Vencer o medo
Para olhar-nos um pouco lá de cima:
Tolos, agachados, mãos na carabina..."
"Enxergar-nos do alto de um rochedo
Como talvez Deus nos veja: aparvalhados,
Ainda "gauches" nos sentindo, e pelados..."
.
13/05/2018
quinta-feira, 10 de maio de 2018
A Obra Aberta (de Alma Welt)
"Não estamos nunca prontos, acabados,
E somos obra aberta pra retoques",
Dizia, remexendo os seus guardados,
Minha avó nos seus típicos enfoques.
E eu ficava imaginando o meu pintor
A pintar-me numa tela com esmero
Sem atingir o fim, e em desespero
Destruindo-me afinal por puro amor.
E dei-me conta de que Deus é o Artista
Que envelhece e mata por capricho
O modelo, quanto mais Sua mão insista.
E sorri, como a própria Monalisa
Cujo sorriso era tão somente o início
Da gargalhada a vir, e que ela avisa...
.
10/05/2018
E somos obra aberta pra retoques",
Dizia, remexendo os seus guardados,
Minha avó nos seus típicos enfoques.
E eu ficava imaginando o meu pintor
A pintar-me numa tela com esmero
Sem atingir o fim, e em desespero
Destruindo-me afinal por puro amor.
E dei-me conta de que Deus é o Artista
Que envelhece e mata por capricho
O modelo, quanto mais Sua mão insista.
E sorri, como a própria Monalisa
Cujo sorriso era tão somente o início
Da gargalhada a vir, e que ela avisa...
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10/05/2018
quarta-feira, 9 de maio de 2018
"Por quem os sinos dobram" (de Alma Welt)
Eu gostaria de ter sido só amor,
Sem dor, ressentimentos e ironia
Que se estes marcaram minha poesia,
Revistos quase ferem meu pudor.
O espelho da poesia não é qualquer,
Muito menos como um espelho de cristal
Lisonjeiro que devolve o que se quer,
Mas terrível, zombeteiro e quase mau.
A poesia é esse dom de solidão
E por nós os amigos vestem luto
Ou nos dão essa precoce sensação...
Pois os versos seu pacto nos cobram
Como ao Fausto a beleza do minuto
E somos vivos "por quem os sinos dobram"...
.
09/05/2018
Notas
* "Por quem os sinos dobram"- Este verso célebre ( ...for whom the bells tolls...) são do poeta inglês elisabethano, John Donne (contemporâneo de Shakespeare) O poema a que ele pertence, começa assim: "No man is an island.."" Nenhum homem é uma ilha, somos todos parte do continente)...e termina : "Por isso não pergunte por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti."
*...seu pacto nos cobram/como ao Fausto a beleza do minuto - alusão ao pacto que o insatisfeito e entediado Fausto ( no grande poema dramático de Goethe) faz com Mefistófeles (encarnação do Diabo), segundo o qual se através das dádivas e poderes que o demônio lhe proporcionasse, num momento de satisfação e deslumbramento dissesse afinal "ao minuto que passa" : "Pára! És tão belo! ", o pacto cessaria, e pelo contrato ele morreria e a sua alma seria levada por Mefistófeles. Mas no final, inusitadamente Deus caloteia o Diabo (tratava-se de uma aposta de Deus com o Diabo pela alma do sábio recluso) e manda um anjo serafim sedutor em evoluções e meneios despertar a luxúria do diabo na hora da saída da Alma do corpo de Fausto, distraindo-o com sua beleza adolescente e tentadora, O serafim se aproveita da distração e escamoteia a Alma de Fausto levando-a para o céu. Deus, que perdera a aposta... ludibria o Demônio.
Sem dor, ressentimentos e ironia
Que se estes marcaram minha poesia,
Revistos quase ferem meu pudor.
O espelho da poesia não é qualquer,
Muito menos como um espelho de cristal
Lisonjeiro que devolve o que se quer,
Mas terrível, zombeteiro e quase mau.
A poesia é esse dom de solidão
E por nós os amigos vestem luto
Ou nos dão essa precoce sensação...
Pois os versos seu pacto nos cobram
Como ao Fausto a beleza do minuto
E somos vivos "por quem os sinos dobram"...
.
09/05/2018
Notas
* "Por quem os sinos dobram"- Este verso célebre ( ...for whom the bells tolls...) são do poeta inglês elisabethano, John Donne (contemporâneo de Shakespeare) O poema a que ele pertence, começa assim: "No man is an island.."" Nenhum homem é uma ilha, somos todos parte do continente)...e termina : "Por isso não pergunte por quem os sinos dobram. Eles dobram por ti."
*...seu pacto nos cobram/como ao Fausto a beleza do minuto - alusão ao pacto que o insatisfeito e entediado Fausto ( no grande poema dramático de Goethe) faz com Mefistófeles (encarnação do Diabo), segundo o qual se através das dádivas e poderes que o demônio lhe proporcionasse, num momento de satisfação e deslumbramento dissesse afinal "ao minuto que passa" : "Pára! És tão belo! ", o pacto cessaria, e pelo contrato ele morreria e a sua alma seria levada por Mefistófeles. Mas no final, inusitadamente Deus caloteia o Diabo (tratava-se de uma aposta de Deus com o Diabo pela alma do sábio recluso) e manda um anjo serafim sedutor em evoluções e meneios despertar a luxúria do diabo na hora da saída da Alma do corpo de Fausto, distraindo-o com sua beleza adolescente e tentadora, O serafim se aproveita da distração e escamoteia a Alma de Fausto levando-a para o céu. Deus, que perdera a aposta... ludibria o Demônio.
Autocrítica (quase pedante) (de Alma Welt)
Bem cedo com a beleza fiz um pacto
E dela eu seria uma devota,
"Data venia, latu sensu, ipso facto",
Preservando sua essência e sua nota.
Quero dizer com isso que elegi
A estética e o rigor greco-romano
Em que pese o beco em que me vi
Sem saída, passadista, quase insano.
Mas tal clássico modelo restringi
Tão somente à forma da expressão
Pois no conteúdo eu me expandi.
E do soneto eu seria esta guria
Cheia dos caprichos da Invenção,
Que são meu núcleo denso de Poesia...
.
09/05/2018
E dela eu seria uma devota,
"Data venia, latu sensu, ipso facto",
Preservando sua essência e sua nota.
Quero dizer com isso que elegi
A estética e o rigor greco-romano
Em que pese o beco em que me vi
Sem saída, passadista, quase insano.
Mas tal clássico modelo restringi
Tão somente à forma da expressão
Pois no conteúdo eu me expandi.
E do soneto eu seria esta guria
Cheia dos caprichos da Invenção,
Que são meu núcleo denso de Poesia...
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09/05/2018
terça-feira, 8 de maio de 2018
O Esquecimento (de Alma Welt)
Nada é mais triste que esquecer...
O esquecimento é o maior castigo
Que não desejo nem para o inimigo
Porque é a pura essência do morrer.
Me refiro só ao meu esquecimento
De mim em mim mesma, e não no outro.
A memória é o destino do momento,
Lembrar é ter consigo novo encontro.
Senhor, leva contigo a minha vida
Mas, rogo, não me tires a memória,
Tudo o que tenho é a minha história...
Que me importa uma alma sem lembrança!
Se toda esta bagagem é esquecida
Porque tanto a carreguei como fiança?
.
08/05/2018
O esquecimento é o maior castigo
Que não desejo nem para o inimigo
Porque é a pura essência do morrer.
Me refiro só ao meu esquecimento
De mim em mim mesma, e não no outro.
A memória é o destino do momento,
Lembrar é ter consigo novo encontro.
Senhor, leva contigo a minha vida
Mas, rogo, não me tires a memória,
Tudo o que tenho é a minha história...
Que me importa uma alma sem lembrança!
Se toda esta bagagem é esquecida
Porque tanto a carreguei como fiança?
.
08/05/2018
segunda-feira, 7 de maio de 2018
Filosofia simples (de Alma Welt)
Pelo amor vivi a vida inteira,
Mormente o amor do ser humano,
E de tudo que existe na tal Feira
Das Vaidades, que pra manga dão o pano.
Tudo o que é humano me concerne
E até os pecadilhos me são gratos;
Na verdade, desta vida são o cerne,
Só não suporto os maus e os ingratos.
Há aqueles que nos desqualificam
Reafirmando o Mal em nossa vida,
E na escolha mesma com ele ficam...
Quero crer: o Mal não é a medida,
Só nos coloca fora de um sistema,
Pois é a falsa clara e não a gema...
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07/05/2018
domingo, 6 de maio de 2018
A queda (de Alma Welt)
"O mundo é falso, mas como tentação
O pomo continua em toda parte,
E o Jardim, com sua árvore de exceção,
Há muito virou lote de descarte..."
Assim dizia um velho professor
Quando eu estava na escolinha,
E eu ficava impressionada, com horror
Pois que o Éden no coração eu tinha.
Mas percebi o laivo de amargura
Mascarada de humor, daquele Mestre
Que perdera a mulher em queda equestre.
Ele mesmo é que caíra do cavalo:
Ela levada por bem melhor figura
Descobrira o Paraíso, sem amá-lo...
.
06/05/2018
O pomo continua em toda parte,
E o Jardim, com sua árvore de exceção,
Há muito virou lote de descarte..."
Assim dizia um velho professor
Quando eu estava na escolinha,
E eu ficava impressionada, com horror
Pois que o Éden no coração eu tinha.
Mas percebi o laivo de amargura
Mascarada de humor, daquele Mestre
Que perdera a mulher em queda equestre.
Ele mesmo é que caíra do cavalo:
Ela levada por bem melhor figura
Descobrira o Paraíso, sem amá-lo...
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06/05/2018
sábado, 5 de maio de 2018
O Mestre da Montanha (de Alma Welt)
"Se queres ser poeta muito leias,
Não sejas mera fazedora de versinhos.
Como os ninhos, os casulos e as teias,
A poesia faz-se à margem dos caminhos."
"Deverás sair da trilha das estradas
E abrir mil picadas a machete
Evitando as áreas desbravadas,
Somente nova trilha te compete..."
Assim dizia um mestre que sonhei
E que vivia no alto da montanha
Bem longe da cidade e sua sanha.
Mas de repente, foi-se o sonho, acordei
Na planura, e do soneto até a ode
O Poeta é o que faz só o que pode...
Não sejas mera fazedora de versinhos.
Como os ninhos, os casulos e as teias,
A poesia faz-se à margem dos caminhos."
"Deverás sair da trilha das estradas
E abrir mil picadas a machete
Evitando as áreas desbravadas,
Somente nova trilha te compete..."
Assim dizia um mestre que sonhei
E que vivia no alto da montanha
Bem longe da cidade e sua sanha.
Mas de repente, foi-se o sonho, acordei
Na planura, e do soneto até a ode
O Poeta é o que faz só o que pode...
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05/05/2018
Teu é o Mundo (de Alma Welt)
"Teu é o mundo, filha, por princípio,
Pois, como todos nós, nele vieste.
Não o vejas como algo vão ou ímpio,
Ou do Eden uma fuga para o Leste..."
"Não matarás nunca um teu irmão
Nem roubarás o fruto do vizinho
De quem respeitarás a opinião
E mesmo um palpite comezinho."
"Frua o mundo, sem culpa, com respeito,
E o mundo te abrirá o seu segredo
Se provares te-lo antes no teu peito."
Assim disse meu pai quando nasci,
E por isso cresci quase sem medo,
Mas também por este "quase" eu me perdi...
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05/05/2018
Pois, como todos nós, nele vieste.
Não o vejas como algo vão ou ímpio,
Ou do Eden uma fuga para o Leste..."
"Não matarás nunca um teu irmão
Nem roubarás o fruto do vizinho
De quem respeitarás a opinião
E mesmo um palpite comezinho."
"Frua o mundo, sem culpa, com respeito,
E o mundo te abrirá o seu segredo
Se provares te-lo antes no teu peito."
Assim disse meu pai quando nasci,
E por isso cresci quase sem medo,
Mas também por este "quase" eu me perdi...
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05/05/2018
segunda-feira, 30 de abril de 2018
A rebelde (de Alma Welt)
Medo da vida mesma tive nunca,
Tive medo é da sua adversária,
A maldita, multiforme, triste e vária,
Embuçada ou nua, sempre adunca.
Entretanto cortês, de voz melíflua
Um tanto grave, é verdade, mas macia,
Empenhada em evitar que a vida flua,
A despejar-nos com a água da bacia...
Devemos aceitá-la, ouvi na missa:
Só estamos aqui como castigo,
Nosso Vale não imita os da Suíça.
Mesmo assim, rebelo-me, discuto;
O que houve nada tem a ver comigo,
Jamais assumo o pomo que não furto...
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30/04/2018
Tive medo é da sua adversária,
A maldita, multiforme, triste e vária,
Embuçada ou nua, sempre adunca.
Entretanto cortês, de voz melíflua
Um tanto grave, é verdade, mas macia,
Empenhada em evitar que a vida flua,
A despejar-nos com a água da bacia...
Devemos aceitá-la, ouvi na missa:
Só estamos aqui como castigo,
Nosso Vale não imita os da Suíça.
Mesmo assim, rebelo-me, discuto;
O que houve nada tem a ver comigo,
Jamais assumo o pomo que não furto...
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30/04/2018
domingo, 29 de abril de 2018
Balanço da Alma (III) (de Alma Welt)
Quantos amores e alegrias eu vivi
Na casa grande de meus pais e meus avós!
Quantas memórias e segredos recolhi
Como base de meus textos logo após...
Nada é falso ou fictício, pois meus sonhos
Fazem parte verdadeira desta saga,
Omitidos quando toscos ou bisonhos,
Transfigurando outros, nunca amarga...
Tristezas, sim, tive algumas, passageiras
Que não pude evitar no meu percurso
Estas intrusas e noturnas companheiras...
Mas emergi como musa triunfante,
De mim mesma, retomando meu discurso,
Indiscreta, pois da Vida fui amante...
.
29/04/2018
Na casa grande de meus pais e meus avós!
Quantas memórias e segredos recolhi
Como base de meus textos logo após...
Nada é falso ou fictício, pois meus sonhos
Fazem parte verdadeira desta saga,
Omitidos quando toscos ou bisonhos,
Transfigurando outros, nunca amarga...
Tristezas, sim, tive algumas, passageiras
Que não pude evitar no meu percurso
Estas intrusas e noturnas companheiras...
Mas emergi como musa triunfante,
De mim mesma, retomando meu discurso,
Indiscreta, pois da Vida fui amante...
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29/04/2018
quarta-feira, 25 de abril de 2018
Alma no bosque florido (de Alma Welt)
Alma no bosque florido - óleo sobre tela de Guilherme de Faria, 2018, 100x100cm
Alma no bosque florido (de Alma Welt)
Chegaste, Alma, no bosque tão florido
Que será a tua casa verdadeira,
E em silêncio doce e comovido
És branca nau com flores como esteira...
No mundo toda alma tem o seu nicho
Que é como um refúgio, uma capela,
Onde sem necessidade de uma vela
O Ser se reintegra, como um bicho.
É tua casa, chegaste, é como um porto.
Para alguns é como um estaleiro,
Para outros uma vigília, como o Horto...
Sossega, se acaso inquieta estejas
Para voltar ao mundo, esse vespeiro;
Agora abelha és, e as flores beijas...
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25/04/2018
terça-feira, 24 de abril de 2018
Pique-esconde (de Alma Welt)
Eu bem quis burlar o meu destino
Tentando evitar o inevitável
Como uma brincadeira de menino
Naquele pique-esconde memorável...
Mas a Moira era com quem eu brincava
E sorria para mim o tempo todo
Tal como companheira (assim pensava),
Já tramava dar comigo nalgum lodo.
Tristes são os jogos do vivente:
Não há como escapar na brincadeira,
Somos sempre descobertos de repente.
Mas retornando em forma de poesia
Através de mil sonetos em carreira,
Eu, meu pique-esconde estenderia...
.
24/04/2018
Tentando evitar o inevitável
Como uma brincadeira de menino
Naquele pique-esconde memorável...
Mas a Moira era com quem eu brincava
E sorria para mim o tempo todo
Tal como companheira (assim pensava),
Já tramava dar comigo nalgum lodo.
Tristes são os jogos do vivente:
Não há como escapar na brincadeira,
Somos sempre descobertos de repente.
Mas retornando em forma de poesia
Através de mil sonetos em carreira,
Eu, meu pique-esconde estenderia...
.
24/04/2018
segunda-feira, 23 de abril de 2018
Eu e a Poesia (de Alma Welt)
"O autêntico real absoluto
É a Poesia", Novalis já dizia...
E sou sua companheira até de luto
Quando morre à míngua, em afazia.
Mas renasce e sou fiel à renascida
Quando parece não se recordar de mim
E tenho de acenar-lhe constrangida:
Sou Alma, não te lembras? Estou aqui, sim!
Morro e reencarno em mim mesma
Me buscando onde for meu paradeiro
Mesmo quando quase uma abantesma...
Meu mundo é realidade paralela
Mas real, absoluto, verdadeiro,
Com humilde persistência de uma vela...
.
23/04/2018
É a Poesia", Novalis já dizia...
E sou sua companheira até de luto
Quando morre à míngua, em afazia.
Mas renasce e sou fiel à renascida
Quando parece não se recordar de mim
E tenho de acenar-lhe constrangida:
Sou Alma, não te lembras? Estou aqui, sim!
Morro e reencarno em mim mesma
Me buscando onde for meu paradeiro
Mesmo quando quase uma abantesma...
Meu mundo é realidade paralela
Mas real, absoluto, verdadeiro,
Com humilde persistência de uma vela...
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23/04/2018
domingo, 22 de abril de 2018
A Dança das Cadeiras (de Alma Welt)
Ó meus amigos, que saudades tenho eu
Dos tempos de nossas brincadeiras
De salão, como a "dança das cadeiras" :
Quem não sentou, caiu, saiu, perdeu...
Depois, na vida, seguimos com o jogo,
Nunca haveria cadeira para todos
E vi de alguns amigos pranto e rogo
Já que foram dar em chão de lodos...
Há quem diga que injustiça não existe
(meu pai mesmo era desta opinião)
Mormente para quem no erro insiste,
Mas, ai, como me lembro dos caídos,
Quem nem por isso mereciam ser punidos,
Desajeitados para os jogos de salão...
.
22/04/2018
Dos tempos de nossas brincadeiras
De salão, como a "dança das cadeiras" :
Quem não sentou, caiu, saiu, perdeu...
Depois, na vida, seguimos com o jogo,
Nunca haveria cadeira para todos
E vi de alguns amigos pranto e rogo
Já que foram dar em chão de lodos...
Há quem diga que injustiça não existe
(meu pai mesmo era desta opinião)
Mormente para quem no erro insiste,
Mas, ai, como me lembro dos caídos,
Quem nem por isso mereciam ser punidos,
Desajeitados para os jogos de salão...
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22/04/2018
sexta-feira, 20 de abril de 2018
Cristo nos espelhos (de Alma Welt)
Tinha tantas providências a tomar,
Como pôr a casa em ordem, por exemplo,
Me compor como se fosse me casar
Mas fazendo do meu corpo o próprio templo.
Assim perdi meu tempo em ninharias
Sem me dar conta um só momento,
Orbitando o espelho das marias
Madalenas antes do arrependimento...
Mas eis que vi um quadro do Van Gogh
Um belo autorretrato tão intenso
Que por um instante fiquei grogue
E vi que ele era o Cristo dos espelhos
Como em todos nós, mas nele imenso,
E me pus diante da Arte, de joelhos...
.
20/04/2018
Como pôr a casa em ordem, por exemplo,
Me compor como se fosse me casar
Mas fazendo do meu corpo o próprio templo.
Assim perdi meu tempo em ninharias
Sem me dar conta um só momento,
Orbitando o espelho das marias
Madalenas antes do arrependimento...
Mas eis que vi um quadro do Van Gogh
Um belo autorretrato tão intenso
Que por um instante fiquei grogue
E vi que ele era o Cristo dos espelhos
Como em todos nós, mas nele imenso,
E me pus diante da Arte, de joelhos...
.
20/04/2018
quinta-feira, 19 de abril de 2018
Como posei para o pintor (de Alma Welt)
Pois ali estava eu frente ao pintor
Diante da tela no seu grande cavalete,
E sem ordem e o mais leve rumor
Fiquei nua sem ajuda de um valete
Ao deixar cair ao chão o meu vestido
Diante do surpreso olhar do artista
Que nem sequer fizera um tal pedido
E logo, de imediato, a tela risca...
Foi assim, mas não me alongarei
Pois jamais entro nos "sórdidos detalhes"
Que, tão lindos na verdade, ocultarei.
E emergi em pintura gloriosa
Como se fosse a rainha de Versalhes
E não esta tão inquieta que mal posa...
.
19/04/2018
Diante da tela no seu grande cavalete,
E sem ordem e o mais leve rumor
Fiquei nua sem ajuda de um valete
Ao deixar cair ao chão o meu vestido
Diante do surpreso olhar do artista
Que nem sequer fizera um tal pedido
E logo, de imediato, a tela risca...
Foi assim, mas não me alongarei
Pois jamais entro nos "sórdidos detalhes"
Que, tão lindos na verdade, ocultarei.
E emergi em pintura gloriosa
Como se fosse a rainha de Versalhes
E não esta tão inquieta que mal posa...
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19/04/2018
segunda-feira, 16 de abril de 2018
O eterno retorno (IV) (de Alma Welt)
O eterno retorno (IV) (de Alma Welt)
Memórias, pensamentos, devaneios,
Com que ricos povoo estes meus dias
Que por certo não o são por outros meios,
Rica de mim, pobre de mim se não me lias
Tu leitor e face-amigo, passo a passo, *
O melhor que posso, sim, diariamente,
Logo eu, que na verdade nada faço,
E tudo em mim se passa só na mente...
Mas o que é o corpo, não é verdade?
Este se vai como a canção do pó no vento *
E só resta de alguns poucos a saudade...
Quero, pois, estar contigo como agora
Já que fui só um ou outro pensamento
Que retorne de mim se eu for embora...
.
16/04/2018
Que por certo não o são por outros meios,
Rica de mim, pobre de mim se não me lias
Tu leitor e face-amigo, passo a passo, *
O melhor que posso, sim, diariamente,
Logo eu, que na verdade nada faço,
E tudo em mim se passa só na mente...
Mas o que é o corpo, não é verdade?
Este se vai como a canção do pó no vento *
E só resta de alguns poucos a saudade...
Quero, pois, estar contigo como agora
Já que fui só um ou outro pensamento
Que retorne de mim se eu for embora...
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16/04/2018
Notas
*... face-amigo - A Alma Welt, após sua morte em 2007, passou a se apresentar ao artista Guilherme de Faria, desde 2008 na página dele no facebook, diariamente, seus sonetos e pensamentos digitados ali diretamente no Status, e datados na hora. Iniciados em 2001, seus sonetos já beiram os 5.000 (!!!). Somente neste blog, um dos mais de 60 da poetisa, são, até este momento, cerca de 1.405.
* canção do pó no vento - Alma certamente se refere à belíssima e pessimista canção "Dust in the Wind", sucesso dos anos 80 da banda de rock americana Kansas.
sábado, 14 de abril de 2018
Pecado Original (de Alma Welt)
Adão e Eva no Paraiso - curiosa pintura a quatro mãos, de Rubens e Jan Brueghel.
Rubens pintou o casal e Brueghel a paisagem e os animais..
Pecado Original (de Alma Welt)
"Minha Alma, cabe a ti vencer o Mal
Que herdaste ao nascer, o tal pecado
Original, de fato assim chamado
E que faz de ti um ser mortal..."
Assim disse meu pai, quando eu guria
Lhe perguntei o porquê da confissão,
Que tão inútil então me parecia
Porque não tinha nenhum mal no coração.
Olhou nos olhos meus meu lindo pai,
Deu um suspiro e disse: "Vai brincar
No Jardim com teu irmão. Sossega e vai..."
Então voltamos, eu e Rodo, às maçãs
E até hoje não sei o que é pecar
Ao brincar nua no pomar pelas manhãs...
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14/04/2018
sexta-feira, 13 de abril de 2018
Autocrítica (de Alma Welt)
Representação artística alemã de um aparato para destilação da Aqua vitae (em italiano "Aqua de Vita") o ethanol, do Liber de arte Distillandi, de Hieronymus Brunschwig, 1512.
Entretanto Aqua de Vita, era também conhecida como a mítica Fonte da Juventude, procurada e supostamente encontrada na Flórida pelo espanhol Juan Ponce de León 1460-152
Autocrítica (de Alma Welt)
Não costumo dizer "nós" no meu soneto,
Não sou ego-centrada o suficiente.
O que há comigo, erro ou acerto,
Por certo não atribuo à toda gente...
Individualista empedernida,
Quem quiser que se veja ou se reflita...
Estou a falar da minha vida,
Sou fonte mas não sou "aqua de vita". *
"Egotista sublime", disse um crítico, *
Dos de minha espécie, ou parecido,
Faço do meu centro um polo mítico.
Como se fora um humano querubim
Mas sem me atribuir geral sentido,
Tenho a desculpa de só falar de mim...
.
13/04/2018
Notas
* "Egotista sublime" ´Expressão criada pelo crítico inglês Herbert Reed, que assim classificava o mais alto tipo de poeta (a seu ver), que aparentemente falando somente de si mesmo, falava de toda humanidade. Como exemplo disso "rendia todos os dias" graças a Shakespeare, "um poeta que não era nem um filósofo nem um moralista, e que vivia ao sabor do cristal terrível de uma mente intuitiva." Reed cita o poeta John Keats, um grande admirador de Shakespeare, que em uma famosa carta a Richard Woodhouse, contrasta Imogen com um dos personagens mais notoriamente imorais de Shakespeare, Iago, a fim de descrever o caráter do poeta: "O caráter poético não tem personalidade própria", tudo e nada - não tem caráter e goza de luz e sombra, vive com prazer, seja mau ou justo, alto ou baixo, rico ou pobre, mesquinho ou elevado - tem tanto prazer em conceber um Iago quanto um Imogen. O que choca o filósofo virtuoso encanta o camaleão poeta... Um poeta é o menos poético de tudo o que existe já que não tem identidade, e está continuamente preenchendo o corpo de outrem.
(Pesquisa de Guilherme de Faria)
___________________________
Nota (2)
* Aqua de Vita (em italiano) ou Aqua Vitae (em latim ) - Água da Vida, mais conhecida como Fonte da Juventude:
1. Em 1493, Juan Ponce de León sai da Espanha rumo à América, acompanhando Cristóvão Colombo em sua segunda expedição – financiada pelos reis Fernando e Isabel. Desembarca na ilha de Hispaniola (atual ilha de São Domingos), colonizando o território
2. Com o objetivo de explorar novas terras, Ponce de León chega a Porto Rico, onde é nomeado governador, em 1508. Por meio dos nativos, teria descoberto a existência de uma fonte da juventude, que ficaria ao norte de Cuba, em uma ilha chamada Bimini
3. Em 1513, sai em busca das águas rejuvenescedoras. Como a lenda dizia que a fonte ficava em um ambiente paradisíaco (onde também estaria o jardim do Éden), qualquer ilha tropical era digna de ser investigada
4. No domingo de Páscoa do mesmo ano, Ponce de León chega a uma costa, que nomeia de “La Florida” – que significa “A Florida”. Durante a expedição, é ferido gravemente por índios, sendo levado a Cuba, onde não resiste e morre
5. Muitos acreditam que o explorador tenha encontrado a fonte na Flórida – região rica em águas minerais. Em sua homenagem, foi criado o Parque Nacional da Fonte da Juventude, em Saint Augustine – cidade situada na primeira costa a ser colonizada por europeus
(Fonte Claudio Carlan, professor de história antiga da Universidade Federal de Alfenas, MG)
Entretanto Aqua de Vita, era também conhecida como a mítica Fonte da Juventude, procurada e supostamente encontrada na Flórida pelo espanhol Juan Ponce de León 1460-152
Autocrítica (de Alma Welt)
Não costumo dizer "nós" no meu soneto,
Não sou ego-centrada o suficiente.
O que há comigo, erro ou acerto,
Por certo não atribuo à toda gente...
Individualista empedernida,
Quem quiser que se veja ou se reflita...
Estou a falar da minha vida,
Sou fonte mas não sou "aqua de vita". *
"Egotista sublime", disse um crítico, *
Dos de minha espécie, ou parecido,
Faço do meu centro um polo mítico.
Como se fora um humano querubim
Mas sem me atribuir geral sentido,
Tenho a desculpa de só falar de mim...
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13/04/2018
Notas
* "Egotista sublime" ´Expressão criada pelo crítico inglês Herbert Reed, que assim classificava o mais alto tipo de poeta (a seu ver), que aparentemente falando somente de si mesmo, falava de toda humanidade. Como exemplo disso "rendia todos os dias" graças a Shakespeare, "um poeta que não era nem um filósofo nem um moralista, e que vivia ao sabor do cristal terrível de uma mente intuitiva." Reed cita o poeta John Keats, um grande admirador de Shakespeare, que em uma famosa carta a Richard Woodhouse, contrasta Imogen com um dos personagens mais notoriamente imorais de Shakespeare, Iago, a fim de descrever o caráter do poeta: "O caráter poético não tem personalidade própria", tudo e nada - não tem caráter e goza de luz e sombra, vive com prazer, seja mau ou justo, alto ou baixo, rico ou pobre, mesquinho ou elevado - tem tanto prazer em conceber um Iago quanto um Imogen. O que choca o filósofo virtuoso encanta o camaleão poeta... Um poeta é o menos poético de tudo o que existe já que não tem identidade, e está continuamente preenchendo o corpo de outrem.
(Pesquisa de Guilherme de Faria)
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Nota (2)
* Aqua de Vita (em italiano) ou Aqua Vitae (em latim ) - Água da Vida, mais conhecida como Fonte da Juventude:
1. Em 1493, Juan Ponce de León sai da Espanha rumo à América, acompanhando Cristóvão Colombo em sua segunda expedição – financiada pelos reis Fernando e Isabel. Desembarca na ilha de Hispaniola (atual ilha de São Domingos), colonizando o território
2. Com o objetivo de explorar novas terras, Ponce de León chega a Porto Rico, onde é nomeado governador, em 1508. Por meio dos nativos, teria descoberto a existência de uma fonte da juventude, que ficaria ao norte de Cuba, em uma ilha chamada Bimini
3. Em 1513, sai em busca das águas rejuvenescedoras. Como a lenda dizia que a fonte ficava em um ambiente paradisíaco (onde também estaria o jardim do Éden), qualquer ilha tropical era digna de ser investigada
4. No domingo de Páscoa do mesmo ano, Ponce de León chega a uma costa, que nomeia de “La Florida” – que significa “A Florida”. Durante a expedição, é ferido gravemente por índios, sendo levado a Cuba, onde não resiste e morre
5. Muitos acreditam que o explorador tenha encontrado a fonte na Flórida – região rica em águas minerais. Em sua homenagem, foi criado o Parque Nacional da Fonte da Juventude, em Saint Augustine – cidade situada na primeira costa a ser colonizada por europeus
(Fonte Claudio Carlan, professor de história antiga da Universidade Federal de Alfenas, MG)
quarta-feira, 11 de abril de 2018
A Esperança (de Alma Welt)
Das intempéries estamos à mercê
Na frágil embarcação fazendo água,
E a lançar sinais no ar, que ninguém vê,
A trocar a nossa fé por pura mágoa.
"O quê que é isso, Alma? Não blasfemes!
A perda da esperança leva à morte,
Não da carne mesma, se é o que temes
Mas da alma, condenando a sua sorte"...
Assim disse meu anjo de asas brancas,
Imenso e claro velando sobre mim
Quando eu já tinha a água pelas ancas.
Então logo sacudi meu desespero
Como um cão, do focinho ao duplo rim,
Pois sobrava da vaidade aquele esmero...
.
11/04/2018
Na frágil embarcação fazendo água,
E a lançar sinais no ar, que ninguém vê,
A trocar a nossa fé por pura mágoa.
"O quê que é isso, Alma? Não blasfemes!
A perda da esperança leva à morte,
Não da carne mesma, se é o que temes
Mas da alma, condenando a sua sorte"...
Assim disse meu anjo de asas brancas,
Imenso e claro velando sobre mim
Quando eu já tinha a água pelas ancas.
Então logo sacudi meu desespero
Como um cão, do focinho ao duplo rim,
Pois sobrava da vaidade aquele esmero...
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11/04/2018
segunda-feira, 2 de abril de 2018
O Último Baile (de Alma Welt)
Como é bom estar aqui entre vocês,
Amigos meus, reunidos pela face *
Melhor que temos, afinal, a cada vez,
Pra não mostrar somente o que se passe.
Porque se mostro sempre o meu melhor
Para estar entre vocês em plena sala,
Quero dizer que me visto, assim, de gala
Para as nossas reuniões, em tom maior...
Houve um baile, uma vez, na Ilha Fiscal
Onde a Corte reuniu-se em saideira,
Sem nem sequer desconfiar do Marechal...
Amigos, como então naquele Rio,
Dancemos nossa valsa, a derradeira,
Que a Liberdade está apenas por um fio...
.
02/04/2018
Nota
*Amigos meus, reunidos pela face - subentende-se: pelo facebook...
Amigos meus, reunidos pela face *
Melhor que temos, afinal, a cada vez,
Pra não mostrar somente o que se passe.
Porque se mostro sempre o meu melhor
Para estar entre vocês em plena sala,
Quero dizer que me visto, assim, de gala
Para as nossas reuniões, em tom maior...
Houve um baile, uma vez, na Ilha Fiscal
Onde a Corte reuniu-se em saideira,
Sem nem sequer desconfiar do Marechal...
Amigos, como então naquele Rio,
Dancemos nossa valsa, a derradeira,
Que a Liberdade está apenas por um fio...
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02/04/2018
Nota
*Amigos meus, reunidos pela face - subentende-se: pelo facebook...
domingo, 1 de abril de 2018
Páscoa de Chocolates (de Alma Welt)
Na Páscoa a gente ia para Gramado
Atrás de chocolate e até de neve,
E então, por um momento breve
Me sentia na Europa em meu Estado.
Imersa em um mar de chocolate
E cercada de pinheiros e de hortênsia
Eu vivia uma outra existência
Em que faltava o nosso charque e o mate.
Mas essas lembranças são inúteis
Não fazem parte do corpo de memória
Que compõem de fato a minha história.
Como postais são belas mas são fúteis,
Só meu pampa me contém, é plano e largo,
Ó coração de chocolate meio-amargo!...
.
01/03/2018
Atrás de chocolate e até de neve,
E então, por um momento breve
Me sentia na Europa em meu Estado.
Imersa em um mar de chocolate
E cercada de pinheiros e de hortênsia
Eu vivia uma outra existência
Em que faltava o nosso charque e o mate.
Mas essas lembranças são inúteis
Não fazem parte do corpo de memória
Que compõem de fato a minha história.
Como postais são belas mas são fúteis,
Só meu pampa me contém, é plano e largo,
Ó coração de chocolate meio-amargo!...
.
01/03/2018
sábado, 31 de março de 2018
O véu rubro (de Alma Welt)
Às vezes, me perdoem, eu quero ir-me.
Quantas vezes, ai! quero partir,
Com esta "dor de pátria" a afligir-me
E não tendo mais pra onde fugir...
Minha nação envenenada, agonizante,
Os lábios distorcidos em agonias;
Dois punhais de fogo temos diante,
Mas, há muito, povo nosso, já não rias...
Não quero mais ver isto, e ir embora
Tornou-se-me desejo imperativo
Conquanto nada exista pra mim fora.
Ó véu rubro que assomas como nuvens,
Não há nada de bom de onde tu vens,
Nem mais o doce gosto de estar vivo...
.
31/03/2018
Quantas vezes, ai! quero partir,
Com esta "dor de pátria" a afligir-me
E não tendo mais pra onde fugir...
Minha nação envenenada, agonizante,
Os lábios distorcidos em agonias;
Dois punhais de fogo temos diante,
Mas, há muito, povo nosso, já não rias...
Não quero mais ver isto, e ir embora
Tornou-se-me desejo imperativo
Conquanto nada exista pra mim fora.
Ó véu rubro que assomas como nuvens,
Não há nada de bom de onde tu vens,
Nem mais o doce gosto de estar vivo...
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31/03/2018
sexta-feira, 30 de março de 2018
A falsa paz (de Alma Welt)
Sempre senti que paira uma ameaça
No ar, em meio a paz deste jardim,
E diante de uma nuvem má que passa
Eu perguntava à minha avó, assim:
"Nenhum alarma nem flâmula se alça
E mal ouvimos o rangido da porteira.
Vó Frida, por quê a paz me soa falsa?
Por quê razão não a sinto verdadeira?"
E a velha zombeteira e perspicaz
Piscou o olho fazendo uma careta,
E disse: "Alma, pergunte ao capataz."
"O Galdério é que sabe dos rumores
E ouve primeiro o rufo dos tambores
E muito longe o sopro da corneta..."
.
30/03/2018
No ar, em meio a paz deste jardim,
E diante de uma nuvem má que passa
Eu perguntava à minha avó, assim:
"Nenhum alarma nem flâmula se alça
E mal ouvimos o rangido da porteira.
Vó Frida, por quê a paz me soa falsa?
Por quê razão não a sinto verdadeira?"
E a velha zombeteira e perspicaz
Piscou o olho fazendo uma careta,
E disse: "Alma, pergunte ao capataz."
"O Galdério é que sabe dos rumores
E ouve primeiro o rufo dos tambores
E muito longe o sopro da corneta..."
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30/03/2018
quinta-feira, 29 de março de 2018
O Manjar Branco (de Alma Welt)
"Como estar em paz na vida e relevar
Tantas ofensas graves e ameaças?
Como inteira ser feliz e perdoar
As perfídias alheias e as trapaças?"
Assim falava minha mãe pondo perguntas
E questões na minha boca emudecida
E perplexa, já que essas coisas juntas
Sequer faziam parte da minha vida.
" Mãe" - eu respondi - "Não tenho queixas!
Mas do que a senhora está falando?
Fiz um branco manjar cheio de ameixas...
Vê, olha os contrastes, sou assim.
As ameixas são escuras, mas melando,
Não desejes pôr receios no pudim..."
.
29/03/2018
Tantas ofensas graves e ameaças?
Como inteira ser feliz e perdoar
As perfídias alheias e as trapaças?"
Assim falava minha mãe pondo perguntas
E questões na minha boca emudecida
E perplexa, já que essas coisas juntas
Sequer faziam parte da minha vida.
" Mãe" - eu respondi - "Não tenho queixas!
Mas do que a senhora está falando?
Fiz um branco manjar cheio de ameixas...
Vê, olha os contrastes, sou assim.
As ameixas são escuras, mas melando,
Não desejes pôr receios no pudim..."
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29/03/2018
terça-feira, 27 de março de 2018
Memórias da Alma (de Alma Welt)
"Minha filha, viver é estar na selva
E deixar o rastro onde passemos.
Nossas ações, nossos passos nessa relva
Definem quem nós somos ou seremos..."
Assim meu pai dizia, aventureiro
Que avistara coisas escabrosas
Na ascensão do Reich (o Terceiro),
Mas voltara aos vinhos e às rosas...
E eu, sentadinha em seus joelhos,
Viajando em suas palavras como um coche
Diante do Jardim da minha avó Frida,
Cercados pela vinha do avô boche
Chegado mais aos mandos, não conselhos,
Lá ia eu, no coração forte da Vida...
.
27/03/2018
E deixar o rastro onde passemos.
Nossas ações, nossos passos nessa relva
Definem quem nós somos ou seremos..."
Assim meu pai dizia, aventureiro
Que avistara coisas escabrosas
Na ascensão do Reich (o Terceiro),
Mas voltara aos vinhos e às rosas...
E eu, sentadinha em seus joelhos,
Viajando em suas palavras como um coche
Diante do Jardim da minha avó Frida,
Cercados pela vinha do avô boche
Chegado mais aos mandos, não conselhos,
Lá ia eu, no coração forte da Vida...
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27/03/2018
domingo, 25 de março de 2018
As três perguntas (de Alma Welt)
D'ou Venons Nous / Que Sommes Nous / Où Allons Nous (pintura de Paul Gauguin)
As três perguntas (de Alma Welt)
Investigar a razão e o sentido
Da Vida e da Arte... e comovido
Então, mais uma vez, o grande homem, vi...
"Alma minha" - disse ele- eu acredito
Que procurarás o Bem, o Justo,
E a Beleza, que já têm um alto custo,
Pois neles, sim, é que repousa todo Mito.
Fiquei perplexa, mas só por um segundo,
E respondi que os usaria como meio
Pois queria penetrar ainda mais fundo.
Pois queria é encontrar as três respostas
Para as três perguntas, no alto postas
Da pintura de Gauguin, que sempre leio...
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25/03/2018
Que procurarás o Bem, o Justo,
E a Beleza, que já têm um alto custo,
Pois neles, sim, é que repousa todo Mito.
Fiquei perplexa, mas só por um segundo,
E respondi que os usaria como meio
Pois queria penetrar ainda mais fundo.
Pois queria é encontrar as três respostas
Para as três perguntas, no alto postas
Da pintura de Gauguin, que sempre leio...
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25/03/2018
quinta-feira, 22 de março de 2018
Quê mistério... (Alma Welt)
Quê mistério a vida é, quão espantoso!
A rigor tudo é milagre, se pensamos...
Dormir e sonhar são um dos ramos
Da Árvore da Vida em pleno gozo.
Mas em quê pesadelo a transformamos
Em nosso recebido arbítrio livre
Que, se nos define enquanto humanos
Também cria o Inferno que em nós vive.
Sempre uma e outra coisa, sempre extremos,
Sempre dupla a visão ou o conceito,
Dupla chance ou falsa escolha temos...
Quantas vezes quando estou desesperada
Peço a Deus mais uma mão, nova cartada,
Outra rodada de blefes no meu peito...
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22/03/2018
A rigor tudo é milagre, se pensamos...
Dormir e sonhar são um dos ramos
Da Árvore da Vida em pleno gozo.
Mas em quê pesadelo a transformamos
Em nosso recebido arbítrio livre
Que, se nos define enquanto humanos
Também cria o Inferno que em nós vive.
Sempre uma e outra coisa, sempre extremos,
Sempre dupla a visão ou o conceito,
Dupla chance ou falsa escolha temos...
Quantas vezes quando estou desesperada
Peço a Deus mais uma mão, nova cartada,
Outra rodada de blefes no meu peito...
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22/03/2018
sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018
Olhai as flores (de Alma Welt)
Vivo, sim, em eterna vigilância,
No que for concernente à minha alma,
Que me foi dada, eu sei, em confiança,
Para levá-la de volta sem um trauma.
Mas "trauma" é sonho, dizia minha avó *
Se referindo da palavra a própria origem
Na sua aldeia, de onde saiu só
Pra encontrar com meu avô, ainda virgem.
E zelaria por mim muito mais tarde,
Preservando não a minha inocência
Mas a própria chama que em mim arde.
" Minha Alma"- ela dizia- "olhai as flores
E mantenha como elas vossas cores
Até o fim, tudo mais é excrecência"...
.
23/02/2018
Nota
*..."trauma" é sonho, dizia minha avó - O termo psicanalítico "trauma", deriva da palavra alemã "traum" = sonho, sonhar.
Frida (Frieda Henner-Welt), a avó da Alma, era alsaciana e sua língua de origem, o alemão.
No que for concernente à minha alma,
Que me foi dada, eu sei, em confiança,
Para levá-la de volta sem um trauma.
Mas "trauma" é sonho, dizia minha avó *
Se referindo da palavra a própria origem
Na sua aldeia, de onde saiu só
Pra encontrar com meu avô, ainda virgem.
E zelaria por mim muito mais tarde,
Preservando não a minha inocência
Mas a própria chama que em mim arde.
" Minha Alma"- ela dizia- "olhai as flores
E mantenha como elas vossas cores
Até o fim, tudo mais é excrecência"...
.
23/02/2018
Nota
*..."trauma" é sonho, dizia minha avó - O termo psicanalítico "trauma", deriva da palavra alemã "traum" = sonho, sonhar.
Frida (Frieda Henner-Welt), a avó da Alma, era alsaciana e sua língua de origem, o alemão.
quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018
Devolução (de Alma Welt)
Muito andei por aí perambulando
No meu tempo de desassossego,
Algo muito específico buscando,
Não tateando como camundongo cego...
"O que buscas?"-perguntaram- "Estás perdida?
"Não perdeste o aplom e a doçura...
De onde vem essa desenvoltura
Como quem já se encontrou na vida?"
Busco um poema tão perfeito (eu respondi)
Que revele do Ser o quando e o como,
E que tenha sido eu que o escrevi.
Quero levá-lo ao meu Jardim e seus limites
E dizer logo a Deus: "Eis Vosso pomo.
Tomai-o, pois, de volta e estamos quites ..."
.
22/02/2018
No meu tempo de desassossego,
Algo muito específico buscando,
Não tateando como camundongo cego...
"O que buscas?"-perguntaram- "Estás perdida?
"Não perdeste o aplom e a doçura...
De onde vem essa desenvoltura
Como quem já se encontrou na vida?"
Busco um poema tão perfeito (eu respondi)
Que revele do Ser o quando e o como,
E que tenha sido eu que o escrevi.
Quero levá-lo ao meu Jardim e seus limites
E dizer logo a Deus: "Eis Vosso pomo.
Tomai-o, pois, de volta e estamos quites ..."
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22/02/2018
Entre Deus e o Diabo (de Alma Welt)
"Que queres, Alma?" me disse Deus um dia.
"Peça claro e bom som embora eu saiba.
E não me venha com papo de poesia
Ou qualquer outro truque que não caiba."
"Mas Senhor, só me destes as palavras,
Do teu Logos um pouco, em verso e rima.
Se tudo isto não vem aí de cima,
De onde vem, Senhor? Que outras lavras?"
Assim eu conversava com o Senhor,
Inconteste criador do Céu e Terra
A quem, modesta, atribuo meu pendor...
"Filha, o Diabo aqui esteve em meu salão.
Qual Salomão me pediu que usasse a serra
Pra dividir-te com ele, o fanfarrão..."
.
22/02/2018
Nota
*Qual Salomão me pediu que usasse a serra - Alusão ao episódio bíblico do Juizo de Salomão, em que duas mulheres disputavam a maternidade de um um recém nascido acusando-se uma a outra de usurpação. Salomão mandou que um soldado dividisse a criança ao meio com a espada (aqui,figuradamente "serra") A verdadeira mãe, cujo bebê fora roubado durante o seu seu sono pela vizinha que sufocara no leito o seu próprio por acidente, desesperada, gritou: "Não o matem! Deem a ela o bebê!" O rei Salomão então soube que essa era a verdadeira mãe...
"Peça claro e bom som embora eu saiba.
E não me venha com papo de poesia
Ou qualquer outro truque que não caiba."
"Mas Senhor, só me destes as palavras,
Do teu Logos um pouco, em verso e rima.
Se tudo isto não vem aí de cima,
De onde vem, Senhor? Que outras lavras?"
Assim eu conversava com o Senhor,
Inconteste criador do Céu e Terra
A quem, modesta, atribuo meu pendor...
"Filha, o Diabo aqui esteve em meu salão.
Qual Salomão me pediu que usasse a serra
Pra dividir-te com ele, o fanfarrão..."
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22/02/2018
Nota
*Qual Salomão me pediu que usasse a serra - Alusão ao episódio bíblico do Juizo de Salomão, em que duas mulheres disputavam a maternidade de um um recém nascido acusando-se uma a outra de usurpação. Salomão mandou que um soldado dividisse a criança ao meio com a espada (aqui,figuradamente "serra") A verdadeira mãe, cujo bebê fora roubado durante o seu seu sono pela vizinha que sufocara no leito o seu próprio por acidente, desesperada, gritou: "Não o matem! Deem a ela o bebê!" O rei Salomão então soube que essa era a verdadeira mãe...
A filha pródiga (de Alma Welt)
No bosque das ilusões perdidas *
Encontrei-me em certa ocasião
E perdido o rumo e as saídas
Sentei-me e chorei, não por Sião,
Mas por minha vida àquela altura,
Sem fé, sem rumo, sem um Deus
Que me pusesse de novo na procura
Ou mesmo uma razão para um adeus.
O bosque mesmo já desaparecia
Como a quem sua própria terra arrasa
Quando ouvi uma voz que me dizia:
"Alma, já que não foste nada módica,
Podes voltar agora pra tua casa
E seres de ti mesma a filha pródiga..."
.
22/02/2018
Nota
* " bosque das ilusões perdidas"- Alma pede emprestado este belíssimo título brasileiro do filme francês do diretor Jean-Gabriel Albicocco, baseado no romance de título original infeliz:" Le grand Meaulnes"...
Encontrei-me em certa ocasião
E perdido o rumo e as saídas
Sentei-me e chorei, não por Sião,
Mas por minha vida àquela altura,
Sem fé, sem rumo, sem um Deus
Que me pusesse de novo na procura
Ou mesmo uma razão para um adeus.
O bosque mesmo já desaparecia
Como a quem sua própria terra arrasa
Quando ouvi uma voz que me dizia:
"Alma, já que não foste nada módica,
Podes voltar agora pra tua casa
E seres de ti mesma a filha pródiga..."
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22/02/2018
Nota
* " bosque das ilusões perdidas"- Alma pede emprestado este belíssimo título brasileiro do filme francês do diretor Jean-Gabriel Albicocco, baseado no romance de título original infeliz:" Le grand Meaulnes"...
quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018
Lições e lembranças (de Alma Welt)
"Que podemos nós fazer diante do mundo
Repleto de maldade e injustiça? "
"Olha dentro de ti a tua preguiça
E se puderes vai mais fundo..."
Assim com meu pai eu conversava
Já que era um agradável moralista
Pois que a alma alguma condenava
Mas as passava em boa revista...
A mim nunca ralhou, era meu fã,
E se a sua ternura me mimava
Me acordava muito cedo de manhã.
Com sua voz de baixo irrompendo
No meu quarto a Nona ele entoava,
Eu mais fundo nas cobertas me escondendo...
.
21/02/2018
Repleto de maldade e injustiça? "
"Olha dentro de ti a tua preguiça
E se puderes vai mais fundo..."
Assim com meu pai eu conversava
Já que era um agradável moralista
Pois que a alma alguma condenava
Mas as passava em boa revista...
A mim nunca ralhou, era meu fã,
E se a sua ternura me mimava
Me acordava muito cedo de manhã.
Com sua voz de baixo irrompendo
No meu quarto a Nona ele entoava,
Eu mais fundo nas cobertas me escondendo...
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21/02/2018
O País dos Belos Sonhos (de Alma Welt)
As lembranças da infância, recorrentes,
Não cessam de me acompanhar,
E aparecem também as provenientes
De outra dimensão, tempo e lugar.
Temos muitos passados e presentes,
Estou disso há muito tempo convencida,
E vivo por enquanto ou entrementes
Na experiência de um exílio nesta vida.
Daí esta minha eterna nostalgia
Que não há meios e modos de curar-se
E que é a raiz de minha poesia...
"És romântica" (me dizem com espanto),
"Para ti o feio mundo é um disfarce
Do país dos belos sonhos sob um manto"...
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21/02/2018
Não cessam de me acompanhar,
E aparecem também as provenientes
De outra dimensão, tempo e lugar.
Temos muitos passados e presentes,
Estou disso há muito tempo convencida,
E vivo por enquanto ou entrementes
Na experiência de um exílio nesta vida.
Daí esta minha eterna nostalgia
Que não há meios e modos de curar-se
E que é a raiz de minha poesia...
"És romântica" (me dizem com espanto),
"Para ti o feio mundo é um disfarce
Do país dos belos sonhos sob um manto"...
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21/02/2018
O que cala um coração (de Alma Welt)
Meu pai dizia "plebe insana e rude"
Se referindo ao nosso bom povão,
E chocada e pensativa nunca pude
Entender muito bem esta noção,
Porque ele era bom e compassivo
No trato pessoal com os peões
E com todo e qualquer outro ser vivo,
Excetuados os bandidos e vilões...
Um dia me pediu, e nunca esqueço,
Que fechasse a porta do escritório
Pois recebia um tipo "faço e aconteço"...
Pouco depois saía pálido o peão,
E aquilo que cortou-lhe o palavrório,
Vi, era o medo que cala um coração...
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21/02/2018
Se referindo ao nosso bom povão,
E chocada e pensativa nunca pude
Entender muito bem esta noção,
Porque ele era bom e compassivo
No trato pessoal com os peões
E com todo e qualquer outro ser vivo,
Excetuados os bandidos e vilões...
Um dia me pediu, e nunca esqueço,
Que fechasse a porta do escritório
Pois recebia um tipo "faço e aconteço"...
Pouco depois saía pálido o peão,
E aquilo que cortou-lhe o palavrório,
Vi, era o medo que cala um coração...
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21/02/2018
terça-feira, 20 de fevereiro de 2018
O Mau Passo (de Alma Welt)
Queria voltar àquela estaçãozinha
Que se foi, agora sei, não mais existe.
Fechou e era a derradeira linha
Que passava por aqui, tu a cumpriste.
Levei-te já saudosa à plataforma,
A despedir-me de ti entre vapores,
Uma névoa de lembranças que se forma
Quando vou abandonar os meus amores...
E tu me acenaste após o abraço,
Sabendo ambas que foram só delírios
Como as que deram, virgens, um mau passo.
E fiquei a acenar-te aliviada,
Porque agora poderia amar sem lírios,
Sem sustos, sem culpa, sem mais nada...
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20/02/2018
Que se foi, agora sei, não mais existe.
Fechou e era a derradeira linha
Que passava por aqui, tu a cumpriste.
Levei-te já saudosa à plataforma,
A despedir-me de ti entre vapores,
Uma névoa de lembranças que se forma
Quando vou abandonar os meus amores...
E tu me acenaste após o abraço,
Sabendo ambas que foram só delírios
Como as que deram, virgens, um mau passo.
E fiquei a acenar-te aliviada,
Porque agora poderia amar sem lírios,
Sem sustos, sem culpa, sem mais nada...
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20/02/2018
O Cais Perdido (de Alma Welt)
Questionar a existência e seu declínio
Foi-me sempre uma coisa recorrente
Desde que me foi dado o raciocínio
E no auge do poder de minha mente...
Perderei minhas memórias tão queridas
Um dia velha e carente de razão?
Eu que me nutro de meus gozos e feridas
Rumarei a uma implacável escuridão?
Quando medito nisso a voz me treme
E eu, a bordo de uma nave decidida
Me dou conta de que me falta o leme...
E gargalho qual marujo enlouquecido
Que ainda lembra da hora da partida
Os acenos, o apito, o cais perdido...
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20/02/2018
Foi-me sempre uma coisa recorrente
Desde que me foi dado o raciocínio
E no auge do poder de minha mente...
Perderei minhas memórias tão queridas
Um dia velha e carente de razão?
Eu que me nutro de meus gozos e feridas
Rumarei a uma implacável escuridão?
Quando medito nisso a voz me treme
E eu, a bordo de uma nave decidida
Me dou conta de que me falta o leme...
E gargalho qual marujo enlouquecido
Que ainda lembra da hora da partida
Os acenos, o apito, o cais perdido...
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20/02/2018
segunda-feira, 19 de fevereiro de 2018
O Importador (de Alma Welt)
Minha vida é bela, eu reconheço,
Não sei a de vocês, se assim também...
Pois para haver beleza é um começo
O prazer em aceitar o que se tem.
Minha avó assim dizia e me ensinou
Às coisas boas sempre reverenciar
Excetuadas às que o Demo importou
Mas mudou a marca, hora e lugar...
Eu ria e ria com as lições de minha avó
E jamais as haveria de esquecer
Pois quando se ri cria-se um nó.
Sim, a vida é bela, eis seu sentido,
Malgrado o Importador a perverter
Falsificando tudo, o intrometido...
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19/02/2018
Não sei a de vocês, se assim também...
Pois para haver beleza é um começo
O prazer em aceitar o que se tem.
Minha avó assim dizia e me ensinou
Às coisas boas sempre reverenciar
Excetuadas às que o Demo importou
Mas mudou a marca, hora e lugar...
Eu ria e ria com as lições de minha avó
E jamais as haveria de esquecer
Pois quando se ri cria-se um nó.
Sim, a vida é bela, eis seu sentido,
Malgrado o Importador a perverter
Falsificando tudo, o intrometido...
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19/02/2018
domingo, 18 de fevereiro de 2018
A Mariposa (II) ( de Alma Welt)
O medo é nosso triste companheiro
Que nos acompanha a vida inteira,
Uma síndrome perpétua de atoleiro
Para alguns, uma espécie de coleira.
Para mim foi felizmente um aguilhão
Que me impeliu além das minhas forças,
Frágil guria mas de forte coração,
E alguém por certo por quem torças
Porque ser poeta é um desafio,
O mais antigo chamado das estradas
A um coração afeito ao meio fio
Ou mariposa em noites desastradas
(senão borboleta em plenitude),
Que, alada, fiz de mim mais do que pude...
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18/02/2018
Que nos acompanha a vida inteira,
Uma síndrome perpétua de atoleiro
Para alguns, uma espécie de coleira.
Para mim foi felizmente um aguilhão
Que me impeliu além das minhas forças,
Frágil guria mas de forte coração,
E alguém por certo por quem torças
Porque ser poeta é um desafio,
O mais antigo chamado das estradas
A um coração afeito ao meio fio
Ou mariposa em noites desastradas
(senão borboleta em plenitude),
Que, alada, fiz de mim mais do que pude...
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18/02/2018
quinta-feira, 15 de fevereiro de 2018
Eu, heterônimo (de Alma Welt)
Confesso, sonhei grande, tola eu era
Fui em busca do meu sonho de guria,Tão ingênua a perseguir uma quimera
Ser poeta e viver da minha poesia...
Mais tarde descobri que ser poeta
É o mais miserável dos amores,
E a triste razão de tão seleta
É que a fome é o premio dos melhores.
E claro, existem os poetas diplomatas
Que, pobres funcionários de escritório,
Não passam de modestos burocratas.
Mas na dimensão poética, só, viver
Para mim se tornou obrigatório,
Um caminho bem mais digno do ser...
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15/02/2018
quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018
Quarta-feira de cinzas (de Alma Welt)
Meu irmão Rodo chegava de ressaca
Na quarta e a custo se esgueirava
Subindo para o sótão quase em maca,
Ajudado por mim que o amparava...
E ele gemia como o arrependido faz,
Maldizendo um amor de Colombina,
Decepção que o amor fútil sempre traz
Pois amor com saideira não combina.
E eu rindo, condoída, perguntava:
Era bela aquela tua bailarina?
E na caixinha de música rodava?
Ele então chorava mais e mais,
Dizendo: Alma, ela era uma menina,
Não parecia ser cruel e foi capaz...
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14/02/2018
Na quarta e a custo se esgueirava
Subindo para o sótão quase em maca,
Ajudado por mim que o amparava...
E ele gemia como o arrependido faz,
Maldizendo um amor de Colombina,
Decepção que o amor fútil sempre traz
Pois amor com saideira não combina.
E eu rindo, condoída, perguntava:
Era bela aquela tua bailarina?
E na caixinha de música rodava?
Ele então chorava mais e mais,
Dizendo: Alma, ela era uma menina,
Não parecia ser cruel e foi capaz...
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14/02/2018
Soneto da Quarta-feira (de Alma Welt)
Apreciava sobretudo a quarta-feira
De cinzas e com a súbita tristeza
De quem cai na real ou está na beira,
Como quem para dançar subiu na mesa...
Meu avô boche me dizia: "Ai de ti,
Se colocares a saia na cabeça,
Tendo ingerido champanha ou Parati,
Não esperes que depois te reconheça."
Mas pobre de mim, e quem me dera!
Eu era sóbria, recatada até demais,
E o Carnaval, uma espécie de quimera.
Minha avó dava risinhos de ironia
Pois sabia do meu navio no cais,
Em cuja mesa eu sonhava e escrevia...
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14/02/2018
De cinzas e com a súbita tristeza
De quem cai na real ou está na beira,
Como quem para dançar subiu na mesa...
Meu avô boche me dizia: "Ai de ti,
Se colocares a saia na cabeça,
Tendo ingerido champanha ou Parati,
Não esperes que depois te reconheça."
Mas pobre de mim, e quem me dera!
Eu era sóbria, recatada até demais,
E o Carnaval, uma espécie de quimera.
Minha avó dava risinhos de ironia
Pois sabia do meu navio no cais,
Em cuja mesa eu sonhava e escrevia...
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14/02/2018
Velho Tema (de Alma Welt)
"Procurar-se um amor não tem sentido
Pois que amor deve estar dentro de ti.
Deus dá a cada um o que lhe é devido
Se te faltar amor por dentro, não és daqui."
Assim dizia minha avó podando rosas
Com sua vetusta figura de espantar,
Tão curvada e com suas mãos nodosas
Com uma pequena tesoura de podar.
E eu confiava em minha avó em tudo,
Já que ela tinha amado a vida inteira
Aquele velho difícil e carrancudo.
Não procurou o amor e o amor subiu
E o derramou de si sobre a roseira
Toda de espinhos com que Amor surgiu...
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14/02/2018
Pois que amor deve estar dentro de ti.
Deus dá a cada um o que lhe é devido
Se te faltar amor por dentro, não és daqui."
Assim dizia minha avó podando rosas
Com sua vetusta figura de espantar,
Tão curvada e com suas mãos nodosas
Com uma pequena tesoura de podar.
E eu confiava em minha avó em tudo,
Já que ela tinha amado a vida inteira
Aquele velho difícil e carrancudo.
Não procurou o amor e o amor subiu
E o derramou de si sobre a roseira
Toda de espinhos com que Amor surgiu...
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14/02/2018
terça-feira, 13 de fevereiro de 2018
A cabrinha valente (de Alma Welt)
Meu pai tinha pistola e espingarda,
Esta, pequena, na parede fixada,
E um dia garantiu-me que a mantinha
Para que, eu quando moça, fosse minha.
Esta, pequena, na parede fixada,
E um dia garantiu-me que a mantinha
Para que, eu quando moça, fosse minha.
Isto me chocava, não entendia
Por qual razão uma arma empunharia;
Impensável um enredo àquela altura
Que comportasse na Alma tal loucura.
Mas uma noite li "Lettres de mon Moulin"
De um Alphonse Daudet, francês querido,
E com a cabrinha resisti até a manhã...*
Mas se venceram os lobos na novela,
Com chifrinhos tendo tanto combatido,
Eu teria uma arma como ela...
.
13/02/208
Nota
*E com a cabrinha resisti até a manhã - Alma se refere ao conto "La chèvre de monsieur Seguin", tocante conto das "Lettres de mon Moulin", um clássico de Alphonse de Daudet (1840 — 1897).
Por qual razão uma arma empunharia;
Impensável um enredo àquela altura
Que comportasse na Alma tal loucura.
Mas uma noite li "Lettres de mon Moulin"
De um Alphonse Daudet, francês querido,
E com a cabrinha resisti até a manhã...*
Mas se venceram os lobos na novela,
Com chifrinhos tendo tanto combatido,
Eu teria uma arma como ela...
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13/02/208
Nota
*E com a cabrinha resisti até a manhã - Alma se refere ao conto "La chèvre de monsieur Seguin", tocante conto das "Lettres de mon Moulin", um clássico de Alphonse de Daudet (1840 — 1897).
segunda-feira, 12 de fevereiro de 2018
A cruz e as asas (de Alma Welt)
"No Vale de Lágrimas que é a vida
Cada um tem que levar sua própria cruz..."
Assim dizia minha mãe, e eu dividida
Hesitava entre a depressão e a luz.
Meu pai adepto da luzes do saber,
Dizia à minha Mãe: "Para com isso!"
Não ensines a guria a só sofrer,
Sentir tal peso nesse ato submisso..."
"Não lhe acenes com essa abantesma.
Vê, a cruz era objeto de tortura
E nada tem a ver com a Vida mesma."
"Os versos tornarão sua vida leve,
Não vês que a sua alma nasceu pura?
Grandes asas lhe darão na vida breve."
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12/02/2018
Cada um tem que levar sua própria cruz..."
Assim dizia minha mãe, e eu dividida
Hesitava entre a depressão e a luz.
Meu pai adepto da luzes do saber,
Dizia à minha Mãe: "Para com isso!"
Não ensines a guria a só sofrer,
Sentir tal peso nesse ato submisso..."
"Não lhe acenes com essa abantesma.
Vê, a cruz era objeto de tortura
E nada tem a ver com a Vida mesma."
"Os versos tornarão sua vida leve,
Não vês que a sua alma nasceu pura?
Grandes asas lhe darão na vida breve."
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12/02/2018
domingo, 11 de fevereiro de 2018
Báh! Amores meus ( de Alma Welt)
Báh! Amores meus, peço perdão
Por tanta independência que mantive
E por pouco tolerar guri mandão
E ser esta poeta que ainda vive.
Gostar de aninhar-me em largo peito
Iludiu alguns de vós por um momento
Quando isso era apenas o meu jeito
De ser mansa e feliz trinta por cento.
Olho agora pra trás, como uma tela,
E minha face desconheço e meu andar
Embora reconheça que era bela...
Então deixem-me sozinha com os meu versos
Mas não me digam que já não sei amar:
Sem amor até os poemas são perversos...
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11/02/2018
Por tanta independência que mantive
E por pouco tolerar guri mandão
E ser esta poeta que ainda vive.
Gostar de aninhar-me em largo peito
Iludiu alguns de vós por um momento
Quando isso era apenas o meu jeito
De ser mansa e feliz trinta por cento.
Olho agora pra trás, como uma tela,
E minha face desconheço e meu andar
Embora reconheça que era bela...
Então deixem-me sozinha com os meu versos
Mas não me digam que já não sei amar:
Sem amor até os poemas são perversos...
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11/02/2018
Minha pátria (de Alma Welt)
Minha pátria trago em mim em carne viva
E sangra quando a choro pelas noites,
Por toda essa baldada tentativa
De sorrir e libertar-se dos açoites.
Meu país fracassado, tão bonito,
Mas viola embolorada no seu bojo,
De caráter fraco, afeito ao mito
Do gigante que agora me dá nojo.
E me sinto como a mãe trazendo meia
Ao filho delinquente, que aos sussurros,
Lhe pede alguma droga na cadeia..
E penso como ela que ainda ama:
"Só lamento tenhas dado com os burros,
Nem sequer foram na água mas na lama..."
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11/02/2018
E sangra quando a choro pelas noites,
Por toda essa baldada tentativa
De sorrir e libertar-se dos açoites.
Meu país fracassado, tão bonito,
Mas viola embolorada no seu bojo,
De caráter fraco, afeito ao mito
Do gigante que agora me dá nojo.
E me sinto como a mãe trazendo meia
Ao filho delinquente, que aos sussurros,
Lhe pede alguma droga na cadeia..
E penso como ela que ainda ama:
"Só lamento tenhas dado com os burros,
Nem sequer foram na água mas na lama..."
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11/02/2018
O riso que fica (de Alma Welt)
Todo e cada passo e pensamento
Nosso, fica registrado em nossa alma?
Consiste nisso a eternidade do momento
Ou o Tempo escolhe com mais calma?
Quanta ninharia e perda fútil
Da matéria preciosa do minuto
Que parece longo ou breve, até inútil
No silencio pedido por um luto.
O mistério do Tempo, eis o mistério
Maior que a Morte e suas ossadas
Cujo crânio não parece nada sério.
O que resta é oculto em seu sentido
E as órbitas nos miram, esvaziadas,
E só fica de nós o que foi rido...
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11/02/2018
Consiste nisso a eternidade do momento
Ou o Tempo escolhe com mais calma?
Quanta ninharia e perda fútil
Da matéria preciosa do minuto
Que parece longo ou breve, até inútil
No silencio pedido por um luto.
O mistério do Tempo, eis o mistério
Maior que a Morte e suas ossadas
Cujo crânio não parece nada sério.
O que resta é oculto em seu sentido
E as órbitas nos miram, esvaziadas,
E só fica de nós o que foi rido...
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11/02/2018
sexta-feira, 9 de fevereiro de 2018
De anjos e demônios (de Alma Welt)
Meu pai era austero e carinhoso
Pois comigo ele se identificava
Já que muito de mim ele esperava,
Cada sucesso meu era seu gozo.
Um dia mostrei-lhe um meu poema.
Ele ficou sério e constrangido
Pois que não concordou com o seu sentido
Que colocava em xeque seu sistema.
Nada disse, entretanto, pensativo
E esperou ao todo uns quinze anos
Para questionar-me sobre o assunto:
"Alma, disseste que o pecado é relativo
E acreditas nosso dom, pobres humanos,
Sermos anjos e demônios, tudo junto..."
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09/02/2018
Pois comigo ele se identificava
Já que muito de mim ele esperava,
Cada sucesso meu era seu gozo.
Um dia mostrei-lhe um meu poema.
Ele ficou sério e constrangido
Pois que não concordou com o seu sentido
Que colocava em xeque seu sistema.
Nada disse, entretanto, pensativo
E esperou ao todo uns quinze anos
Para questionar-me sobre o assunto:
"Alma, disseste que o pecado é relativo
E acreditas nosso dom, pobres humanos,
Sermos anjos e demônios, tudo junto..."
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09/02/2018
O que disseram as flores (de Alma Welt)
Quanto é bom colher flores no jardim
Já que deixo por momentos inefáveis
As perpétuas doze sílabas contábeis
E tão somente de tratar tanto de mim.
Na sala ponho as flores nos seus vasos
Nos quartos e cozinha, no conjunto,
Que alegria dão em muitos casos,
Exceto os lírios e cravos de defunto.
Mas minha avó Frida disse um dia:
"Alma pare de colher as minhas flores
Que não são passarinhos de gaiola."
"Elas se queixaram que as colhia
E agora a mim gritam seus pudores,
E que nada as obriga a dar esmola..."
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09/02/2018
Já que deixo por momentos inefáveis
As perpétuas doze sílabas contábeis
E tão somente de tratar tanto de mim.
Na sala ponho as flores nos seus vasos
Nos quartos e cozinha, no conjunto,
Que alegria dão em muitos casos,
Exceto os lírios e cravos de defunto.
Mas minha avó Frida disse um dia:
"Alma pare de colher as minhas flores
Que não são passarinhos de gaiola."
"Elas se queixaram que as colhia
E agora a mim gritam seus pudores,
E que nada as obriga a dar esmola..."
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09/02/2018
quarta-feira, 7 de fevereiro de 2018
Que belos olhos... (de Alma Welt)
Que belos olhos tinham os meus amigos!
Alguns fortes, uns mais doces, uns atentos,
Revelavam-se às vezes em perigos,
E regiam-me alguns dos movimentos.
Quanto aconcheguei suas belas frontes
De macias cabeleiras, de bons cheiros!
Uns como que fluindo como fontes,
Uns como milharal, outros trigueiros...
Quanto se quer partir quando se é moço!
Alguns foram parar no fim do mundo
Mas outros conheceram o fim do poço...
Alguns deles se perderam, não voltaram;
O pálido era antes rubicundo,
Alguns só reconheci quando choraram...
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07/02/2018
Alguns fortes, uns mais doces, uns atentos,
Revelavam-se às vezes em perigos,
E regiam-me alguns dos movimentos.
Quanto aconcheguei suas belas frontes
De macias cabeleiras, de bons cheiros!
Uns como que fluindo como fontes,
Uns como milharal, outros trigueiros...
Quanto se quer partir quando se é moço!
Alguns foram parar no fim do mundo
Mas outros conheceram o fim do poço...
Alguns deles se perderam, não voltaram;
O pálido era antes rubicundo,
Alguns só reconheci quando choraram...
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07/02/2018
segunda-feira, 5 de fevereiro de 2018
A Corretora (de Alma Welt)
Guardar as emoções na mente apenas,
Então mantendo o coração à parte
Das alegrias fáceis e das penas,
Eis aí um segredo para a arte...
Minhas dores não distingo da poesia
E por isso as faço interessantes
Quanto uma grande ode à alegria
Ou o antigo lirismo dos amantes...
Então não és como todo mundo?
Me perguntam os de coração partido
Que querem me ver também no fundo...
Mas, talvez como poeta e fingidora,
Desta vida como simples corretora
Sofro muito mais que o consentido...
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05/02/2018
Então mantendo o coração à parte
Das alegrias fáceis e das penas,
Eis aí um segredo para a arte...
Minhas dores não distingo da poesia
E por isso as faço interessantes
Quanto uma grande ode à alegria
Ou o antigo lirismo dos amantes...
Então não és como todo mundo?
Me perguntam os de coração partido
Que querem me ver também no fundo...
Mas, talvez como poeta e fingidora,
Desta vida como simples corretora
Sofro muito mais que o consentido...
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05/02/2018
Sonho mau ou A Floresta do Não Sei (de Alma Welt)
O nome do castelo sempre esqueço
Onde, pasmem, sou princesa encantada.
Também perdi o rumo e o endereço
E o caminho que refiz não leva a nada.
Estou perdida na Floresta do Não Sei
E me sinto levemente esfarrapada.
Esta noite sobre a ervilha dormirei?
Tal proeza não é de minha alçada...
Numa nau de súbito embarcada
Deito cartas para ver se me descubro
Ou saio deste sonho de enrascada,
Mas a nave em que me vejo a bordo
E o território obscuro que não cubro
Ainda são os mesmos quando acordo...
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05/02/2018
Onde, pasmem, sou princesa encantada.
Também perdi o rumo e o endereço
E o caminho que refiz não leva a nada.
Estou perdida na Floresta do Não Sei
E me sinto levemente esfarrapada.
Esta noite sobre a ervilha dormirei?
Tal proeza não é de minha alçada...
Numa nau de súbito embarcada
Deito cartas para ver se me descubro
Ou saio deste sonho de enrascada,
Mas a nave em que me vejo a bordo
E o território obscuro que não cubro
Ainda são os mesmos quando acordo...
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05/02/2018
domingo, 4 de fevereiro de 2018
Aonde Vais? (de Alma Welt)
"Aonde vais?" um sitiante perguntou-me,
Vendo-me perdida e andarilha
A caminhar em círculos na coxilha
E para a sua casa convidou-me.
"Aonde vais, bom velho?" perguntei
A um desnorteado caminhante
Como eu mesma fui e me lembrei
De quão perdida estive e hesitante...
Perdidos, na verdade algo nos junta
Abandonados nesta Terra, forasteiros
À procura de caminhos verdadeiros.
Até ao Cristo caminhante, esta pergunta
Fez Pedro velho, e ensejou melhor escolha...
A cada um sua cruz, novinha em folha.
.
04/02/2018
Nota
* ... ao Cristo caminhante esta pergunta/ Fez Pedro, velho... - Alma alude à seguinte lenda cristã: Durante o massacre dos cristãos no Coliseu, ordenado por Nero, o apóstolo de Cristo, Pedro, bastante velho, estava entre eles pregando e consolando-os nas catacumbas antes que fossem presos e martirizados . Então, os fiéis imploraram a ele que fugisse, pois era o último apóstolo, testemunha viva do Mestre, e outros tantos precisariam de sua palavra. Então Pedro cedeu e se esgueirou à noite para fora dos portões de Roma e começou a caminhar na Via Ápia, se afastando da cidade. Eis que no começo do caminho parou quando avistou ao longe um andarilho que caminhava na estrada em sua direção. Quando este chegou bem perto, Pedro reconheceu o próprio Jesus, e surpreso perguntou-lhe em latim: "Quo Vadis, Domine? " ( Aonde vais, Senhor?). E Jesus respondeu-lhe: "Vou a Roma ser crucificado novamente, visto que abandonas meu rebanho." E desapareceu. Então Pedro voltou pela estrada e logo nas portas de Roma foi detido pelos pretorianos de César, e identificando-se foi imediatamente preso e condenado à crucificação. Pedro então pediu que fosse crucificado de cabeça para baixo, no que foi atendido, porque disse "não ser digno de receber o martírio idêntico ao do Mestre"...
Vendo-me perdida e andarilha
A caminhar em círculos na coxilha
E para a sua casa convidou-me.
"Aonde vais, bom velho?" perguntei
A um desnorteado caminhante
Como eu mesma fui e me lembrei
De quão perdida estive e hesitante...
Perdidos, na verdade algo nos junta
Abandonados nesta Terra, forasteiros
À procura de caminhos verdadeiros.
Até ao Cristo caminhante, esta pergunta
Fez Pedro velho, e ensejou melhor escolha...
A cada um sua cruz, novinha em folha.
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04/02/2018
Nota
* ... ao Cristo caminhante esta pergunta/ Fez Pedro, velho... - Alma alude à seguinte lenda cristã: Durante o massacre dos cristãos no Coliseu, ordenado por Nero, o apóstolo de Cristo, Pedro, bastante velho, estava entre eles pregando e consolando-os nas catacumbas antes que fossem presos e martirizados . Então, os fiéis imploraram a ele que fugisse, pois era o último apóstolo, testemunha viva do Mestre, e outros tantos precisariam de sua palavra. Então Pedro cedeu e se esgueirou à noite para fora dos portões de Roma e começou a caminhar na Via Ápia, se afastando da cidade. Eis que no começo do caminho parou quando avistou ao longe um andarilho que caminhava na estrada em sua direção. Quando este chegou bem perto, Pedro reconheceu o próprio Jesus, e surpreso perguntou-lhe em latim: "Quo Vadis, Domine? " ( Aonde vais, Senhor?). E Jesus respondeu-lhe: "Vou a Roma ser crucificado novamente, visto que abandonas meu rebanho." E desapareceu. Então Pedro voltou pela estrada e logo nas portas de Roma foi detido pelos pretorianos de César, e identificando-se foi imediatamente preso e condenado à crucificação. Pedro então pediu que fosse crucificado de cabeça para baixo, no que foi atendido, porque disse "não ser digno de receber o martírio idêntico ao do Mestre"...
sábado, 3 de fevereiro de 2018
O Enigma de um Dia (de Alma Welt)
Como no dia dos meus anos ser feliz
Como no tempo de uma quase perfeição
Quando o sorriso era a simples condição
Do projeto de vida que me fiz:
Se eu pudesse sempre rir me bastaria
Pois seria sinal de estar acima
Do obscuro enigma de um dia
Que eu solveria, assim, como uma rima.
Eu singraria mares, desfaria teias
Sendo pequena nau de volta ao lar
E imune àqueles cantos de sereias...
E não seria esta simples pretendida
Assediada e renitente no tear
Pelos versos, qual se isto fora a vida...
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03/02/2018
Como no tempo de uma quase perfeição
Quando o sorriso era a simples condição
Do projeto de vida que me fiz:
Se eu pudesse sempre rir me bastaria
Pois seria sinal de estar acima
Do obscuro enigma de um dia
Que eu solveria, assim, como uma rima.
Eu singraria mares, desfaria teias
Sendo pequena nau de volta ao lar
E imune àqueles cantos de sereias...
E não seria esta simples pretendida
Assediada e renitente no tear
Pelos versos, qual se isto fora a vida...
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03/02/2018
sexta-feira, 2 de fevereiro de 2018
Farelos sobre a mesa (de Alma Welt)
Quisera que uma festa a vida fosse
De retorno dos amigos tão dispersos,
Agora em torno e esbanjando versos,
Depois silencio (eu imitando tosse):
"Meus amigos, façamos novo brinde!
Todos os maus enfim foram recolhidos;
Vós, os bons, foram, pois, os escolhidos,
Bebamos, e aos Novos Tempos vinde !"
Eis como penso um reencontro alegre
Com esta tola alma idealista
Que evitava engolir gato por lebre...
Mas olho em torno a mesa desolada,
Com farelos de pão, única pista
De um café da manhã, de abandonada...
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02/02/2018
De retorno dos amigos tão dispersos,
Agora em torno e esbanjando versos,
Depois silencio (eu imitando tosse):
"Meus amigos, façamos novo brinde!
Todos os maus enfim foram recolhidos;
Vós, os bons, foram, pois, os escolhidos,
Bebamos, e aos Novos Tempos vinde !"
Eis como penso um reencontro alegre
Com esta tola alma idealista
Que evitava engolir gato por lebre...
Mas olho em torno a mesa desolada,
Com farelos de pão, única pista
De um café da manhã, de abandonada...
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02/02/2018
quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018
O Jardim de minha avó (de Alma Welt)
No jardim de minha avó eu aprendia
Muito mais do que na escolinha
Pois sua esperteza surpreendia
A pura ingenuidade que era minha.
Mas sua malícia aberta, sem pudor,
Não logrou manchar minha pureza
E logo transformou-se nesse humor,
Minha carta da manga, sobre a mesa...
Essa ironia me manteve a salvo, sim,
De sujar minhas mãos na porcaria
Como as luvas que ela usava no jardim
E me deu certa distância, de quem sonda
Com um olhar de oblíqua simetria,
E um sorriso, assim, de Gioconda...
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01/02/2018
Muito mais do que na escolinha
Pois sua esperteza surpreendia
A pura ingenuidade que era minha.
Mas sua malícia aberta, sem pudor,
Não logrou manchar minha pureza
E logo transformou-se nesse humor,
Minha carta da manga, sobre a mesa...
Essa ironia me manteve a salvo, sim,
De sujar minhas mãos na porcaria
Como as luvas que ela usava no jardim
E me deu certa distância, de quem sonda
Com um olhar de oblíqua simetria,
E um sorriso, assim, de Gioconda...
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01/02/2018
A Estratégia da Mentira (de Alma Welt)
Firmei meu compromisso com a verdade
Quando ainda bem guria em meu jardim,
Sem nenhuma consciência da maldade
Nem sequer da porção dela que há em mim.
Depois vi que a maldade e a mentira
Se juntam amiúde em aliança
Pra que de uma a outra se transfira
Algum peso pro equilíbrio na balança.
É por isso que a Justiça, sendo cega
Muitas vezes é assim ludibriada
Ou hesita em pegar a sua espada.
Pra isso abro mão de minha maldade
E garanto que a mentira não me pega,
Reduzida que já foi, à sua metade...
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01/02/2018
Quando ainda bem guria em meu jardim,
Sem nenhuma consciência da maldade
Nem sequer da porção dela que há em mim.
Depois vi que a maldade e a mentira
Se juntam amiúde em aliança
Pra que de uma a outra se transfira
Algum peso pro equilíbrio na balança.
É por isso que a Justiça, sendo cega
Muitas vezes é assim ludibriada
Ou hesita em pegar a sua espada.
Pra isso abro mão de minha maldade
E garanto que a mentira não me pega,
Reduzida que já foi, à sua metade...
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01/02/2018
quarta-feira, 31 de janeiro de 2018
A dama da paisagem (de Alma Welt)
A dama da paisagem- pintura de Guilherme de Faria
A dama da paisagem (de Alma Welt)
Tenho muito a sensação de estar vagando
Em território alheio, e inoportuna
Com a minha estranheza quando ando,
Branca, ruiva, solitária, antiga e una.
Levo sempre por disfarce meu cãozinho
Não só pra me dar ares mais domésticos
Mas pra no âmbito ficar do comezinho
Malgrado esta beleza sem cosméticos...
Sou essa pálida dama da poesia
Celebrada em nostálgicas pinturas
Que refletem minha própria nostalgia,
Já que fora do meu tempo e ambiente
Vivo num limbo com as outras criaturas
Que unir ousaram o coração e a mente...
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31/01/2018
Em território alheio, e inoportuna
Com a minha estranheza quando ando,
Branca, ruiva, solitária, antiga e una.
Levo sempre por disfarce meu cãozinho
Não só pra me dar ares mais domésticos
Mas pra no âmbito ficar do comezinho
Malgrado esta beleza sem cosméticos...
Sou essa pálida dama da poesia
Celebrada em nostálgicas pinturas
Que refletem minha própria nostalgia,
Já que fora do meu tempo e ambiente
Vivo num limbo com as outras criaturas
Que unir ousaram o coração e a mente...
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31/01/2018
terça-feira, 30 de janeiro de 2018
Uma vez (de Alma Welt)
Uma vez senti por perto a Tentação
Rodeando a minha alma imortal,
Que nem mesmo de poder ou ambição
De prata e ouro ou translúcido cristal,
Mas volúpia de voragem, vã vertigem
Da perfeita paz, supostamente,
Num momento infeliz da própria mente
Chamando aquela branca e falsa virgem...
Já pendia a corda em laço no galpão
E a banqueta colocada bem debaixo,
Faltava mesmo era a final disposição.
Então num grito: "Vade retro, tentadora!"
Voltei ao simples nicho em que me encaixo
E enchi de flores minha caixa de Pandora...
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30/01/2018
Rodeando a minha alma imortal,
Que nem mesmo de poder ou ambição
De prata e ouro ou translúcido cristal,
Mas volúpia de voragem, vã vertigem
Da perfeita paz, supostamente,
Num momento infeliz da própria mente
Chamando aquela branca e falsa virgem...
Já pendia a corda em laço no galpão
E a banqueta colocada bem debaixo,
Faltava mesmo era a final disposição.
Então num grito: "Vade retro, tentadora!"
Voltei ao simples nicho em que me encaixo
E enchi de flores minha caixa de Pandora...
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30/01/2018
quinta-feira, 25 de janeiro de 2018
A Volta aos Risos (de Alma Welt)
Voltar àqueles risos de alegria,
Tão simples, espontâneos, sem malícia,
De olhinhos brilhantes de delícia
Por coisas singelas que ainda havia...
"Caímos na real. Não é mais possível...
Por que queres, Alma tola, retornar?"
O riso é imaterial, mas perecível
Como os nossos sonhos são ao acordar...
Vê, a tua velha casa inteira estala
E geme e suspira em agonia,
Cheia desse tempo que não cala.
"Põe fogo em tua casa, dentro em ti!
Liberta-te!" diz a voz que não havia
Quando o riso era real, e tanto o ri...
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25/01/2018
Tão simples, espontâneos, sem malícia,
De olhinhos brilhantes de delícia
Por coisas singelas que ainda havia...
"Caímos na real. Não é mais possível...
Por que queres, Alma tola, retornar?"
O riso é imaterial, mas perecível
Como os nossos sonhos são ao acordar...
Vê, a tua velha casa inteira estala
E geme e suspira em agonia,
Cheia desse tempo que não cala.
"Põe fogo em tua casa, dentro em ti!
Liberta-te!" diz a voz que não havia
Quando o riso era real, e tanto o ri...
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25/01/2018
sexta-feira, 19 de janeiro de 2018
O Eterno Retorno (V) (de Alma Welt)
Tive sempre a sensação de estar voltando
Para um ponto de partida original
Acabado, organizado e já final,
Em que nada é o "se", mas simples "quando".
Conhecer, sempre me foi "reconhecer"
E inteirar-me foi sempre "relembrar";
E me perdoem pretensiosa parecer
Mas Platão já nos fazia isto notar...
Voltar ao lar foi sempre a minha meta,
Sem bússola, perdida pelo mundo,
Mas com uma saudade como seta.
E quando ao longe avistei meu casarão,
Murmurei num suspiro, o mais profundo:
"Posso morrer, voltei de mim ao coração."
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19/01/2018
Para um ponto de partida original
Acabado, organizado e já final,
Em que nada é o "se", mas simples "quando".
Conhecer, sempre me foi "reconhecer"
E inteirar-me foi sempre "relembrar";
E me perdoem pretensiosa parecer
Mas Platão já nos fazia isto notar...
Voltar ao lar foi sempre a minha meta,
Sem bússola, perdida pelo mundo,
Mas com uma saudade como seta.
E quando ao longe avistei meu casarão,
Murmurei num suspiro, o mais profundo:
"Posso morrer, voltei de mim ao coração."
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19/01/2018
quarta-feira, 17 de janeiro de 2018
O país do limbo eterno (de Alma Welt)
Eu vivo no país do limbo eterno
Onde nada chega a ir ao fundo...
Não me refiro ao nicho onde hiberno,
Um dos mais formosos pagos deste mundo...
Mas a uma pátria, além, de fancaria,
Onde nada afinal se concretiza
Não estas flores na minha pradaria
Ou a relva que a geada cristaliza,
Nem ao montado peão jogando o laço
Ou à sua boleadeira em extinção
Só pra efeito de performance de feira,
Nem da varanda a olhar (o que mais faço),
O Poente sem igual, que mais não queira,
A promessa de Deus, da perfeição...
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17/01/2018
Onde nada chega a ir ao fundo...
Não me refiro ao nicho onde hiberno,
Um dos mais formosos pagos deste mundo...
Mas a uma pátria, além, de fancaria,
Onde nada afinal se concretiza
Não estas flores na minha pradaria
Ou a relva que a geada cristaliza,
Nem ao montado peão jogando o laço
Ou à sua boleadeira em extinção
Só pra efeito de performance de feira,
Nem da varanda a olhar (o que mais faço),
O Poente sem igual, que mais não queira,
A promessa de Deus, da perfeição...
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17/01/2018
segunda-feira, 15 de janeiro de 2018
Pequenos fogos (de Alma Welt)
Meu mundo é o dos versos ritmados,
Acidentado universo de perigo
Alcançando momentos inspirados
Ou caindo no vórtice do umbigo.
É preciso savoir-faire e vigilância
Para evitar lugar comum e o banal,
E talvez um pouco aquela ânsia
De esconder um bem possível lado mau.
Mas quanta aventura num soneto!
Sequer sabemos o que mais dará no fim,
Dourada chave do último terceto...
Então, tudo se faz luz, parte do Logos
Que a própria Divindade pôs em mim,
Se não a Luz Maior, pequenos fogos...
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15/01/2018
Acidentado universo de perigo
Alcançando momentos inspirados
Ou caindo no vórtice do umbigo.
É preciso savoir-faire e vigilância
Para evitar lugar comum e o banal,
E talvez um pouco aquela ânsia
De esconder um bem possível lado mau.
Mas quanta aventura num soneto!
Sequer sabemos o que mais dará no fim,
Dourada chave do último terceto...
Então, tudo se faz luz, parte do Logos
Que a própria Divindade pôs em mim,
Se não a Luz Maior, pequenos fogos...
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15/01/2018
À estrela do mundo (de Alma Welt) (para Clarisse Lispector)
Ó amor, quisera amar como nas lendas
Dos que davam suas vidas pelo amor
E enfrentavam as feras pelas rendas
De uma donzela vezeira de se expôr...
E ser eu a donzela desses versos
Naquela torre cercada de floresta,
A mercê de cavaleiros controversos,
Só um capaz do tal beijo que presta.
Mas que sei eu dos tempos de nobreza
Se nasci num casarão já decadente
De família não fidalga, mas burguesa?
Assim, só me restava reinventar-me,
Ser eu mesma a cigana e a cliente,
E à estrela do mundo também dar-me...
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15/01/2018
Dos que davam suas vidas pelo amor
E enfrentavam as feras pelas rendas
De uma donzela vezeira de se expôr...
E ser eu a donzela desses versos
Naquela torre cercada de floresta,
A mercê de cavaleiros controversos,
Só um capaz do tal beijo que presta.
Mas que sei eu dos tempos de nobreza
Se nasci num casarão já decadente
De família não fidalga, mas burguesa?
Assim, só me restava reinventar-me,
Ser eu mesma a cigana e a cliente,
E à estrela do mundo também dar-me...
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15/01/2018
domingo, 14 de janeiro de 2018
Deem-me Tempo (de Alma Welt)
Minhas fontes vêm todas da memória:
Do passado vem meu Eu cristalizado,
De onde fruo do presente toda a glória,
E o sentido oculto, ou disfarçado...
"Então não vives o Presente, cara Alma?"
Pergunta um leitor meio apressado...
E eu respondo com a costumeira calma:
"Não, não vivo. Tua pergunta é já Passado."
Deem-me Tempo, ó coisas e fatos,
Pra digerir vossas tramas e delícias
E os coelhos que saíram desses matos...
Pois tudo o que depois de acontecido
Deixou os seus sabores, tons, malícias,
É Poesia e não pão amanhecido...
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14/01/2018
Do passado vem meu Eu cristalizado,
De onde fruo do presente toda a glória,
E o sentido oculto, ou disfarçado...
"Então não vives o Presente, cara Alma?"
Pergunta um leitor meio apressado...
E eu respondo com a costumeira calma:
"Não, não vivo. Tua pergunta é já Passado."
Deem-me Tempo, ó coisas e fatos,
Pra digerir vossas tramas e delícias
E os coelhos que saíram desses matos...
Pois tudo o que depois de acontecido
Deixou os seus sabores, tons, malícias,
É Poesia e não pão amanhecido...
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14/01/2018
A princesa meio-quilo (de Alma Welt)
Eu, guria, minha avó recomendava:
"Alma minha, seja sempre recatada
E mantenha tua porta com a trava,
Olhos baixos quando passes pela armada." *
"Olha, os homens estão sempre numa guerra,
Cada donzela é como aldeia sitiada...
Então te valorizes como à terra
E não te entregues assim de mão beijada."
E eu ria, ria ouvindo aquilo,
Qual se estivesse nua num castelo
E fosse uma princesa meio-quilo...
E não tendo me levado muito a sério,
Tornei-me, não princesa, ao percebê-lo,
Mas poeta, o que é bem maior mistério...
.
14/01/2018
Nota
*Olhos baixos quando passes pela armada - A avó da Alma faz alusão ao famoso poema medieval português de autoria anônima " A Donzela Que Foi à Guerra", que certamente inspirou Guimarães Rosa para o seu personagem Diadorim, do "Grande Sertão: Veredas." ( "Venham armas e cavalo e serei filho varão. /.... Quando passar pela Armada, porei os olhos no chão/ .....Senhor pai, senhora mãe, grande dó de coração/ Os olhos de dom Martinho são de mulher, de homem não./Convidai-o, voz, meu filho.... ")
"Alma minha, seja sempre recatada
E mantenha tua porta com a trava,
Olhos baixos quando passes pela armada." *
"Olha, os homens estão sempre numa guerra,
Cada donzela é como aldeia sitiada...
Então te valorizes como à terra
E não te entregues assim de mão beijada."
E eu ria, ria ouvindo aquilo,
Qual se estivesse nua num castelo
E fosse uma princesa meio-quilo...
E não tendo me levado muito a sério,
Tornei-me, não princesa, ao percebê-lo,
Mas poeta, o que é bem maior mistério...
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14/01/2018
Nota
*Olhos baixos quando passes pela armada - A avó da Alma faz alusão ao famoso poema medieval português de autoria anônima " A Donzela Que Foi à Guerra", que certamente inspirou Guimarães Rosa para o seu personagem Diadorim, do "Grande Sertão: Veredas." ( "Venham armas e cavalo e serei filho varão. /.... Quando passar pela Armada, porei os olhos no chão/ .....Senhor pai, senhora mãe, grande dó de coração/ Os olhos de dom Martinho são de mulher, de homem não./Convidai-o, voz, meu filho.... ")
sábado, 13 de janeiro de 2018
sexta-feira, 12 de janeiro de 2018
De repente (de Alma Welt)
De repente olhei assim ao meu redor
E me vi no deserto da Esperança
Onde rasteja o Mal e o Desamor
E temos medo da noite, qual criança.
Mas o mundo era o mesmo... O que havia?
Na verdade era uma guerra escondida
No dia a dia até no íntimo da vida,
E rubro sangue nas almas escorria...
Nossas mãos como inimigas degladiam,
Direita e esquerda, num funil,
Enquanto nosso tronco asfixiam...
E vi que o homem do homem é o tormento
Desde que o fumo de um ao céu subiu
E o do outro foi levado pelo vento...
.
12/01/2018
Nota
*Desde que o fumo de um ao céu subiu/
E o do outro foi levado pelo vento. - alusão ao episódio do Gênesis, da Bíblia, em que Caim oferece um sacrifício de um fruto da terra a Deus (provavelmente queimando ervas), mas Deus não aceitou a oferenda (o fumo não subiu para o céu) mas aceitou de Abel "as primícias de seu rebanho e a gordura deste". Então, Caim enciumado matou seu irmão Abel. Quando Deus perguntou a Caim: "Onde está Abel, teu irmão?" Caim respondeu: "Acaso sou o guardião do meu irmão? " E Deus o amaldiçoou... Eis aí a origem de toda a discórdia entre os homens.
E me vi no deserto da Esperança
Onde rasteja o Mal e o Desamor
E temos medo da noite, qual criança.
Mas o mundo era o mesmo... O que havia?
Na verdade era uma guerra escondida
No dia a dia até no íntimo da vida,
E rubro sangue nas almas escorria...
Nossas mãos como inimigas degladiam,
Direita e esquerda, num funil,
Enquanto nosso tronco asfixiam...
E vi que o homem do homem é o tormento
Desde que o fumo de um ao céu subiu
E o do outro foi levado pelo vento...
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12/01/2018
Nota
*Desde que o fumo de um ao céu subiu/
E o do outro foi levado pelo vento. - alusão ao episódio do Gênesis, da Bíblia, em que Caim oferece um sacrifício de um fruto da terra a Deus (provavelmente queimando ervas), mas Deus não aceitou a oferenda (o fumo não subiu para o céu) mas aceitou de Abel "as primícias de seu rebanho e a gordura deste". Então, Caim enciumado matou seu irmão Abel. Quando Deus perguntou a Caim: "Onde está Abel, teu irmão?" Caim respondeu: "Acaso sou o guardião do meu irmão? " E Deus o amaldiçoou... Eis aí a origem de toda a discórdia entre os homens.
Ó meus amigos (de Alma Welt)
Ó meus amigos, mais um ano com vocês...
Eu que até pensava em ir embora,
Para a vizinha Vila Nova das Mercês
Ou para a mais distante Bora Bora...
E fico, fico sempre até o final...
Sou aquela que fica na estação
A acenar pro trem em comoção
Na plataforma eternizada do real...
Estou cansada, amigos, de ver claro
A ponto de enxergar o trem fantasma
Que me irá levar sem cobrar caro,
Quando meu peito cheio de ar fecundo
Não quererá fechar, se não de asma,
Pelo apego que tenho a este mundo...
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12/01/2018
Eu que até pensava em ir embora,
Para a vizinha Vila Nova das Mercês
Ou para a mais distante Bora Bora...
E fico, fico sempre até o final...
Sou aquela que fica na estação
A acenar pro trem em comoção
Na plataforma eternizada do real...
Estou cansada, amigos, de ver claro
A ponto de enxergar o trem fantasma
Que me irá levar sem cobrar caro,
Quando meu peito cheio de ar fecundo
Não quererá fechar, se não de asma,
Pelo apego que tenho a este mundo...
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12/01/2018
sábado, 6 de janeiro de 2018
Propósitos para o novo ano ( de Alma Welt)
Como todo novo ano que começa
Reúno meus melhores pensamentos,
Conquanto intenções boas não meça,
Sei que delas é o Vale dos Tormentos...
Neste ano não darei sequer conselho
Aos amigos que perderem o juízo,
Evitando, pois, meter o meu bedelho
Ou no gato sugerir botar um guizo...
Mas palavras de consolo, isto não nego,
Que embora seja grande pessimista
Meu coração mole logo entrego...
Dos sonhos despojados ou de intrigas
Consciente de estar na mesma lista,
Hei de unir minhas cigarras e formigas...
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06/01/2018
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Reúno meus melhores pensamentos,
Conquanto intenções boas não meça,
Sei que delas é o Vale dos Tormentos...
Neste ano não darei sequer conselho
Aos amigos que perderem o juízo,
Evitando, pois, meter o meu bedelho
Ou no gato sugerir botar um guizo...
Mas palavras de consolo, isto não nego,
Que embora seja grande pessimista
Meu coração mole logo entrego...
Dos sonhos despojados ou de intrigas
Consciente de estar na mesma lista,
Hei de unir minhas cigarras e formigas...
.
06/01/2018
.
Os Conselhos de Meu Pai (de Alma Welt)
"Seja honesta, justa e verdadeira,
Mas não se esqueça de ser boa.
Eis só o que é preciso, mais não queira,
Não vieste ao universo bela à toa."
"Se tiveres ambição, vai com calma,
Esta pode te levar a correr muito.
Alguns deixam para traz a própria alma
Numa curva perigosa do circuito..."
Assim dizia meu pai, se bem me lembro,
Comigo sentadinha em seus joelhos,
E se não me engano era Dezembro...
Mas do que disse, e me ficou do conselheiro
Não foram na verdade os bons conselhos,
Mas meu toque em sua barba, o tom e o cheiro...
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01/01/2018
Mas não se esqueça de ser boa.
Eis só o que é preciso, mais não queira,
Não vieste ao universo bela à toa."
"Se tiveres ambição, vai com calma,
Esta pode te levar a correr muito.
Alguns deixam para traz a própria alma
Numa curva perigosa do circuito..."
Assim dizia meu pai, se bem me lembro,
Comigo sentadinha em seus joelhos,
E se não me engano era Dezembro...
Mas do que disse, e me ficou do conselheiro
Não foram na verdade os bons conselhos,
Mas meu toque em sua barba, o tom e o cheiro...
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01/01/2018
Réveillon (de Alma Welt)
Chegamos afinal no fim do ano,
Nada levava a crer (cá entre nós);
Estivemos navegando a meio pano
Num oceano só de dúvidas, atroz.
Mas, marinheiros, fizemos nossa parte
Acorrentados e remando qual galés
Em calmarias ou abalroo de combate,
E estamos já com água pelos pés...
Mas pensando bem, esta é a vida.
Não foi diferente pra minha avó,
Sorridente e disposta à acolhida...
E ao chegar ao minuto da passagem
Que seja mais pra cima e não ao pó
E sejamos pleno rio e não a margem...
.
31/12/2017
Nada levava a crer (cá entre nós);
Estivemos navegando a meio pano
Num oceano só de dúvidas, atroz.
Mas, marinheiros, fizemos nossa parte
Acorrentados e remando qual galés
Em calmarias ou abalroo de combate,
E estamos já com água pelos pés...
Mas pensando bem, esta é a vida.
Não foi diferente pra minha avó,
Sorridente e disposta à acolhida...
E ao chegar ao minuto da passagem
Que seja mais pra cima e não ao pó
E sejamos pleno rio e não a margem...
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31/12/2017
sábado, 30 de dezembro de 2017
O Lobo no armário (de Alma Welt)
O poeta é um enganador quase perverso,
Reverte suas pegadas de tal sorte
Que como um perseguido, faz o inverso:
Indo ao sul mais parece ir ao norte.
As palavras são essas impressões,
Deixadas no musgo das florestas
Apontando à ilusórias direções,
Enquanto escapamos pelas frestas.
Nunca vá para onde aponta o teu poeta,
O seu recado é pra ser lido ao contrário
Como um espelho, não como uma seta,
E a cada olhar veremos nova ruga.
Afinal se trata sempre de uma fuga
Da Morte, ancestral lobo no armário...
.
30/12/2017
Reverte suas pegadas de tal sorte
Que como um perseguido, faz o inverso:
Indo ao sul mais parece ir ao norte.
As palavras são essas impressões,
Deixadas no musgo das florestas
Apontando à ilusórias direções,
Enquanto escapamos pelas frestas.
Nunca vá para onde aponta o teu poeta,
O seu recado é pra ser lido ao contrário
Como um espelho, não como uma seta,
E a cada olhar veremos nova ruga.
Afinal se trata sempre de uma fuga
Da Morte, ancestral lobo no armário...
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30/12/2017
sábado, 23 de dezembro de 2017
A Gargalhada (de Alma Welt)
A Gargalhada- desenho de Guilherme de Faria, 1967
A Gargalhada (de Alma Welt)
E vi aquela imensa gargalhada
Vir rolando como onda pela sala
Até formar espuma concentrada
E morrer com um vazio que não cala.
Eram os homens fúteis e eu os via
Loucos para rir a qualquer hora
Já que a estupidez os denuncia
E seu riso sem sentido corrobora.
Não rirei convosco, ó gargalhantes,
Nem mesmo que a piada seja boa,
Que alegria verdadeira assim não soa.
Um som de cristal, um brilho vago
De dentes modestos, hesitantes,
Eis o riso da alma que em mim trago...
.
23/12/2017
Nota
A Gargalhada- desenho de Guilherme de Faria, 1967 coleção do MAM de São Paulo (este desenho em forma de vinheta, a pincel, foi feito como ilustração para o conto " A Gargalhada " de Luigi Pirandello, em tradução primorosa do Alfredo Bosi, publicado no Suplemento Literário de O Estado de São Paulo, em 1967, e décadas depois doado por aquele jornal ao MAM em cujo acervo agora se encontra junto com outras obras do artista.
E vi aquela imensa gargalhada
Vir rolando como onda pela sala
Até formar espuma concentrada
E morrer com um vazio que não cala.
Eram os homens fúteis e eu os via
Loucos para rir a qualquer hora
Já que a estupidez os denuncia
E seu riso sem sentido corrobora.
Não rirei convosco, ó gargalhantes,
Nem mesmo que a piada seja boa,
Que alegria verdadeira assim não soa.
Um som de cristal, um brilho vago
De dentes modestos, hesitantes,
Eis o riso da alma que em mim trago...
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23/12/2017
A Gargalhada- desenho de Guilherme de Faria, 1967 coleção do MAM de São Paulo (este desenho em forma de vinheta, a pincel, foi feito como ilustração para o conto " A Gargalhada " de Luigi Pirandello, em tradução primorosa do Alfredo Bosi, publicado no Suplemento Literário de O Estado de São Paulo, em 1967, e décadas depois doado por aquele jornal ao MAM em cujo acervo agora se encontra junto com outras obras do artista.
quinta-feira, 21 de dezembro de 2017
Retorno a Wuthering Heights (de Alma Welt)
Retorno ao meu Morro dos Ventos
Conquanto não haja morro mas planura.
Uivantes minuanos de meus tempos
Esperavam por mim, que volto pura.
Sou a Cathy desta terra do meu pampa
E como ela, volto ao que se adora
De tanto amor cheia até a tampa
E aberta como caixa de Pandora...
E te adentro, ó casarão velho que estalas
Aos meus leves passos como outrora
E levantas teus espectros das valas...
Eu, Anita e Giuseppe, entrelaçados,
Nos abraçamos no turbilhão de agora:
Nossos cumes estão longe de alcançados...
.
21/12/2017
Nota
*Wuthering Heigths - titulo original do maravilhoso romance O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Brontë (era o nome da propriedade da família de Cathy Earneshaw, depois Cathy Linton, a heroína do romance, amada por Heathcliff...
(Nos anos 90 eu fiz uma litografia com esse título: "Retorno a Wuthering Heights". Mas infelizmente não fiquei com nenhum exemplar para postar agora como ilustração a este soneto da Alma). (Guilherme de Faria)
Conquanto não haja morro mas planura.
Uivantes minuanos de meus tempos
Esperavam por mim, que volto pura.
Sou a Cathy desta terra do meu pampa
E como ela, volto ao que se adora
De tanto amor cheia até a tampa
E aberta como caixa de Pandora...
E te adentro, ó casarão velho que estalas
Aos meus leves passos como outrora
E levantas teus espectros das valas...
Eu, Anita e Giuseppe, entrelaçados,
Nos abraçamos no turbilhão de agora:
Nossos cumes estão longe de alcançados...
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21/12/2017
Nota
*Wuthering Heigths - titulo original do maravilhoso romance O Morro dos Ventos Uivantes, de Emily Brontë (era o nome da propriedade da família de Cathy Earneshaw, depois Cathy Linton, a heroína do romance, amada por Heathcliff...
(Nos anos 90 eu fiz uma litografia com esse título: "Retorno a Wuthering Heights". Mas infelizmente não fiquei com nenhum exemplar para postar agora como ilustração a este soneto da Alma). (Guilherme de Faria)
O bem vivido (de Alma Welt)
Não nos desejo muito para a frente
Mas que tenhamos muito bem vivido,
Aproveitado ao máximo o presente
E não só "o que queríamos ter sido".
Foste feliz, meu amigo, te cumpriste?
A vida nos devolve um bom passado
Para degustarmos como alpiste
Na pequena gaiola de alambrado...
Olha, a vida é o que foi, não que será,
O futuro é uma cigana charlatã
Que as cartas corta, lança e Deus dá"...
Se não soubeste viver, agora é tarde,
Nem sequer desejarei-te um amanhã,
Que desperdiçarás como um covarde...
.
21/12/2017
Mas que tenhamos muito bem vivido,
Aproveitado ao máximo o presente
E não só "o que queríamos ter sido".
Foste feliz, meu amigo, te cumpriste?
A vida nos devolve um bom passado
Para degustarmos como alpiste
Na pequena gaiola de alambrado...
Olha, a vida é o que foi, não que será,
O futuro é uma cigana charlatã
Que as cartas corta, lança e Deus dá"...
Se não soubeste viver, agora é tarde,
Nem sequer desejarei-te um amanhã,
Que desperdiçarás como um covarde...
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21/12/2017
Velhos amigos (de Alma Welt)
Vejo alguns velhos amigos se acabarem
Derrotados por um sonho que os ilude,
Batendo as teclas até se esfacelarem
Dos equívocos de nossa juventude...
Quanta coisa já não é mais o que era
Ou perdeu o sentido com o vento
Por sua natureza de quimera
E seu canto de sereia longo e lento...
E eu baixo os olhos constrangida
Com imensa pena dos amigos,
Alguns quase reduzidos a mendigos.
Quisera reuni-los, e sem mágoa
(todos demos com os nossos burros n'água)
Combinar com os amigos nova vida...
.
21/12/2017
Derrotados por um sonho que os ilude,
Batendo as teclas até se esfacelarem
Dos equívocos de nossa juventude...
Quanta coisa já não é mais o que era
Ou perdeu o sentido com o vento
Por sua natureza de quimera
E seu canto de sereia longo e lento...
E eu baixo os olhos constrangida
Com imensa pena dos amigos,
Alguns quase reduzidos a mendigos.
Quisera reuni-los, e sem mágoa
(todos demos com os nossos burros n'água)
Combinar com os amigos nova vida...
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21/12/2017
sexta-feira, 15 de dezembro de 2017
(O Jardim das Aflições" (de Alma Welt) Para o Mestre Olavo de Carvalho (republicando)
Estamos à deriva em meio a brumas,
Se perderam nossos sonhos superiores;
Nosso barco é um circo dos horrores,
As melhores ilusões viram espumas...
Marujada, quem quer ser o capitão?
Nosso último se foi pela amurada
E só de noite aparece no porão,
Onde os ratos construíram sua morada...
Contra-mestre, avisto terra no horizonte!
Só pode ser a tal Ilha dos Conflitos,
Onde dizem que nem com Deus não conte.
Vamos lá, ao Jardim das Aflições!
Beber da água amarga dos aflitos,
Sem um consolo mas repleta de lições...
.
19/11/2017
Se perderam nossos sonhos superiores;
Nosso barco é um circo dos horrores,
As melhores ilusões viram espumas...
Marujada, quem quer ser o capitão?
Nosso último se foi pela amurada
E só de noite aparece no porão,
Onde os ratos construíram sua morada...
Contra-mestre, avisto terra no horizonte!
Só pode ser a tal Ilha dos Conflitos,
Onde dizem que nem com Deus não conte.
Vamos lá, ao Jardim das Aflições!
Beber da água amarga dos aflitos,
Sem um consolo mas repleta de lições...
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19/11/2017
quarta-feira, 6 de dezembro de 2017
Meu Natal da Infância (de Alma Welt)
Depois de saber de tudo um pouco,
Buscando a compreensão universal,
E mesmo tendo lido como um louco
Ainda ingenua esperar pelo Natal...
Voltar ao lar, que nem "devera" ter saído,
Com aquela imagem de guria
De pé diante da leda maravilha
Que é aquele pinheirinho revestido
Com a estrela no topo, a de Belém,
E aqueles mil presentes em pacotes,
Que ainda nem sabemos para quem...
Destruir o que a memória ainda tece,
Os anos não puderam, nem as mortes:
O meu Natal da infância permanece...
.
06/12/2017
Buscando a compreensão universal,
E mesmo tendo lido como um louco
Ainda ingenua esperar pelo Natal...
Voltar ao lar, que nem "devera" ter saído,
Com aquela imagem de guria
De pé diante da leda maravilha
Que é aquele pinheirinho revestido
Com a estrela no topo, a de Belém,
E aqueles mil presentes em pacotes,
Que ainda nem sabemos para quem...
Destruir o que a memória ainda tece,
Os anos não puderam, nem as mortes:
O meu Natal da infância permanece...
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06/12/2017
sexta-feira, 1 de dezembro de 2017
O sonho do real (de Alma Welt)
Sonhar com o real é meu ofício,
Não propriamente os "Sonhos da Razão",*
Que estes produzem um malefício,
Como queria o grande Surdo da Mansão. *
Meus sonhos são singelos, literários,
Não lembram os anseios de homens fortes,
Rotas falsas, logo seus itinerários
Ou seus amores francos, sem "transportes".*
A Arte é mais real que a realidade,
Foi por isso que a concebeu o homem,
E pra ter algum controle da maldade...
Quanto a mim sonho a beleza com humor,
Ainda mesmo que por cínica me tomem
Brinco de amar meu verdadeiro amor...
.
01/10/2017
Nota
*...o grande surdo da mansão - Alma se refere ao grande pintor espanhol Francisco de Goya y Lucientes, que vivia na chamada "Mansón del Sordo" (por ter ficado surdo na velhice) cujas paredes encheu de seus quadros da "Fase Negra", com temas escabrosos de feitiçaria e até o horrendo canibalismo de Cronos. Quanto aos * "Sonhos da Razão", é alusão à gravura de Goya que ostenta a famosa frase: "El sueño de la razón produces monstruos".
*..."sem "transportes". - antigamente, em linguagem poética se falava em "transportes de amor", os arroubos dos apaixonados...
Não propriamente os "Sonhos da Razão",*
Que estes produzem um malefício,
Como queria o grande Surdo da Mansão. *
Meus sonhos são singelos, literários,
Não lembram os anseios de homens fortes,
Rotas falsas, logo seus itinerários
Ou seus amores francos, sem "transportes".*
A Arte é mais real que a realidade,
Foi por isso que a concebeu o homem,
E pra ter algum controle da maldade...
Quanto a mim sonho a beleza com humor,
Ainda mesmo que por cínica me tomem
Brinco de amar meu verdadeiro amor...
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01/10/2017
Nota
*...o grande surdo da mansão - Alma se refere ao grande pintor espanhol Francisco de Goya y Lucientes, que vivia na chamada "Mansón del Sordo" (por ter ficado surdo na velhice) cujas paredes encheu de seus quadros da "Fase Negra", com temas escabrosos de feitiçaria e até o horrendo canibalismo de Cronos. Quanto aos * "Sonhos da Razão", é alusão à gravura de Goya que ostenta a famosa frase: "El sueño de la razón produces monstruos".
*..."sem "transportes". - antigamente, em linguagem poética se falava em "transportes de amor", os arroubos dos apaixonados...
A Lição (de Alma Welt)
Pensei ter obtido o dom das fadas
Por ter nascido em berço esplêndido
E muito bela também, ruiva sem sardas,
Pecando cedo sem ter me arrependido.
Com tal orgulho ingênuo fui crescendo
Perdoada de antemão pelo bom Deus,
Pois as bençãos sobre mim e sobre os meus,
Visíveis, eu sabia e ia vendo...
Mas o Senhor quis dar-me uma lição
E fez-me uma sonetista desde cedo,
Incapaz para qualquer uma outra ação,
Só contar sílabas, colher flores no jardim,
Como se o mundo fosse bom e ledo,
Porquanto dói, que assim o é só para mim...
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01/12/2017
Por ter nascido em berço esplêndido
E muito bela também, ruiva sem sardas,
Pecando cedo sem ter me arrependido.
Com tal orgulho ingênuo fui crescendo
Perdoada de antemão pelo bom Deus,
Pois as bençãos sobre mim e sobre os meus,
Visíveis, eu sabia e ia vendo...
Mas o Senhor quis dar-me uma lição
E fez-me uma sonetista desde cedo,
Incapaz para qualquer uma outra ação,
Só contar sílabas, colher flores no jardim,
Como se o mundo fosse bom e ledo,
Porquanto dói, que assim o é só para mim...
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01/12/2017
quarta-feira, 29 de novembro de 2017
Julgamentos (de Alma Welt)
Que a vida me permita o bom julgar
Já que tudo são escolhas judiciosas,
O bom Deus o livre arbítrio nos quis dar
Nas nossas fúteis causas pretensiosas.
Mas Deus não me permita julgar outrem
Sem antes muito olhar meu próprio rabo.
Nossa vida, dizem, passa como um trem,
Quer embarques ou o percas no lavabo.
Tudo tem sua hora marcada, seu lugar,
E não temos em geral segunda chance.
Também nada vem de graça, nem o lanche.
Acho que devo ir parando por aqui,
Noto em mim uma tendência ao "popular":
Tantos chavões nunca outrora cometi...
.
29/11/2017
Já que tudo são escolhas judiciosas,
O bom Deus o livre arbítrio nos quis dar
Nas nossas fúteis causas pretensiosas.
Mas Deus não me permita julgar outrem
Sem antes muito olhar meu próprio rabo.
Nossa vida, dizem, passa como um trem,
Quer embarques ou o percas no lavabo.
Tudo tem sua hora marcada, seu lugar,
E não temos em geral segunda chance.
Também nada vem de graça, nem o lanche.
Acho que devo ir parando por aqui,
Noto em mim uma tendência ao "popular":
Tantos chavões nunca outrora cometi...
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29/11/2017
terça-feira, 28 de novembro de 2017
Para amar a Alma (de Alma Welt)
Não temais, meus amores, meu mistério,
Embora digam que deveis temê-lo...
Se meu coração é um eremitério,
O é em plena primavera de degelo.
Só acolho o solitário, é bem verdade.
Aquele de exigente natureza,
Ou o que renunciou à sociedade,
Moderno Prometeu de alma presa.
Não quero o bom guri, eterno infante
Que só pensa na vida em divertir-se;
Devo, pois, evitá-lo como amante...
Então venha, meu amor, mas reverente:
Meu coração é tal como a deusa Circe,
Tudo que toca é seu eternamente...
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28/11/2017
Embora digam que deveis temê-lo...
Se meu coração é um eremitério,
O é em plena primavera de degelo.
Só acolho o solitário, é bem verdade.
Aquele de exigente natureza,
Ou o que renunciou à sociedade,
Moderno Prometeu de alma presa.
Não quero o bom guri, eterno infante
Que só pensa na vida em divertir-se;
Devo, pois, evitá-lo como amante...
Então venha, meu amor, mas reverente:
Meu coração é tal como a deusa Circe,
Tudo que toca é seu eternamente...
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28/11/2017
sábado, 25 de novembro de 2017
Sem restauro (de Alma Welt)
Não tiraria uma vírgula sequer,
Dos meus erros e acertos nesta vida.
Também não me prevalece ser mulher
E com esta dupla alma dividida.
Quê dizes? De nós, Alma, ocultas algo?
"Não" (eu respondo). "Duplos somos,
Um de nós raposa e o outro galgo,
Este a perseguir alguém que fomos."
Anima e animus (disse o mestre)
Em perpétuo convívio conturbado,
Ou em harmonia, frágil e equestre:
Sim, cavalo e cavaleiro, não centauro.
Podemos ir ao chão, vidro rachado,
E, portanto, impossível de restauro...
Dos meus erros e acertos nesta vida.
Também não me prevalece ser mulher
E com esta dupla alma dividida.
Quê dizes? De nós, Alma, ocultas algo?
"Não" (eu respondo). "Duplos somos,
Um de nós raposa e o outro galgo,
Este a perseguir alguém que fomos."
Anima e animus (disse o mestre)
Em perpétuo convívio conturbado,
Ou em harmonia, frágil e equestre:
Sim, cavalo e cavaleiro, não centauro.
Podemos ir ao chão, vidro rachado,
E, portanto, impossível de restauro...
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25/11/2017
25/11/2017
domingo, 19 de novembro de 2017
Lições do abismo (de Alma Welt)
Já não temos mais consolo nem perdão,
Estamos fritos, ferrados e mal pagos
Como diria o povo simples, com razão,
Já não cabem panos quentes nem afagos.
Medea exclama: "Tudo está perdido!",
Com fogo no palácio, os filhos mortos,
Quando já nem procuramos nossos portos,
Na esperança de algum novo sentido.
Quê resta então? Agarrados num arbusto
De amoras na beira de um abismo
Com um tigre a acrescentar ao nosso susto,
Só nos cabe colher uma ou duas frutinhas
E comê-las a esperar um novo sismo,
Ou aprender a agarrar como as gavinhas...
.
Estamos fritos, ferrados e mal pagos
Como diria o povo simples, com razão,
Já não cabem panos quentes nem afagos.
Medea exclama: "Tudo está perdido!",
Com fogo no palácio, os filhos mortos,
Quando já nem procuramos nossos portos,
Na esperança de algum novo sentido.
Quê resta então? Agarrados num arbusto
De amoras na beira de um abismo
Com um tigre a acrescentar ao nosso susto,
Só nos cabe colher uma ou duas frutinhas
E comê-las a esperar um novo sismo,
Ou aprender a agarrar como as gavinhas...
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19/11/2017
"O Jardim das Aflições" (de Alma Welt) Para o mestre Olavo de Carvalho
Estamos à deriva em meio a brumas,
Se perderam nossos sonhos superiores;
Nosso barco é um circo dos horrores,
As melhores ilusões viram espumas...
Marujada, quem quer ser o capitão?
Nosso último se foi pela amurada
E só de noite aparece no porão,
Onde os ratos construíram sua morada...
Contra-mestre, avisto terra no horizonte!
Só pode ser a tal Ilha dos Conflitos,
Onde dizem que nem com Deus não conte.
Vamos lá, ao Jardim das Aflições!
Beber da água amarga dos aflitos,
Sem um consolo mas repleta de lições...
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19/11/2017
Se perderam nossos sonhos superiores;
Nosso barco é um circo dos horrores,
As melhores ilusões viram espumas...
Marujada, quem quer ser o capitão?
Nosso último se foi pela amurada
E só de noite aparece no porão,
Onde os ratos construíram sua morada...
Contra-mestre, avisto terra no horizonte!
Só pode ser a tal Ilha dos Conflitos,
Onde dizem que nem com Deus não conte.
Vamos lá, ao Jardim das Aflições!
Beber da água amarga dos aflitos,
Sem um consolo mas repleta de lições...
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19/11/2017
quarta-feira, 15 de novembro de 2017
Às claras (de Alma Welt)
Mais tarde desceria à profundeza
Do abismo de minha própria alma,
Coisa que uns percebem com clareza
E outros experimentam como trauma.
Corresponde àquela selva escura
Que o bardo florentino descrevia
Tendo perdido a verdadeira via,
Adentrando a porta dos sem cura...
Mas ao chegar num certo turbilhão
E tendo conversado com a Da Rimini
Que continua voando desde então, *
Eu preferi voltar e amar às claras
Nada como quem desfila de biquini
Mas nua, sem pudores, dando as caras...
.
15/11/2017
Nota
*Mas ao chegar num certo turbilhão/
E tendo conversado com a Da Rimini/
Que continua voando desde então. -
Na Divina Comédia de Dante Alighieri, o bardo florentino na sua travessia do Inferno guiado pelo poeta romano Virgílio, atravessa um círculo onde estão as almas dos amantes clandestinos, levados eternamente abraçados, sem pouso, num turbilhão sem fim. Ali estava a alma de Francesca Da Rimini, com seu cunhado e amante Paolo Malatesta, e esta contou ao poeta a história de seu amor e sua desgraça, assassinado que foi o casal pelo marido corcunda de Francesca, Giovanni Malatesta, que os pegou em flagrante.
Alma sugere que visitou como Dante o Inferno e conversou também com a alma de Francesca da Rimini, tantos séculos depois de Dante, já que os suplícios do Inferno são eternos...
Do abismo de minha própria alma,
Coisa que uns percebem com clareza
E outros experimentam como trauma.
Corresponde àquela selva escura
Que o bardo florentino descrevia
Tendo perdido a verdadeira via,
Adentrando a porta dos sem cura...
Mas ao chegar num certo turbilhão
E tendo conversado com a Da Rimini
Que continua voando desde então, *
Eu preferi voltar e amar às claras
Nada como quem desfila de biquini
Mas nua, sem pudores, dando as caras...
.
15/11/2017
Nota
*Mas ao chegar num certo turbilhão/
E tendo conversado com a Da Rimini/
Que continua voando desde então. -
Na Divina Comédia de Dante Alighieri, o bardo florentino na sua travessia do Inferno guiado pelo poeta romano Virgílio, atravessa um círculo onde estão as almas dos amantes clandestinos, levados eternamente abraçados, sem pouso, num turbilhão sem fim. Ali estava a alma de Francesca Da Rimini, com seu cunhado e amante Paolo Malatesta, e esta contou ao poeta a história de seu amor e sua desgraça, assassinado que foi o casal pelo marido corcunda de Francesca, Giovanni Malatesta, que os pegou em flagrante.
Alma sugere que visitou como Dante o Inferno e conversou também com a alma de Francesca da Rimini, tantos séculos depois de Dante, já que os suplícios do Inferno são eternos...
A Casa do Enforcado (de Alma Welt)
O casarão da infância, misterioso,
Continha lembranças de outra era,
E mesmo de um evento pavoroso
Que as paredes recobria como hera.
No sótão houvera um enforcado,
Da trave do telhado pendurado,
Com a banqueta tombada, o chimarrão
Esparramado e fumegante pelo chão.
Valentim, antigo proprietário, *
Pelo seu gosto das cartas arruinado
Preferiu a saída pelo armário...
E eu, guria, aquilo tudo ouvia
E o via de bombacha, ataviado,
Na vida e na corda em que pendia...
.
15/11/2017
Nota
* Alma, no seu romance autobiográfico A Herança, se refere a este episódio real narrado por seu avô Joachim Welt, que adquiriu a velha estância Farroupilha (da qual mudou o nome para Santa Gertrudes) do seu último herdeiro, Valentim Ferro, de antiga família gaúcha e que arruinado pelo seu vício do poker viu-se forçado por imensas dívidas a vender ao "boche" (alemão) arrivista, a estância e seu casarão.. No dia seguinte à passagem da escritura, o velho Welt o encontrou todo ataviado, de bombacha bordada, botas, faixa na cintura com punhal de prata atravessado, lenço vermelho no pescoço e chapéu de aba dobrada na cabeça, enforcado por laço de couro na trave do sótão, com a banqueta caída e a bomba e a cuia do chimarrão esparramado ainda fumegante (!!) pelo assoalho... Essas coisas enchiam a imaginação da guria, futura poetisa daquele pampa cheio de assombros e mistérios.
Continha lembranças de outra era,
E mesmo de um evento pavoroso
Que as paredes recobria como hera.
No sótão houvera um enforcado,
Da trave do telhado pendurado,
Com a banqueta tombada, o chimarrão
Esparramado e fumegante pelo chão.
Valentim, antigo proprietário, *
Pelo seu gosto das cartas arruinado
Preferiu a saída pelo armário...
E eu, guria, aquilo tudo ouvia
E o via de bombacha, ataviado,
Na vida e na corda em que pendia...
.
15/11/2017
Nota
* Alma, no seu romance autobiográfico A Herança, se refere a este episódio real narrado por seu avô Joachim Welt, que adquiriu a velha estância Farroupilha (da qual mudou o nome para Santa Gertrudes) do seu último herdeiro, Valentim Ferro, de antiga família gaúcha e que arruinado pelo seu vício do poker viu-se forçado por imensas dívidas a vender ao "boche" (alemão) arrivista, a estância e seu casarão.. No dia seguinte à passagem da escritura, o velho Welt o encontrou todo ataviado, de bombacha bordada, botas, faixa na cintura com punhal de prata atravessado, lenço vermelho no pescoço e chapéu de aba dobrada na cabeça, enforcado por laço de couro na trave do sótão, com a banqueta caída e a bomba e a cuia do chimarrão esparramado ainda fumegante (!!) pelo assoalho... Essas coisas enchiam a imaginação da guria, futura poetisa daquele pampa cheio de assombros e mistérios.
Ricordanze (de Alma Welt)
Eu tenho até vergonha da saudade
Que me causa o recordar da infância,
Malgrado uma ou outra circunstância
Menos feliz, ou eventual maldade.
Tal era o meu mundo, e me conformo.
Também nunca blasfemei contra a vidinha.
Perguntada o que fazia na escolinha,
Disse: "Eu merendo, brinco e "dormo"...
Era plena, feliz e até sabia...
E isso me dava aquela aura
Que (alguns afirmavam) me envolvia...
E cresci entre flores e pastagens
Cuja lembrança ainda me restaura,
Mesmo agora, cercada de bobagens...
.
15/11/2017
Ricordanze (by Alma Welt)
I'm ashamed of the longing
That causes me to remember childhood,
In spite of either circumstance
Less happy, or maybe evil.
Such was my world, and I am satisfied .
I have never blasphemed the life.
Asked what I was doing in the school,
Said: "Eating, playing and sleeping "...
I was full, happy and even knew
And that gave me that aura
That (some claimed) involved me ...
And I grew up among flowers and pastures
Whose memory still restores me,
Even now, surrounded by nonsense ...
.
11/15/2017
Que me causa o recordar da infância,
Malgrado uma ou outra circunstância
Menos feliz, ou eventual maldade.
Tal era o meu mundo, e me conformo.
Também nunca blasfemei contra a vidinha.
Perguntada o que fazia na escolinha,
Disse: "Eu merendo, brinco e "dormo"...
Era plena, feliz e até sabia...
E isso me dava aquela aura
Que (alguns afirmavam) me envolvia...
E cresci entre flores e pastagens
Cuja lembrança ainda me restaura,
Mesmo agora, cercada de bobagens...
.
15/11/2017
Ricordanze (by Alma Welt)
I'm ashamed of the longing
That causes me to remember childhood,
In spite of either circumstance
Less happy, or maybe evil.
Such was my world, and I am satisfied .
I have never blasphemed the life.
Asked what I was doing in the school,
Said: "Eating, playing and sleeping "...
I was full, happy and even knew
And that gave me that aura
That (some claimed) involved me ...
And I grew up among flowers and pastures
Whose memory still restores me,
Even now, surrounded by nonsense ...
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11/15/2017
segunda-feira, 13 de novembro de 2017
Palavras à Realidade (de Alma Welt)
Realidade, quanto eu vos venero,
Perseguindo-vos em bruma persistente,
Tateante como o cego Homero,
Nosso ponto comum a toda gente...
Também eu pra captar-vos faço versos,
(e há quem diga que só amo a fantasia!)
Com o palpável, sabeis, não tergiverso,
Jamais sonhei fugir para Utopia...
Pois confiante na beleza do real
Prosterno-me aos pés da Natureza
Mesmo quando se apresente em areal.
Mudar o vosso mundo jamais quis,
Senhora, este pecado, e a avareza,
Não pertencem à breve lista que me fiz...
.
13/11/2017
Perseguindo-vos em bruma persistente,
Tateante como o cego Homero,
Nosso ponto comum a toda gente...
Também eu pra captar-vos faço versos,
(e há quem diga que só amo a fantasia!)
Com o palpável, sabeis, não tergiverso,
Jamais sonhei fugir para Utopia...
Pois confiante na beleza do real
Prosterno-me aos pés da Natureza
Mesmo quando se apresente em areal.
Mudar o vosso mundo jamais quis,
Senhora, este pecado, e a avareza,
Não pertencem à breve lista que me fiz...
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13/11/2017
domingo, 12 de novembro de 2017
A Chave (de Alma Welt)
"Não esperar do mundo, eis o segredo
Para se evitar amarga frustração.
Espere de si mesmo, acorde cedo,
Depois faça em casa a sua lição."
Assim dizia meu pai, bom pessimista,
Solitário como uma soberba ilha
Apesar de exemplar pai de família,
E malgrado a tendência fatalista.
Assim criada, eis a chave dos meus versos
Que cumprem à risca os mandamentos,
E guardam uma surpresa em passos lentos.
Sim, espero a resposta sem pergunta,
Que é a graça de meus sonhos dispersos,
E que só o derradeiro verso junta...
.
12/11/2017
Para se evitar amarga frustração.
Espere de si mesmo, acorde cedo,
Depois faça em casa a sua lição."
Assim dizia meu pai, bom pessimista,
Solitário como uma soberba ilha
Apesar de exemplar pai de família,
E malgrado a tendência fatalista.
Assim criada, eis a chave dos meus versos
Que cumprem à risca os mandamentos,
E guardam uma surpresa em passos lentos.
Sim, espero a resposta sem pergunta,
Que é a graça de meus sonhos dispersos,
E que só o derradeiro verso junta...
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12/11/2017
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