domingo, 4 de dezembro de 2016

Às botinas de Rimbaud (de Alma Welt)

Rimbaud tinha o dom da caminhada
E percorreu as estradas de seu tempo
Como um grande peregrino da alvorada
Parando só para tomar algum alento.

Guri poeta, descreveu uma parada
Onde tocava a lira dos elásticos
De sua bota (até consta que furada)
Um joelho junto ao peito, gestos plásticos.

A ninguém ocorreria tal lirismo
De botinas surradas de mil léguas,
Orfeu por muito menos deu orfismo.

Mas eu, sua fã e herdeira na coxilha,
Para por meu pé na terra a cada milha,
Também às minhas sandálias darei tréguas...

.
03/12/2016
Nota
Este é o famoso soneto de Rimbaud que contém os versos citados pela Alma:

Ma Bohème
Arthur Rimbaud

Je m’en allais, les poings dans mes poches crevées ;
Mon paletot aussi devenait idéal ;
J’allais sous le ciel, Muse ! et j’étais ton féal ;
Oh ! là ! là ! que d’amours splendides j’ai rêvées !

Mon unique culotte avait un large trou.
– Petit-Poucet rêveur, j’égrenais dans ma course
Des rimes. Mon auberge était à la Grande-Ourse.
– Mes étoiles au ciel avaient un doux frou-frou

Et je les écoutais, assis au bord des routes,
Ces bons soirs de septembre où je sentais des gouttes
De rosée à mon front, comme un vin de vigueur ;

Où, rimant au milieu des ombres fantastiques,
Comme des lyres, je tirais les élastiques *
De mes souliers blessés, un pied près de mon coeur ! *

_____________________________________

Nota
*Comme des lyres, je tirais les élastiques
*De mes souliers blessés, un pied près de mon coeur ! - estes notáveis versos, sugestivos, quase intraduzíveis, podem ser entendidos assim:
Como das liras eu puxo as cordas (os elásticos)
De meus calçados feridos (botas furadas) , um pé (joelho) perto do coração ( gesto de quem se agacha para amarrar as botinas)

Arthur Rimbaud, Cahier de Douai (1870)

Nenhum comentário: