"Estão em ti teu pai, mãe, avô e avó,
E digo que a morte é uma ilusão,
Que nossa vida não se reduz ao pó,
Somos almas em breve transição..."
Assim dizia o padre em seu sermão
E o repetiu quando veio aqui em casa
Pensando em dar-me a extrema unção
Por alarme que desta estância vaza...
"Alma está morrendo!" (murmúrio dos peões).
"Não viram os sinais na tempestade?
Na casa escura já nem vemos lampiões!"
Então percebo como meus humores correm:
Se sofro os que me amam também sofrem.
E me alteio de mim contra a vontade...
.
30/09/2017
Este espaço é destinado às diversas séries de sonetos da poetisa gaúcha Alma Welt, que, mais genéricas, não se enquadrem nos outros blogs da poetisa, de séries mais específicas, como os eróticos, os metafísicos, etc. (vide lista de seus blogs)
sábado, 30 de setembro de 2017
quarta-feira, 27 de setembro de 2017
Quase, tudo (de Alma Welt)
Ouvi de mim quase sempre o coração
E esse "quase", quase foi minha desgraça.
O "quase" mesmo, não o orgão-diapasão
Que afina tudo o que por ele passa.
Deus me deu uma mente prodigiosa
Capaz de tudo traduzir em mil sonetos,
Numa linguagem próxima da prosa
Mas vinda de além-mar e não dos guetos.
A Portugal e a Camões devo o acento
E mesmo um pouco aos castelhanos
E a até seu invasor envolto em panos.
Mas se me falta às vezes um alento,
Dentro em mim um lampejo do Walhalla *
Não me permita, ó coração, cair na vala...
.
27/09/2017
___________________
Notas
*E a até seu invasor envolto em panos - Alma se refere aos árabes e seus albornozes e mantos, que pela conquista da península Ibérica influenciaram a língua portuguesa e espanhola.
"Dentro em mim um lampejo do Walhalla - Alma alude ao seu sangue alemão por parte de pai, ou ao seu inconsciente coletivo germânico, cujos arquétipos guerreiros permaneceriam no seu íntimo mais profundo.
E esse "quase", quase foi minha desgraça.
O "quase" mesmo, não o orgão-diapasão
Que afina tudo o que por ele passa.
Deus me deu uma mente prodigiosa
Capaz de tudo traduzir em mil sonetos,
Numa linguagem próxima da prosa
Mas vinda de além-mar e não dos guetos.
A Portugal e a Camões devo o acento
E mesmo um pouco aos castelhanos
E a até seu invasor envolto em panos.
Mas se me falta às vezes um alento,
Dentro em mim um lampejo do Walhalla *
Não me permita, ó coração, cair na vala...
.
27/09/2017
___________________
Notas
*E a até seu invasor envolto em panos - Alma se refere aos árabes e seus albornozes e mantos, que pela conquista da península Ibérica influenciaram a língua portuguesa e espanhola.
"Dentro em mim um lampejo do Walhalla - Alma alude ao seu sangue alemão por parte de pai, ou ao seu inconsciente coletivo germânico, cujos arquétipos guerreiros permaneceriam no seu íntimo mais profundo.
Meu retrato nu (de Alma Welt)
Grande Nu - óleo s/ tela de Guilheme deFaria, 1991, 140x120cm
Meu retrato nu (de Alma Welt)
Quando bem jovem morei na Paulicéia
E no ateliê de um bom velho pintor
Me desnudei como se fora ateia
Ou mesmo após o pomo, sem pudor...
E então ele me disse: "Ao retratar-te
Precisarei te amar demais, sem restrições.
Retrato nu tem que ser obra de arte
Que a nós expulse, a ambos, dos salões."
E eu, claro, caí na sua lábia
E logo o amei de mais, pernas pra cima,
Descobrindo então que nasci sábia.
Mas voltei ao Sul sem meu retrato
Porque o pintor a sua pintura mima
Retocando-me sem fim, fora do trato...
Meu retrato nu (de Alma Welt)
Quando bem jovem morei na Paulicéia
E no ateliê de um bom velho pintor
Me desnudei como se fora ateia
Ou mesmo após o pomo, sem pudor...
E então ele me disse: "Ao retratar-te
Precisarei te amar demais, sem restrições.
Retrato nu tem que ser obra de arte
Que a nós expulse, a ambos, dos salões."
E eu, claro, caí na sua lábia
E logo o amei de mais, pernas pra cima,
Descobrindo então que nasci sábia.
Mas voltei ao Sul sem meu retrato
Porque o pintor a sua pintura mima
Retocando-me sem fim, fora do trato...
.
27/09/2017
27/09/2017
Quase (de Alma Welt)
Ouvi de mim quase sempre o coração
E esse "quase", quase foi minha desgraça.
O "quase" mesmo, não o orgão-diapasão
Que afina tudo o que por ele passa.
Deus me deu uma mente prodigiosa
Capaz de tudo traduzir em mil sonetos,
Numa linguagem próxima da prosa
Mas vinda de além-mar e não dos guetos.
A Portugal e a Camões devo o acento
E mesmo um pouco aos castelhanos
E a até seu invasor envolto em panos.
Mas se me falta às vezes um alento,
Dentro em mim um lampejo do Walhalla *
Não me permita, ó coração, cair na vala...
.
27/09/2017
E esse "quase", quase foi minha desgraça.
O "quase" mesmo, não o orgão-diapasão
Que afina tudo o que por ele passa.
Deus me deu uma mente prodigiosa
Capaz de tudo traduzir em mil sonetos,
Numa linguagem próxima da prosa
Mas vinda de além-mar e não dos guetos.
A Portugal e a Camões devo o acento
E mesmo um pouco aos castelhanos
E a até seu invasor envolto em panos.
Mas se me falta às vezes um alento,
Dentro em mim um lampejo do Walhalla *
Não me permita, ó coração, cair na vala...
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27/09/2017
terça-feira, 26 de setembro de 2017
O que virá (de Alma Welt)
Quando me sento pra escrever, o que virá?
Essa incógnita é uma esfinge da minha mente,
E quase sempre o resultado é surpreendente:
De minha alma... o que agora sairá?
Sou eu mesma minha caixa de Pandora
Mas não de demônios e outros bichos,
Mas de entes e arquétipos de outrora,
Colocados todavia em novos nichos.
Consciente dos tesouros que carrego
Percorro este mundo que me aponta
Como o judeu errante que não nego,
Guardando ouro para uma Terra Santa
Mas da alma, que a riqueza já nem conta,
E como um rei trovador que apenas canta...
.
26/09/2017
________________
Nota
*E como um rei trovador que apenas canta - Alma parece evocar D. Dinis I, O Poeta (Lisboa, 9 de outubro de 1261 – Santarém, 7 de janeiro de 1325), que foi Rei de Portugal e do Algarve de 1279 até sua morte. Era o filho mais velho do rei Afonso III e sua segunda esposa Beatriz de Castela.
D. Dinis I foi grande amante das artes e letras. Tendo sido um famoso trovador, cultivou as Cantigas de Amigo, de Amor e a sátira, contribuindo para o desenvolvimento da poesia trovadoresca na Península Ibérica. Pensa-se ter sido o primeiro monarca português verdadeiramente alfabetizado, tendo assinado sempre com o nome completo. Foi o responsável pela criação da primeira Universidade portuguesa, inicialmente instalada em Lisboa e depois para Coimbra.
(Fonte: Wikipédia)
Essa incógnita é uma esfinge da minha mente,
E quase sempre o resultado é surpreendente:
De minha alma... o que agora sairá?
Sou eu mesma minha caixa de Pandora
Mas não de demônios e outros bichos,
Mas de entes e arquétipos de outrora,
Colocados todavia em novos nichos.
Consciente dos tesouros que carrego
Percorro este mundo que me aponta
Como o judeu errante que não nego,
Guardando ouro para uma Terra Santa
Mas da alma, que a riqueza já nem conta,
E como um rei trovador que apenas canta...
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26/09/2017
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Nota
*E como um rei trovador que apenas canta - Alma parece evocar D. Dinis I, O Poeta (Lisboa, 9 de outubro de 1261 – Santarém, 7 de janeiro de 1325), que foi Rei de Portugal e do Algarve de 1279 até sua morte. Era o filho mais velho do rei Afonso III e sua segunda esposa Beatriz de Castela.
D. Dinis I foi grande amante das artes e letras. Tendo sido um famoso trovador, cultivou as Cantigas de Amigo, de Amor e a sátira, contribuindo para o desenvolvimento da poesia trovadoresca na Península Ibérica. Pensa-se ter sido o primeiro monarca português verdadeiramente alfabetizado, tendo assinado sempre com o nome completo. Foi o responsável pela criação da primeira Universidade portuguesa, inicialmente instalada em Lisboa e depois para Coimbra.
(Fonte: Wikipédia)
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segunda-feira, 25 de setembro de 2017
Lembranças de minha avó (de Alma Welt)
Frida Welt, a avó da Alma - lito de Guilherme de Faria
Lembranças de minha avó (de Alma Welt)
Se queres o melhor pra ti e pros outros,
Monta tu e teu irmão aí nuns potros
E vão vós mesmos, galopando, lá buscar."
Assim dizia minha avó meio matuta,
No jardim ou pondo a mesa pro jantar.
E eu, calada, em permanente escuta,
Aguardava seu espantoso gargalhar.
Eu pensava que minha avó era uma bruxa,
Que assim diziam os peões e suas prendas
Que apontavam seu nariz e a boca murcha.
Então dizia uma besteira, simples chiste,
E sua risada que deixava o pelo em riste,
Vinha do fundo ancestral de antigas lendas...
.
25/09/2017
Aos meus amores (de Alma Welt)
Amores meus, já por mim abandonados,
Me perdoem minha imensa solidão,
Pois poupei-lhes dos custos e dos fardos
De uma vida mental, de pouca ação...
Sou apenas a andarilha de mim mesma
E nem preciso sair do meu jardim
Porque todos os mundos vêm a mim,
E de noite sou eu mesma a abantesma,
Alguém que toda sociedade abandonou
Como o Frankenstein disse de si,
O monstro mesmo, não o gênio que o criou...
Mas se isso não logrei completamente,
É que o amor, uma ternura, algo que ri,
Continua a fluir da minha mente...
.
25/09/2017
Me perdoem minha imensa solidão,
Pois poupei-lhes dos custos e dos fardos
De uma vida mental, de pouca ação...
Sou apenas a andarilha de mim mesma
E nem preciso sair do meu jardim
Porque todos os mundos vêm a mim,
E de noite sou eu mesma a abantesma,
Alguém que toda sociedade abandonou
Como o Frankenstein disse de si,
O monstro mesmo, não o gênio que o criou...
Mas se isso não logrei completamente,
É que o amor, uma ternura, algo que ri,
Continua a fluir da minha mente...
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25/09/2017
Há quem pense... (de Alma Welt)
Há quem pense que poesia é abstração,
Que ela requer viver em devaneio.
Mas garanto que é o contrário: é pura ação
Do real sujeito nosso sobre o meio...
E é pegar quase tudo no concreto
Como fazem as crianças e é tão belo,
Pois permite o ilimitado ao objeto
Como as vozes de um coral de violoncelo.
Como Gump, esperar o bus do filho, *
E a tarde toda aguardar o seu retorno
No banco, como trem não sai do trilho.
O poder do poeta é seu pimpolho
Que sabe que o cavalo oculta o corno
E que mesmo a noite escura tem um olho...
.
25/09/2017
_________________________
Nota
* Como as vozes de um coral de violoncelo - Alusão ao conceito musicológico que se tornou popular, de que o violoncelo é o instrumento que mais se aproxima do timbre da voz humana. Se você diz isso a uma criança ela provavelmente imaginará um violoncelo com boca, cantando.
*Como Gump, esperar o bus do filho - cena final do belíssimo filme americano, "Forrester Gump, o Contador de Histórias", em que o personagem ( atuação magnífica de Tom Hanks) espera o ônibus escolar no banco, à beira da estrada em frente de sua casa, e quando ônibus chega ele diz ao menino: "Quando você voltar estarei aqui esperando por você". O menino sobe, o ônibus parte, e Gump permanece sentado, quase duro, na mesma posição, dando a entender que esperará mesmo, sem sair dali um minuto sequer, a volta de seu filho. Uma penugem aos pés dele é focalizada pela câmera, e sobe brincando, levada pelo vento, como a alma brinca no ar, como o pó brinca infinitamente na luz...
Que ela requer viver em devaneio.
Mas garanto que é o contrário: é pura ação
Do real sujeito nosso sobre o meio...
E é pegar quase tudo no concreto
Como fazem as crianças e é tão belo,
Pois permite o ilimitado ao objeto
Como as vozes de um coral de violoncelo.
Como Gump, esperar o bus do filho, *
E a tarde toda aguardar o seu retorno
No banco, como trem não sai do trilho.
O poder do poeta é seu pimpolho
Que sabe que o cavalo oculta o corno
E que mesmo a noite escura tem um olho...
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25/09/2017
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Nota
* Como as vozes de um coral de violoncelo - Alusão ao conceito musicológico que se tornou popular, de que o violoncelo é o instrumento que mais se aproxima do timbre da voz humana. Se você diz isso a uma criança ela provavelmente imaginará um violoncelo com boca, cantando.
*Como Gump, esperar o bus do filho - cena final do belíssimo filme americano, "Forrester Gump, o Contador de Histórias", em que o personagem ( atuação magnífica de Tom Hanks) espera o ônibus escolar no banco, à beira da estrada em frente de sua casa, e quando ônibus chega ele diz ao menino: "Quando você voltar estarei aqui esperando por você". O menino sobe, o ônibus parte, e Gump permanece sentado, quase duro, na mesma posição, dando a entender que esperará mesmo, sem sair dali um minuto sequer, a volta de seu filho. Uma penugem aos pés dele é focalizada pela câmera, e sobe brincando, levada pelo vento, como a alma brinca no ar, como o pó brinca infinitamente na luz...
As três perguntas (de Alma Welt)
O que sou, de onde vim, pr'onde correr
São perguntas que não precisei fazer,
Ou nasceram no meu caso, respondidas,
E gastei minhas energias noutras lidas:
Ler os clássicos, quase todos, de enfiada,
Vivendo minhas Troias na cabeça,
Não como complexa empreitada,
Mas aventura e diversão à beça...
E instrumentalizada como poucos
Pude sentar e escrever o primo verso
Com a clareza universal dos loucos.
Eis que me voltam as perguntas sobre o Ser,
Cujo sentido permanece imerso
Nestes mares que navego sem saber...
.
25/09/2017
_____________________
Transliteração para o idioma inglês:
The three questions (by Alma Welt)
What I am, where I came from, where to run
These are issues that are not need
Or in my case answered by fun,
So I spent my energies on read and read:
Read the classics, almost all, of threadbare,
Living my Trojans in the head,
Not as a complex undertaking and bare
But adventure and fun as I already said.
And instrumentalized, although a little sad
I was able to sit down and write the first verse
With an universal clarity of the mad.
Behold, they turn as questions about the Self,
Whose meaning remains immersed
In the seas I sail and ask about myself...
.
25/09/2017
Que revertido literalmente, ficaria assim:
As três perguntas (por Alma Welt)
O que sou, de onde eu vim, onde correr
São questões que não são necessárias
Ou no meu caso respondidas por diversão,
Então eu gastei minhas energias em ler e ler
Leia os clássicos, quase todos, na raça,
Viver meus toianos na cabeça,
Não como uma empresa complexa e nua
Mas aventura e diversão como já disse.
E instrumentalizado, embora um pouco triste
Pude sentar e escrever o primeiro verso
Com uma clareza universal de louco.
Eis que eles se tornam perguntas sobre o Eu,
Cujo significado permanece imerso
Nos mares que eu navego e pergunto sobre mim...
.
25/09;2017
São perguntas que não precisei fazer,
Ou nasceram no meu caso, respondidas,
E gastei minhas energias noutras lidas:
Ler os clássicos, quase todos, de enfiada,
Vivendo minhas Troias na cabeça,
Não como complexa empreitada,
Mas aventura e diversão à beça...
E instrumentalizada como poucos
Pude sentar e escrever o primo verso
Com a clareza universal dos loucos.
Eis que me voltam as perguntas sobre o Ser,
Cujo sentido permanece imerso
Nestes mares que navego sem saber...
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25/09/2017
_____________________
Transliteração para o idioma inglês:
The three questions (by Alma Welt)
What I am, where I came from, where to run
These are issues that are not need
Or in my case answered by fun,
So I spent my energies on read and read:
Read the classics, almost all, of threadbare,
Living my Trojans in the head,
Not as a complex undertaking and bare
But adventure and fun as I already said.
And instrumentalized, although a little sad
I was able to sit down and write the first verse
With an universal clarity of the mad.
Behold, they turn as questions about the Self,
Whose meaning remains immersed
In the seas I sail and ask about myself...
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25/09/2017
Que revertido literalmente, ficaria assim:
As três perguntas (por Alma Welt)
O que sou, de onde eu vim, onde correr
São questões que não são necessárias
Ou no meu caso respondidas por diversão,
Então eu gastei minhas energias em ler e ler
Leia os clássicos, quase todos, na raça,
Viver meus toianos na cabeça,
Não como uma empresa complexa e nua
Mas aventura e diversão como já disse.
E instrumentalizado, embora um pouco triste
Pude sentar e escrever o primeiro verso
Com uma clareza universal de louco.
Eis que eles se tornam perguntas sobre o Eu,
Cujo significado permanece imerso
Nos mares que eu navego e pergunto sobre mim...
.
25/09;2017
sábado, 23 de setembro de 2017
Nós, Verônicas (de Alma Welt)
A vida é triste, a beleza a justifica
Como a dor no turbilhão da Rimini,*
Ou quando assisto um filme do De Sicca
Ou um do novo realismo de Fellini ...
Que queres dizer, Alma? A vida é bela?
Então só isso é que tens a nos dizer?
Ora pois, poetisa, não engambela!
Quê beleza é suficiente pra viver?
Então me lembro da pobre Gelsomina, *
E da Cabíria presa num armário, *
Encarnadas pela mesma atriz Masina.
Choro de dor e de beleza pela vida,
Pelas verônicas, suas faces no sudário,
Sua própria face no véu reproduzida... *
.
23/09/2017
_______________
Notas
*Como a dor no turbilhão da Rimini - . Alusão ao episódio do canto 5 da Divina Comédia de Dante Alighieri, em que este encontra as almas dos amantes clandestinos Paolo e Francesca da Rimini, em punição eterna suspensos abraçados num turbilhão sem fim. Uma curiosidade: Rimini é também a cidade natal de Federico Fellini.
*Gelsomina - a personagem que Giulietta Masina encarna no grande filme "La Strada", da fase do Neo-realismo italiano de Fellini, e que rendeu a ela, com justiça, o título de "Carlitos de saias".
"E da Cabíria presa num armário - Alma se refere à personagem da pobre prostituta Cabíria, do filme Noites de Cabíria, que é esquecida trancada no armário de um cliente quando este é surpreendido pela volta e reconciliação com a amante. No dia seguinte é solta, e muito triste, caminhando pela estrada é seguida de maneira alegre, saudada por belos jovens, rapazes e moças que montadas em Vespas (lambretas) que como anjos fazem evoluções em torno dela enquanto caminha, despertando-lhe um sorriso, que fecha o filme ...
* Pelas verônicas, suas faces no sudário/
Sua própria face no véu reproduzida - Alma alude ao episódio da Via Crucis, em que a jovem Verônica enxuga com um véu o rosto suado e ensanguentado de Cristo, ficando a imagem do rosto de Jesus estampada no véu. O nome Verônica deriva de "vero ícone" (verdadeira imagem ). Alma sugere que a verdadeira imagem surgida nos véus das "verônicas", as mulheres tristes e sofridas, é a da própria imagem delas mesmas...
Como a dor no turbilhão da Rimini,*
Ou quando assisto um filme do De Sicca
Ou um do novo realismo de Fellini ...
Que queres dizer, Alma? A vida é bela?
Então só isso é que tens a nos dizer?
Ora pois, poetisa, não engambela!
Quê beleza é suficiente pra viver?
Então me lembro da pobre Gelsomina, *
E da Cabíria presa num armário, *
Encarnadas pela mesma atriz Masina.
Choro de dor e de beleza pela vida,
Pelas verônicas, suas faces no sudário,
Sua própria face no véu reproduzida... *
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23/09/2017
_______________
Notas
*Como a dor no turbilhão da Rimini - . Alusão ao episódio do canto 5 da Divina Comédia de Dante Alighieri, em que este encontra as almas dos amantes clandestinos Paolo e Francesca da Rimini, em punição eterna suspensos abraçados num turbilhão sem fim. Uma curiosidade: Rimini é também a cidade natal de Federico Fellini.
*Gelsomina - a personagem que Giulietta Masina encarna no grande filme "La Strada", da fase do Neo-realismo italiano de Fellini, e que rendeu a ela, com justiça, o título de "Carlitos de saias".
"E da Cabíria presa num armário - Alma se refere à personagem da pobre prostituta Cabíria, do filme Noites de Cabíria, que é esquecida trancada no armário de um cliente quando este é surpreendido pela volta e reconciliação com a amante. No dia seguinte é solta, e muito triste, caminhando pela estrada é seguida de maneira alegre, saudada por belos jovens, rapazes e moças que montadas em Vespas (lambretas) que como anjos fazem evoluções em torno dela enquanto caminha, despertando-lhe um sorriso, que fecha o filme ...
* Pelas verônicas, suas faces no sudário/
Sua própria face no véu reproduzida - Alma alude ao episódio da Via Crucis, em que a jovem Verônica enxuga com um véu o rosto suado e ensanguentado de Cristo, ficando a imagem do rosto de Jesus estampada no véu. O nome Verônica deriva de "vero ícone" (verdadeira imagem ). Alma sugere que a verdadeira imagem surgida nos véus das "verônicas", as mulheres tristes e sofridas, é a da própria imagem delas mesmas...
Desencanto (de Alma Welt)
Esta vida, meus amigos, que loucura
Quando olho pra trás, meio de esguelha,
Vejo erros, sim, nunca impostura,
Que em nós todos havia uma centelha...
Tínhamos anjo, no dizer dos castelhanos,
E portanto algum talento não faltava
Aos nossos primeiros trinta anos,
Acreditando que o futuro assegurava...
Nossos feitos passaram, só eu lembro.
O sucesso é fogo de artifício,
Menos saúda que despede de Dezembro.
E alguns nos vimos às voltas com rotinas
Ou roendo os ossos de um ofício,
Só trocando a meia sola das botinas...
.
23/09/2017
Quando olho pra trás, meio de esguelha,
Vejo erros, sim, nunca impostura,
Que em nós todos havia uma centelha...
Tínhamos anjo, no dizer dos castelhanos,
E portanto algum talento não faltava
Aos nossos primeiros trinta anos,
Acreditando que o futuro assegurava...
Nossos feitos passaram, só eu lembro.
O sucesso é fogo de artifício,
Menos saúda que despede de Dezembro.
E alguns nos vimos às voltas com rotinas
Ou roendo os ossos de um ofício,
Só trocando a meia sola das botinas...
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23/09/2017
sexta-feira, 22 de setembro de 2017
Cartas de corso (de Alma Welt)
De tão alto o meu sonho mal revelo,
Que é a ambição de todo artista
E ao pudor e sensatez apelo,
E possa eu decolar do chão da pista....
Pois é como arrasar montanha inteira
Ou então ceifar sozinha um bom trigal;
Rolar um rochedo à cumeeira
Para lançá-lo no círculo inercial...
Tal é o meu sonho grandioso de poeta
Uma vez que transmutar o mundo em versos
É entre todas, a mais difícil meta.
Um pé na terra outro no mar é necessário
Ao poeta para unir mundos dispersos,
Com a sanha e a coragem de um corsário...
Que é a ambição de todo artista
E ao pudor e sensatez apelo,
E possa eu decolar do chão da pista....
Pois é como arrasar montanha inteira
Ou então ceifar sozinha um bom trigal;
Rolar um rochedo à cumeeira
Para lançá-lo no círculo inercial...
Tal é o meu sonho grandioso de poeta
Uma vez que transmutar o mundo em versos
É entre todas, a mais difícil meta.
Um pé na terra outro no mar é necessário
Ao poeta para unir mundos dispersos,
Com a sanha e a coragem de um corsário...
.
22/09/2017
Nota
*Cartas de corso - tratava-se de um documento da coroa inglesa autorizando de maneira não oficial (como se faz por exemplo aos espiões) um pirata a fazer abordagens, saques e pilhagens a navios estrangeiros entregando uma porcentagem do roubo à coroa. Um dos mais conhecidos corsários foi Francis Drake, o favorito da rainha Elisabeth I da Inglaterra (note-se que se um corsário fosse derrotado e aprisionado por uma potencia estrangeira, o seu governo não o reconheceria, isto é, não se responsabilizaria por seus atos.
22/09/2017
Nota
*Cartas de corso - tratava-se de um documento da coroa inglesa autorizando de maneira não oficial (como se faz por exemplo aos espiões) um pirata a fazer abordagens, saques e pilhagens a navios estrangeiros entregando uma porcentagem do roubo à coroa. Um dos mais conhecidos corsários foi Francis Drake, o favorito da rainha Elisabeth I da Inglaterra (note-se que se um corsário fosse derrotado e aprisionado por uma potencia estrangeira, o seu governo não o reconheceria, isto é, não se responsabilizaria por seus atos.
Entre terra e céu (de Alma Welt)
Aqui no plaino estou entre terra e céu,
Meu pampa é suspenso território
E olho as nuvens que me cobrem como véu,
E embaixo, o capim, meu escritório...
Aqui sobre a relva escrevo versos
Que me levam pelo mundo com o vento,
Estou na confluência de universos.
Não há muros, por aqui, pro pensamento.
E quando estou cansada de pensar,
Estendo a mão ao léu, colho uma flor
E esvazio o pensamento ao aspirar...
Então ao longe, ouço o grito da Matilde
Me chamando pra almoçar, seja o que for,
No terreno da matéria sou humilde...
.
22/09/2017
Meu pampa é suspenso território
E olho as nuvens que me cobrem como véu,
E embaixo, o capim, meu escritório...
Aqui sobre a relva escrevo versos
Que me levam pelo mundo com o vento,
Estou na confluência de universos.
Não há muros, por aqui, pro pensamento.
E quando estou cansada de pensar,
Estendo a mão ao léu, colho uma flor
E esvazio o pensamento ao aspirar...
Então ao longe, ouço o grito da Matilde
Me chamando pra almoçar, seja o que for,
No terreno da matéria sou humilde...
.
22/09/2017
Nosso Muro proibido * (de Alma Welt)
Em Novo Hamburgo, guria aventureira,
Nas brincadeiras não ficava para trás.
Meu irmãozinho, um pequeno satanás,
De um abismo vivíamos à beira,
Nas brincadeiras não ficava para trás.
Meu irmãozinho, um pequeno satanás,
De um abismo vivíamos à beira,
Um dia me induziu pular um muro
Que havia no fundo do quintal
Para ir à casa de um vizinho obscuro
De estranha luz vermelha no portal...
Mas fomos recebidos pelos fundos
Por uma bela moça de corpete
Sorrindo para nós (dentes imundos).
"Ora, ora, aqui temos dois lindinhos!
Vieram ver seu papai, o de colete?
Primeiro a dar boas vindas de vizinhos..."
.
22/09/2017
Que havia no fundo do quintal
Para ir à casa de um vizinho obscuro
De estranha luz vermelha no portal...
Mas fomos recebidos pelos fundos
Por uma bela moça de corpete
Sorrindo para nós (dentes imundos).
"Ora, ora, aqui temos dois lindinhos!
Vieram ver seu papai, o de colete?
Primeiro a dar boas vindas de vizinhos..."
.
22/09/2017
quinta-feira, 21 de setembro de 2017
Perséfone (de Alma Welt)
Mirante do Tempo, a minha varanda
Com sua velha cadeira de balanço
Sobre os campos com cheiro de lavanda
Em que observo das sombras o avanço,
Imagino-a vazia, muito em breve
Com todo este casarão espectral
Quando a terra me for pesada ou leve,
Num sepulcro a pedir sua mão de cal...
Pára com isso, Alma, estás lúgubre!
Esse gótico sinistro nos revolta...
Esse teu gosto estranho pelo fúnebre...
Vê os pastos florindo sob as reses:
Core pois de ti mesma, estás de volta
Aos braços de tua mãe por mais seis meses...*
.
21/09/2017
Nota
*Core pois de ti mesma, estás de volta /
Aos braços de tua mãe por mais seis meses - Duplo sentido peculiar à Alma: Ao mesmo tempo que significa "envergonha-te de ti mesma", significa "Perséfone de ti mesma", remetendo ao "mito de Core" nome latino da Perséfone grega, jovem princesa filha de Deméter (a deusa das colheitas), que foi raptada no campo quando colhia flores, por Hades, deus dos Infernos, que a fez sua esposa. Desesperada, Demeter implora a intercessão de Zeus, que arbitra que Perséfone deve passar meio ano no mundo subterrâneo com seu marido, e meio ano na superfície dos campos com sua devotada mãe.
Com sua velha cadeira de balanço
Sobre os campos com cheiro de lavanda
Em que observo das sombras o avanço,
Imagino-a vazia, muito em breve
Com todo este casarão espectral
Quando a terra me for pesada ou leve,
Num sepulcro a pedir sua mão de cal...
Pára com isso, Alma, estás lúgubre!
Esse gótico sinistro nos revolta...
Esse teu gosto estranho pelo fúnebre...
Vê os pastos florindo sob as reses:
Core pois de ti mesma, estás de volta
Aos braços de tua mãe por mais seis meses...*
.
21/09/2017
Nota
*Core pois de ti mesma, estás de volta /
Aos braços de tua mãe por mais seis meses - Duplo sentido peculiar à Alma: Ao mesmo tempo que significa "envergonha-te de ti mesma", significa "Perséfone de ti mesma", remetendo ao "mito de Core" nome latino da Perséfone grega, jovem princesa filha de Deméter (a deusa das colheitas), que foi raptada no campo quando colhia flores, por Hades, deus dos Infernos, que a fez sua esposa. Desesperada, Demeter implora a intercessão de Zeus, que arbitra que Perséfone deve passar meio ano no mundo subterrâneo com seu marido, e meio ano na superfície dos campos com sua devotada mãe.
quarta-feira, 20 de setembro de 2017
Pedra rolada (de Alma Welt)
Venho mostrando em versos meu percurso
Desde o inocente jardim de minha avó.
Não, por certo, em um linear discurso,
Como simples trajetória rumo ao pó...
Quanto voo, rodeio, circunlóquio
Fez esta mariposa em torno a luz!
Quantas tolas aventuras de Pinóquio
Antes de encontrar quem me supus.
Se não da alma, a construção do Ser
Se fez como escultura, por desgastes,
Ou como arado no campo, a revolver...
Senhor, eis-me então, já burilada
De minhas crespas facetas e contrastes,
De Vosso rio, afinal, pedra rolada....
.
20/09/2017
Transliteração* livre para o inglês, com rimas:
Rolling Stone * (by Alma Welt)
I have been showing my poetic course
From my grandmother's garden without lust.
Not, of course, in a linear discourse,
As simple trajectory towards dust ...
How much flight, rodeo, and few ventures
made this rebel Soul like a moth.
How many silly Pinocchio adventures
Before I found who I thought I was.
The construction of the Being, if not the Soul,
Was made not like carved busts
Or as an arid camp with a plow ...
Lord, behold, I have been done
the polishing of my facets and contrasts,
From Your river, at last, rolled stone ...
.
20/09/2017
O que, de volta ao português, literalmente, daria:
Pedra rolada (por Alma Welt)
Tenho mostrado meu curso poético
Desde o jardim da minha avó sem luxúria.
Não, é claro, em um discurso linear,
Como simples trajetória em direção ao pó...
Quanto vôo, rodeio e poucos empreendimentos
fez com que essa alma rebelde fosse uma mariposa.
Quantas aventuras tolas de Pinóquio
Antes de encontrar quem pensei que era.
Se não da alma, a construção do Ser
Não foi feita como bustos esculpidos
Ou no árido campo com um arado
Senhor, eis que já está terminado
o polimento de minhas facetas e contrastes,
Do Vosso rio, afinal, pedra rolada...
__________________
Notas
* Transliteração - Termo criado pelos poetas brasileiros Augusto e Haroldo de Campos para designar uma tradução livre que preserve rimas, e às vezes até métrica, tomando liberdades ao criar novas imagens ou metáforas, sem trair o sentido e substância do poema original.
*Rolling Stone - esta expressão inglesa deriva do provérbio também existente em português: "Pedras rolando não criam limo", que quer dizer que a dinâmica do Ser evita a deterioração viciosa.
Desde o inocente jardim de minha avó.
Não, por certo, em um linear discurso,
Como simples trajetória rumo ao pó...
Quanto voo, rodeio, circunlóquio
Fez esta mariposa em torno a luz!
Quantas tolas aventuras de Pinóquio
Antes de encontrar quem me supus.
Se não da alma, a construção do Ser
Se fez como escultura, por desgastes,
Ou como arado no campo, a revolver...
Senhor, eis-me então, já burilada
De minhas crespas facetas e contrastes,
De Vosso rio, afinal, pedra rolada....
.
20/09/2017
Transliteração* livre para o inglês, com rimas:
Rolling Stone * (by Alma Welt)
I have been showing my poetic course
From my grandmother's garden without lust.
Not, of course, in a linear discourse,
As simple trajectory towards dust ...
How much flight, rodeo, and few ventures
made this rebel Soul like a moth.
How many silly Pinocchio adventures
Before I found who I thought I was.
The construction of the Being, if not the Soul,
Was made not like carved busts
Or as an arid camp with a plow ...
Lord, behold, I have been done
the polishing of my facets and contrasts,
From Your river, at last, rolled stone ...
.
20/09/2017
O que, de volta ao português, literalmente, daria:
Pedra rolada (por Alma Welt)
Tenho mostrado meu curso poético
Desde o jardim da minha avó sem luxúria.
Não, é claro, em um discurso linear,
Como simples trajetória em direção ao pó...
Quanto vôo, rodeio e poucos empreendimentos
fez com que essa alma rebelde fosse uma mariposa.
Quantas aventuras tolas de Pinóquio
Antes de encontrar quem pensei que era.
Se não da alma, a construção do Ser
Não foi feita como bustos esculpidos
Ou no árido campo com um arado
Senhor, eis que já está terminado
o polimento de minhas facetas e contrastes,
Do Vosso rio, afinal, pedra rolada...
__________________
Notas
* Transliteração - Termo criado pelos poetas brasileiros Augusto e Haroldo de Campos para designar uma tradução livre que preserve rimas, e às vezes até métrica, tomando liberdades ao criar novas imagens ou metáforas, sem trair o sentido e substância do poema original.
*Rolling Stone - esta expressão inglesa deriva do provérbio também existente em português: "Pedras rolando não criam limo", que quer dizer que a dinâmica do Ser evita a deterioração viciosa.
segunda-feira, 18 de setembro de 2017
Gruppo di famiglia in un interno (de Alma Welt)
Meu pai colecionava quadros belos
Que cobriam desta casa as paredes
Como aqueles mais ricos castelos,
Do tal tempo do "vós sois" e do "vós vedes".
Mas morto meu pai começa a sanha
E meu irmão jogador leva um quarto,
Que no jogo de poker perde e ganha
E diz que até co' a Morte fez um trato.
Minhas irmãs levaram outros pra vender
Num leilão qualquer em pleno inverno
Enquanto, eu desolada, quis morrer.
Mas um que a mim me coube, que escolhi:
"Gruppo di famiglia in un interno",
Recompõe em fantasia o que perdi...
.
18/09/2017
Nota
*"Gruppo di famiglia in un interno"- Alma com este soneto parece querer homenagear o último filme de Luchino Visconti (que tem este sugestivo título), obra-prima inesquecível, que fecha com chave de ouro a carreira do grande cineasta italiano, e também a do maravilhoso ator americano Burt Lancaster...
Que cobriam desta casa as paredes
Como aqueles mais ricos castelos,
Do tal tempo do "vós sois" e do "vós vedes".
Mas morto meu pai começa a sanha
E meu irmão jogador leva um quarto,
Que no jogo de poker perde e ganha
E diz que até co' a Morte fez um trato.
Minhas irmãs levaram outros pra vender
Num leilão qualquer em pleno inverno
Enquanto, eu desolada, quis morrer.
Mas um que a mim me coube, que escolhi:
"Gruppo di famiglia in un interno",
Recompõe em fantasia o que perdi...
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18/09/2017
Nota
*"Gruppo di famiglia in un interno"- Alma com este soneto parece querer homenagear o último filme de Luchino Visconti (que tem este sugestivo título), obra-prima inesquecível, que fecha com chave de ouro a carreira do grande cineasta italiano, e também a do maravilhoso ator americano Burt Lancaster...
O Concílio falhado (de Alma Welt)
Na juventude, já paga e sem estorno,
Conclamei dentro de mim os velhos deuses
Para um concílio com visas ao retorno
Mas sem levar em conta seus adeuses.
Não estavam os deuses mortos, mas doentes,
E pior: transfigurados em neuroses,
Suas manhas e manias só latentes,
Apenas não se ouviam suas vozes.
Electra e Édipo, mortais, chamei num canto
E disse: "Amigos, todos matam mãe e pai,
Mas já houve um casal que era santo...
C'o Nazareno vamos pois nos encontrar
E tentar um novo acordo... Ou ninguém vai?"
Mas os deuses nem quiseram despertar...
.
18/09/2017
Conclamei dentro de mim os velhos deuses
Para um concílio com visas ao retorno
Mas sem levar em conta seus adeuses.
Não estavam os deuses mortos, mas doentes,
E pior: transfigurados em neuroses,
Suas manhas e manias só latentes,
Apenas não se ouviam suas vozes.
Electra e Édipo, mortais, chamei num canto
E disse: "Amigos, todos matam mãe e pai,
Mas já houve um casal que era santo...
C'o Nazareno vamos pois nos encontrar
E tentar um novo acordo... Ou ninguém vai?"
Mas os deuses nem quiseram despertar...
.
18/09/2017
domingo, 17 de setembro de 2017
Bicho pequeno (de Alma Welt)
Eu guria, na borrasca de uma noite,
Me vi numa escuridão absoluta,
E compreendi de um raio o forte açoite
Que evidenciava a eterna luta.
Luz e trevas, sim, eu compreendi
Não com tais sutis palavras, claro,
Que estas pouco são como eu as vi,
As forças em combate nada raro...
Minha alma meio virgem (quem diria?)
Lembrou-se da primeira expulsão
Quando a espada do Anjo reluzia...
"Deus, poupai tanta energia, não mereço:
Sou um bicho pequeno, ando no chão,
Mas com nome conhecido e endereço..."
.
17/09/2017
Me vi numa escuridão absoluta,
E compreendi de um raio o forte açoite
Que evidenciava a eterna luta.
Luz e trevas, sim, eu compreendi
Não com tais sutis palavras, claro,
Que estas pouco são como eu as vi,
As forças em combate nada raro...
Minha alma meio virgem (quem diria?)
Lembrou-se da primeira expulsão
Quando a espada do Anjo reluzia...
"Deus, poupai tanta energia, não mereço:
Sou um bicho pequeno, ando no chão,
Mas com nome conhecido e endereço..."
.
17/09/2017
O cão de mim (de Alma Welt)
Juntei as mãos e de joelhos perguntei:
"Meu Senhor Deus, que fizeste o céu azul,
Também, de noite, o cruzeiro do meu Sul
E este pampa infinito que nem sei..."
"Dizei, Senhor, o que fiz pra merecer
Tantos dons, privilégios e presentes,
Quando vejo ao redor seres carentes
Que me fazem ter vergonha de assim ser?"
"Além de bela, poeta me fizestes
Com o dom incompreensível do soneto,
Num tempo de miséria e de pestes... "
Então, envergonhada de minha prosa,
Vi o céu azul mudar ficando preto,
E cão de mim, encolhi-me, temerosa...
.
17/09/2017
"Meu Senhor Deus, que fizeste o céu azul,
Também, de noite, o cruzeiro do meu Sul
E este pampa infinito que nem sei..."
"Dizei, Senhor, o que fiz pra merecer
Tantos dons, privilégios e presentes,
Quando vejo ao redor seres carentes
Que me fazem ter vergonha de assim ser?"
"Além de bela, poeta me fizestes
Com o dom incompreensível do soneto,
Num tempo de miséria e de pestes... "
Então, envergonhada de minha prosa,
Vi o céu azul mudar ficando preto,
E cão de mim, encolhi-me, temerosa...
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17/09/2017
sábado, 16 de setembro de 2017
O Corifeu (de Alma Welt)
Pra descrever a vida escrevo versos,
Antiga forma de distinguir os fatos,
Já que neles convergem os universos
As formas-pensamento, os entreatos.
O Poeta é o corifeu do espetáculo
E anuncia o que a vida descortina
Batendo no tablado com um báculo,
Proclamando que quase tudo é Sina.
E as lágrimas, o riso e sua catarse
São a comporta aberta da represa
Antes do vale dos aflitos inundar-se.
Mas se no palco a alma se apresenta
Com a máscara fatal no rosto presa,
Ri o poeta e o duplo rosto ostenta...
.
16/09/2017
Antiga forma de distinguir os fatos,
Já que neles convergem os universos
As formas-pensamento, os entreatos.
O Poeta é o corifeu do espetáculo
E anuncia o que a vida descortina
Batendo no tablado com um báculo,
Proclamando que quase tudo é Sina.
E as lágrimas, o riso e sua catarse
São a comporta aberta da represa
Antes do vale dos aflitos inundar-se.
Mas se no palco a alma se apresenta
Com a máscara fatal no rosto presa,
Ri o poeta e o duplo rosto ostenta...
.
16/09/2017
Flor de cactus (de Alma Welt)
"Podermos enxergar a realidade
É o nosso atributo superior...
Fantasia, o sonho nosso sem idade
É um mero paliativo para a dor."
Assim dizia minha avó, colhendo flores
Um pouco antes de se por a divagar
Contando estórias de seus velhos amores,
Do kaiser da Alemanha, e do czar.
E eu, ingênua guria deslumbrada,
Não lograva separar sonhos e fatos,
Sem saber o que era anjo ou mera fada.
Então para me aproximar da vida,
Eu não evitaria a flor dos cactus,
A beleza que nos dói quando colhida...
.
16/09/2017
É o nosso atributo superior...
Fantasia, o sonho nosso sem idade
É um mero paliativo para a dor."
Assim dizia minha avó, colhendo flores
Um pouco antes de se por a divagar
Contando estórias de seus velhos amores,
Do kaiser da Alemanha, e do czar.
E eu, ingênua guria deslumbrada,
Não lograva separar sonhos e fatos,
Sem saber o que era anjo ou mera fada.
Então para me aproximar da vida,
Eu não evitaria a flor dos cactus,
A beleza que nos dói quando colhida...
.
16/09/2017
sexta-feira, 15 de setembro de 2017
A Mariposa, uma oração (de Alma Welt)
Senhor, dai-me nova chance, serei digna,
Tentarei baixar o tom, bem mais humilde,
Embora nunca tenha sido uma Brunhilde,
Mas, Senhor, minh'alma é pura e fidedigna.
Sei que Sois uma imensa Luz Brilhante
Segundo a descrição forte de Dante
(quando levado até Vós por Beatriz)
Mas, meu Senhor, irei ousar e pedir bis...
Talvez seja inconveniente tal discurso,
E nem chegue a enxergar a Vossa Luz,
Já que vou queimar as asas nesse curso...
Sabeis, sou simples mariposa, amo a lua
Porque ela, humilde, a luz do Sol reduz;
Só por isso, ó Senhor, eu vivo nua...
.
14/09/2017
Tentarei baixar o tom, bem mais humilde,
Embora nunca tenha sido uma Brunhilde,
Mas, Senhor, minh'alma é pura e fidedigna.
Sei que Sois uma imensa Luz Brilhante
Segundo a descrição forte de Dante
(quando levado até Vós por Beatriz)
Mas, meu Senhor, irei ousar e pedir bis...
Talvez seja inconveniente tal discurso,
E nem chegue a enxergar a Vossa Luz,
Já que vou queimar as asas nesse curso...
Sabeis, sou simples mariposa, amo a lua
Porque ela, humilde, a luz do Sol reduz;
Só por isso, ó Senhor, eu vivo nua...
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14/09/2017
quarta-feira, 13 de setembro de 2017
À Margem (de Alma Welt)
Fui ao mundo e me encontrei em Babilônia,
O caos instalado envolto em névoa
De ignorância e ira malévola,
De tanta insensatez sem parcimônia.
Uma aridez total tudo cercava
E julguei estar no mármore do Inferno;
Hibernavam todos sem inverno
E o sonho da razão monstros criava...
Então ergui o punho e invectivei:
"Ó cidade de tola iniquidade!
De mal e ignorância, ó cidade!"
Mas a resposta veio como aragem
Vinda de outro tempo e outra lei:
"Aproveita, Alma, o dom de estar à margem..."
.
13/09/2017
O caos instalado envolto em névoa
De ignorância e ira malévola,
De tanta insensatez sem parcimônia.
Uma aridez total tudo cercava
E julguei estar no mármore do Inferno;
Hibernavam todos sem inverno
E o sonho da razão monstros criava...
Então ergui o punho e invectivei:
"Ó cidade de tola iniquidade!
De mal e ignorância, ó cidade!"
Mas a resposta veio como aragem
Vinda de outro tempo e outra lei:
"Aproveita, Alma, o dom de estar à margem..."
.
13/09/2017
terça-feira, 12 de setembro de 2017
A rebelde natureza (de Alma Welt)
Se não houvesse o verde, flores, aves,
Eu não desejaria estar no mundo
Que malgrado os obstáculos e entraves
Estranha perfeição mantém de fundo.
Os animais com seu ânimo laborioso
Num come-come infinito pela vida
Carregando o fardo tão sem pouso
(pois não devia atingi-los nossa dívida).
Entretanto um estranho equilíbrio
Nos faz pensar de Deus a hábil mão
De titereiro atento a cada brio,
Que Deus nos quer rebeldes já suspeito,
Antes que fracos, passivos e em vão
Um punho contra o céu, outro no peito.
.
12/09/2017
Eu não desejaria estar no mundo
Que malgrado os obstáculos e entraves
Estranha perfeição mantém de fundo.
Os animais com seu ânimo laborioso
Num come-come infinito pela vida
Carregando o fardo tão sem pouso
(pois não devia atingi-los nossa dívida).
Entretanto um estranho equilíbrio
Nos faz pensar de Deus a hábil mão
De titereiro atento a cada brio,
Que Deus nos quer rebeldes já suspeito,
Antes que fracos, passivos e em vão
Um punho contra o céu, outro no peito.
.
12/09/2017
A Espera (de Alma Welt)
Contra o mal incapaz de remédio,
Afasta-te e espera, disse um sábio;
E dei-me conta que ainda que sem tédio
Passei a vida a folhear um alfarrábio,
Sim, a Realidade, mas nos livros,
Que aqui fora não a vejo com clareza
A não ser muito conflito entre os vivos,
Controvérsia, maldade, e esperteza.
Vê como tiram o pão da boca do povão
E o jogam no chão dos corredores
Sem repouso, sem consolo, sem razão...
Um mundo-pesadelo, de delírios,
De uma realidade cheia de pavores,
Onde nem aos pobres mortos cabem círios...
.
12/09/2017
Afasta-te e espera, disse um sábio;
E dei-me conta que ainda que sem tédio
Passei a vida a folhear um alfarrábio,
Sim, a Realidade, mas nos livros,
Que aqui fora não a vejo com clareza
A não ser muito conflito entre os vivos,
Controvérsia, maldade, e esperteza.
Vê como tiram o pão da boca do povão
E o jogam no chão dos corredores
Sem repouso, sem consolo, sem razão...
Um mundo-pesadelo, de delírios,
De uma realidade cheia de pavores,
Onde nem aos pobres mortos cabem círios...
.
12/09/2017
"El sueño de la razón produces monstruos"- gravura de Goya
Sin el sueño de la razón (de Alma Welt)
Nesta manhã levantei-me do meu leito
Com uma estranha esperança no futuro,
Eu, que poucas ilusões trago no peito,
Que de toda embarcação enxergo o furo.
Bem sei que quem se impõe é a Natura,
Malgrado nós e nossa tola presunção
De afetar sua lei mais forte e pura
Que amiúde se apresenta em furacão.
E a Deus agradeci minha lucidez
Que me faz amar o mundo sem condão,
Sem abóbora e cristal como calçado.
Assim pensei antes de por o pé no chão,
Clara e desperta, tal como Deus me fez
Tendo o Sonho da Razão bem afastado...
.
12/09/2017
Sin el sueño de la razón (de Alma Welt)
Nesta manhã levantei-me do meu leito
Com uma estranha esperança no futuro,
Eu, que poucas ilusões trago no peito,
Que de toda embarcação enxergo o furo.
Bem sei que quem se impõe é a Natura,
Malgrado nós e nossa tola presunção
De afetar sua lei mais forte e pura
Que amiúde se apresenta em furacão.
E a Deus agradeci minha lucidez
Que me faz amar o mundo sem condão,
Sem abóbora e cristal como calçado.
Assim pensei antes de por o pé no chão,
Clara e desperta, tal como Deus me fez
Tendo o Sonho da Razão bem afastado...
.
12/09/2017
segunda-feira, 11 de setembro de 2017
A Arte e o Mundo (de Alma Welt)
Melhorar este mundo em que vivemos
É tarefa muito nobre par' os poucos
Que serão tomados como extremos
E frequentemente como loucos.
Te concentra, alma minha, em teu quintal
Se és capaz de o varrer e de cuidá-lo
Bem antes de julgar o mundo mau
E a enxergar o burro no cavalo...
Fui ao mundo, olhei, não vi remédio
A não ser criar outro meio à parte
E doá-lo a quem possa interessar...
E descobri que isto é a pura Arte
Que se não pode nosso mundo transformar
Quer ao menos despojá-lo do seu tédio...
.
11/09/2017
É tarefa muito nobre par' os poucos
Que serão tomados como extremos
E frequentemente como loucos.
Te concentra, alma minha, em teu quintal
Se és capaz de o varrer e de cuidá-lo
Bem antes de julgar o mundo mau
E a enxergar o burro no cavalo...
Fui ao mundo, olhei, não vi remédio
A não ser criar outro meio à parte
E doá-lo a quem possa interessar...
E descobri que isto é a pura Arte
Que se não pode nosso mundo transformar
Quer ao menos despojá-lo do seu tédio...
.
11/09/2017
domingo, 10 de setembro de 2017
El Grande Festival de Tonterías (de Alma Welt)
Com o mundo é preciso paciência,
Pois que ele é de modo a endoidar;
Nada recomenda sua ciência
Que em matéria de cinismo não tem par.
Pra se viver é preciso vista grossa,
Ouvidos moucos e também "bocca chiusa",
Não só pra cantar como uma musa
Na varanda ao luar belo da roça...
Porque é um festival de "tonterías"
Como dizem os simpáticos hermanos,
Que da cegueira são também decanos.
Pois se vais por aí por essas vias,
Esquerdopata, fabiana ou radical,
Como a tal canção do Chico: "Cê vai mal..."
.
10/09/2017
Nota
*... "bocca chiusa"/
Não só pra cantar como uma musa/
Na varanda ao luar belo da roça - Alusão à cantilena da Bachiana n° 5 de Villa-Lobos, que é cantada, na repetição do tema, em "bocca chiusa" (expressão italiana que significa boca fechada, o som saindo pelo nariz), pela soprano lírica.
Com a boca fechada, Alma completa a imagem dos três macaquinhos da prudência (ou da omissão e alienação) : vista grossa (olhos fechados), ouvidos moucos (ouvidos tapados), bocca chiusa...
Pois que ele é de modo a endoidar;
Nada recomenda sua ciência
Que em matéria de cinismo não tem par.
Pra se viver é preciso vista grossa,
Ouvidos moucos e também "bocca chiusa",
Não só pra cantar como uma musa
Na varanda ao luar belo da roça...
Porque é um festival de "tonterías"
Como dizem os simpáticos hermanos,
Que da cegueira são também decanos.
Pois se vais por aí por essas vias,
Esquerdopata, fabiana ou radical,
Como a tal canção do Chico: "Cê vai mal..."
.
10/09/2017
Nota
*... "bocca chiusa"/
Não só pra cantar como uma musa/
Na varanda ao luar belo da roça - Alusão à cantilena da Bachiana n° 5 de Villa-Lobos, que é cantada, na repetição do tema, em "bocca chiusa" (expressão italiana que significa boca fechada, o som saindo pelo nariz), pela soprano lírica.
Com a boca fechada, Alma completa a imagem dos três macaquinhos da prudência (ou da omissão e alienação) : vista grossa (olhos fechados), ouvidos moucos (ouvidos tapados), bocca chiusa...
sexta-feira, 8 de setembro de 2017
O Fruto (de Alma Welt)
Construir um universo de palavras
Foi sempre minha metódica ambição;
Então arei e semeei as minhas lavras
Com humilde e exemplar dedicação.
Como? Lendo tudo ao meu alcance,
Noite e dia, das estantes copiosas,
Com uma ênfase no reino do romance
E as poesias colhendo, como rosas...
Um dia disse: "Basta! Agora escrevo,
Que de Deus palavra e imagem herdamos,
Do Logos o mistério em que me inscrevo."
Quanto à felicidade, o pomo procurado,
Fruto que pomos onde não estamos, *
De tanto tenho a escrever... deixei de lado.
.
08/09/2017
Foi sempre minha metódica ambição;
Então arei e semeei as minhas lavras
Com humilde e exemplar dedicação.
Como? Lendo tudo ao meu alcance,
Noite e dia, das estantes copiosas,
Com uma ênfase no reino do romance
E as poesias colhendo, como rosas...
Um dia disse: "Basta! Agora escrevo,
Que de Deus palavra e imagem herdamos,
Do Logos o mistério em que me inscrevo."
Quanto à felicidade, o pomo procurado,
Fruto que pomos onde não estamos, *
De tanto tenho a escrever... deixei de lado.
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08/09/2017
Nota
*Fruto que pomos onde não estamos - alusão aos versos finais do belo soneto "Felicidade", do imortal poeta de Santos, Vicente de Carvalho:
"Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa, que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim : mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos."
*Fruto que pomos onde não estamos - alusão aos versos finais do belo soneto "Felicidade", do imortal poeta de Santos, Vicente de Carvalho:
"Essa felicidade que supomos,
Árvore milagrosa, que sonhamos
Toda arreada de dourados pomos,
Existe, sim : mas nós não a alcançamos
Porque está sempre apenas onde a pomos
E nunca a pomos onde nós estamos."
Monólogos (de Alma Welt)
Não tentes, meu amor, me seduzir,
Foi-se o tempo inocente da beleza,
E certamente não me posso permitir
Ser artigo, assim, de cama e mesa.
Se queres que eu te siga, diga um verso
Que seja a este momento pertinente;
Seja irônico, mordaz, e controverso,
Mas não dobre à esquerda de repente.
Assim dizia, em sonho, a um belo jovem,
Mas acordei quando ele ia responder
E só as boas respostas me comovem.
Então pensei, comigo, que o sonhado
Somente se refere ao que se quer
E nunca propriamente ao ser amado...
.
08/09/2017
Foi-se o tempo inocente da beleza,
E certamente não me posso permitir
Ser artigo, assim, de cama e mesa.
Se queres que eu te siga, diga um verso
Que seja a este momento pertinente;
Seja irônico, mordaz, e controverso,
Mas não dobre à esquerda de repente.
Assim dizia, em sonho, a um belo jovem,
Mas acordei quando ele ia responder
E só as boas respostas me comovem.
Então pensei, comigo, que o sonhado
Somente se refere ao que se quer
E nunca propriamente ao ser amado...
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08/09/2017
quinta-feira, 7 de setembro de 2017
O anátema de um dia (de Alma Welt)
Ser o que sou e viver para a poesia
Foi meu dom e privilégio relativo,
Pois formada de tudo o que eu lia,
Quanta dor deixei passar pelo meu crivo.
Dor do mundo, eu a conheço em empatia,
Mas conheci de fato uma expulsão,
O flagrante e o anátema de um dia, *
Uma injustiça de Deus... Peço perdão.
Passei a vida com quem flores colheu
No jardim de minha avó (que mais fiz eu?)
A olhar de longe o mundo e seus clamores.
Me perdoe, outrossim, leitor amigo,
Acaso olhe demais pro meu umbigo,
Referencial talvez de poucas dores...
.
07/09/2017
Nota
*Mas conheci de fato uma expulsão,
O flagrante e o anátema de um dia - Alma se refere ao trauma fundamental de sua infância: a guria Alma, de oito anos, foi flagrada em inocente brincadeira sexual com seu irmãozinho Rodo (irmão adotivo), debaixo da macieira do pomar do casarão, por sua mãe, Ana Morgado, que fez um escândalo e os puniu com uma separação que durou anos, enviando o menino para um colégio interno. Alma se refere a este episódio arquetípico (o "pecado original" e a expulsão do Éden) em inúmeros textos e sonetos, como sendo o fundamento primal de sua poesia.
Foi meu dom e privilégio relativo,
Pois formada de tudo o que eu lia,
Quanta dor deixei passar pelo meu crivo.
Dor do mundo, eu a conheço em empatia,
Mas conheci de fato uma expulsão,
O flagrante e o anátema de um dia, *
Uma injustiça de Deus... Peço perdão.
Passei a vida com quem flores colheu
No jardim de minha avó (que mais fiz eu?)
A olhar de longe o mundo e seus clamores.
Me perdoe, outrossim, leitor amigo,
Acaso olhe demais pro meu umbigo,
Referencial talvez de poucas dores...
.
07/09/2017
Nota
*Mas conheci de fato uma expulsão,
O flagrante e o anátema de um dia - Alma se refere ao trauma fundamental de sua infância: a guria Alma, de oito anos, foi flagrada em inocente brincadeira sexual com seu irmãozinho Rodo (irmão adotivo), debaixo da macieira do pomar do casarão, por sua mãe, Ana Morgado, que fez um escândalo e os puniu com uma separação que durou anos, enviando o menino para um colégio interno. Alma se refere a este episódio arquetípico (o "pecado original" e a expulsão do Éden) em inúmeros textos e sonetos, como sendo o fundamento primal de sua poesia.
terça-feira, 5 de setembro de 2017
A cavaleira, ou O novo pacto (de Alma Welt)
Senhor, peço, preservai minha poesia
Que me destes e que vem toda do anjo,
E que pouco recorre à fantasia,
Verdadeira que é e a qual esbanjo.
Já não falo de fadas fazem anos,
E conquanto sejam vossas criaturas
Colocavam sobre a vida quentes panos
E a dor minimizavam, mas sem curas.
Então chamei o anjo que me destes
E fiz com ele precioso novo pacto
Quando a um com a loucura estava prestes...
Eis-me pois, Senhor, por ele ungida
Como vossa cavaleira em novo trato
E com cota e burel com a cruz vestida...
.
05/08/2017
Que me destes e que vem toda do anjo,
E que pouco recorre à fantasia,
Verdadeira que é e a qual esbanjo.
Já não falo de fadas fazem anos,
E conquanto sejam vossas criaturas
Colocavam sobre a vida quentes panos
E a dor minimizavam, mas sem curas.
Então chamei o anjo que me destes
E fiz com ele precioso novo pacto
Quando a um com a loucura estava prestes...
Eis-me pois, Senhor, por ele ungida
Como vossa cavaleira em novo trato
E com cota e burel com a cruz vestida...
.
05/08/2017
segunda-feira, 4 de setembro de 2017
As três perguntas (de Alma Welt)
De onde venho eu, que tão sem rumo
Vivo como se meu caminhar levasse
A algum lugar, além do prumo
Que já se esperaria a quem andasse?
E saberei quem sou, chegada a hora?
O espelho ou um oráculo me dirá?
O enigma do Eu e do agora
Terá a solução? Deus me dará?
Para onde irei, se o céu nós temos
E o Inferno, arremate de absurdos
Do purgatório, já que este conhecemos?
Tais perguntas permanecem sem respostas
Como o nosso gesticular aos surdos
Ou como espelho cego a quem te mostras...
.
04/09/2017
Nota
Vivo como se meu caminhar levasse
A algum lugar, além do prumo
Que já se esperaria a quem andasse?
E saberei quem sou, chegada a hora?
O espelho ou um oráculo me dirá?
O enigma do Eu e do agora
Terá a solução? Deus me dará?
Para onde irei, se o céu nós temos
E o Inferno, arremate de absurdos
Do purgatório, já que este conhecemos?
Tais perguntas permanecem sem respostas
Como o nosso gesticular aos surdos
Ou como espelho cego a quem te mostras...
.
04/09/2017
Nota
D'où venons-nous? Que sommes-nous? Où allons-nous? - escreveu Gauguin na sua grande tela do Paraíso...
sábado, 2 de setembro de 2017
A Palavra e o Desejo (de Alma Welt)
Só a Beleza justifica a Vida
Já que é inerente a quase tudo,
E até mesmo ao sofrimento mudo
Menos à maldade presumida...
Longe de mim pontificar, julgar, punir
Meus pares neste mundo, tão perplexos
Quanto eu mesma entre o agora e o devir
Ante essa dura carga dos dois sexos...
Mas ao amaldiçoar nosso Desejo
Quis o nosso Criador, ou deu ensejo
A que dele o Mal do mundo derivasse...
Senhor, foi Vosso o Desejo que me fez
Com a Palavra herdada, num impasse:
Poeta Vossa, calai-me então, de vez!
.
02/09/2017
Já que é inerente a quase tudo,
E até mesmo ao sofrimento mudo
Menos à maldade presumida...
Longe de mim pontificar, julgar, punir
Meus pares neste mundo, tão perplexos
Quanto eu mesma entre o agora e o devir
Ante essa dura carga dos dois sexos...
Mas ao amaldiçoar nosso Desejo
Quis o nosso Criador, ou deu ensejo
A que dele o Mal do mundo derivasse...
Senhor, foi Vosso o Desejo que me fez
Com a Palavra herdada, num impasse:
Poeta Vossa, calai-me então, de vez!
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02/09/2017
De versos e ruínas (de Alma Welt)
De tão mal ficou o mundo já não posso
Escrever minha poesia "de vidente"
Já que a superfície apenas roço
No esforço de a captar somente.
Há quem possa dizer:"O mundo esqueça,
A poesia tem seu próprio universo;
Vá fundo na vida, o fogo aqueça,
Use o som e a fúria no teu verso." *
Rimbaud profetizou como "voyant" *
O poeta do futuro e estava certo,
Mas não contava com os truques de Satã.
E eis-me a contemplar a feia ruína
De um belo mundo que parecia perto
Mas que virou à esquerda numa esquina.
.
31/08/2017
Notas
*Use o som e a fúria no teu verso..." - Alusão ao famoso monólogo do Macbeth de Shakespeare.
" Rimbaud profetizou como "voyant" - Alma alude à famosa "Lettre du Voyant" (Carta do Vidente) onde Rimbaud diz que o poeta do futuro deveria se tornar vidente.
Escrever minha poesia "de vidente"
Já que a superfície apenas roço
No esforço de a captar somente.
Há quem possa dizer:"O mundo esqueça,
A poesia tem seu próprio universo;
Vá fundo na vida, o fogo aqueça,
Use o som e a fúria no teu verso." *
Rimbaud profetizou como "voyant" *
O poeta do futuro e estava certo,
Mas não contava com os truques de Satã.
E eis-me a contemplar a feia ruína
De um belo mundo que parecia perto
Mas que virou à esquerda numa esquina.
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31/08/2017
Notas
*Use o som e a fúria no teu verso..." - Alusão ao famoso monólogo do Macbeth de Shakespeare.
" Rimbaud profetizou como "voyant" - Alma alude à famosa "Lettre du Voyant" (Carta do Vidente) onde Rimbaud diz que o poeta do futuro deveria se tornar vidente.
quarta-feira, 30 de agosto de 2017
Ervas daninhas (de Alma Welt)
"Perceber claramente o Mal no mundo
É uma carga pesada, obrigação
De todo escritor claro e profundo
Dentro de lúcida e nobre tradição."
Assim dizia meu pai, sentencioso,
Preocupado que por causa da beleza
Eu me tornasse fútil ou só leveza
Num tempo de combate silencioso.
Silencioso? Sangue mina das paredes
Numa guerra verbal no mundo todo
Cobrindo as duas mãos de puro lodo...
E eu tranquila já não posso, como vedes,
Ervas daninhas brotando poderosas,
No meu jardim colher mais as puras rosas...
É uma carga pesada, obrigação
De todo escritor claro e profundo
Dentro de lúcida e nobre tradição."
Assim dizia meu pai, sentencioso,
Preocupado que por causa da beleza
Eu me tornasse fútil ou só leveza
Num tempo de combate silencioso.
Silencioso? Sangue mina das paredes
Numa guerra verbal no mundo todo
Cobrindo as duas mãos de puro lodo...
E eu tranquila já não posso, como vedes,
Ervas daninhas brotando poderosas,
No meu jardim colher mais as puras rosas...
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30/08/2017
30/08/2017
Alma Livre (de Alma Welt)
Jamais me viram pelo em ovo procurar
E também não esmurrei ponta de faca;
Pelo nariz jamais alguém vai me levar
E eu nunca enfiarei o pé na jaca.
Assim dizia eu com meus botões
Embora sejam mudos como peixes;
Jamais chorei de mágoa aos borbotões
E não implorarei que não me deixes.
E então sacudo o jugo, de repente,
Dos lugares comuns e dos chavões
Que estavam a acorrentar a minha mente...
E eis-me livre, afinal, e sem doutrinas
Nem slogans, ditos, lemas, posições,
Reenviadas ao fundo das latrinas...
.
29/08/2017
E também não esmurrei ponta de faca;
Pelo nariz jamais alguém vai me levar
E eu nunca enfiarei o pé na jaca.
Assim dizia eu com meus botões
Embora sejam mudos como peixes;
Jamais chorei de mágoa aos borbotões
E não implorarei que não me deixes.
E então sacudo o jugo, de repente,
Dos lugares comuns e dos chavões
Que estavam a acorrentar a minha mente...
E eis-me livre, afinal, e sem doutrinas
Nem slogans, ditos, lemas, posições,
Reenviadas ao fundo das latrinas...
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29/08/2017
terça-feira, 29 de agosto de 2017
Sempre quis (de Alma Welt)
Sempre quis ir-me daqui não sei pra onde
Mas já com uma certeza de voltar;
Perder de mim mesma a hora e o bonde
E nunca ter que, obrigada, trabalhar
Mas viver num jardim meu por direito,
Negando o tal pecado original
De que não trago culpa nem defeito,
E nem remorsos, já que nada fiz de mal.
Amando a lógica, fruto da harmonia
E o absurdo tão somente por poesia
Pois nele está a causa da expulsão
Que sofreu o casal belo, antepassado,
Ingênuo sob a árvore da paixão
Com que Deus veio tentá-los disfarçado.
.
29/08/2017
Mas já com uma certeza de voltar;
Perder de mim mesma a hora e o bonde
E nunca ter que, obrigada, trabalhar
Mas viver num jardim meu por direito,
Negando o tal pecado original
De que não trago culpa nem defeito,
E nem remorsos, já que nada fiz de mal.
Amando a lógica, fruto da harmonia
E o absurdo tão somente por poesia
Pois nele está a causa da expulsão
Que sofreu o casal belo, antepassado,
Ingênuo sob a árvore da paixão
Com que Deus veio tentá-los disfarçado.
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29/08/2017
Conselhos de meu pai (de Alma Welt)
Meu pai já me alertava, na verdade,
Contra as almas canhotas traiçoeiras
Que conspiram no campo e na cidade
Roendo a nossa liberdade pelas beiras.
As almas torpes, afeitas à mentira,
Que torcem os fatos por pura negação,
Que fedorentos pneus são sua pira
De ódio e inveja do rico e do patrão.
Que amam a escravidão e a pobreza
Mas dos outros, que não a deles mesmos,
Esquerdopatas de caviar na mesa...
E dizia meu pai: "Sempre os combata
Enquanto estão aí somente a esmos,
Por que depois estarás sob a chibata..."
.
29/08/2017
Contra as almas canhotas traiçoeiras
Que conspiram no campo e na cidade
Roendo a nossa liberdade pelas beiras.
As almas torpes, afeitas à mentira,
Que torcem os fatos por pura negação,
Que fedorentos pneus são sua pira
De ódio e inveja do rico e do patrão.
Que amam a escravidão e a pobreza
Mas dos outros, que não a deles mesmos,
Esquerdopatas de caviar na mesa...
E dizia meu pai: "Sempre os combata
Enquanto estão aí somente a esmos,
Por que depois estarás sob a chibata..."
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29/08/2017
quarta-feira, 23 de agosto de 2017
Ponderações (de Alma Welt)
É visível que o destino é humorado
E até mesmo chegado em ironia.
Mas Deus é sério, sisudo e enfezado,
Não tolera blasfêmias sem poesia.
Entretanto Ele é bastante complacente
Com o desespero dos poetas, haja visto
Lord Byron e sua epopeia do anticristo
Que não consta ter de Deus sido descrente.
Mas que sei eu, que só tenho opinião
Sobre coisas pelos seus meros reflexos
Como o tolo da caverna de Platão?
"Cala-te boca", eu me digo amiúde;
Meus melhores momentos são perplexos
E nem meu bom espelho já me ilude...
23/08/2017
E até mesmo chegado em ironia.
Mas Deus é sério, sisudo e enfezado,
Não tolera blasfêmias sem poesia.
Entretanto Ele é bastante complacente
Com o desespero dos poetas, haja visto
Lord Byron e sua epopeia do anticristo
Que não consta ter de Deus sido descrente.
Mas que sei eu, que só tenho opinião
Sobre coisas pelos seus meros reflexos
Como o tolo da caverna de Platão?
"Cala-te boca", eu me digo amiúde;
Meus melhores momentos são perplexos
E nem meu bom espelho já me ilude...
23/08/2017
Perambulando (de Alma Welt)
Perambulei pelo mundo, não à toa,
Seguindo o claro rastro dos poetas
Que por certo não viviam só na boa
Seguindo outros rastros, mesmas metas.
Haja fumo e absinto pros coitados
Em imensas discussões acaloradas
Sobre os grandes destinos isolados
Versus modernos seres de manadas.
No Zutique, a colorir cada vogal,
Sentei-me àquela mesa com Rimbaud
E Baudelaire a cultivar flores do Mal
E traduzindo para o franco num "Jamais",
Num agouro até lá, Rue de la Paix,
O tal mascote negro do Allan Poe...
.
23/08/2017
Notas
*No Zutique, a colorir cada vogal - O chamado " Album Zutique" era um livro de recordações e presenças mantido pelo Cafè Zutique em Paris, no século XIX em que foram encontrados vários poema de Rimbaud, que descobertos ali ficaram célebres. "A colorir cada vogal- é referência ao poema de Rimbaud "Les couleurs des voyelles", que no entanto não consta propriamente do Álbum Zutique. Um engano da Alma? Na verdade pode ser uma generalização da Alma, sugerindo que ele coloria cada vogal sempre, em qualquer de seus notáveis poemas).
*E Baudelaire a cultivar flores do Mal - alusão ao célebre livro de Poemas de Charles Baudelaire, "Les Fleurs du Mal"
"E traduzindo para o franco num "Jamais" - (pr. francesa "jamé")- alusão à tradução que Baudelaire fez do poema The Raven (O Corvo) em que a ave agourenta respondia às perguntas desesperadas do poeta: "Nevermore" (Nunca mais), em francês: "Jamais plus".
*Num agouro até lá, Rue de la Paix - aparentemente só para rimar com o francês ´Jamais", Alma na verdade quer dizer que o agouro de desesperança do corvo, chegava até à rua mais elegante de Paris.
*O tal mascote negro do Allan Poe- obviamente o corvo, aqui tratado ironicamente como um mascote do poeta Poe ( pr, Pou) em rima falsa com Rimbaud (pr. Rambô)
Seguindo o claro rastro dos poetas
Que por certo não viviam só na boa
Seguindo outros rastros, mesmas metas.
Haja fumo e absinto pros coitados
Em imensas discussões acaloradas
Sobre os grandes destinos isolados
Versus modernos seres de manadas.
No Zutique, a colorir cada vogal,
Sentei-me àquela mesa com Rimbaud
E Baudelaire a cultivar flores do Mal
E traduzindo para o franco num "Jamais",
Num agouro até lá, Rue de la Paix,
O tal mascote negro do Allan Poe...
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23/08/2017
Notas
*No Zutique, a colorir cada vogal - O chamado " Album Zutique" era um livro de recordações e presenças mantido pelo Cafè Zutique em Paris, no século XIX em que foram encontrados vários poema de Rimbaud, que descobertos ali ficaram célebres. "A colorir cada vogal- é referência ao poema de Rimbaud "Les couleurs des voyelles", que no entanto não consta propriamente do Álbum Zutique. Um engano da Alma? Na verdade pode ser uma generalização da Alma, sugerindo que ele coloria cada vogal sempre, em qualquer de seus notáveis poemas).
*E Baudelaire a cultivar flores do Mal - alusão ao célebre livro de Poemas de Charles Baudelaire, "Les Fleurs du Mal"
"E traduzindo para o franco num "Jamais" - (pr. francesa "jamé")- alusão à tradução que Baudelaire fez do poema The Raven (O Corvo) em que a ave agourenta respondia às perguntas desesperadas do poeta: "Nevermore" (Nunca mais), em francês: "Jamais plus".
*Num agouro até lá, Rue de la Paix - aparentemente só para rimar com o francês ´Jamais", Alma na verdade quer dizer que o agouro de desesperança do corvo, chegava até à rua mais elegante de Paris.
*O tal mascote negro do Allan Poe- obviamente o corvo, aqui tratado ironicamente como um mascote do poeta Poe ( pr, Pou) em rima falsa com Rimbaud (pr. Rambô)
Antes só (de Alma Welt)
Prefiro ser solitária nesta vida,
Acreditem, do que mal acompanhada.
E assim pensava eu entristecida
Só de me imaginar abandonada...
Mas que louca agonia é ser sozinha
A colher flores para por num simples jarro
Para o inútil enfeitar de uma casinha
Ou um palácio de fundações de barro...
Mas então batem na porta, de repente,
E eu levanto e corro a ver quem pode ser,
Não sem antes de me passar um pente.
Mas é o vento batendo meu postigo,
Ironizando o meu estranho conviver,
Eternamente de mim para comigo...
.
23/08/2017
Acreditem, do que mal acompanhada.
E assim pensava eu entristecida
Só de me imaginar abandonada...
Mas que louca agonia é ser sozinha
A colher flores para por num simples jarro
Para o inútil enfeitar de uma casinha
Ou um palácio de fundações de barro...
Mas então batem na porta, de repente,
E eu levanto e corro a ver quem pode ser,
Não sem antes de me passar um pente.
Mas é o vento batendo meu postigo,
Ironizando o meu estranho conviver,
Eternamente de mim para comigo...
.
23/08/2017
terça-feira, 22 de agosto de 2017
A rosa flutuante (de Alma Welt)
A rosa meditativa - de Salvador Dalí
A rosa flutuante (de Alma Welt)
E de repente me encontrei no turbilhão,
Mas não havia um belo Malatesta. *
Abraçava a mim mesma sem mais chão,
E sozinha estava só com minha testa.
Era, pois, meu destino de amorosa:
Solidão, solidão e um grande abraço
No ar, como sem haste a pura rosa
Flutuando absurda em pleno espaço...
Nesse momento perguntei à Divindade,
Onde estava o amor que me cabia
Em sofrimento ou clandestinidade?
E Deus me respondeu: "Ó Alma ingrata!
Dei-te o eterno abraço da Poesia...
Do que pensas tu que Amor se trata?"
.
22/08/2017
Nota
*E de repente me encontrei no turbilhão,
Mas não havia um belo Malatesta - Alma alude à punição dos amantes clandestinos Francesca da Rímini e Paolo Malatesta, que assassinados, foram condenados a voarem eternamente abraçados, num turbilhão sem pouso, no Canto V, do Inferno, da Divina Comédia, de Dante Alighieri.
A rosa flutuante (de Alma Welt)
E de repente me encontrei no turbilhão,
Mas não havia um belo Malatesta. *
Abraçava a mim mesma sem mais chão,
E sozinha estava só com minha testa.
Era, pois, meu destino de amorosa:
Solidão, solidão e um grande abraço
No ar, como sem haste a pura rosa
Flutuando absurda em pleno espaço...
Nesse momento perguntei à Divindade,
Onde estava o amor que me cabia
Em sofrimento ou clandestinidade?
E Deus me respondeu: "Ó Alma ingrata!
Dei-te o eterno abraço da Poesia...
Do que pensas tu que Amor se trata?"
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22/08/2017
Nota
*E de repente me encontrei no turbilhão,
Mas não havia um belo Malatesta - Alma alude à punição dos amantes clandestinos Francesca da Rímini e Paolo Malatesta, que assassinados, foram condenados a voarem eternamente abraçados, num turbilhão sem pouso, no Canto V, do Inferno, da Divina Comédia, de Dante Alighieri.
A retirada (de Alma Welt)
Dança de Aldeia- Pieter Bruegel
Mesmo triste sendo a vida, viva,viva,
Pois a alegria é nossa, independente,
E podemos inseri-la na corrente,
Eis nossa bela e maior prerrogativa.
A alegria de Deus é um nosso dom
Para mudar o tom e fazer festa
Não só quando parece tudo bom,
Mas na véspera de "sturm", de "tempesta".
Dancem, dancem, companheiros aldeões,
Não há tempo para encher a nossa pança,
A colheita vai ficar para os ladrões...
Mas ainda estamos vivos, celebremos!
Temos tempo para uma derradeira dança,
Por estratégia depois nos retiremos...
.
22/08/2017
Inocência II (de Alma Welt)
Percebi precocemente, de guria,
Que o mundo vai do erro à injustiça;
Que impotente o nosso ser nascia
E que pouco adiantava ir à missa.
Sem querer dei uma de comadre:
"Mutti, já conheço o Evangelho
Mas não gosto daquele nosso padre
E dos carinhos seus de feio velho..."
"Como? Disse minha mãe em polvorosa.
Que me dizes? Nosso padre é um apóstolo!
Nunca ouvi coisa assim, tão horrorosa!..."
"Não, Mutti! (recuei). Não é isso, não!
Não gosto é de sentar-me no seu colo,
Que ele me pede durante a confissão..."
.
22/08/2017
Que o mundo vai do erro à injustiça;
Que impotente o nosso ser nascia
E que pouco adiantava ir à missa.
Sem querer dei uma de comadre:
"Mutti, já conheço o Evangelho
Mas não gosto daquele nosso padre
E dos carinhos seus de feio velho..."
"Como? Disse minha mãe em polvorosa.
Que me dizes? Nosso padre é um apóstolo!
Nunca ouvi coisa assim, tão horrorosa!..."
"Não, Mutti! (recuei). Não é isso, não!
Não gosto é de sentar-me no seu colo,
Que ele me pede durante a confissão..."
.
22/08/2017
sábado, 19 de agosto de 2017
O Nicho (de Alma Welt)
Atirados num mundo sem sistema,
Temos de encará-lo de improviso.
Escolhemos um código e um lema
E enfrentamos procelas sem aviso...
O barco está furado, e de nascença;
A vida é absurda pois precária,
Mas existe mesmo quando não se pensa
E nem temos escolha, sendo vária...
Pensando nessas coisas, cabisbaixa,
Assim buscava eu, desencantada,
O nicho em que o coração se encaixa.
Mas então bastou o sol sair das nuvens
Para tudo ficar claro e ver a estrada
Onde, lento, caminhando, Amor, tu vens...
.
19/08/2017
Temos de encará-lo de improviso.
Escolhemos um código e um lema
E enfrentamos procelas sem aviso...
O barco está furado, e de nascença;
A vida é absurda pois precária,
Mas existe mesmo quando não se pensa
E nem temos escolha, sendo vária...
Pensando nessas coisas, cabisbaixa,
Assim buscava eu, desencantada,
O nicho em que o coração se encaixa.
Mas então bastou o sol sair das nuvens
Para tudo ficar claro e ver a estrada
Onde, lento, caminhando, Amor, tu vens...
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19/08/2017
quarta-feira, 16 de agosto de 2017
Um brinde (de Alma Welt)
Um brinde aos que de nós se foram cedo,
É só o que lhes proponho nesta noite...
Aos que de nós pareciam tão sem medo
Que amiúde lhes dizia: "Não se afoite!"
Brinde aos que deram a cara pra bater,
Que se meteram em encrencas previsíveis
E não quiseram nos ouvir nem se deter
(nossos conselhos soavam-lhes risíveis...)
Bebamos, pois, aos queridos imprudentes
Com seus lances temerários ou bobagens,
Mas também aos que nem tinham tais repentes
E ficavam nas poltronas lendo livros
Mas foram logo se juntar aos personagens
Que lhes eram tão amados, tão mais vivos...
.
16/08/2017
É só o que lhes proponho nesta noite...
Aos que de nós pareciam tão sem medo
Que amiúde lhes dizia: "Não se afoite!"
Brinde aos que deram a cara pra bater,
Que se meteram em encrencas previsíveis
E não quiseram nos ouvir nem se deter
(nossos conselhos soavam-lhes risíveis...)
Bebamos, pois, aos queridos imprudentes
Com seus lances temerários ou bobagens,
Mas também aos que nem tinham tais repentes
E ficavam nas poltronas lendo livros
Mas foram logo se juntar aos personagens
Que lhes eram tão amados, tão mais vivos...
.
16/08/2017
sábado, 12 de agosto de 2017
Versinhos (de Alma Welt)
Nada pergunto ao vento, não me iludo...
Discreto o vento não me responderá
Conquanto saiba o vento quase tudo,
De tanto andar aí ao Deus dará...
Atentamente pois perscruto as nuvens
Mas jamais pra perguntar se vai chover
Mas tão somente pra saber quando tu vens,
Que é tudo que do amor ouso querer...
Não, não fico eu com meus versinhos
Como uma donzela de outras eras
A trilhar e retrilhar velhos caminhos...
Então do face me perdoe o novo amigo,
Pois de algum modo sei que o intrigo
Por jamais falar de sonhos e quimeras...
.
12/08/2017
Discreto o vento não me responderá
Conquanto saiba o vento quase tudo,
De tanto andar aí ao Deus dará...
Atentamente pois perscruto as nuvens
Mas jamais pra perguntar se vai chover
Mas tão somente pra saber quando tu vens,
Que é tudo que do amor ouso querer...
Não, não fico eu com meus versinhos
Como uma donzela de outras eras
A trilhar e retrilhar velhos caminhos...
Então do face me perdoe o novo amigo,
Pois de algum modo sei que o intrigo
Por jamais falar de sonhos e quimeras...
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12/08/2017
quinta-feira, 10 de agosto de 2017
Reclamos da Alma (de Alma Welt)
Como eu me sinto e vivo, o que faço?
Quem me quer e interesso nesta vida?
Minha vida tem de ser reconstruída
A cada manhã em que renasço...
É sofrido ser poetisa e musa
E escrever um soneto cada dia...
Então digo pro poeta: "Me alivia!
Deixa-me ir embora, estou confusa!"
Mas o tirano que me mantém cativa
Desde que me descobriu em sua mente,
Explora meus encantos, docemente...
No seu sonho profundo eu era diva,
Agora sou escrava a seu serviço
Enquanto perco juventude, cor e viço...
.
10/08/2017
Quem me quer e interesso nesta vida?
Minha vida tem de ser reconstruída
A cada manhã em que renasço...
É sofrido ser poetisa e musa
E escrever um soneto cada dia...
Então digo pro poeta: "Me alivia!
Deixa-me ir embora, estou confusa!"
Mas o tirano que me mantém cativa
Desde que me descobriu em sua mente,
Explora meus encantos, docemente...
No seu sonho profundo eu era diva,
Agora sou escrava a seu serviço
Enquanto perco juventude, cor e viço...
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10/08/2017
quarta-feira, 9 de agosto de 2017
As duas fontes (de Alma Wel
Amo, logo existo, diz minha alma
Contra esta minha vontade de pensar,
Originária do tal primeiro trauma
Que haveria do Jardim nos expulsar.
Mas o trauma, bem sabeis, também é sonho *
Na língua ancestral de minha avó
Cujos mitos, então, também proponho,
Da árvore Yggdrasil e Askr, não o pó.
Inconsciente derivado de duas fontes, *
Já que desde minha mãe açoriana
São judaico-cristãos meus horizontes...
Ó Alma, encruzilhada de dois mitos! *
Esta pobre poetisa com seus ritos,
Eis aí porque alguns julgam insana...
.
09/08/2017
Notas
*Mas o trauma, bem sabeis, também é sonho - a palavra "trauma", difundida pela psicanálise, deriva do alemão "träum" = sonhar
*Inconsciente derivado de duas fontes- Alma se refere à teoria do "inconsciente coletivo" de Carl Jung, cuja "mitanálise" é feita de acordo com os mitos pertinentes às origens raciais e culturais do analisando. Por exemplo, se o indivíduo é alemão ou descendente de alemães, sua análise deve ser feita baseada nos mitos germânicos (do Valhalla, de Odin, das Valquírias, de Thor, da Árvore Yggdrasil, e do primeiro homem, Askr (não de Adão, criado do pó), etc... Mas se o paciente for de origem latina, sua análise deve ser feita segundo os mitos greco-romanos, mas também judaico-cristãos. Entretanto, curiosamente, se o indivíduo for francês, dependendo da região, a análise pode ser feita com base nos mitos celtas (gauleses) da criação. Os irlandeses, escoceses e mesmo ingleses, idem.
*Ó Alma, encruzilhada de dois mitos! - Alma Welt é descendente de avós alemães por parte de pai, Werner Friedrich Welt e de portugueses açorianos por parte de sua mãe, Ana Morgado.
Comp
Contra esta minha vontade de pensar,
Originária do tal primeiro trauma
Que haveria do Jardim nos expulsar.
Mas o trauma, bem sabeis, também é sonho *
Na língua ancestral de minha avó
Cujos mitos, então, também proponho,
Da árvore Yggdrasil e Askr, não o pó.
Inconsciente derivado de duas fontes, *
Já que desde minha mãe açoriana
São judaico-cristãos meus horizontes...
Ó Alma, encruzilhada de dois mitos! *
Esta pobre poetisa com seus ritos,
Eis aí porque alguns julgam insana...
.
09/08/2017
Notas
*Mas o trauma, bem sabeis, também é sonho - a palavra "trauma", difundida pela psicanálise, deriva do alemão "träum" = sonhar
*Inconsciente derivado de duas fontes- Alma se refere à teoria do "inconsciente coletivo" de Carl Jung, cuja "mitanálise" é feita de acordo com os mitos pertinentes às origens raciais e culturais do analisando. Por exemplo, se o indivíduo é alemão ou descendente de alemães, sua análise deve ser feita baseada nos mitos germânicos (do Valhalla, de Odin, das Valquírias, de Thor, da Árvore Yggdrasil, e do primeiro homem, Askr (não de Adão, criado do pó), etc... Mas se o paciente for de origem latina, sua análise deve ser feita segundo os mitos greco-romanos, mas também judaico-cristãos. Entretanto, curiosamente, se o indivíduo for francês, dependendo da região, a análise pode ser feita com base nos mitos celtas (gauleses) da criação. Os irlandeses, escoceses e mesmo ingleses, idem.
*Ó Alma, encruzilhada de dois mitos! - Alma Welt é descendente de avós alemães por parte de pai, Werner Friedrich Welt e de portugueses açorianos por parte de sua mãe, Ana Morgado.
Comp
domingo, 6 de agosto de 2017
O fruto e a saga (de Alma Welt)
Na mesa éramos seis, por muito anos,
E havia tantos risos, alegria...
Nosso pai e nossa mãe, eu e os manos,
Sim, éramos felizes e eu sabia.
Adviriam logo após as desavenças...
A serpente, o pomo, o anjo, a espada,
Independente ou não de nossas crenças
Também vimos de maneira declarada.
Eis porque carrego dentro em mim
Toda a ancestral herança humana
Em pleno processo rumo ao fim...
Então, se a cada verso reconstruo
Uma saga que através de mim emana,
É porque o sabor do fruto ainda fruo...
.
06/08/2017
E havia tantos risos, alegria...
Nosso pai e nossa mãe, eu e os manos,
Sim, éramos felizes e eu sabia.
Adviriam logo após as desavenças...
A serpente, o pomo, o anjo, a espada,
Independente ou não de nossas crenças
Também vimos de maneira declarada.
Eis porque carrego dentro em mim
Toda a ancestral herança humana
Em pleno processo rumo ao fim...
Então, se a cada verso reconstruo
Uma saga que através de mim emana,
É porque o sabor do fruto ainda fruo...
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06/08/2017
sábado, 5 de agosto de 2017
Realidade, ficção (de Alma Welt)
Quando colho flores no jardim
A vida se arruma em minha mente
E tudo fica claro dentro em mim,
Qual se tudo fosse igual, eternamente.
Tudo ocupa seu lugar num tabuleiro
E o movimento se torna irrelevante
Num mundo de signos primeiros
Que nada por instantes leva adiante.
Mas então me situo e escolho lances
Que repetem por estranha coincidência
Os melhores ocorridos nos romances.
A vida é a ficção acontecida,
Com ou sem a nossa interferência,
Realidade é crítica não lida...
.
05/08/2017
A vida se arruma em minha mente
E tudo fica claro dentro em mim,
Qual se tudo fosse igual, eternamente.
Tudo ocupa seu lugar num tabuleiro
E o movimento se torna irrelevante
Num mundo de signos primeiros
Que nada por instantes leva adiante.
Mas então me situo e escolho lances
Que repetem por estranha coincidência
Os melhores ocorridos nos romances.
A vida é a ficção acontecida,
Com ou sem a nossa interferência,
Realidade é crítica não lida...
.
05/08/2017
A teia e o mel (de Alma Welt)
Os minutos, pressupostos pretendentes,
Me cercam pressionando-me a cabeça:
Descobriram o meu truque e, exigentes,
Minha teia esperam que eu desteça.
Dizem: Alma, tua mania de soneto
Te afastou de toda sociedade,
Prendendo-te e jogando-te num gueto
Com muros de palavras, na verdade...
Alma, quem se foi ou quem esperas,
A cada verso urdindo a tua trama
Quando fora rolam mundos e esferas?
E eu digo: minha teia é um painel
Da vida, mas que cabe a uma dama
Como abelha destilando o próprio mel...
.
05/08/2017
Me cercam pressionando-me a cabeça:
Descobriram o meu truque e, exigentes,
Minha teia esperam que eu desteça.
Dizem: Alma, tua mania de soneto
Te afastou de toda sociedade,
Prendendo-te e jogando-te num gueto
Com muros de palavras, na verdade...
Alma, quem se foi ou quem esperas,
A cada verso urdindo a tua trama
Quando fora rolam mundos e esferas?
E eu digo: minha teia é um painel
Da vida, mas que cabe a uma dama
Como abelha destilando o próprio mel...
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05/08/2017
sexta-feira, 4 de agosto de 2017
Imagem e Semelhança (de Alma Welt)
Seremos tão ingratos nos queixando,
Convidados ao banquete do Ocidente
E desde o berço nos empanturrando
Enquanto o povo de fome se ressente?
"Sim, a vida não é justa, tal é o mundo",
Dizia outrora meu antigo confessor.
"Mas a Justiça de Deus está no fundo,
Não questiones Seu infinito amor."
E assim fui pela vida, atarantada,
Falando das coisas que mal sei,
Quando daquele fundo não sei nada...
Mas quando olho a mim na superfície
Do espelho, é que percebo o que ganhei,
E é como se o próprio Deus me visse...
.
04;08/2017
Convidados ao banquete do Ocidente
E desde o berço nos empanturrando
Enquanto o povo de fome se ressente?
"Sim, a vida não é justa, tal é o mundo",
Dizia outrora meu antigo confessor.
"Mas a Justiça de Deus está no fundo,
Não questiones Seu infinito amor."
E assim fui pela vida, atarantada,
Falando das coisas que mal sei,
Quando daquele fundo não sei nada...
Mas quando olho a mim na superfície
Do espelho, é que percebo o que ganhei,
E é como se o próprio Deus me visse...
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04;08/2017
A Máfia do Soneto (de Alma Welt)
"Desta água não bebo", diz um dia
Todo aquele que vai ter dia de cão,
E um pássaro voando, eu não sabia,
É melhor do que tê-lo em minha mão.
"Pelo nariz ninguém me leva, não a mim"...
Isto disse um velhote meio tonto
E já levado pelo estranho Stavroguin *
Com dois dedos pela sala, assim de pronto.
"Do soneto não pertencerei à Máfia"
Digo eu, que me acusam já de vício
Por escrevê-los sem dor nem sacrifício...
Mas risíveis sempre soam as bravatas:
Levados, pela língua e pela empáfia,
Pelos narizes ou até pelas gravatas...
.
04/08/2017
Nota
*E já levado pelo estranho Stavroguin
Com dois dedos pela sala, assim de pronto - Alma se refere à estranha cena do romance "Os Demônios", de Dostoiévsky, em que o jovem fidalgo Nikolai Vsevolodovitch Stavroguin, personagem central, numa recepção em sua casa se aproxima de um conviva, um velho, ao ouvi-lo dizer aquela frase que era conhecido por repetir, e com os nós de dois dedos de uma mão o arrasta por todo o salão, para escândalo geral, antes dele mesmo ter uma síncope e desmaiar, o que serviria para os amigos como explicação e mesmo absolvição para o seu inusitado gesto de afronta e humilhação a um velho tolo. Na verdade esse tresloucado gesto seria um prenúncio para as coisas terríveis que aquele nobre desencadearia na aldeia.
Todo aquele que vai ter dia de cão,
E um pássaro voando, eu não sabia,
É melhor do que tê-lo em minha mão.
"Pelo nariz ninguém me leva, não a mim"...
Isto disse um velhote meio tonto
E já levado pelo estranho Stavroguin *
Com dois dedos pela sala, assim de pronto.
"Do soneto não pertencerei à Máfia"
Digo eu, que me acusam já de vício
Por escrevê-los sem dor nem sacrifício...
Mas risíveis sempre soam as bravatas:
Levados, pela língua e pela empáfia,
Pelos narizes ou até pelas gravatas...
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04/08/2017
Nota
*E já levado pelo estranho Stavroguin
Com dois dedos pela sala, assim de pronto - Alma se refere à estranha cena do romance "Os Demônios", de Dostoiévsky, em que o jovem fidalgo Nikolai Vsevolodovitch Stavroguin, personagem central, numa recepção em sua casa se aproxima de um conviva, um velho, ao ouvi-lo dizer aquela frase que era conhecido por repetir, e com os nós de dois dedos de uma mão o arrasta por todo o salão, para escândalo geral, antes dele mesmo ter uma síncope e desmaiar, o que serviria para os amigos como explicação e mesmo absolvição para o seu inusitado gesto de afronta e humilhação a um velho tolo. Na verdade esse tresloucado gesto seria um prenúncio para as coisas terríveis que aquele nobre desencadearia na aldeia.
quinta-feira, 3 de agosto de 2017
Insuficiência de fundos (de Alma Welt)
Amores meus, perdidos, sinto tanto
Que as coisas tenham ido pelo ralo.
Nem passaram de volta no gargalo,
Só esmolas demais para o meu santo.
Um espelho trincado, sem conserto,
Fragmenta-se em detalhes o amor,
Perdida a sua integridade e o acerto
Que dois corações pensam compor...
Ser sozinhos é afinal nosso mister
Do qual mal temos plena consciência,
Bocas ávidas a sugar o que vier...
Meus cheques afetivos eram nimbos,
Mas de fundos tinham certa insuficiência
Bateram e já voltaram com carimbos...
.
03/08/2017
Que as coisas tenham ido pelo ralo.
Nem passaram de volta no gargalo,
Só esmolas demais para o meu santo.
Um espelho trincado, sem conserto,
Fragmenta-se em detalhes o amor,
Perdida a sua integridade e o acerto
Que dois corações pensam compor...
Ser sozinhos é afinal nosso mister
Do qual mal temos plena consciência,
Bocas ávidas a sugar o que vier...
Meus cheques afetivos eram nimbos,
Mas de fundos tinham certa insuficiência
Bateram e já voltaram com carimbos...
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03/08/2017
quarta-feira, 2 de agosto de 2017
Ponderações sobre o tédio (de Alma Welt)
Arauto do diabo é o nosso tédio,
Outrora também chamado spleen, *
E as flores do Mal, falso remédio,
Receitadas foram até pra mim...
Mas de Bach música venha, não florais, *
E o velho Baudelaire que me perdoe, *
Com o Cujo já não se brinca mais,
Disputando-se a alma antes que voe.
Fausto foi longe demais com seu Mefisto:
Nem o tédio justifica tal desmando
Embora o Bem e o Mal formem um misto.
Deus, livrai-me deste tédio insidioso
E mantendo sobre mim Vosso comando,
Não me tente fora dele nenhum gozo...
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02/08/2017
Outrora também chamado spleen, *
E as flores do Mal, falso remédio,
Receitadas foram até pra mim...
Mas de Bach música venha, não florais, *
E o velho Baudelaire que me perdoe, *
Com o Cujo já não se brinca mais,
Disputando-se a alma antes que voe.
Fausto foi longe demais com seu Mefisto:
Nem o tédio justifica tal desmando
Embora o Bem e o Mal formem um misto.
Deus, livrai-me deste tédio insidioso
E mantendo sobre mim Vosso comando,
Não me tente fora dele nenhum gozo...
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02/08/2017
terça-feira, 1 de agosto de 2017
Na fila (de Alma Welt)
Não serei aquela que se queixa,
Nem tampouco a que espera homenagens,
Aguardarei paciente a minha deixa
Mas também sei que não mais direi bobagens.
Por quê afirmas isso? Me perguntas.
E eu direi que espero ser chamada
Uma vez que estou na fila na calçada
Onde estão as esperanças todas juntas.
Fui honesta, reta, doce, compassiva...
Minha fraqueza era apenas a poesia,
Que é tudo que garante que estou viva.
Existir, privilégio ou contingência,
Não depende tão só da inteligência
Mas de um coração que chore e ria...
.
01/08/2017
Nem tampouco a que espera homenagens,
Aguardarei paciente a minha deixa
Mas também sei que não mais direi bobagens.
Por quê afirmas isso? Me perguntas.
E eu direi que espero ser chamada
Uma vez que estou na fila na calçada
Onde estão as esperanças todas juntas.
Fui honesta, reta, doce, compassiva...
Minha fraqueza era apenas a poesia,
Que é tudo que garante que estou viva.
Existir, privilégio ou contingência,
Não depende tão só da inteligência
Mas de um coração que chore e ria...
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01/08/2017
Sombras (de Alma Welt)
Sombras se acumulam no horizonte
E um clima de ameaça vem da Pérsia;
Se arme cada um, com a guerra conte
O mundo mergulhado em controvérsia...
Os bravos de Esparta eram trezentos,
E o mundo de novo está no fim.
Se miram leste e oeste, odientos,
Nem Semíramis passeia em seu jardim...
As hordas vem em ondas do Oriente,
Tudo reincide, é uma desgraça,
Mas agora a gente em Cristo se ressente.
E eu, no fim do mundo do Poente,
Colho flores enquanto o Tempo passa
Como se nada houvesse, simplesmente...
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01/08/2017
E um clima de ameaça vem da Pérsia;
Se arme cada um, com a guerra conte
O mundo mergulhado em controvérsia...
Os bravos de Esparta eram trezentos,
E o mundo de novo está no fim.
Se miram leste e oeste, odientos,
Nem Semíramis passeia em seu jardim...
As hordas vem em ondas do Oriente,
Tudo reincide, é uma desgraça,
Mas agora a gente em Cristo se ressente.
E eu, no fim do mundo do Poente,
Colho flores enquanto o Tempo passa
Como se nada houvesse, simplesmente...
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01/08/2017
domingo, 30 de julho de 2017
Inocência (de Alma Welt)
É tão cheia de dúvidas minha fé
Que um fiel me aponta ou me acusa
De não tê-la de modo algum, até ,
Uma vez que a fé é cega e obtusa.
Mas meu Deus tolera minha teima
Em não abandonar minha razão
Já que o fruto comi e ele me queima
Produzindo em torno este clarão.
Minha ilusão faz sorrir Deus, divertido,
E Ele parece apreciar minha poesia
Com toda essa aparência de sentido.
Então, Alma, em torno a ti a aura,
Que só a verdadeira fé restaura,
É a da tua inocência à revelia...
.
30/07/2017
Que um fiel me aponta ou me acusa
De não tê-la de modo algum, até ,
Uma vez que a fé é cega e obtusa.
Mas meu Deus tolera minha teima
Em não abandonar minha razão
Já que o fruto comi e ele me queima
Produzindo em torno este clarão.
Minha ilusão faz sorrir Deus, divertido,
E Ele parece apreciar minha poesia
Com toda essa aparência de sentido.
Então, Alma, em torno a ti a aura,
Que só a verdadeira fé restaura,
É a da tua inocência à revelia...
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30/07/2017
O brinde (de Alma Welt)
A vida como o vidro é inteiriça,
E não permite restauro se trincada;
Um terço não sabemos de sua missa,
Se continua, ou não, quando acabada.
Não sabemos do Universo o mistério
Na pergunta que mais nos interessa
E diz respeito ao depois do cemitério
Quando vamos pra casa bem depressa
Mas antes passamos nalgum bar
Para tomar um gole de consolo
Ou a patética função arrematar.
Aproveitemos então para um brinde
A este nosso crime sem o dolo
De prosseguir qual se nada nunca finde...
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30/07/2017
E não permite restauro se trincada;
Um terço não sabemos de sua missa,
Se continua, ou não, quando acabada.
Não sabemos do Universo o mistério
Na pergunta que mais nos interessa
E diz respeito ao depois do cemitério
Quando vamos pra casa bem depressa
Mas antes passamos nalgum bar
Para tomar um gole de consolo
Ou a patética função arrematar.
Aproveitemos então para um brinde
A este nosso crime sem o dolo
De prosseguir qual se nada nunca finde...
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30/07/2017
quinta-feira, 27 de julho de 2017
Palavras ao Senhor (de Alma Welt)
Prometo, Senhor, não mais queixar-me,
E também não questionar vossos desígnios.
Fui tola, meu Senhor, pois perdoai-me,
Nem sequer sabia ler os vossos signos.
Demais já perdoaste meus agravos,
Me cobristes de não merecidas bençãos;
Aqui estou novamente a criticar-vos,
Minha boca calarei com as minhas mãos...
Quem sou eu para exibir-me como faço,
Qual fosse portadora de algum lume
Do qual pecando às vezes me desfaço?
Senhor, não passo de guria sem noção
Mas da soberba não cheguei ao cume,
Malgrado o orgulho de ser Vossa criação...
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28/07/2017
E também não questionar vossos desígnios.
Fui tola, meu Senhor, pois perdoai-me,
Nem sequer sabia ler os vossos signos.
Demais já perdoaste meus agravos,
Me cobristes de não merecidas bençãos;
Aqui estou novamente a criticar-vos,
Minha boca calarei com as minhas mãos...
Quem sou eu para exibir-me como faço,
Qual fosse portadora de algum lume
Do qual pecando às vezes me desfaço?
Senhor, não passo de guria sem noção
Mas da soberba não cheguei ao cume,
Malgrado o orgulho de ser Vossa criação...
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28/07/2017
quarta-feira, 26 de julho de 2017
Ariadne em Náxos II (de Alma Welt)
Solto o fio da meada todo dia,
Um pouco mais, na espera de puxá-lo.
Há um duplo de mim que em mim confia,
Quanto ao Minotauro, hei de encontrá-lo.
Serei deixada em Náxos, a tal ilha
E ficarei jogada ao Zeus dará?
Meu labirinto foi mesmo a minha coxilha
Nas trilhas que ninguém mais andará?
E se por mim mesma abandonada
Por culpa de fútil esquecimento
Ou por negra e vã vela quadrada,
Tal foi o destino, não lamento:
Viria resgatar minha poesia,
Dionisos, o humor, minha alegria...
Um pouco mais, na espera de puxá-lo.
Há um duplo de mim que em mim confia,
Quanto ao Minotauro, hei de encontrá-lo.
Serei deixada em Náxos, a tal ilha
E ficarei jogada ao Zeus dará?
Meu labirinto foi mesmo a minha coxilha
Nas trilhas que ninguém mais andará?
E se por mim mesma abandonada
Por culpa de fútil esquecimento
Ou por negra e vã vela quadrada,
Tal foi o destino, não lamento:
Viria resgatar minha poesia,
Dionisos, o humor, minha alegria...
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25/06/2017
25/06/2017
domingo, 23 de julho de 2017
Minha terra sem palmeiras (de Alma Welt)
Escrevo pra me situar na vida,
Minha bússola apontando para o sul
Onde está o meu ponto de partida
E onde o céu, por certo, é mais azul.
Minha terra jamais teve palmeiras
E o sabiá por lá é estrangeiro;
As corujas te observam, não te esgueiras,
O descampado te expõe o corpo inteiro.
Aves gorjeiam, sim, mas mais chilreiam
Os densos véus incríveis da andorinha
Que a atmosfera límpida permeiam.
E se descansas sob o ubu pampeiro
Pousas tua vista na longínqua linha
Do horizonte, que também é teu, inteiro...
.
23/07/2017
Minha bússola apontando para o sul
Onde está o meu ponto de partida
E onde o céu, por certo, é mais azul.
Minha terra jamais teve palmeiras
E o sabiá por lá é estrangeiro;
As corujas te observam, não te esgueiras,
O descampado te expõe o corpo inteiro.
Aves gorjeiam, sim, mas mais chilreiam
Os densos véus incríveis da andorinha
Que a atmosfera límpida permeiam.
E se descansas sob o ubu pampeiro
Pousas tua vista na longínqua linha
Do horizonte, que também é teu, inteiro...
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23/07/2017
sábado, 22 de julho de 2017
Entusiasmada (Alma Welt)
Nunca esperei que os meus sonhos fossem mais
Que sonhos, sem as vazias esperanças;
Realidade, vigilante capataz,
Pertence a outros nichos, outras instâncias...
Que então queres, pobre Alma, desta vida?
Pergunta-me um amigo, um tanto pasmo.
Eu, sorrindo, como coisa resolvida
Respondo que sou feita de entusiasmo.
Sim, pasme, pela vida e seus mistérios
Que são bem maiores do que o sonho
E tem outros requisitos e critérios.
O entusiamo não é naïf nem bisonho,
É engolir um deus, dizia o grego,
E perder, como quem sonha, todo apego...
.
22/07/2017
Que sonhos, sem as vazias esperanças;
Realidade, vigilante capataz,
Pertence a outros nichos, outras instâncias...
Que então queres, pobre Alma, desta vida?
Pergunta-me um amigo, um tanto pasmo.
Eu, sorrindo, como coisa resolvida
Respondo que sou feita de entusiasmo.
Sim, pasme, pela vida e seus mistérios
Que são bem maiores do que o sonho
E tem outros requisitos e critérios.
O entusiamo não é naïf nem bisonho,
É engolir um deus, dizia o grego,
E perder, como quem sonha, todo apego...
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22/07/2017
sexta-feira, 21 de julho de 2017
A via verdadeira (de Alma Welt)
desenho de Guilherme de Faria, 1973
A via verdadeira (de Alma Welt)
Temos sempre tanto a ver e descobrir
Que uma vida, Senhor, é pouco, perdoai.
Tendo perdido muito cedo mãe e pai
Extraviei-me procurando só partir.
Depois perdida a ponta da meada
E estando a percorrer um labirinto
Que se apresentava como estrada,
Encontrei meu Minotauro e não minto:
Aprendi coisas então, belas demais
E também duras, da nossa natureza
Que, na verdade, Senhor, não revelais.
Recuperada a via verdadeira,
Pra voltar abro, Senhor, mão da beleza:
Tornai branca esta rubra cabeleira...
.
21/07/2017
Nota
* Recuperada a via verdadeira,
Pra voltar abro, Senhor, mão da beleza:
Tornai branca esta rubra cabeleira... -
Neste terceto-chave está veladamente sugerida uma sutil marotice típica da Alma: Ela, para ganhar mais tempo de vida e se dizendo retornada ao caminho verdadeiro, oferece a Deus sua velhice (a cabeleira rubra que Ele lhe fez e que se tornaria branca).
A máscara do meio (de Alma Welt)
Vivemos controversas odisseias
No decurso comum de nossa sina
No plano da alma e suas idéias,
Nossa comédia, então, pouco divina,
Tragicomédia, eu diria, um tanto bufa...
Modo geral, verdadeira pantomima.
Arlequins somos nós no lufa lufa.
Plenitude? Inatingível colombina...
Palhaço triste, em geral pintura vã, *
Não irei mais uma vez corroborar,
No Inferno até Orfeu virou cancan. *
Tirado o humor sobra a tragédia
E os gregos jamais fizeram média,
Coube o patético a nós inaugurar...
.
21/07/2017
Notas
*Palhaço triste, em geral pintura vã - Alma detestava essas pinturas, sempre muito ruins, de palhaços tristes, patéticos, derramando lágrimas, pela banalidade de sua concepção. Entretanto se comovia com a ária "Vesti la giubba", da ópera I Pagliacci, de Ruggero Leoncavallo, que pela beleza pungente da música, conseguia transcender o patético e atingir a tragédia .
*No inferno até Orfeu virou cancan -alusão à opereta buffa "Orfeu no Inferno", de Jacques Offenbach, da qual um tema foi usado popularmente na dança do cancan, no começo do século em Paris no Moulin Rouge, e até hoje...
No decurso comum de nossa sina
No plano da alma e suas idéias,
Nossa comédia, então, pouco divina,
Tragicomédia, eu diria, um tanto bufa...
Modo geral, verdadeira pantomima.
Arlequins somos nós no lufa lufa.
Plenitude? Inatingível colombina...
Palhaço triste, em geral pintura vã, *
Não irei mais uma vez corroborar,
No Inferno até Orfeu virou cancan. *
Tirado o humor sobra a tragédia
E os gregos jamais fizeram média,
Coube o patético a nós inaugurar...
.
21/07/2017
Notas
*Palhaço triste, em geral pintura vã - Alma detestava essas pinturas, sempre muito ruins, de palhaços tristes, patéticos, derramando lágrimas, pela banalidade de sua concepção. Entretanto se comovia com a ária "Vesti la giubba", da ópera I Pagliacci, de Ruggero Leoncavallo, que pela beleza pungente da música, conseguia transcender o patético e atingir a tragédia .
*No inferno até Orfeu virou cancan -alusão à opereta buffa "Orfeu no Inferno", de Jacques Offenbach, da qual um tema foi usado popularmente na dança do cancan, no começo do século em Paris no Moulin Rouge, e até hoje...
quarta-feira, 19 de julho de 2017
A testemunha (de Alma Welt)
Pra nós "tudo é relativo" enquanto vivos,
Mas não como o pobre Einstein entende
E ficou célebre por alguns motivos,
Sobretudo pelo que ninguém compreende.
No mundo tudo é erro e confusão
E o Caos é nossa herança registrada
Com a assinatura do nosso Pai-patrão
E uma cláusula de usufruto disfarçada
Que se refere à parte boa por um tempo,
A da nossa infância (quem supunha?)
No Jardim antes daquele contratempo.
E a quem possa interessar também assina
Um senhor que serviu de testemunha
Mas ria feio uma risada muito fina...
.
19/07/2017
Mas não como o pobre Einstein entende
E ficou célebre por alguns motivos,
Sobretudo pelo que ninguém compreende.
No mundo tudo é erro e confusão
E o Caos é nossa herança registrada
Com a assinatura do nosso Pai-patrão
E uma cláusula de usufruto disfarçada
Que se refere à parte boa por um tempo,
A da nossa infância (quem supunha?)
No Jardim antes daquele contratempo.
E a quem possa interessar também assina
Um senhor que serviu de testemunha
Mas ria feio uma risada muito fina...
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19/07/2017
Minha Troia (de Alma Welt)
Laocoonte - cópia romana antiga de um original grego. ( Museu do Vaticano)
Minha Troia (de Alma Welt)
Agora, neste inverno, só me ocorre
"A cruel fuga das horas" dos antigos,
Quando o dia nasce, a tarde morre,
Os anos a nos ter como inimigos...
Os espelhos, nossos falsos aliados,
Há muito se infiltraram em nossos lares
Com mentiras, lisonjas e agrados,
Cavalinhos de Troia como altares ...
E eu me insurjo apenas com palavras,
Impotente perante essa invasão
Que quer roubar e queimar as minhas lavras.
E sob poucos aplausos, umas vaias,
Ainda luto com a serpente da Razão,
Laocoonte de mim mesma, mas de saias.
.
19/07/2017
Nota
Laocoonte era filho de Acoetes, irmão de Anquises; ele era um sacerdote de Apolo, mas, contra a vontade de Apolo, se casou e teve filhos, Antífantes e Timbreu. Quando Laocoonte estava fazendo um sacrifício a Netuno, Apolo enviou duas serpentes de Tênedos, que mataram o sacerdote e seus descendentes. Segundo os frígios, isto aconteceu porque Laocoonte havia arremessado sua lança contra o Cavalo de Troia.
Possivelmente a mais antiga referência ao mito seja uma tragédia perdida de Sófocles, que possuía mesmo nome. A lenda seria relembrada por Quinto de Esmirna em seu trabalho Posthomerica, uma continuação da Ilíada. No entanto, o relato é mais popularmente conhecido pela escultura que inspirou e pelo poema épico latino Eneida, de autoria de Virgílio no século I a.C.
Uma das expressões mais importantes da Antiguidade, sobretudo do período helenístico, é a escultura que representa Laocoonte e seus filhos sendo atacados. A obra foi objeto de estudo por vários historiadores da arte após sua redescoberta no século XVI. De datação incerta, as estimativas variam entre 140 a.C. até 37 d.C., época do imperador romano Tito (a mais aceita atualmente é 40 a. C.). Winckelmann, Lessing e outros tentaram avaliar a importância da escultura na estética grega, além de considerar uma possível relação com a Eneida.
( Wikipédia)
Minha Troia (de Alma Welt)
Agora, neste inverno, só me ocorre
"A cruel fuga das horas" dos antigos,
Quando o dia nasce, a tarde morre,
Os anos a nos ter como inimigos...
Os espelhos, nossos falsos aliados,
Há muito se infiltraram em nossos lares
Com mentiras, lisonjas e agrados,
Cavalinhos de Troia como altares ...
E eu me insurjo apenas com palavras,
Impotente perante essa invasão
Que quer roubar e queimar as minhas lavras.
E sob poucos aplausos, umas vaias,
Ainda luto com a serpente da Razão,
Laocoonte de mim mesma, mas de saias.
.
19/07/2017
Nota
Laocoonte era filho de Acoetes, irmão de Anquises; ele era um sacerdote de Apolo, mas, contra a vontade de Apolo, se casou e teve filhos, Antífantes e Timbreu. Quando Laocoonte estava fazendo um sacrifício a Netuno, Apolo enviou duas serpentes de Tênedos, que mataram o sacerdote e seus descendentes. Segundo os frígios, isto aconteceu porque Laocoonte havia arremessado sua lança contra o Cavalo de Troia.
Possivelmente a mais antiga referência ao mito seja uma tragédia perdida de Sófocles, que possuía mesmo nome. A lenda seria relembrada por Quinto de Esmirna em seu trabalho Posthomerica, uma continuação da Ilíada. No entanto, o relato é mais popularmente conhecido pela escultura que inspirou e pelo poema épico latino Eneida, de autoria de Virgílio no século I a.C.
Uma das expressões mais importantes da Antiguidade, sobretudo do período helenístico, é a escultura que representa Laocoonte e seus filhos sendo atacados. A obra foi objeto de estudo por vários historiadores da arte após sua redescoberta no século XVI. De datação incerta, as estimativas variam entre 140 a.C. até 37 d.C., época do imperador romano Tito (a mais aceita atualmente é 40 a. C.). Winckelmann, Lessing e outros tentaram avaliar a importância da escultura na estética grega, além de considerar uma possível relação com a Eneida.
( Wikipédia)
terça-feira, 18 de julho de 2017
A Sentença (de Alma Welt)
Sob um certo viés, ponto de vista,
A vida é insensata ou mesmo fútil,
Pois a experiência humana é revista
Como Sísifo, em seu tormento inútil.
A vida é insensata ou mesmo fútil,
Pois a experiência humana é revista
Como Sísifo, em seu tormento inútil.
Rolamos até o cume um só rochedo
Sem sequer a um outro juntá-lo,
Rolando-o para baixo, e nunca quedo
Podemos só na morte abandoná-lo.
Trabalho forçado, eis a sentença
Dada a nós por Deus, dono do fruto
Que até hoje produz tanta desavença.
Mas não falo por mim, mesmo no mundo,
Que não posso me queixar, porque desfruto
De um regime de ócio, mais fecundo...
.
18/07/2017
Sem sequer a um outro juntá-lo,
Rolando-o para baixo, e nunca quedo
Podemos só na morte abandoná-lo.
Trabalho forçado, eis a sentença
Dada a nós por Deus, dono do fruto
Que até hoje produz tanta desavença.
Mas não falo por mim, mesmo no mundo,
Que não posso me queixar, porque desfruto
De um regime de ócio, mais fecundo...
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18/07/2017
O conserto (de Alma Welt)
"Ó Alma inconformada!"- disse Deus-
"Não te fiz assim teimosa e escabreante!
Não me obrigues a passar-te para adiante,
Pro ferreiro que conserta os erros Meus."
E eu fiquei quietinha e entrei na fila
Procurando ser boa e obediente,
Com muito medo daquela forja quente,
Eu que não sou de ferro nem de argila.
Mas depois me aproximando bem quietinha
Disse: "Senhor meu, não mais questiono
Quem veio antes: o ovo ou a galinha..."
"Também não vou perguntar pelo conserto,
Mas, Senhor, o tal ferreiro do abandono
Devolveria-me a Vós, após o aperto? "
.
18/07/2017
"Não te fiz assim teimosa e escabreante!
Não me obrigues a passar-te para adiante,
Pro ferreiro que conserta os erros Meus."
E eu fiquei quietinha e entrei na fila
Procurando ser boa e obediente,
Com muito medo daquela forja quente,
Eu que não sou de ferro nem de argila.
Mas depois me aproximando bem quietinha
Disse: "Senhor meu, não mais questiono
Quem veio antes: o ovo ou a galinha..."
"Também não vou perguntar pelo conserto,
Mas, Senhor, o tal ferreiro do abandono
Devolveria-me a Vós, após o aperto? "
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18/07/2017
RIP (de Alma Welt)
A gente sofre, Senhor, bem o sabeis...
Nos destes da alegria a alternativa
E a felicidade a uns mais hábeis,
Os virtuosos que ainda a mantêm viva.
Mas para a maioria impera o medo
Por não conhecermos os destinos
Além da porta negra do Segredo
Outrora até domínio de um rei Minos.
Por quê, Senhor, esta mente tão perdida
Se já demos no fruto uma mordida
E devíamos saber de alguma coisa?
Não nos destes tempo de enxergar
O que estamos realmente a esperar,
Além do RIP gravado em nossa lousa...
.
18/07/2017
Nos destes da alegria a alternativa
E a felicidade a uns mais hábeis,
Os virtuosos que ainda a mantêm viva.
Mas para a maioria impera o medo
Por não conhecermos os destinos
Além da porta negra do Segredo
Outrora até domínio de um rei Minos.
Por quê, Senhor, esta mente tão perdida
Se já demos no fruto uma mordida
E devíamos saber de alguma coisa?
Não nos destes tempo de enxergar
O que estamos realmente a esperar,
Além do RIP gravado em nossa lousa...
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18/07/2017
O fio perdido (de Alma Welt)
Estar convosco, Senhor, eu bem queria
Ainda esta madrugada, se possível.
Ainda pouco tive um sonho horrível:
Eu perdera do meu dom a sintonia
E estava sozinha a me queixar,
Tendo perdido o fio da minha poesia
E ao Éden não pudesse mais voltar
Como se eu o fizesse todo dia.
Sem avistar, Senhor a árvore e o fruto
De que eu tinha ao menos usufruto,
Solitária, bem no meio da coxilha...
A poesia é um plano de retorno
E eu ficara tão somente a olhar em torno,
Por um nada perdera a minha trilha...
.
18/07/2017
Ainda esta madrugada, se possível.
Ainda pouco tive um sonho horrível:
Eu perdera do meu dom a sintonia
E estava sozinha a me queixar,
Tendo perdido o fio da minha poesia
E ao Éden não pudesse mais voltar
Como se eu o fizesse todo dia.
Sem avistar, Senhor a árvore e o fruto
De que eu tinha ao menos usufruto,
Solitária, bem no meio da coxilha...
A poesia é um plano de retorno
E eu ficara tão somente a olhar em torno,
Por um nada perdera a minha trilha...
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18/07/2017
segunda-feira, 17 de julho de 2017
O Livro Aberto (de Alma Welt)
Em versos minha vida é um livro
Do qual me reservei as entrelinhas
Resistentes do olhar ao mero crivo
E às questões mais óbvias, mesquinhas...
Estou naquilo tudo que eu não disse,
Tanto quanto nos versos mais diretos,
Construídos mais à custa dos afetos
Como se o puro Mal não existisse...
"Assim é fácil" -disse alguém- "reivindicar
Profundidade maior no que calaste,
Generosa e obscura como o mar..."
Mas a este respondo (ao fim de tudo)
Como o príncipe falante em seu contraste:
"O resto é silêncio"... e ficou mudo.
.
17/07/2017
Do qual me reservei as entrelinhas
Resistentes do olhar ao mero crivo
E às questões mais óbvias, mesquinhas...
Estou naquilo tudo que eu não disse,
Tanto quanto nos versos mais diretos,
Construídos mais à custa dos afetos
Como se o puro Mal não existisse...
"Assim é fácil" -disse alguém- "reivindicar
Profundidade maior no que calaste,
Generosa e obscura como o mar..."
Mas a este respondo (ao fim de tudo)
Como o príncipe falante em seu contraste:
"O resto é silêncio"... e ficou mudo.
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17/07/2017
domingo, 16 de julho de 2017
Para escrever poesia (de Alma Welt)
Para se escrever boa poesia
É necessário se ter cara de pau
Como se antes poetas não havia
E tivesses descoberto o universal.
Esqueça tudo o que aprendeste
E passa a conhecer-te pelo verso
Que te revelará o que soubeste
Ou que em tua mente era disperso.
Se não ficares deveras surpreendido,
Com o queixo caído em puro pasmo
Ou não deres um grito de entusiasmo,
Chutaste para fora ou só na trave,
Não terás nem um soneto recebido,
Que te paga com o ouro de uma chave...
.
16/07/2017
É necessário se ter cara de pau
Como se antes poetas não havia
E tivesses descoberto o universal.
Esqueça tudo o que aprendeste
E passa a conhecer-te pelo verso
Que te revelará o que soubeste
Ou que em tua mente era disperso.
Se não ficares deveras surpreendido,
Com o queixo caído em puro pasmo
Ou não deres um grito de entusiasmo,
Chutaste para fora ou só na trave,
Não terás nem um soneto recebido,
Que te paga com o ouro de uma chave...
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16/07/2017
Há algo (de Alma Welt)
Ophelia - Sir John Everett Millais (Tate Gallery)
Há algo (de Alma Welt)
Tem abutres voando, há algo podre *
Nalgum lugar, por aqui, nesta comarca. *
Os peões, entres goles de um bom odre,
Desenterram um crânio e uma arca: *
Era de um humorista de outra era *
Pois seu sorriso alvar o denuncia, *
Seja ou não seja tudo uma quimera, *
E esteja eu em terras de poesia...
Meu pai morreu de olvido faz semanas *
E tenho medo de ver o seu fantasma; *
Não gostamos do meu tio, eu e as manas... *
Chamei a prima Ofélia pra ajudar *
A colher flores, mas tem crises de asma, *
Estava, coitadinha, a se afogar... *
.
16/07/2017
Notas
*...há algo podre
Nalgum lugar, por aqui, nesta comarca - este verso ecoa a famosa frase "Há algo de podre no reino da Dinamarca", que abre a peça Hamlet de Shakespeare
*Desenterraram um crânio...
Era um humorista de outra era - versos alusivos à cena do coveiro e da exumação do antigo e espirituoso bobo da corte, Yorick, que Hamlet amara na infância e a cujo crânio se dirige num monólogo respeitoso.
*Seja ou não seja uma quimera. - alusão ao célebre monólogo "Ser ou não ser... " , de Hamlet.
*Pois seu sorriso alvar o denuncia - se refere ao sorriso branco da caveira.
*Meu pai morreu de olvido faz semanas - ( meu pai morreu de esquecimento) alusão em trocadilho ao assassinato do pai de Hamlet pelo seu irmão com a inoculação durante o sono de um veneno ouvido.
*E tenho medo de ver o seu fantasma - Alusão ao fantasma do pai de Hamlet, cuja cena abre a peça.
*Não gostamos do meu tio, eu e as manas - alusão ao tio de Hamlet assassino do próprio irmão para usurpar-lhe o trono e casar com a viúva sua cunhada a rainha Gertrude (as manas aqui são simplesmente as da Alma mesma, Lucia e Solange). Uma coincidência: a estância da família Welt se chama Santa Gertrude (antiga "Estância Farroupilha")
*Chamei a prima Ofélia pra ajudar
A colher flores, mas tem crises de asma,
Estava, coitadinha, a se afogar... - este terceto é uma paródia da morte por afogamento, de Ofélia (noiva repudiada por Hamlet) enquanto colhia flores...
Há algo (de Alma Welt)
Tem abutres voando, há algo podre *
Nalgum lugar, por aqui, nesta comarca. *
Os peões, entres goles de um bom odre,
Desenterram um crânio e uma arca: *
Era de um humorista de outra era *
Pois seu sorriso alvar o denuncia, *
Seja ou não seja tudo uma quimera, *
E esteja eu em terras de poesia...
Meu pai morreu de olvido faz semanas *
E tenho medo de ver o seu fantasma; *
Não gostamos do meu tio, eu e as manas... *
Chamei a prima Ofélia pra ajudar *
A colher flores, mas tem crises de asma, *
Estava, coitadinha, a se afogar... *
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16/07/2017
Notas
*...há algo podre
Nalgum lugar, por aqui, nesta comarca - este verso ecoa a famosa frase "Há algo de podre no reino da Dinamarca", que abre a peça Hamlet de Shakespeare
*Desenterraram um crânio...
Era um humorista de outra era - versos alusivos à cena do coveiro e da exumação do antigo e espirituoso bobo da corte, Yorick, que Hamlet amara na infância e a cujo crânio se dirige num monólogo respeitoso.
*Seja ou não seja uma quimera. - alusão ao célebre monólogo "Ser ou não ser... " , de Hamlet.
*Pois seu sorriso alvar o denuncia - se refere ao sorriso branco da caveira.
*Meu pai morreu de olvido faz semanas - ( meu pai morreu de esquecimento) alusão em trocadilho ao assassinato do pai de Hamlet pelo seu irmão com a inoculação durante o sono de um veneno ouvido.
*E tenho medo de ver o seu fantasma - Alusão ao fantasma do pai de Hamlet, cuja cena abre a peça.
*Não gostamos do meu tio, eu e as manas - alusão ao tio de Hamlet assassino do próprio irmão para usurpar-lhe o trono e casar com a viúva sua cunhada a rainha Gertrude (as manas aqui são simplesmente as da Alma mesma, Lucia e Solange). Uma coincidência: a estância da família Welt se chama Santa Gertrude (antiga "Estância Farroupilha")
*Chamei a prima Ofélia pra ajudar
A colher flores, mas tem crises de asma,
Estava, coitadinha, a se afogar... - este terceto é uma paródia da morte por afogamento, de Ofélia (noiva repudiada por Hamlet) enquanto colhia flores...
sábado, 15 de julho de 2017
O anjo no balanço (II) (de Alma Welt)
Anjo no balanço - painel lateral esquerdo do Tríptico dos Anjos da Alma, de Guilherme de Faria
O anjo no balanço (II) (de Alma Welt)
De minha vida breve fiz balanço,
Mas não comum, desses contábeis ou morais,
Mas daqueles a que a cada avanço
Corresponde um mergulho para trás.
Tentei levar na minha vida tudo junto,
O passado o presente e o futuro,
Este não como uma sombra atrás do muro
Mas como o auge de um apuro...
Em resumo, num balanço sou guria
Com aquela pura razão mesma de ser,
Que confere ao balançar sua poesia...
E aquele que me ver cobrando asa
Não se espante de um dia assim me ver,
Já que a tive e a perdi longe de casa...
.
15/07/2017
O anjo no balanço (II) (de Alma Welt)
De minha vida breve fiz balanço,
Mas não comum, desses contábeis ou morais,
Mas daqueles a que a cada avanço
Corresponde um mergulho para trás.
Tentei levar na minha vida tudo junto,
O passado o presente e o futuro,
Este não como uma sombra atrás do muro
Mas como o auge de um apuro...
Em resumo, num balanço sou guria
Com aquela pura razão mesma de ser,
Que confere ao balançar sua poesia...
E aquele que me ver cobrando asa
Não se espante de um dia assim me ver,
Já que a tive e a perdi longe de casa...
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15/07/2017
O Eco do Logos (de Alma Welt)
Da Poesia a sintonia fina
É difícil de manter, ou o seu foco.
Por isso mesmo eu pouco me desloco
Do centro rigoroso que a domina.
Por um quase nada ela se perde,
Ela, a palavra em sua essência,
Eco do Logos que um ou outro herde
Por dom que às vezes passa por demência.
Quando guria fiz meu primeiro verso
E como se o mostrasse ao universo,
Correndo pro meu pai eu fui mostrar
E ele sorriu, abraçou-me e me beijou.
Nada disse, mas do jeito que me olhou
Escreveria pra voltar àquele olhar...
.
15/07/207
É difícil de manter, ou o seu foco.
Por isso mesmo eu pouco me desloco
Do centro rigoroso que a domina.
Por um quase nada ela se perde,
Ela, a palavra em sua essência,
Eco do Logos que um ou outro herde
Por dom que às vezes passa por demência.
Quando guria fiz meu primeiro verso
E como se o mostrasse ao universo,
Correndo pro meu pai eu fui mostrar
E ele sorriu, abraçou-me e me beijou.
Nada disse, mas do jeito que me olhou
Escreveria pra voltar àquele olhar...
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15/07/207
Meus oito anos (de Alma Welt)
Me lembro de brincar na minha rua
Antes de mudar-me para a estância.
Estava no esplendor da minha infância,
Pr'um guri (eu tinha oito) fiquei nua...
Antes de mudar-me para a estância.
Estava no esplendor da minha infância,
Pr'um guri (eu tinha oito) fiquei nua...
Gostava dos patins de chave e roda
E dos carrinhos também, de rolimã,
Os guris os construíam, era moda,
E eles me chamavam de alemã...
E eu ali no meio deles, tão feliz,
Correndo, pegando e até brigando,
Quase perdendo a virgindade por um triz.
Meus oito anos, plenos de alegria
E do que está na raiz da minha poesia:
Um mistério de nudez, de vez em quando...
.
15/07/2017
E dos carrinhos também, de rolimã,
Os guris os construíam, era moda,
E eles me chamavam de alemã...
E eu ali no meio deles, tão feliz,
Correndo, pegando e até brigando,
Quase perdendo a virgindade por um triz.
Meus oito anos, plenos de alegria
E do que está na raiz da minha poesia:
Um mistério de nudez, de vez em quando...
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15/07/2017
sexta-feira, 14 de julho de 2017
O Tédio e a Alegria (de Alma Welt)
"Toda alegria quer eternidade..."
Lembro bem que assim falava Zaratustra,
Mas exige outrossim simplicidade
E uma certa inocência que a ilustra.
Mas como procurar a sapiência
E ao mesmo tempo inocência resguardar?
Lá estava o Fruto da Ciência,
Lindo, rubro, capcioso, a nos tentar...
Era uma armadilha preparada
E Deus bem contava com o tédio
Que mina a ordem toda da manada...
Ele mesmo inoculou-nos a inquietude
Para a qual só a Morte é Seu remédio,
E contra o qual lutei enquanto pude...
.
14/07/201
Lembro bem que assim falava Zaratustra,
Mas exige outrossim simplicidade
E uma certa inocência que a ilustra.
Mas como procurar a sapiência
E ao mesmo tempo inocência resguardar?
Lá estava o Fruto da Ciência,
Lindo, rubro, capcioso, a nos tentar...
Era uma armadilha preparada
E Deus bem contava com o tédio
Que mina a ordem toda da manada...
Ele mesmo inoculou-nos a inquietude
Para a qual só a Morte é Seu remédio,
E contra o qual lutei enquanto pude...
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14/07/201
quinta-feira, 13 de julho de 2017
Ó meus amados (de Alma Welt)
Ó meus amados, o que de mim esperam?
Já não tenho soluções e nem respostas,
Há muito abandonei também apostas
E nem jogo numa quina que me deram.
Conselhos? Tenho escrúpulos de dar.
Está furado o meu melhor palpite,
Vendê-los não é direito, nem pensar,
Sou barca a que falta um bom rebite...
E eu coço um pouco o cocoruto:
Então para que sirvo? (boa pergunta),
Quero dizer uma besteira mas reluto...
Amados meus, estamos todos à procura,
Quem encontrar primeiro a nós se junta
E então vamos conferir nossa loucura...
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13/07/2017
Já não tenho soluções e nem respostas,
Há muito abandonei também apostas
E nem jogo numa quina que me deram.
Conselhos? Tenho escrúpulos de dar.
Está furado o meu melhor palpite,
Vendê-los não é direito, nem pensar,
Sou barca a que falta um bom rebite...
E eu coço um pouco o cocoruto:
Então para que sirvo? (boa pergunta),
Quero dizer uma besteira mas reluto...
Amados meus, estamos todos à procura,
Quem encontrar primeiro a nós se junta
E então vamos conferir nossa loucura...
.
13/07/2017
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