quarta-feira, 15 de novembro de 2017

A Casa do Enforcado (de Alma Welt)

O casarão da infância, misterioso,
Continha lembranças de outra era,
E mesmo de um evento pavoroso
Que as paredes recobria como hera.

No sótão houvera um enforcado,
Da trave do telhado pendurado,
Com a banqueta tombada, o chimarrão
Esparramado e fumegante pelo chão.

Valentim, antigo proprietário, *
Pelo seu gosto das cartas arruinado
Preferiu a saída pelo armário...

E eu, guria, aquilo tudo ouvia
E o via de bombacha, ataviado,
Na vida e na corda em que pendia...

.
15/11/2017

Nota
* Alma, no seu romance autobiográfico A Herança, se refere a este episódio real narrado por seu avô Joachim Welt, que adquiriu a velha estância Farroupilha (da qual mudou o nome para Santa Gertrudes) do seu último herdeiro, Valentim Ferro, de antiga família gaúcha e que arruinado pelo seu vício do poker viu-se forçado por imensas dívidas a vender ao "boche" (alemão) arrivista, a estância e seu casarão.. No dia seguinte à passagem da escritura, o velho Welt o encontrou todo ataviado, de bombacha bordada, botas, faixa na cintura com punhal de prata atravessado, lenço vermelho no pescoço e chapéu de aba dobrada na cabeça, enforcado por laço de couro na trave do sótão, com a banqueta caída e a bomba e a cuia do chimarrão esparramado ainda fumegante (!!) pelo assoalho... Essas coisas enchiam a imaginação da guria, futura poetisa daquele pampa cheio de assombros e mistérios.

Nenhum comentário: