Este espaço é destinado às diversas séries de sonetos da poetisa gaúcha Alma Welt, que, mais genéricas, não se enquadrem nos outros blogs da poetisa, de séries mais específicas, como os eróticos, os metafísicos, etc. (vide lista de seus blogs)
quinta-feira, 1 de dezembro de 2016
A origem dos meus versos (de Alma Welt)
Foi preciso uma razão para viver,
Este foi o meu problema a certa altura.
Não bastava o estar aí ou simples ser,
Perdida que estava minha candura.
Tive que me reinventar para durar
Porque já me esvaía em tolice,
Já que a vida era difícil de aturar
Sem varar o meu espelho feito Alice.
E abriu-se uma janela ou uma porta
Para mim quando escolhi escrever versos
Como fora o único que importa.
Tal seria meu legítimo absurdo,
Este, sim, criador de universos
Como a nona sinfonia para um surdo...
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01/12/2016
segunda-feira, 28 de novembro de 2016
A justiça do jogo ( de Alma Welt)
Quantas vezes entro em modo de desgosto
Contra este mundo injusto e desigual
Que parece ser no mínimo o oposto
De qualquer saber transcendental...
Mas então percebo meu orgulho
Que me cega para a grande sutileza
De um baralho de cartas sobre a mesa
Confundido com todo aquele entulho.
E passo a retirar carta por carta
E vejo como o mundo se desata
Em valetes, damas, reis e corações.
Não há pois injustiça neste jogo
Todos temos as mesmas opções
Entre o bem e o mal, sorte e malogro...
.
28/11/2016
Contra este mundo injusto e desigual
Que parece ser no mínimo o oposto
De qualquer saber transcendental...
Mas então percebo meu orgulho
Que me cega para a grande sutileza
De um baralho de cartas sobre a mesa
Confundido com todo aquele entulho.
E passo a retirar carta por carta
E vejo como o mundo se desata
Em valetes, damas, reis e corações.
Não há pois injustiça neste jogo
Todos temos as mesmas opções
Entre o bem e o mal, sorte e malogro...
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28/11/2016
O poker e a cronista (de Alma Welt)
Há quem no jogo se sinta confortável
E desses o savoir-faire eu admiro;
A cabeça erguida o humor estável,
O blefe nem altera o seu respiro.
Porque a vida é um poker de cassino
E não desses de uma mesa familiar.
Jogamos nossas fichas até acabar
E saímos da mesa ao som de um sino.
Mas eu me pus na vida um tanto à parte
Observando o jogo dos senhores,
Admirada, confesso, dessa arte...
Cronista arguta e "par la grâce de Dieu",
Descrevo o jogo, a esperar que Ele me dê
A entrada em Seus estreitos corredores.
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28/11/2016
E desses o savoir-faire eu admiro;
A cabeça erguida o humor estável,
O blefe nem altera o seu respiro.
Porque a vida é um poker de cassino
E não desses de uma mesa familiar.
Jogamos nossas fichas até acabar
E saímos da mesa ao som de um sino.
Mas eu me pus na vida um tanto à parte
Observando o jogo dos senhores,
Admirada, confesso, dessa arte...
Cronista arguta e "par la grâce de Dieu",
Descrevo o jogo, a esperar que Ele me dê
A entrada em Seus estreitos corredores.
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28/11/2016
domingo, 27 de novembro de 2016
A Biblioteca (de Alma Welt)
A biblioteca imensa de meu pai
Contém segredos que jamais desvendarei.
Um mistério ou um clima dali sai
Que de noite tenho um medo que nem sei...
Presumo que em algum tomo ali perdido
Está todo o segredo do Universo,
A julgar pelo saber reconhecido
Do finado, em poder sereno imerso.
Mas Matilde, minha ex-babá se irrita:
Quer fechar para sempre aquela sala
Acreditando ser a fonte da desdita.
E eu, balançando entre os extremos,
Entre o medo e o amor de desvendá-la,
A vida oculta, ignorada, que vivemos...
.
27/11/2016
Contém segredos que jamais desvendarei.
Um mistério ou um clima dali sai
Que de noite tenho um medo que nem sei...
Presumo que em algum tomo ali perdido
Está todo o segredo do Universo,
A julgar pelo saber reconhecido
Do finado, em poder sereno imerso.
Mas Matilde, minha ex-babá se irrita:
Quer fechar para sempre aquela sala
Acreditando ser a fonte da desdita.
E eu, balançando entre os extremos,
Entre o medo e o amor de desvendá-la,
A vida oculta, ignorada, que vivemos...
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27/11/2016
sexta-feira, 25 de novembro de 2016
Viva a Vida (de Alma Welt)
Quando guria assisti a um poente
Tão belo, glorioso e triunfal,
Que eu quis ser levada, de repente,
Pelos anjos, daqui do meu quintal.
E exclamei: "Senhor, já estou pronta!
Levai-me daqui para o teu reino...
O pampa é belo, não tenho nada contra,
Mas sei que é apenas vosso treino."
"As planícies do Reino são douradas
E mais contêm tons róseos e vermelho,
Por certo para eternas cavalgadas..."
E Deus me respondeu: "Pare com isso,
Alma inquieta, e aceite meu conselho,
Viva a vida, que é o nosso compromisso..."
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25/11/2016
Tão belo, glorioso e triunfal,
Que eu quis ser levada, de repente,
Pelos anjos, daqui do meu quintal.
E exclamei: "Senhor, já estou pronta!
Levai-me daqui para o teu reino...
O pampa é belo, não tenho nada contra,
Mas sei que é apenas vosso treino."
"As planícies do Reino são douradas
E mais contêm tons róseos e vermelho,
Por certo para eternas cavalgadas..."
E Deus me respondeu: "Pare com isso,
Alma inquieta, e aceite meu conselho,
Viva a vida, que é o nosso compromisso..."
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25/11/2016
quarta-feira, 23 de novembro de 2016
Palavras ao Senhor (de Alma Welt)
Agradecida ao mundo e ao destino
Por tantos privilégios de nascença,
Percebo um território muito fino
Entre minha fé e a descrença.
Senhor, não me leve tão a sério.
É coisa de poeta entediado
Se minha alma corrompe o teu Império,
Flores do mal colhendo em pleno prado.
Quem sou eu pra questionar a Lei
Se a morte é tua suprema decisão
Para o homem e toda a sua grei?
Ficarei, então, quietinha doravante,
Sem mais fazer marola ou confusão.
Sou aquela da esquerda, ali, adiante...
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23/11/2016
Por tantos privilégios de nascença,
Percebo um território muito fino
Entre minha fé e a descrença.
Senhor, não me leve tão a sério.
É coisa de poeta entediado
Se minha alma corrompe o teu Império,
Flores do mal colhendo em pleno prado.
Quem sou eu pra questionar a Lei
Se a morte é tua suprema decisão
Para o homem e toda a sua grei?
Ficarei, então, quietinha doravante,
Sem mais fazer marola ou confusão.
Sou aquela da esquerda, ali, adiante...
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23/11/2016
terça-feira, 22 de novembro de 2016
Calipso (de Alma Welt)
Odisseu (Ulisses) e Calipso - Arnold Böcklin, 1883
Calipso (de Alma Welt)
Admiro quem cultiva o seu jardim
E mantém sempre vivas as suas flores
Como se nada ou ninguém tivesse fim
E tudo em seus lugares e sem dores.
Tais pessoas sem o senso de tragédia,
Têm motivos para crer que a vida é bela
Apenas como flor de enciclopédia
Que num verbete dá tudo o que é dela.
Quanto a mim, tão atenta à decadência
Observo o murchar das coisas belas
E cada ruga nova em sua essência.
E sei que a vida é breve e nos espera
Como Ulisses ansiando alçar as velas
E abandonar uma eterna primavera...
.
22/11/2016
Calipso (de Alma Welt)
Admiro quem cultiva o seu jardim
E mantém sempre vivas as suas flores
Como se nada ou ninguém tivesse fim
E tudo em seus lugares e sem dores.
Tais pessoas sem o senso de tragédia,
Têm motivos para crer que a vida é bela
Apenas como flor de enciclopédia
Que num verbete dá tudo o que é dela.
Quanto a mim, tão atenta à decadência
Observo o murchar das coisas belas
E cada ruga nova em sua essência.
E sei que a vida é breve e nos espera
Como Ulisses ansiando alçar as velas
E abandonar uma eterna primavera...
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22/11/2016
Capitão, meu capitão (de Alma Welt)
Nossa nave, já se vê, está furada
Fazendo água que não é de se beber.
O capitão se debruça na amurada
E tem visíveis ânsias de descer.
Capitão, meu capitão, espero ordens!
Quase todos nesta barca têm família,
Antes que comecem as desordens
Uma palavra, capitão, ou uma ilha...
Entretanto não há consolo nesta vida
E ninguém pode descer antes da hora,
Quer dizer: antes da barca submergida.
E me pergunto como foi que me meti
Nesta barca se daqui nem fui embora
E navegando em mim já me perdi...
.
22/11/2016
Fazendo água que não é de se beber.
O capitão se debruça na amurada
E tem visíveis ânsias de descer.
Capitão, meu capitão, espero ordens!
Quase todos nesta barca têm família,
Antes que comecem as desordens
Uma palavra, capitão, ou uma ilha...
Entretanto não há consolo nesta vida
E ninguém pode descer antes da hora,
Quer dizer: antes da barca submergida.
E me pergunto como foi que me meti
Nesta barca se daqui nem fui embora
E navegando em mim já me perdi...
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22/11/2016
segunda-feira, 21 de novembro de 2016
Em berço de ouro (de Alma Welt)
Ninguém vem ao mundo por acaso
Cada alma é única e imortal,
O milagre é não haver igual
Ou réplica pra produzir atraso.
Dizia o padre na nossa capelinha
Que eu me lembro em minha infância
E nunca me senti depois sozinha
Nesta amplidão aqui da estância
Pois me falava de um grande companheiro,
Um herói daqueles destemidos
Que gostava até de gente com dinheiro.
E se há quem por nós dê sua vida,
Todos fomos por ele escolhidos
Mesmo eu que em berço de ouro fui nascida...
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21/11/2016
Cada alma é única e imortal,
O milagre é não haver igual
Ou réplica pra produzir atraso.
Dizia o padre na nossa capelinha
Que eu me lembro em minha infância
E nunca me senti depois sozinha
Nesta amplidão aqui da estância
Pois me falava de um grande companheiro,
Um herói daqueles destemidos
Que gostava até de gente com dinheiro.
E se há quem por nós dê sua vida,
Todos fomos por ele escolhidos
Mesmo eu que em berço de ouro fui nascida...
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21/11/2016
O salto (de Alma Welt)
O mundo humano é caos, não ordenado
Malgrado nossa profusão de regras,
Um milhão de leis como um cercado
Tentando coibir sem dó nem tréguas.
Mas não adianta. Em nós a rebeldia
Do anjo maldito é nossa herança.
Procuramos uma brecha, noite e dia
Com nossa teimosia de criança.
Porque sua existência nos humilha
Queria ver um mundo sem presídios,
Mesmo um único que fosse, como ilha.
Sonho ver a humanidade dar um salto,
Com os nossos melhores subsídios,
Um só degrau acima, para o alto...
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21/11/2016
Malgrado nossa profusão de regras,
Um milhão de leis como um cercado
Tentando coibir sem dó nem tréguas.
Mas não adianta. Em nós a rebeldia
Do anjo maldito é nossa herança.
Procuramos uma brecha, noite e dia
Com nossa teimosia de criança.
Porque sua existência nos humilha
Queria ver um mundo sem presídios,
Mesmo um único que fosse, como ilha.
Sonho ver a humanidade dar um salto,
Com os nossos melhores subsídios,
Um só degrau acima, para o alto...
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21/11/2016
Todo mundo (de Alma Welt)
Todo mal do mundo me alcança
E de algum modo me perpassa
Conquanto me mantenha pura e mansa,
Nunca alheia ao que ao redor se passa.
Não dá pra ser feliz, me digo às vezes,
Neste mundo repleto de injustiça.
Não distingo uma rês entre outras reses
Nem um pecador dentro da missa.
Ou todos nos salvamos ou ninguém,
A grosso modo, assim, lance geral,
A humanidade mesmo sendo desigual.
Pois de perto, como dói o ser humano!
Que temor, que olhar aflito de refém
Vejo em mim, em nós, se não me engano...
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21/11/2016
E de algum modo me perpassa
Conquanto me mantenha pura e mansa,
Nunca alheia ao que ao redor se passa.
Não dá pra ser feliz, me digo às vezes,
Neste mundo repleto de injustiça.
Não distingo uma rês entre outras reses
Nem um pecador dentro da missa.
Ou todos nos salvamos ou ninguém,
A grosso modo, assim, lance geral,
A humanidade mesmo sendo desigual.
Pois de perto, como dói o ser humano!
Que temor, que olhar aflito de refém
Vejo em mim, em nós, se não me engano...
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21/11/2016
domingo, 20 de novembro de 2016
Minha Língua (de Alma Welt)
Bem-te-vi
Minha Língua (de Alma Welt)
A minha pátria a si mesma é tão fiel
Que fala uma língua que é só dela
Em meio aos redutos de Gardel
Que a cercam, vivaz, inculta e bela.
Adoro a minha língua e a acalento,
Muito próxima de suas mesmas fontes,
Não com seu chiado trás-os-montes,
Mas com a fluidez sonora ao vento...
E acordo pronta pro soneto da manhã,
De Camões filha dileta e temporã
Para honrá-lo como um pai que não perdi.
E enquanto o gringo nórdico a invade,
O denuncio como um doce bem-te-vi
E conclamo minhas falanges de saudade...
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20/11/2016
Minha Língua (de Alma Welt)
A minha pátria a si mesma é tão fiel
Que fala uma língua que é só dela
Em meio aos redutos de Gardel
Que a cercam, vivaz, inculta e bela.
Adoro a minha língua e a acalento,
Muito próxima de suas mesmas fontes,
Não com seu chiado trás-os-montes,
Mas com a fluidez sonora ao vento...
E acordo pronta pro soneto da manhã,
De Camões filha dileta e temporã
Para honrá-lo como um pai que não perdi.
E enquanto o gringo nórdico a invade,
O denuncio como um doce bem-te-vi
E conclamo minhas falanges de saudade...
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20/11/2016
sábado, 19 de novembro de 2016
Viver a Vida (de Alma Welt)
A queda dos anjos rebeldes - Pieter Bruegel, o Velho
Viver a Vida (de Alma Welt)
Viver a vida, simplesmente, já é dor
Para uma alma, assim, inconformada.
O mundo humano, no geral, é um horror,
Nascemos sob a égide da espada...
Somos fruto da rebelião dos anjos
Que foram jogados sobre a terra,
Vencidos pela fúria dos arcanjos
E por isso nossa natureza aberra.
Assim penso eu quando estou triste
E me deixo levar por velhos mitos
Que a alma ancestral lembrar insiste.
Mas se acordo alegre, rodopio
Como os anjos também em velhos ritos
Em torno de meu Deus perfeito... e rio!
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19/11/2016
Viver a Vida (de Alma Welt)
Viver a vida, simplesmente, já é dor
Para uma alma, assim, inconformada.
O mundo humano, no geral, é um horror,
Nascemos sob a égide da espada...
Somos fruto da rebelião dos anjos
Que foram jogados sobre a terra,
Vencidos pela fúria dos arcanjos
E por isso nossa natureza aberra.
Assim penso eu quando estou triste
E me deixo levar por velhos mitos
Que a alma ancestral lembrar insiste.
Mas se acordo alegre, rodopio
Como os anjos também em velhos ritos
Em torno de meu Deus perfeito... e rio!
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19/11/2016
sexta-feira, 18 de novembro de 2016
Entre o Caos e a Harmonia (de Alma Welt)
A vida não é senão constante luta
Entre a tristeza e a alegria,
O mal e o bem em vã disputa
Entre o escuro caos e a harmonia.
Há os que não percebem esse combate
E flanem pelo mundo como um prado
Todo florido e macio, perolado
Pelas gotas do orvalho em toda parte...
Felizes esses enquanto a ilusão dura
E espero que não caiam das nuvens
E mantenham a alma sempre pura.
Mas eu percebo sua senda muito estreita
Como os trilhos perfeitos desses trens
Sobre trêmulos desertos de maleita...
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18/11/2016
Entre a tristeza e a alegria,
O mal e o bem em vã disputa
Entre o escuro caos e a harmonia.
Há os que não percebem esse combate
E flanem pelo mundo como um prado
Todo florido e macio, perolado
Pelas gotas do orvalho em toda parte...
Felizes esses enquanto a ilusão dura
E espero que não caiam das nuvens
E mantenham a alma sempre pura.
Mas eu percebo sua senda muito estreita
Como os trilhos perfeitos desses trens
Sobre trêmulos desertos de maleita...
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18/11/2016
quinta-feira, 17 de novembro de 2016
Alma Galatea (de Alma Welt)
Pygmalião e Galatea - Jean-Léon Gérôme
Alma Galatea (de Alma Welt)
Na vida somos sempre a gente mesma
Malgrado nossa louca fantasia
De uma poetisa ou abantesma
Que criamos para efeito de poesia.
Me refiro a um poeta semilouco
Que me deu vida e explora-me demais.
E a cada dia recorre a mim um pouco
Para se sentir consigo mesmo em paz.
Mas não posso me queixar, que me deu vida,
E qualquer dia diante dele me apresento
Em carne e osso e quero ver como me lida...
Sou bela e diante dele me desnudo,
Galatea esculpida pelo vento
De uma imaginação que pode tudo...
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17/11/2016
Alma Galatea (de Alma Welt)
Na vida somos sempre a gente mesma
Malgrado nossa louca fantasia
De uma poetisa ou abantesma
Que criamos para efeito de poesia.
Me refiro a um poeta semilouco
Que me deu vida e explora-me demais.
E a cada dia recorre a mim um pouco
Para se sentir consigo mesmo em paz.
Mas não posso me queixar, que me deu vida,
E qualquer dia diante dele me apresento
Em carne e osso e quero ver como me lida...
Sou bela e diante dele me desnudo,
Galatea esculpida pelo vento
De uma imaginação que pode tudo...
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17/11/2016
Lambe-Lambe (de Alma Welt)
Lambe-lambe e Leila Diniz
Lambe-Lambe (de Alma Welt)
Morremos um pouco a cada morte
Dos bons que incorporamos porventura
Mas também de alguns de menor porte,
Um vizinho ou uma doce criatura
Que cruzava conosco na calçada
Com um bom dia, boa tarde, como vais,
Fazendo comentários sobre nada,
Em geral o tempo, a chuva, nada mais...
Lembraremos de todos, num segundo,
Dos que passaram por nós gratuitamente
Só por fazerem parte deste mundo.
Sua comum humanidade nos foi grata,
Sob um pano preto em nossa mente,
Lambe-lambe que, a vida só, retrata...
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17/11/2016
Lambe-Lambe (de Alma Welt)
Morremos um pouco a cada morte
Dos bons que incorporamos porventura
Mas também de alguns de menor porte,
Um vizinho ou uma doce criatura
Que cruzava conosco na calçada
Com um bom dia, boa tarde, como vais,
Fazendo comentários sobre nada,
Em geral o tempo, a chuva, nada mais...
Lembraremos de todos, num segundo,
Dos que passaram por nós gratuitamente
Só por fazerem parte deste mundo.
Sua comum humanidade nos foi grata,
Sob um pano preto em nossa mente,
Lambe-lambe que, a vida só, retrata...
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17/11/2016
quarta-feira, 16 de novembro de 2016
À procura dos deuses (de Alma Welt)
Zeus e Tétis- de Jean-Baptiste-Dominique Ingres
A crucificação de Cristo - gravura (água-forte) de Rembrandt
À procura dos deuses (de Alma Welt)
Ao próprio Zeus a Vida é um desafio
Já que é o fogo que lhe foi roubado *
E anima nosso corpo fulminado *
E a alma que recolhe o próprio fio
Para voltar depressa, se possível,
Ao seio de um feroz rejeitador
Que temos de ganhar em outro nível
Enquanto o procuramos, quanta dor!
Dizia o meu pai, que amava os gregos
E achava que os deuses estão vivos
E que os bons cristãos é que estão cegos.
Mas na procura dos deuses, bem no meio,
Dei com um que era tão bom que sob crivos
Acolheu-nos, uns e outros, no seu seio...
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16/11/2016
Notas
*Já que é o fogo que lhe foi roubado/
*e anima nosso corpo fulminado - Alma Welt está se referindo ao mito órfico* da criação do homem, que remonta a um episódio épico no Olimpo: Os Titãs, raça de gigantes, se rebelou contra Zeus e houve um batalha imensa (Titanomaquia) entre os deuses e eles. Durante a batalha osTitãs estraçalharam e devoraram Dionisos-criança. Mas, afinal vencidos, os Titãs foram fulminados pelos raios de Zeus e seus corpos lançados à Terra. Mas um dos Titãs rebelados, Prometeu, roubou o fogo dos deuses e o doou ao corpo titânico animando Dionisos (a alma ) nele encerrado como num cárcere. Assim o homem surgido deve encarnar por dez ciclos de mil anos antes da alma se purificar e escapando do corpo pecaminoso titânico voar até "a ambicionada coroa" (o ponto mais alto do Empíreo, a morada dos deuses e das almas purificadas.
*mito órfico - O Orfismo foi um religião iniciática grega (relacionada aos Mistérios de Elêusis) de caráter reencarnacionista, anterior ao século VII A.C, e da qual Pitágoras foi um expoente. Essa religião diferia da Mitologia tradicional e tinha sua própria Teogonia, diferente da de Hesíodo que colocava o Caos e a Noite como princípios teogônicos. Na teogonia órfica de Jeronimo e Helânico, o princípio (archè) era Cronos (o Tempo) que se uniu à Ananke ( a Necessidade) para gerar uma tríplice prole: o Éter úmido, o Caos nebuloso e o Érebo tenebroso. A seguir Cronos inseriu no Éter o "Ovo Primogênito", do qual nasceu Zeus, o princípio ordenador, que geraria os "protágonos" (os outros deuses).
A crucificação de Cristo - gravura (água-forte) de Rembrandt
À procura dos deuses (de Alma Welt)
Ao próprio Zeus a Vida é um desafio
Já que é o fogo que lhe foi roubado *
E anima nosso corpo fulminado *
E a alma que recolhe o próprio fio
Para voltar depressa, se possível,
Ao seio de um feroz rejeitador
Que temos de ganhar em outro nível
Enquanto o procuramos, quanta dor!
Dizia o meu pai, que amava os gregos
E achava que os deuses estão vivos
E que os bons cristãos é que estão cegos.
Mas na procura dos deuses, bem no meio,
Dei com um que era tão bom que sob crivos
Acolheu-nos, uns e outros, no seu seio...
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16/11/2016
Notas
*Já que é o fogo que lhe foi roubado/
*e anima nosso corpo fulminado - Alma Welt está se referindo ao mito órfico* da criação do homem, que remonta a um episódio épico no Olimpo: Os Titãs, raça de gigantes, se rebelou contra Zeus e houve um batalha imensa (Titanomaquia) entre os deuses e eles. Durante a batalha osTitãs estraçalharam e devoraram Dionisos-criança. Mas, afinal vencidos, os Titãs foram fulminados pelos raios de Zeus e seus corpos lançados à Terra. Mas um dos Titãs rebelados, Prometeu, roubou o fogo dos deuses e o doou ao corpo titânico animando Dionisos (a alma ) nele encerrado como num cárcere. Assim o homem surgido deve encarnar por dez ciclos de mil anos antes da alma se purificar e escapando do corpo pecaminoso titânico voar até "a ambicionada coroa" (o ponto mais alto do Empíreo, a morada dos deuses e das almas purificadas.
*mito órfico - O Orfismo foi um religião iniciática grega (relacionada aos Mistérios de Elêusis) de caráter reencarnacionista, anterior ao século VII A.C, e da qual Pitágoras foi um expoente. Essa religião diferia da Mitologia tradicional e tinha sua própria Teogonia, diferente da de Hesíodo que colocava o Caos e a Noite como princípios teogônicos. Na teogonia órfica de Jeronimo e Helânico, o princípio (archè) era Cronos (o Tempo) que se uniu à Ananke ( a Necessidade) para gerar uma tríplice prole: o Éter úmido, o Caos nebuloso e o Érebo tenebroso. A seguir Cronos inseriu no Éter o "Ovo Primogênito", do qual nasceu Zeus, o princípio ordenador, que geraria os "protágonos" (os outros deuses).
terça-feira, 15 de novembro de 2016
Fortuna Imperatrix Mundi (de Alma Welt)
Fortuna Imperatrix Mundi (de Alma Welt)
"A fortuna é a imperatriz do mundo",
Assim estava escrito numa carta
De detalhes ilustrados muito farta,
Certamente de sentido bem profundo.
Fortuna é tão somente o nosso fado,
Quer dizer, o destino que nos cabe
E roda nossa vida com enfado
Conquanto enganá-la ninguém sabe.
Grito alto: "Serei livre! (pra que ecoe)
Ninguém vai reger o meu destino
E Vossa Majestade me perdoe..."
"No Pampa o Minuano é meu rei Mino,
Nem mesmo ele sobre mim terá poder,
Nem que eu gele na coxilha até morrer!..."
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15/11/2016
Depois da tempestade ou a Nau dos insensatos (de Alma Welt)
Ship of Fools - Hieronimus Bosch e FatCatArt
Depois da tempestade (ou A Nau dos insensatos)
Depois da tempestade (ou A Nau dos insensatos)
(de Alma Welt)
Depois da tempestade a calmaria...
De nós, metade foi varrida para o mar,
A nave está mais leve, mais vazia,
Nós que sobramos não iremos mais rezar.
"Quem morreu, morreu!", grita o piloto
"Tratem de escovar bem o convés!"
"O capitão está lá embaixo, morto,
Atravessado em sua cama, de viés..."
"Nossos planos se apagaram com a bruma.
Agora sou eu que aqui comando
E não iremos mais a parte alguma."
"Já que isto é nave louca e não convento,
Sem perguntar o como o onde e o quando,
Rumemos para o Nada, a barlavento!..."
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15/11/2016
Depois da tempestade a calmaria...
De nós, metade foi varrida para o mar,
A nave está mais leve, mais vazia,
Nós que sobramos não iremos mais rezar.
"Quem morreu, morreu!", grita o piloto
"Tratem de escovar bem o convés!"
"O capitão está lá embaixo, morto,
Atravessado em sua cama, de viés..."
"Nossos planos se apagaram com a bruma.
Agora sou eu que aqui comando
E não iremos mais a parte alguma."
"Já que isto é nave louca e não convento,
Sem perguntar o como o onde e o quando,
Rumemos para o Nada, a barlavento!..."
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15/11/2016
segunda-feira, 14 de novembro de 2016
O Duplo da Alma (de Alma Welt)
O duplo da Alma - óleo s/ tela de Guilherme de Faria, 2014
O Duplo da Alma (de Alma Welt)
Estou sempre adiante uns poucos passos
E me sigo atrás alerta com meu cão;
Meu duplo não está aqui em vão
E mantém comigo estreitos laços...
Báh, ela é a poetisa mesma em mim,
Entidade suspeita e perigosa
Com seu noturno cheiro de jasmim
E de dia exalando a pura rosa.
Eu a sigo fiel, como criada
Sempre esperando por ela ser amada
E que me faça uns versos pelo menos...
Mas ela a si mesma pinta e borda,
Deixando-me na sombra, de somenos,
Que só estou aqui pra lhe dar corda...
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14/11/2016
O Duplo da Alma (de Alma Welt)
Estou sempre adiante uns poucos passos
E me sigo atrás alerta com meu cão;
Meu duplo não está aqui em vão
E mantém comigo estreitos laços...
Báh, ela é a poetisa mesma em mim,
Entidade suspeita e perigosa
Com seu noturno cheiro de jasmim
E de dia exalando a pura rosa.
Eu a sigo fiel, como criada
Sempre esperando por ela ser amada
E que me faça uns versos pelo menos...
Mas ela a si mesma pinta e borda,
Deixando-me na sombra, de somenos,
Que só estou aqui pra lhe dar corda...
.
14/11/2016
sábado, 12 de novembro de 2016
O crivo (de Alma Welt)
Meu pai me disse um dia, enternecido:
"Foste tomada, Alma, por Poesia,
E a verás onde antes não havia,
E o mundo ganhará novo sentido..."
Mas minha mãe, consternada, ajuntou:
"Pobre Alma, agora estás perdida!
Não terás paz nesse mundo que mudou
Somente em tua mente enlouquecida."
"Não casarás, não terás filhos, secarás,
De ti os homens bons se apartarão,
E a solidão será a terra que herdarás..."
Assim, entre anátema e incentivo
Contando apenas com meu próprio crivo,
Eu seguiria, como os seres todos vão...
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12/11/2016
"Foste tomada, Alma, por Poesia,
E a verás onde antes não havia,
E o mundo ganhará novo sentido..."
Mas minha mãe, consternada, ajuntou:
"Pobre Alma, agora estás perdida!
Não terás paz nesse mundo que mudou
Somente em tua mente enlouquecida."
"Não casarás, não terás filhos, secarás,
De ti os homens bons se apartarão,
E a solidão será a terra que herdarás..."
Assim, entre anátema e incentivo
Contando apenas com meu próprio crivo,
Eu seguiria, como os seres todos vão...
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12/11/2016
sexta-feira, 11 de novembro de 2016
Aos que morrem (de Alma Welt)
Nossos pares no mundo vão morrendo,
Nossas Musas com eles também vão;
Vão-se os dedos com os anéis, doendo,
Vão-se os dentes, os cabelos, e a ilusão.
"Queres viver pra sempre?" Diz o gringo
Apontando a arma para um tolo.
E de repente, nesse instante, claro, bingo!
Somos nós ou sou eu sempre nesse rolo...
Ah! "Jovem para sempre", na canção...
Quanta ilusão em nós plantada!
Nada "vai ficar bem," garanto, nada!
A Terra roda às tontas no universo,
Na minha palma ainda gira o meu pião:
O mundo vive num imenso sonho imerso...
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11/11/2016
Nossas Musas com eles também vão;
Vão-se os dedos com os anéis, doendo,
Vão-se os dentes, os cabelos, e a ilusão.
"Queres viver pra sempre?" Diz o gringo
Apontando a arma para um tolo.
E de repente, nesse instante, claro, bingo!
Somos nós ou sou eu sempre nesse rolo...
Ah! "Jovem para sempre", na canção...
Quanta ilusão em nós plantada!
Nada "vai ficar bem," garanto, nada!
A Terra roda às tontas no universo,
Na minha palma ainda gira o meu pião:
O mundo vive num imenso sonho imerso...
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11/11/2016
quinta-feira, 10 de novembro de 2016
A las cinco de la tarde * (de Alma Welt)
Vivemos na iminência da desgraça,
Eis porque viver é um privilégio
A cada dia o fio mais se esgarça
Desde aqueles belos dias do colégio...
Não sabíamos que o tempo era contado
E pensávamos viver eternamente;
Cada nova experiência era um achado,
E o ponteiro caminhava lentamente
Até mesmo para a hora da saída
"A las cinco de la tarde", auspiciosa,
Quando então recomeçava a vida...
Fluentes mas cheias de "agoras"
Que a memória nossa ainda goza,
Como eram belas, então, as novas horas!...
.
10/11/2016
Nota
* A las cinco de la tarde verso famoso do poema "La cogida y la muerte", do livro "Llanto por Ignacio Sanchez Mejias", de Frederico Garcia Lorca. No poema de Lorca essa é a horas sinistra e fatal da morte do toureiro famoso. Aqui no poema da Alma é a auspiciosa hora do fim da jornada de cada dia das aulas do ginásio, quando então, para ela a verdadeira vida começava...
Eis porque viver é um privilégio
A cada dia o fio mais se esgarça
Desde aqueles belos dias do colégio...
Não sabíamos que o tempo era contado
E pensávamos viver eternamente;
Cada nova experiência era um achado,
E o ponteiro caminhava lentamente
Até mesmo para a hora da saída
"A las cinco de la tarde", auspiciosa,
Quando então recomeçava a vida...
Fluentes mas cheias de "agoras"
Que a memória nossa ainda goza,
Como eram belas, então, as novas horas!...
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10/11/2016
Nota
* A las cinco de la tarde verso famoso do poema "La cogida y la muerte", do livro "Llanto por Ignacio Sanchez Mejias", de Frederico Garcia Lorca. No poema de Lorca essa é a horas sinistra e fatal da morte do toureiro famoso. Aqui no poema da Alma é a auspiciosa hora do fim da jornada de cada dia das aulas do ginásio, quando então, para ela a verdadeira vida começava...
terça-feira, 8 de novembro de 2016
O Armário (de Alma Welt)
"Manter dignidade é necessário
Independente de alegria ou dor;
A coragem pra sair do armário
É a mesma para preservar o amor."
Nossa professora discorria assim
No ginásio, tão cercada de sorrisos
Das gurias, flores tontas de jardim,
Ratinhos sem coragem para os guizos.
Mas eu fui a única a abrir a porta
Em juízo diante de uma promotora
Feroz, que só queria vê-la morta...
Mais de uma caímos em seus braços,
E quão bela era a nossa professora
Antes de reduzirem-na a pedaços!...
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08/11/2016
segunda-feira, 7 de novembro de 2016
A Terra do Engano (de Alma Welt)
Tão belo quão difícil é estar vivo,
Por certo não é tarefa pra amador,
Passar pelo funil e pelo crivo,
Atravessar a dor e o Não, do Bojador. *
Como os nossos antigos navegantes
(também tenho sangue açoriano), *
Por mares navegados nunca dantes *
Vir parar numa terra só de Engano...
Como é dúbia a Terra dos Prazeres
E do ouro de tolo, tão mesquinho *
Dos que refundam terra que não é deles! *
E o saque continua à revelia
De um povo herói cobrado, pobrezinho, *
Com altos juros ao sol do meio-dia...
.
07/11/2016
Notas
* Atravessar a dor e o Não, do Bojador. - Alusão ao verso do poema Mar Português do livro Mensagem de Fernando Pessoa: "Quem quere passar além do Bojador/ Tem que passar além da dor ". A dor e o Não* - alusão ao Cabo Não, no noroeste da Africa, no Marrocos, limite conhecido dos primeiros navegadores portugueses antes de chegar ao cabo Bojador, para além do qual começava o desconhecido, o Mare Tenebrum, Mar Tenebroso...
*também tenho sangue açoriano - A mãe da Alma Welt, Ana Morgado, era neta de açorianos, emigrados para Santa Catarina.
*Por mares navegados nunca dantes - simples inversão do verso de Camões no Lusíadas: "Por mares nunca dantes navegados.
*... ouro de tolo, tão mesquinho - o minério dourado chamado "pirita", também conhecido como "ouro de tolo", que muitas vezes engana mineradores inexperientes.
*Dos que refundam terra que não é deles - alusão à atitude dos "descobridores", que vinham e "fundavam" terras já povoadas a milênios.
"De um povo herói cobrado, pobrezinho - trocadilho com o verso do Hino Nacional Brasileiro: "de um povo heroico o brado retumbante... "
Por certo não é tarefa pra amador,
Passar pelo funil e pelo crivo,
Atravessar a dor e o Não, do Bojador. *
Como os nossos antigos navegantes
(também tenho sangue açoriano), *
Por mares navegados nunca dantes *
Vir parar numa terra só de Engano...
Como é dúbia a Terra dos Prazeres
E do ouro de tolo, tão mesquinho *
Dos que refundam terra que não é deles! *
E o saque continua à revelia
De um povo herói cobrado, pobrezinho, *
Com altos juros ao sol do meio-dia...
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07/11/2016
Notas
* Atravessar a dor e o Não, do Bojador. - Alusão ao verso do poema Mar Português do livro Mensagem de Fernando Pessoa: "Quem quere passar além do Bojador/ Tem que passar além da dor ". A dor e o Não* - alusão ao Cabo Não, no noroeste da Africa, no Marrocos, limite conhecido dos primeiros navegadores portugueses antes de chegar ao cabo Bojador, para além do qual começava o desconhecido, o Mare Tenebrum, Mar Tenebroso...
*também tenho sangue açoriano - A mãe da Alma Welt, Ana Morgado, era neta de açorianos, emigrados para Santa Catarina.
*Por mares navegados nunca dantes - simples inversão do verso de Camões no Lusíadas: "Por mares nunca dantes navegados.
*... ouro de tolo, tão mesquinho - o minério dourado chamado "pirita", também conhecido como "ouro de tolo", que muitas vezes engana mineradores inexperientes.
*Dos que refundam terra que não é deles - alusão à atitude dos "descobridores", que vinham e "fundavam" terras já povoadas a milênios.
"De um povo herói cobrado, pobrezinho - trocadilho com o verso do Hino Nacional Brasileiro: "de um povo heroico o brado retumbante... "
sábado, 5 de novembro de 2016
Prece da Alma (de Alma Welt)
Senhor Deus, poupai-me de morrer,
Fui gerada pelos versos de sonetos,
E, bem sei, nasci longe dos guetos,
Ruiva e bela sem nem mesmo merecer...
Sendo eu só poesia, não apagai
A minha nítida mas frágil realidade
E deixai-me em ao menos um hai kai
Que me dê alguma vã posteridade!
Sou tênue, diáfana, dependente
Do poeta em que habito docemente
Enquanto ele for puro e fiel...
Mas se me apagares, só o que temo
É que morro não apenas no papel,
Morre o rio em que navego e remo...
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05/11/2016
Fui gerada pelos versos de sonetos,
E, bem sei, nasci longe dos guetos,
Ruiva e bela sem nem mesmo merecer...
Sendo eu só poesia, não apagai
A minha nítida mas frágil realidade
E deixai-me em ao menos um hai kai
Que me dê alguma vã posteridade!
Sou tênue, diáfana, dependente
Do poeta em que habito docemente
Enquanto ele for puro e fiel...
Mas se me apagares, só o que temo
É que morro não apenas no papel,
Morre o rio em que navego e remo...
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05/11/2016
O Desassossego (de Alma Welt)
Adão e Eva - de Henry Fuselli
O Desassossego (de Alma Welt)
O desassossego move o homem,
Bem mais que a detratada ambição,
Diante da libido as contas somem
E o ouro desempenha outra função.
Dourados sonhos, jóias e cabelos,
Ainda mantêm a antiga cotação
E o homem, há muito, pra obtê-los
Se debate sem escrúpulo e sem noção.
O prazer rege o mundo, antiga face
De Lúcifer, o eterno descontente,
Sem que novos descaminhos ele trace.
Pobre homem escravo do desejo
Desde quando reprimido de repente,
Sem tempo nem pro seu primeiro beijo!
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05/11/2016
A Fera na Selva (de Alma Welt)
A beleza da vida é uma escolha,
Cada um que faça a sua parte,
Ervas más ou as belas rosas colha
Conforme sua inclinação e arte.
Bem sei que a rigor o mundo é mau
Mas pode ser domado em nosso âmbito
Como um leão criado no quintal
Se falsa rima for o mundo que eu habito.
Mas não... Prefiro a fera em sua selva
E não preciso viajar pra ver o bicho,
E pôr meus pobres passos noutra relva.
Interessa é o princípio, a liberdade
Que cada um desfruta no seu nicho,
Feroz é quem o espaço alheio invade...
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05/11/2016
Cada um que faça a sua parte,
Ervas más ou as belas rosas colha
Conforme sua inclinação e arte.
Bem sei que a rigor o mundo é mau
Mas pode ser domado em nosso âmbito
Como um leão criado no quintal
Se falsa rima for o mundo que eu habito.
Mas não... Prefiro a fera em sua selva
E não preciso viajar pra ver o bicho,
E pôr meus pobres passos noutra relva.
Interessa é o princípio, a liberdade
Que cada um desfruta no seu nicho,
Feroz é quem o espaço alheio invade...
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05/11/2016
Os aventureiros (de Alma Welt)
Depois que rodei o mundo um pouco,
Voltei pra casa e aqui fiquei a esperar
Que os amigos com seu sonho louco,
Todos também voltassem para o lar.
Vinham ecos (os anos se passaram)
De algumas suas façanhas e fracassos
E poucos, na verdade, retornaram
Para conferirmos nossos passos.
Mas um deles disse: "O mundo é vasto,
Maior que nossos sonhos de grandeza
E o nosso melhor fôlego foi gasto..."
"Alma, te vimos lá do alto do Himalaia,
Nos esperavas aqui sentada à mesa,
E havias posto a tua melhor saia..."
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05/11/2016
Voltei pra casa e aqui fiquei a esperar
Que os amigos com seu sonho louco,
Todos também voltassem para o lar.
Vinham ecos (os anos se passaram)
De algumas suas façanhas e fracassos
E poucos, na verdade, retornaram
Para conferirmos nossos passos.
Mas um deles disse: "O mundo é vasto,
Maior que nossos sonhos de grandeza
E o nosso melhor fôlego foi gasto..."
"Alma, te vimos lá do alto do Himalaia,
Nos esperavas aqui sentada à mesa,
E havias posto a tua melhor saia..."
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05/11/2016
sexta-feira, 4 de novembro de 2016
O horror do mundo (de Alma Welt)
Quantas vezes vejo o horror do mundo,
E somente o vejo assim e nada mais.
E então não há como ir mais fundo
Menos ainda como, assim, voltar atrás...
E grito para o mundo: És pestilento!
Tua bela natureza mal consola!
És, isto sim, como o tal pão bolorento
Que por fora ainda é bela viola...
E corro, e me debato, ergo o punho,
Me revolto contra o nosso pobre Deus
Que permite a confusão que testemunho.
Então, de repente, há uma virada,
E como os mais dúbios servos Seus,
Digo: "Perdão, meu Deus: Não falei nada!"
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04/11/2016
E somente o vejo assim e nada mais.
E então não há como ir mais fundo
Menos ainda como, assim, voltar atrás...
E grito para o mundo: És pestilento!
Tua bela natureza mal consola!
És, isto sim, como o tal pão bolorento
Que por fora ainda é bela viola...
E corro, e me debato, ergo o punho,
Me revolto contra o nosso pobre Deus
Que permite a confusão que testemunho.
Então, de repente, há uma virada,
E como os mais dúbios servos Seus,
Digo: "Perdão, meu Deus: Não falei nada!"
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04/11/2016
quinta-feira, 3 de novembro de 2016
A segunda chance (de Alma Welt)
Temos só duas chances nesta vida,
De a limpo nos passarmos com emendas,
E alcançarmos a Terra Prometida,
Pois estão dentro de nós as suas sendas.
Há, então, segunda chance verdadeira
Se carregamos o fracasso da primeira
Com seus estigmas, dores e vergonha
Que compartilhamos só com a fronha...
Com a nossa Tróia a assombrar-nos
Podemos afinal transfigurar-nos
Pela ação redentora da catástrofe,
Os bêbados ou ridículos que fomos,
Os loucos saltimbancos do desastre,
Chegando à terra dos dourados pomos...
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03/11/2016
De a limpo nos passarmos com emendas,
E alcançarmos a Terra Prometida,
Pois estão dentro de nós as suas sendas.
Há, então, segunda chance verdadeira
Se carregamos o fracasso da primeira
Com seus estigmas, dores e vergonha
Que compartilhamos só com a fronha...
Com a nossa Tróia a assombrar-nos
Podemos afinal transfigurar-nos
Pela ação redentora da catástrofe,
Os bêbados ou ridículos que fomos,
Os loucos saltimbancos do desastre,
Chegando à terra dos dourados pomos...
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03/11/2016
quarta-feira, 2 de novembro de 2016
Pesadelo (de Alma Welt)
Eu gritei ao sol de Deus e seu poder
E corri como se corre de um perigo;
Não havia onde chegar nem esconder,
Não havia por ali um só amigo...
Tudo eram névoas na coxilha
E o mundo estava ainda mais vazio,
Cercada que eu estava como ilha
E só minha solidão era o navio.
E novo grito dei mas de alegria,
O navio, a ilha, a névoa não havia
Pois acordara eu do pesadelo...
Então, envergonhada e mais afável,
Vi que Deus fez o mundo suportável,
Tanto Lhe atormenta o nosso apelo...
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02/11/2016
E corri como se corre de um perigo;
Não havia onde chegar nem esconder,
Não havia por ali um só amigo...
Tudo eram névoas na coxilha
E o mundo estava ainda mais vazio,
Cercada que eu estava como ilha
E só minha solidão era o navio.
E novo grito dei mas de alegria,
O navio, a ilha, a névoa não havia
Pois acordara eu do pesadelo...
Então, envergonhada e mais afável,
Vi que Deus fez o mundo suportável,
Tanto Lhe atormenta o nosso apelo...
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02/11/2016
O Ódio (de Alma Welt)
Revelou um peão velho aqui da estância,
Num fogo de chão de bomba e cuia,
Que malgrado sua fama de constância
Seu casamento fora há muito pra cucuia.
E afirmava: Dona Alma, tenho ódios!
Bah! O ódio que eu tenho, dona Alma,
Da minha mulher desde os primórdios
Do meu casamento, não se acalma...
"Não se deitam vosmecês no mesmo leito",
-Eu chocada perguntei- " é isso vero?"
E ele disse que não, de nenhum jeito,
Mas que encontrava pronta a janta,
A casa bem cuidada e com esmero
Flores nos vasos, os chinelos e a manta...
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02/11/2016
Num fogo de chão de bomba e cuia,
Que malgrado sua fama de constância
Seu casamento fora há muito pra cucuia.
E afirmava: Dona Alma, tenho ódios!
Bah! O ódio que eu tenho, dona Alma,
Da minha mulher desde os primórdios
Do meu casamento, não se acalma...
"Não se deitam vosmecês no mesmo leito",
-Eu chocada perguntei- " é isso vero?"
E ele disse que não, de nenhum jeito,
Mas que encontrava pronta a janta,
A casa bem cuidada e com esmero
Flores nos vasos, os chinelos e a manta...
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02/11/2016
segunda-feira, 31 de outubro de 2016
A nave louca (de Alma Welt)
A nau dos insensatos - de Hieronimus Bosch
A nave louca (de Alma Welt)
Cada um faça da vida o que quiser...
Com o vir-a-ser do outro não me meto.
Desperdicem a vida ao bel prazer,
Quem sou eu pra lhes dizer que não aceito?
A nave louca (de Alma Welt)
Cada um faça da vida o que quiser...
Com o vir-a-ser do outro não me meto.
Desperdicem a vida ao bel prazer,
Quem sou eu pra lhes dizer que não aceito?
Corram, pulem, esbravejem, caiam, vivam!
Estarei só no meu canto observando
Ou ficarei semi-deitada num divã
Vendo a insensata nau passando...
Báh! Bem sei que a nau é o mundo,
E se nela não estou, onde estou eu?
E esta pergunta mesma cala fundo...
Na verdade, mesmo agora me ocorreu
Que o povo, deste cais só se avizinha,
E naquela nave louca estou sozinha...
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31/10/2016
Estarei só no meu canto observando
Ou ficarei semi-deitada num divã
Vendo a insensata nau passando...
Báh! Bem sei que a nau é o mundo,
E se nela não estou, onde estou eu?
E esta pergunta mesma cala fundo...
Na verdade, mesmo agora me ocorreu
Que o povo, deste cais só se avizinha,
E naquela nave louca estou sozinha...
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31/10/2016
sábado, 29 de outubro de 2016
Desesperada e só (de Alma Welt)
Desesperada e só, no fim de tudo,
Aqui estou eu neste velho casarão
A conversar com meu criado-mudo
E ouvindo estalos surdos no porão.
A solidão sua frio nas paredes
E ninguém mais responde ao meu chamado;
Sobraram-me as tais sociais redes
De uns fantasmas queridos deste lado.
Minha saga uns olhos ainda molha,
Fui o cristal em quem gente se espelha
E agora estou vazia e ninguém olha...
Onde eu errei? Estou jovem ainda
Embora como o mundo já tão velha,
E vejam como a minha vida finda!
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29/10]2016
Aqui estou eu neste velho casarão
A conversar com meu criado-mudo
E ouvindo estalos surdos no porão.
A solidão sua frio nas paredes
E ninguém mais responde ao meu chamado;
Sobraram-me as tais sociais redes
De uns fantasmas queridos deste lado.
Minha saga uns olhos ainda molha,
Fui o cristal em quem gente se espelha
E agora estou vazia e ninguém olha...
Onde eu errei? Estou jovem ainda
Embora como o mundo já tão velha,
E vejam como a minha vida finda!
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29/10]2016
sexta-feira, 28 de outubro de 2016
Com as duas orelhas (de Alma Welt)
Auto retrato mutilado de Van Gogh
Com as duas orelhas (de Alma Welt)
Quando guria, o coração ardente,
Eu tinha uma pureza de intenções
Que já não são minhas no presente
Minado por mais cínicas ações...
Hoje uma ilusão ainda perdura,
Os sonhos escondidos de grandeza
Que não confesso nem sob tortura,
Tão ridículos, agora, sobre a mesa.
Uma vã posteridade bem possível,
Último sonho do artista fracassado
Que ambiciona se elevar a outro nível.
E qual Van Gogh, mas com duas orelhas,
Chegar ainda sangrando do outro lado
Cobertinha de vitórias como telhas...
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28/10/2016
Com as duas orelhas (de Alma Welt)
Quando guria, o coração ardente,
Eu tinha uma pureza de intenções
Que já não são minhas no presente
Minado por mais cínicas ações...
Hoje uma ilusão ainda perdura,
Os sonhos escondidos de grandeza
Que não confesso nem sob tortura,
Tão ridículos, agora, sobre a mesa.
Uma vã posteridade bem possível,
Último sonho do artista fracassado
Que ambiciona se elevar a outro nível.
E qual Van Gogh, mas com duas orelhas,
Chegar ainda sangrando do outro lado
Cobertinha de vitórias como telhas...
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28/10/2016
quinta-feira, 27 de outubro de 2016
O mais além (de Alma Welt)
Construir um sistema eu pretendi
No meu tempo de alegres veleidades.
Era bela a vida que eu escolhi
Cheia de senso, certezas e verdades.
Mas de dentro do sistema a morte sai
E começava a rondar o casarão.
Primeiro minha mãe, depois meu pai,
Quebrando minha regra e meu padrão.
Como viver, então? Onde as belezas?
Onde o meu sentido e as certezas?
Entrava então na terra de ninguém,
Não meu pampa, fim do mundo conhecido,
Mas releitura do que jamais foi lido,
A Poesia, o sem limite, o mais além...
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27/10//2016
No meu tempo de alegres veleidades.
Era bela a vida que eu escolhi
Cheia de senso, certezas e verdades.
Mas de dentro do sistema a morte sai
E começava a rondar o casarão.
Primeiro minha mãe, depois meu pai,
Quebrando minha regra e meu padrão.
Como viver, então? Onde as belezas?
Onde o meu sentido e as certezas?
Entrava então na terra de ninguém,
Não meu pampa, fim do mundo conhecido,
Mas releitura do que jamais foi lido,
A Poesia, o sem limite, o mais além...
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27/10//2016
quarta-feira, 26 de outubro de 2016
As rosas dos meus sonhos (de Alma Welt)
As Rosas dos meu Sonhos (de Alma Welt)
Os sonhos que sonhei sempre acordada
Com os do meu sono não coincidem
Nesta falha ou brecha atormentada
Os versos aproveitam e logo incidem...
Eis conclusão inútil, inconclusiva,
A que cheguei depois de muitos anos
Por ver que naveguei sempre à deriva,
Sem rotas apesar de uns portulanos.
No fim de tudo existe só meu pampa
Onde o vento faz a curva no galpão
E vai de volta para além do Cabo Não.
E eu vagueio na coxilha meus delírios,
Aqui onde o cigano agora acampa
E a rosas dos meus sonhos viram lírios...
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26/10/2016
Notas
(da Wikipedia)
O Cabo Não ou Cabo do Não, actual Cabo Chaunar, também conhecido como Cabo Nun, Cabo Noun e Cabo Nant, é umcabo situado na costa atlântica do noroeste de África, no sul de Marrocos, entre Tarfaya e Sidi Ifni. Até ao século XV era considerado intransponível por europeus e muçulmanos, o que originou o seu nome.[1]
Os navegadores genoveses do século XIII, Vandino e Ugolino Vivaldi poderão ter navegado até este cabo antes de se perderem no mar. Foi chamado de "Cabo Não", "cabo Non" ou "Nam" pelos navegadores portugueses do século XV, por ser considerado o "non plus ultra" além do qual a navegação seria impossível. "Quem o passa tornará ou não" escreveu o navegador italiano Alvise Cadamosto em "Navigazione".[2]
Desde 1417 navios de exploração foram enviados pelo Infante D. Henrique, que viajaram 180 milhas para além do Cabo Não até ao Cabo Bojador, então considerado o limite sul do mundo, que se estendia pelo "mar tenebroso"[3] (do latim Mare Tenebrarum ou Mare Tenebrosum, Bahr al-Zulumat em árabe, o nome medieval por que era conhecido o Oceano Atlântico, inacessível aos marinheiros da época.
terça-feira, 25 de outubro de 2016
A espada e a vaidade (de Alma Welt)
Não sou muito amiga da vaidade
Muito embora a tenha como todas,
Essa filha da banal futilidade
Com quem jamais casei, não farei bodas.
Querem saber por quê tanto desprezo?
Só posso explicar pela Poesia
Que da morte nos coloca todo o peso
Numa crua e recorrente alegoria...
Eis o preço da beleza e da verdade
Uma terra de todos, de ninguém,
E uma lucidez sem veleidade:
Não esquecer jamais de nossa espada
O fio de cabelo que a sustém,
Damocles que somos por um nada...
.
25/10/2016
Nota
* Damocles - . Consta que Dioniso, tirano de Siracusa, colocou uma espada suspensa por um fio de cabelo sobre a cabeça de um seu cortesão chamado Damocles, para que este, cumulado de favores e prazeres, jamais esquecesse da presença da morte.
Muito embora a tenha como todas,
Essa filha da banal futilidade
Com quem jamais casei, não farei bodas.
Querem saber por quê tanto desprezo?
Só posso explicar pela Poesia
Que da morte nos coloca todo o peso
Numa crua e recorrente alegoria...
Eis o preço da beleza e da verdade
Uma terra de todos, de ninguém,
E uma lucidez sem veleidade:
Não esquecer jamais de nossa espada
O fio de cabelo que a sustém,
Damocles que somos por um nada...
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25/10/2016
Nota
* Damocles - . Consta que Dioniso, tirano de Siracusa, colocou uma espada suspensa por um fio de cabelo sobre a cabeça de um seu cortesão chamado Damocles, para que este, cumulado de favores e prazeres, jamais esquecesse da presença da morte.
Aventuras da guria do Pampa (de Alma Welt)
Quando morreu meu pai saí de casa
E fui à Pauliceia, eu desvairada, *
Que não ela simplesmente depravada,
E que minha alma pura quase atrasa.
De tentações cercada, homens fortes,
Igualmente também belas mulheres;
Jantares de bem mais trinta talheres
E eu no meio, insegura e sem suportes.
Na cama de uma bela rapariga
Que meu pai pensaria: "só uma amiga",
Um dia acordei nua entre lençóis... *
Não se iludam, de nada me arrependo,
Mas se então retornei ao lar correndo
Foi para apresentá-la a outros sóis...
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25/10/2016
Notas
*E fui à Pauliceia, eu desvairada - Alma alude à expressão de Mario de Andrade, "Pauliceia Desvairada", como ele chamava a cidade de São Paulo, mas atribuindo o desvario a si mesma, e atribuindo à cidade a simples depravação...
*Um dia acordei nua entre lençóis - *A história do ardente amor entre Alma e a bela Aline (que foi sua modelo de pintura em São Paulo), é um dos temas de base do romance autobiográfico A Herança, de Alma Welt, que pode ser adquirido e lido no Kindle Amazon...
E fui à Pauliceia, eu desvairada, *
Que não ela simplesmente depravada,
E que minha alma pura quase atrasa.
De tentações cercada, homens fortes,
Igualmente também belas mulheres;
Jantares de bem mais trinta talheres
E eu no meio, insegura e sem suportes.
Na cama de uma bela rapariga
Que meu pai pensaria: "só uma amiga",
Um dia acordei nua entre lençóis... *
Não se iludam, de nada me arrependo,
Mas se então retornei ao lar correndo
Foi para apresentá-la a outros sóis...
.
25/10/2016
Notas
*E fui à Pauliceia, eu desvairada - Alma alude à expressão de Mario de Andrade, "Pauliceia Desvairada", como ele chamava a cidade de São Paulo, mas atribuindo o desvario a si mesma, e atribuindo à cidade a simples depravação...
*Um dia acordei nua entre lençóis - *A história do ardente amor entre Alma e a bela Aline (que foi sua modelo de pintura em São Paulo), é um dos temas de base do romance autobiográfico A Herança, de Alma Welt, que pode ser adquirido e lido no Kindle Amazon...
segunda-feira, 24 de outubro de 2016
O rastro (de Alma Welt)
Deixamos sempre um rastro de passagem
Por mais leve que seja o nosso passo,
Ou que, furtivo, seja como aragem
Que procura evitar deixar seu traço.
Entretanto são os passos delicados
Que os corações guardam na estante
Ou que restam nos nossos guardados
Em maços amarrados com barbante.
Não chegam a compor grandes histórias
A menos que o rastreador seja poeta
E saiba de poeira fazer glórias...
Lembro que tive uma tia predileta
Que perguntada como ia, suspirava:
"Vai-se vivendo!..." e pronto, eu me calava.
.
24/10/2016
Por mais leve que seja o nosso passo,
Ou que, furtivo, seja como aragem
Que procura evitar deixar seu traço.
Entretanto são os passos delicados
Que os corações guardam na estante
Ou que restam nos nossos guardados
Em maços amarrados com barbante.
Não chegam a compor grandes histórias
A menos que o rastreador seja poeta
E saiba de poeira fazer glórias...
Lembro que tive uma tia predileta
Que perguntada como ia, suspirava:
"Vai-se vivendo!..." e pronto, eu me calava.
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24/10/2016
Minha aldeia (de Alma Welt)
Falar por todos? Eu falo só por mim!
Ai de quem no coletivo se coloca
Trocando seu narciso por jasmim
Sem ter o que dar de si em troca...
É abrindo o emsimesmado coração
Muitas vezes de maneira desabrida,
Que atingimos o cerne da questão
Com que a nossa coletiva alma lida.
Quanto aos mágicos desejos de criança,
Jamais diria após tanto desmantelo
Do ideal: "nosso amor, nossa esperança."
.
Que sei eu do outro que há em mim?
Justamente para vir a conhecê-lo
Espero do soneto a chave, e o fim...
.
24/10/2016
Ai de quem no coletivo se coloca
Trocando seu narciso por jasmim
Sem ter o que dar de si em troca...
É abrindo o emsimesmado coração
Muitas vezes de maneira desabrida,
Que atingimos o cerne da questão
Com que a nossa coletiva alma lida.
Quanto aos mágicos desejos de criança,
Jamais diria após tanto desmantelo
Do ideal: "nosso amor, nossa esperança."
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Que sei eu do outro que há em mim?
Justamente para vir a conhecê-lo
Espero do soneto a chave, e o fim...
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24/10/2016
domingo, 23 de outubro de 2016
O tigre e a corça (de Alma Welt)
De onde cada um tira sua força,
Eis o mistério da individualidade.
A vida em nós é antiga, sem idade
E trazemos dentro o tigre e a corça.
Nossos dois maestros nos confundem,
Presa e predador entram em ação
Se ódio ou amor nossa alma inundem
Conforme dê o tom seu diapasão.
Sou boa, generosa e tenho medo
Embora exale o perfume de jasmim
Da cruel sombra que trago desde cedo
Como uma doce vampira muito calma
Quando vago na coxilha ou no jardim
Nas noites duvidosas de minha alma...
.
23/10/2016
Eis o mistério da individualidade.
A vida em nós é antiga, sem idade
E trazemos dentro o tigre e a corça.
Nossos dois maestros nos confundem,
Presa e predador entram em ação
Se ódio ou amor nossa alma inundem
Conforme dê o tom seu diapasão.
Sou boa, generosa e tenho medo
Embora exale o perfume de jasmim
Da cruel sombra que trago desde cedo
Como uma doce vampira muito calma
Quando vago na coxilha ou no jardim
Nas noites duvidosas de minha alma...
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23/10/2016
sábado, 22 de outubro de 2016
Destino solitário (de Alma Welt)
Um destino deveras solitário
Foi o que me coube nesta vida.
Meus amigos em seu caminho vário
Foram-se, deixando-me perdida
Mas somente nos dez primeiros anos
Da vida adulta, se é que tal existe,
Já que nem tive sequer uns portulanos
Pra navegar-me em águas de mar triste.
Quantos erros, tolices, ninharia...
Quase uma vocação desperdiçada,
Uma alma em formação, inacabada!
Não faz mal... renasci de linhas tortas
Em versão mas escorreita (quem diria?),
Pois as falsas esperanças estão mortas...
.
22/10/2016
Foi o que me coube nesta vida.
Meus amigos em seu caminho vário
Foram-se, deixando-me perdida
Mas somente nos dez primeiros anos
Da vida adulta, se é que tal existe,
Já que nem tive sequer uns portulanos
Pra navegar-me em águas de mar triste.
Quantos erros, tolices, ninharia...
Quase uma vocação desperdiçada,
Uma alma em formação, inacabada!
Não faz mal... renasci de linhas tortas
Em versão mas escorreita (quem diria?),
Pois as falsas esperanças estão mortas...
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22/10/2016
Cantar a vida (de Alma Welt)
Quê tenho feito senão cantar a vida
Em todos os seus aspectos, os mais sutis,
E também sua versão enlouquecida
Desde altos vôos até o raso, de perdiz?
Um lado nobre, outro simples, galhofeiro,
Que humor não deve nunca ser deixado
Sob pena de um inverno de ano inteiro
Nunca mais o corpo ao sol, nu e deitado.
Mas também, por quê não, aquelas sombras,
De onde emergem corpos pálidos de orgia,
Num palco de luxúria sobre alfombras...
Mas, melhor, a pura e simples nostalgia,
Ou ainda que as cantemos à capela,
Saudades de uma infância sempre bela...
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21/10/2016
Em todos os seus aspectos, os mais sutis,
E também sua versão enlouquecida
Desde altos vôos até o raso, de perdiz?
Um lado nobre, outro simples, galhofeiro,
Que humor não deve nunca ser deixado
Sob pena de um inverno de ano inteiro
Nunca mais o corpo ao sol, nu e deitado.
Mas também, por quê não, aquelas sombras,
De onde emergem corpos pálidos de orgia,
Num palco de luxúria sobre alfombras...
Mas, melhor, a pura e simples nostalgia,
Ou ainda que as cantemos à capela,
Saudades de uma infância sempre bela...
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21/10/2016
quinta-feira, 20 de outubro de 2016
Viver é um improviso (de Alma Welt)
O grito -xilogravura de Edvard Munch
Viver é um improviso (de Alma Welt)
Viver é um improviso dia a dia
Malgrado os nossos pequenos rituais,
As abluções mesquinhas matinais,
O café da manhã na padaria
Com manteiga o pão na chapa, de barquinha,
A média muitas vezes requentada,
Dois dedos de prosa na calçada,
Sempre a mesma e sonsa ladainha.
Então, Alma, onde está o improviso?
Espere, amigo, ele vem sim, e sem aviso:
Uma notícia inusitada e sem horário
Que contenha a tua face e o teu grito
Ao abrires o jornal no obituário
Com teu nome em caixa alta ou só negrito...
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20/10/2016
Viver é um improviso (de Alma Welt)
Viver é um improviso dia a dia
Malgrado os nossos pequenos rituais,
As abluções mesquinhas matinais,
O café da manhã na padaria
Com manteiga o pão na chapa, de barquinha,
A média muitas vezes requentada,
Dois dedos de prosa na calçada,
Sempre a mesma e sonsa ladainha.
Então, Alma, onde está o improviso?
Espere, amigo, ele vem sim, e sem aviso:
Uma notícia inusitada e sem horário
Que contenha a tua face e o teu grito
Ao abrires o jornal no obituário
Com teu nome em caixa alta ou só negrito...
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20/10/2016
quarta-feira, 19 de outubro de 2016
Chopin (de Alma Welt)
Tenho em mim uma tristeza incipiente
Que não me deixa de algum modo ser feliz.
Por favor não passe isto pra frente,
Fique aqui entre nós, como se diz...
Porque ser triste é só inquietude
Assim dizia meu pai que também era
E garanto que tentei enquanto pude
Mas ser triste como ele quem me dera...
Pois meu pai foi o último romântico
E tocava só pra si e para mim,
Beethoven, Shubert, Liszt e Chopin...
Chopin! Quanto chorei ouvindo o mestre
Cuja tristeza atravessara o Atlântico
Pra se hospedar numa mansão agreste...
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19/10/2016
Que não me deixa de algum modo ser feliz.
Por favor não passe isto pra frente,
Fique aqui entre nós, como se diz...
Porque ser triste é só inquietude
Assim dizia meu pai que também era
E garanto que tentei enquanto pude
Mas ser triste como ele quem me dera...
Pois meu pai foi o último romântico
E tocava só pra si e para mim,
Beethoven, Shubert, Liszt e Chopin...
Chopin! Quanto chorei ouvindo o mestre
Cuja tristeza atravessara o Atlântico
Pra se hospedar numa mansão agreste...
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19/10/2016
domingo, 16 de outubro de 2016
Estórias ao pé do fogo (de Alma Welt)
Novamente ao pé do fogo, lhes proponho
Nos reunamos pra ouvir e pra narrar
Estórias de talvez senso bisonho
Mas que nos façam sorrir e até sonhar.
Me contem estórias velhas dos avós
Também aquelas de mesa de cozinha,
Que me davam medo logo após
Na hora de deitar, que logo vinha...
Ah! Sempre me parece interrompida
Como uma terra eternamente prometida,
Minha velha infância ainda em pauta.
Ainda hoje, pelo reino como aguardo!
Cavaleiro de mim mesma ainda tardo
Com o beijo final que ainda me falta...
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15/10/2016
Nos reunamos pra ouvir e pra narrar
Estórias de talvez senso bisonho
Mas que nos façam sorrir e até sonhar.
Me contem estórias velhas dos avós
Também aquelas de mesa de cozinha,
Que me davam medo logo após
Na hora de deitar, que logo vinha...
Ah! Sempre me parece interrompida
Como uma terra eternamente prometida,
Minha velha infância ainda em pauta.
Ainda hoje, pelo reino como aguardo!
Cavaleiro de mim mesma ainda tardo
Com o beijo final que ainda me falta...
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15/10/2016
quinta-feira, 13 de outubro de 2016
Receita de paz (de Alma Welt)
A vida é triste, precisamos de alegria,
Cabe a nós tornar o mundo belo
Às custas de arte e de poesia,
Uma gaita, um violino, um violoncelo
Ou uma simples voz cantando alto,
Um soprano, um tenor ou um contralto;
Um pintor jogando tinta numa tela,
No fundo de um porão ou numa cela...
Mas veja, a Poesia tudo aceita
Porque não julga nem recorre à moral,
Esta menos bem já fez, do que o mal...
E se queremos da paz uma receita
Não esperemos de Deus a perfeição
Mas só de cada dia o nosso pão...
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13/10/2016
Cabe a nós tornar o mundo belo
Às custas de arte e de poesia,
Uma gaita, um violino, um violoncelo
Ou uma simples voz cantando alto,
Um soprano, um tenor ou um contralto;
Um pintor jogando tinta numa tela,
No fundo de um porão ou numa cela...
Mas veja, a Poesia tudo aceita
Porque não julga nem recorre à moral,
Esta menos bem já fez, do que o mal...
E se queremos da paz uma receita
Não esperemos de Deus a perfeição
Mas só de cada dia o nosso pão...
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13/10/2016
O bosque da perdição (de Alma Welt)
O bosque da perdição (de Alma Welt)
Em criança do meu bosque tinha medo
Mas eu o adentrava mesmo assim,
Pois via ali, do mundo um arremedo
De suas sombras e mistérios, mas em mim.
Mas um dia perdi-me, fim de tarde,
E caiu a noite sobre o bosque;
Vi duendes e gnomos num quiosque
E as fadas cuja silhueta arde.
Então percebi que o mundo é mágico
E maior do que querem nossos pais
Que creem somente no que é trágico.
E proibida, não pude voltar mais,
Pois eram coisas do diabo... Cruzes!
Àquele mundo de sombras e de luzes...
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13/10/2016
Sonhos antigos (de Alma Welt)
O túmulo de Inês de Castro
Sonhos antigos (de Alma Welt)
É doloroso sonhar sonhos antigos
Ou ver eles voltarem, recorrentes,
Carícias requentadas nos umbigos
E votos sibilados entre dentes...
Nada mais é possível, Inês é morta,
No seu trono sagrado de defunta
E o Tempo refervido na retorta
Derretendo a maquiagem que nos unta.
Como é cruel o vento em seu retorno
Trazendo o belo espectro e o cheiro
E um calor perdido, agora morno...
Vai, sonho cruel, não voltes mais
Antes prefiro as lembranças irreais
Do que o toque tão real do desespero...
.
13/10/2016
Nota
*... Inês é morta - Tradicional expressão que se refere a um episódio histórico da monarquia de Portugal, na Idade Média, quando o príncipe herdeiro do trono, Dom Pedro, apaixonou-se por uma bela dama da corte, de nobreza menor,Inês de Castro contra a vontade de seus cortesãos, que conspiraram para assassiná-la. Pouco depois do enterro da pobre Inês, Dom Pedro foi coroado rei (como Dom Pedro I)* e depois de mandar matar os assassinos de sua amada, mando exumar o corpo de Inês e colocando o cadáver no trono, obrigou toda a corte a desfilar se joelhar, um por um, e a beijar a mão da defunta. Um episódio romântico-macabro, conhecido como "aquela que depois de morta foi rainha". e que foi celebrado pelo grande Camões no momento mais lírico de seu poema épico Lusíadas, episódio que no poema começa com os seguintes versos imortais: "Estavas, bela Inês, posta em sossego/ dos teus verdes anos colhendo o doce fruto/ nos saudosos campos do Mondego/ que a Fortuna não deixa durar muito...
*(como Dom Pedro I ) - O nosso Dom Pedro era o primeiro do Brasil, mas segundo de Portugal...
Sonhos antigos (de Alma Welt)
É doloroso sonhar sonhos antigos
Ou ver eles voltarem, recorrentes,
Carícias requentadas nos umbigos
E votos sibilados entre dentes...
Nada mais é possível, Inês é morta,
No seu trono sagrado de defunta
E o Tempo refervido na retorta
Derretendo a maquiagem que nos unta.
Como é cruel o vento em seu retorno
Trazendo o belo espectro e o cheiro
E um calor perdido, agora morno...
Vai, sonho cruel, não voltes mais
Antes prefiro as lembranças irreais
Do que o toque tão real do desespero...
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13/10/2016
Nota
*... Inês é morta - Tradicional expressão que se refere a um episódio histórico da monarquia de Portugal, na Idade Média, quando o príncipe herdeiro do trono, Dom Pedro, apaixonou-se por uma bela dama da corte, de nobreza menor,Inês de Castro contra a vontade de seus cortesãos, que conspiraram para assassiná-la. Pouco depois do enterro da pobre Inês, Dom Pedro foi coroado rei (como Dom Pedro I)* e depois de mandar matar os assassinos de sua amada, mando exumar o corpo de Inês e colocando o cadáver no trono, obrigou toda a corte a desfilar se joelhar, um por um, e a beijar a mão da defunta. Um episódio romântico-macabro, conhecido como "aquela que depois de morta foi rainha". e que foi celebrado pelo grande Camões no momento mais lírico de seu poema épico Lusíadas, episódio que no poema começa com os seguintes versos imortais: "Estavas, bela Inês, posta em sossego/ dos teus verdes anos colhendo o doce fruto/ nos saudosos campos do Mondego/ que a Fortuna não deixa durar muito...
*(como Dom Pedro I ) - O nosso Dom Pedro era o primeiro do Brasil, mas segundo de Portugal...
quarta-feira, 12 de outubro de 2016
O urso (de Alma Welt)
Cena do filme Valente, de Walt Disney
O urso (de Alma Welt)
Quando criança, eu amava quase tudo
Mas tinha um tropeço de percurso
O poeta tinha eu que manter mudo,
Percebendo, minha mãe virava um urso.
"A vida não é isso, minha filha!
Se te pões assim a escrever versos
Não casarás jamais nesta coxilha,
Poemas são estéreis e perversos!
E eu tinha um desgosto, assim, por ela
Que tão bela era igualmente ignorante,
Só me queria ver casada e procriante.
Mas, morrendo, revelou que o que ela quis
Era somente que eu não fosse infeliz,
E então pude perdoá-la nesse instante...
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12/10/2016
O urso (de Alma Welt)
Quando criança, eu amava quase tudo
Mas tinha um tropeço de percurso
O poeta tinha eu que manter mudo,
Percebendo, minha mãe virava um urso.
"A vida não é isso, minha filha!
Se te pões assim a escrever versos
Não casarás jamais nesta coxilha,
Poemas são estéreis e perversos!
E eu tinha um desgosto, assim, por ela
Que tão bela era igualmente ignorante,
Só me queria ver casada e procriante.
Mas, morrendo, revelou que o que ela quis
Era somente que eu não fosse infeliz,
E então pude perdoá-la nesse instante...
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12/10/2016
Nota
* ... minha mãe virava um urso - Para entender melhor este soneto, recomendo que assistam a obra- prima de animação "Valente", de Walt Disney, em que personagem da garota ruiva, é o retrato perfeito da Alma Welt adolescente, a ponto de me arrancar lágrimas quando o assisti pela primeira vez.
* ... minha mãe virava um urso - Para entender melhor este soneto, recomendo que assistam a obra- prima de animação "Valente", de Walt Disney, em que personagem da garota ruiva, é o retrato perfeito da Alma Welt adolescente, a ponto de me arrancar lágrimas quando o assisti pela primeira vez.
A infância bem guardada (de Alma Welt)
Sou movida a rimas e saudades
Mas trago minha guria bem guardada,
Não a misturo com as gratas novidades
De que vou desfrutando, deslumbrada.
Pra cantar a minha infância amada
Precisei estar assim quase madura
Para ser por mim mesma autorizada,
Que a criança em mim pouco perdura...
Quantos não conseguem mais pular os muros
De sua infância antiga e verdadeira
Por tê-la carregado na algibeira!
Pobres adultos infantis ou imaturos,
Que nada mais têm na mesa a declarar,
Pois só repleto o coração pode guardar...
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12/10/2016
Mas trago minha guria bem guardada,
Não a misturo com as gratas novidades
De que vou desfrutando, deslumbrada.
Pra cantar a minha infância amada
Precisei estar assim quase madura
Para ser por mim mesma autorizada,
Que a criança em mim pouco perdura...
Quantos não conseguem mais pular os muros
De sua infância antiga e verdadeira
Por tê-la carregado na algibeira!
Pobres adultos infantis ou imaturos,
Que nada mais têm na mesa a declarar,
Pois só repleto o coração pode guardar...
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12/10/2016
Dos amigos que se foram (de Alma Welt)
Dos amigos que se foram, só saudades,
Alguns, para os pagos de além-mar
Uns poucos pelas fúteis veleidades
Outros tantos para nunca mais voltar...
Como éramos felizes sem saber!
Rebeldes inocentes e curiosos,
De muita importância achando ser,
Pobres ingênuos, belos, preciosos...
A vida nos deu grandes bordoadas,
Pelo menos nos melhores, desde então,
E ostentamos nossas almas remendadas.
Mas os únicos que se foram por juízo
Não voltaram trazendo uma canção
Ou um chiste que provoque novo riso...
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12/10/2016
Alguns, para os pagos de além-mar
Uns poucos pelas fúteis veleidades
Outros tantos para nunca mais voltar...
Como éramos felizes sem saber!
Rebeldes inocentes e curiosos,
De muita importância achando ser,
Pobres ingênuos, belos, preciosos...
A vida nos deu grandes bordoadas,
Pelo menos nos melhores, desde então,
E ostentamos nossas almas remendadas.
Mas os únicos que se foram por juízo
Não voltaram trazendo uma canção
Ou um chiste que provoque novo riso...
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12/10/2016
terça-feira, 11 de outubro de 2016
À sombra do vulcão (de Alma Welt)
À sombra do vulcão - óleo s/ tela de Guilherme de Faria, 2015
À sombra do vulcão (de Alma Welt) *
"Vivemos à sombra de um vulcão,
Mesmo quando, na verdade, ele não há.
Quero dizer, na iminência de explosão
De uma interna e latente bomba H "
"São os nossos desejos reprimidos
E toda essa selvagem natureza
Que reside em nossos corpos deprimidos
Pela nossa contenção, falsa frieza."
Assim falava o meu doido analista
Que já estava pronto a me agarrar
Quando me via distante e fatalista.
E foi assim que um dia me dei alta
Para ao divã ocidental jamais voltar *
Antes que da explosão sentisse falta...
.
11/10/2016
Nota
*À sombra do vulcão - titulo em português do livro de Malcolm Lowry: Under the Volcane (literalmente Sob o Vulcão), do qual foi feito também um magnífico filme inglês passado no México.
* Para ao divã ocidental jamais voltar- Diván é como se chama uma coleção de poemas árabes clássicos de teor amoroso ou erótico, ou em homenagem aos árabes da Espanha medieval, como no caso do "El Diván de Tamarit " , coleção de poemas de Garcia Lorca com essa conotação.
"Divã ocidental", no dizer da Alma, seria o divã de psicanalista.
O Errante (de Alma Welt)
Preferem alguns de nós seu próprio nicho
Do que vagar a esmo pela Terra.
Pois se estamos longe há um rabicho
Que nos liga à fonte ou nos desterra.
Judeus errantes somos de algum jeito,
Já que expulsos do Jardim do Paraíso
Alternamos a procura de um juízo
Que nos devolva à terra de direito...
O homem quer um chão, plantar raízes.
É muito duro viver escorraçado
Pelas tais ervas daninhas ou juízes...
Lamento o homem, veja o quanto bebe,
Mesmo quando não se queixa ou não percebe
Que a Terra inteira já foi dele num passado...
.
11/10/2016
Do que vagar a esmo pela Terra.
Pois se estamos longe há um rabicho
Que nos liga à fonte ou nos desterra.
Judeus errantes somos de algum jeito,
Já que expulsos do Jardim do Paraíso
Alternamos a procura de um juízo
Que nos devolva à terra de direito...
O homem quer um chão, plantar raízes.
É muito duro viver escorraçado
Pelas tais ervas daninhas ou juízes...
Lamento o homem, veja o quanto bebe,
Mesmo quando não se queixa ou não percebe
Que a Terra inteira já foi dele num passado...
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11/10/2016
O Enigma (de Alma Welt)
Édipo e a Esfinge- pintura de Jean-Auguste Dominique Ingres
O Enigma (de Alma Welt)
A vida é um enigma insolúvel *
Que, irônico, termina sem resposta.
Édipo era fiel, e não volúvel,
Já que mãe é em geral primeira aposta.*
Vivemos, sem saber, duplo universo,
Um deles acessível só em sonhos,
Mesmo assim de modo controverso
Considerados perversos ou bisonhos.
Entretanto nos sonhos não há lei
E estamos ao sabor da crueldade
E um absurdo Ubu é nosso rei. *
Mas tanto o real como o sonhar
São faces do mesmo cauchemar, *
Moeda falsa em uso, sem idade...
.
11/10/2016
Notas
*A vida é um enigma insolúvel - Na tragédia Édipo Rei, de Sófocles, há o famoso episódio do enigma da Esfinge, que só resolvido dava acesso à cidade de Tebas
* Já que mãe é em geral primeira aposta - Freud, que descobriu o Complexo de Édipo, afirmava que a primeira paixão de um bebê do sexo masculino é a mãe, e que isso persiste na maioria dos homens.
*E um absurdo Ubu é nosso rei- menção ao personagem Ubu, da peça surrealista humorística Ubu Roi, do poeta e dramaturgo francês Alfred Jarry. Ubu é um rei cruel e anárquico, mas muito engraçado, definido por uma sua fala na peça: "Depois de roubar todo o dinheiro, matarei todos, e irei embora..."
*cauchemar - palavra do idioma francês que significa pesadelo, que nesse idioma tem uma conotação poético-sinistra.
Numa casca de noz (de Alma Welt)
Ando pelo mundo em minha mente
Em montanhas, cidades e países
Todas as canções minha alma sente,
Em todos os rincões tenho raízes .
Mas isso é do humano desempenho,
Não é prerrogativa de poeta,
Me diz minha amiga predileta
Aquela que dentro de mim tenho.
Sim, isso é comum aos corações
Como poeta sou apenas porta-voz,
Meu universo é, sim, casca de noz.
Nada sou nem apenas pra mim quero,
É pra não dissolver-me, assim espero,
Que admiro no espelho minhas feições...
.
11/10/2016
Em montanhas, cidades e países
Todas as canções minha alma sente,
Em todos os rincões tenho raízes .
Mas isso é do humano desempenho,
Não é prerrogativa de poeta,
Me diz minha amiga predileta
Aquela que dentro de mim tenho.
Sim, isso é comum aos corações
Como poeta sou apenas porta-voz,
Meu universo é, sim, casca de noz.
Nada sou nem apenas pra mim quero,
É pra não dissolver-me, assim espero,
Que admiro no espelho minhas feições...
.
11/10/2016
Meu pequeno relógio (de Alma Welt)
Um reloginho ganhei quando guria
De ouro, um mimo, com ponteiros
Que me fascinavam, de certeiros,
Mas o tempo, neles não corria...
Como eram lentos os ponteirinhos!
Como o tempo era longo, e a vida, enfim...
Era difícil maturar aqueles vinhos
Nas garrafas reservadas para mim.
Então eu disse ao pai: "Me deste o Tempo
Ele agora me poupa à revelia,
Preciso que me dês um contratempo".
Rindo, meu pai, então, seu mimo retirou:
"És impaciente, e eu não sabia,
Mas foi a vida que até hoje te poupou..."
.
10/10/2016
De ouro, um mimo, com ponteiros
Que me fascinavam, de certeiros,
Mas o tempo, neles não corria...
Como eram lentos os ponteirinhos!
Como o tempo era longo, e a vida, enfim...
Era difícil maturar aqueles vinhos
Nas garrafas reservadas para mim.
Então eu disse ao pai: "Me deste o Tempo
Ele agora me poupa à revelia,
Preciso que me dês um contratempo".
Rindo, meu pai, então, seu mimo retirou:
"És impaciente, e eu não sabia,
Mas foi a vida que até hoje te poupou..."
.
10/10/2016
O bosque dos aflitos (de Alma Welt)
O bosque dos aflitos (de Alma Welt)
Bastam-me um jardim e uma varanda
Pra que eu possa mirar o mundo inteiro
E possa ver como todo mundo anda,
E fazer as correções no meu roteiro...
O que estás dizendo, alienada?
Então pensas que podes ter ideia
Do que é este mundo, aí parada?
Confundes o teu palco com platéia?
Venha para baixo, onde fervilha,
Durma em colchão sujo esburacado
E não mais sobre vinte numa ervilha... *
Assim minha cabeça em seus conflitos,
Sempre uma coisa e o outro lado,
Não há paz no lindo bosque dos aflitos... *
.
11/10/2016
Notas
* E não mais sobre vinte numa ervilha - alusão ao conto de Hans Christian Andersen, publicado pela primeira vez em 1835, em que uma princesa se perde num bosque e chegando esfarrapada num casa de camponeses, pede abrigo dizendo ser uma princesa perdida. O casal de camponeses duvida daquela moça enlameada e com o vestido em farrapos. Então resolvem fazer um teste: depois de banhá-la colocam a moça para dormir sobre vinte colchões empilhados (!!), mas sob o primeiro, no solo, colocaram uma ervilha. No dia seguinte a donzela ao despertar queixou-se de dores no corpo todo, que dormira muito mal , como se tivesse deitada sobre uma pedra. Então o casal de camponeses se ajoelhou e pediu perdão à sua princesa...
*Não há paz no lindo bosque dos aflitos -
Alusão ao bosque do famoso romance francês de Alain-Fournier "O bosque das ilusões perdidas", em que acontece uma tragédia romântica.O belo título é um achado da edição brasileira, pois o t´tulo no original francês é horrível: "Le grand Meaulnes" ( O grande Meaulnes), nome do personagem principal. Estranhamente, o Brasil ( por ser um país criativo) é o país que recria o melhores títulos para obras estrangeiras. Exemplo: "Um estranho no ninho" ( filme americano notável cujo titulo original é "One flew over the cooko's nest" ( Alusão à brincadeira infantil americana: One flew east and one flew west / one flew over tlhe cooko's next (um voou para o leste outro vou para o oeste,/ um voou sobre o ninho do cuco) . Quanto ao título do filme no Brasil, é tão criativo que criou uma expressão duradoura e que tem tudo a ver com a situação do falso louco tumultuando o hospício , "um estanho no ninho" (O cuco mata os filhotes do ninho de uma ave de outra espécie e coloca seu filhote ali para ser criado como um enorme parasita".
Então pensas que podes ter ideia
Do que é este mundo, aí parada?
Confundes o teu palco com platéia?
Venha para baixo, onde fervilha,
Durma em colchão sujo esburacado
E não mais sobre vinte numa ervilha... *
Assim minha cabeça em seus conflitos,
Sempre uma coisa e o outro lado,
Não há paz no lindo bosque dos aflitos... *
.
11/10/2016
Notas
* E não mais sobre vinte numa ervilha - alusão ao conto de Hans Christian Andersen, publicado pela primeira vez em 1835, em que uma princesa se perde num bosque e chegando esfarrapada num casa de camponeses, pede abrigo dizendo ser uma princesa perdida. O casal de camponeses duvida daquela moça enlameada e com o vestido em farrapos. Então resolvem fazer um teste: depois de banhá-la colocam a moça para dormir sobre vinte colchões empilhados (!!), mas sob o primeiro, no solo, colocaram uma ervilha. No dia seguinte a donzela ao despertar queixou-se de dores no corpo todo, que dormira muito mal , como se tivesse deitada sobre uma pedra. Então o casal de camponeses se ajoelhou e pediu perdão à sua princesa...
*Não há paz no lindo bosque dos aflitos -
Alusão ao bosque do famoso romance francês de Alain-Fournier "O bosque das ilusões perdidas", em que acontece uma tragédia romântica.O belo título é um achado da edição brasileira, pois o t´tulo no original francês é horrível: "Le grand Meaulnes" ( O grande Meaulnes), nome do personagem principal. Estranhamente, o Brasil ( por ser um país criativo) é o país que recria o melhores títulos para obras estrangeiras. Exemplo: "Um estranho no ninho" ( filme americano notável cujo titulo original é "One flew over the cooko's nest" ( Alusão à brincadeira infantil americana: One flew east and one flew west / one flew over tlhe cooko's next (um voou para o leste outro vou para o oeste,/ um voou sobre o ninho do cuco) . Quanto ao título do filme no Brasil, é tão criativo que criou uma expressão duradoura e que tem tudo a ver com a situação do falso louco tumultuando o hospício , "um estanho no ninho" (O cuco mata os filhotes do ninho de uma ave de outra espécie e coloca seu filhote ali para ser criado como um enorme parasita".
segunda-feira, 10 de outubro de 2016
A luz e a sombra (de Alma Welt)
Entre a luz e a sombra desta vida
Balanço o meu olhar e a razão,
Sempre tive esta alma dividida,
Entre o escuro e o claro coração.
Amo a luz que ilumina o céu azul
E que bate sobre a relva cintilante;
Os crepúsculos mágicos do sul
E as noites caindo mais adiante.
De noite amo as estrelas e a lua
Como todo respeitoso ser vivente
Que não faz das trevas sua mente.
A luz do dia me veste e é meu adorno,
Já a noite me convida a ficar nua
Para assim iluminar o meu entorno.
.
10/10/2016
Balanço o meu olhar e a razão,
Sempre tive esta alma dividida,
Entre o escuro e o claro coração.
Amo a luz que ilumina o céu azul
E que bate sobre a relva cintilante;
Os crepúsculos mágicos do sul
E as noites caindo mais adiante.
De noite amo as estrelas e a lua
Como todo respeitoso ser vivente
Que não faz das trevas sua mente.
A luz do dia me veste e é meu adorno,
Já a noite me convida a ficar nua
Para assim iluminar o meu entorno.
.
10/10/2016
O Livro-Caixa (de Alma Welt)
Suspeito que terei muitas saudades
Quando afinal fechar esta bodega.
Se a morte é o balanço das idades
Quanto mais se vive mais se apega.
Há quem diga que é justo o contrário
E que pouco sabemos desta vida
E estamos aqui como um notário
Anotando nossa entrada e a saída
No misterioso livro-caixa do Patrão
Que não nos diz a que vem isso,
Qual o comércio, afinal, qual a razão.
Estarei a vender gato por lebre?
Vendi queijo de Minas pra suiço?
A firma é devedora, talvez quebre...
.
10/10/2016
Quando afinal fechar esta bodega.
Se a morte é o balanço das idades
Quanto mais se vive mais se apega.
Há quem diga que é justo o contrário
E que pouco sabemos desta vida
E estamos aqui como um notário
Anotando nossa entrada e a saída
No misterioso livro-caixa do Patrão
Que não nos diz a que vem isso,
Qual o comércio, afinal, qual a razão.
Estarei a vender gato por lebre?
Vendi queijo de Minas pra suiço?
A firma é devedora, talvez quebre...
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10/10/2016
domingo, 9 de outubro de 2016
A Alfândega ou A boba das estrelas (de Alma Welt)
A quem afinal estou enganando?
Minhas questões fatais são as de todos:
Não sei onde, como e quando
Deixarei de ser voltando aos lodos.
Que coisas tenho eu, pois, a dizer?
Nada a declarar nesta alfândega,
Depois de tanto medo do não-ser
E por isso tentar viver à pândega.
Pobres de nós, crianças do destino
Que herdamos a maldita consciência
Que antecipa toda vela e todo sino.
Eu quisera ser a boba das estrelas
Que sorri ao mundo sem ciência,
Perseguindo os vaga-lumes para vê-las...
.
09/10/2016
Minhas questões fatais são as de todos:
Não sei onde, como e quando
Deixarei de ser voltando aos lodos.
Que coisas tenho eu, pois, a dizer?
Nada a declarar nesta alfândega,
Depois de tanto medo do não-ser
E por isso tentar viver à pândega.
Pobres de nós, crianças do destino
Que herdamos a maldita consciência
Que antecipa toda vela e todo sino.
Eu quisera ser a boba das estrelas
Que sorri ao mundo sem ciência,
Perseguindo os vaga-lumes para vê-las...
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09/10/2016
sexta-feira, 7 de outubro de 2016
O agora inexistente (de Alma Welt)
Estou viva para o próximo poema
Como um surfista espera a onda
Que será aquela bem redonda
Que produz o túnel ou o dilema.
O próximo minuto, o dia, a aurora,
Quiçá um crepúsculo rosado,
Sempre o momento anunciado,
Pelos vãos suspenses da demora.
O agora? Bem quisera que o houvesse
E o relógio sem ponteiros estivesse
Sem as batidas fatais da meia noite...
Mas resta-me a ideia do advento,
E o tempo presente é só açoite
A fustigar-me para nada, como o vento...
.
07/10/2016
Como um surfista espera a onda
Que será aquela bem redonda
Que produz o túnel ou o dilema.
O próximo minuto, o dia, a aurora,
Quiçá um crepúsculo rosado,
Sempre o momento anunciado,
Pelos vãos suspenses da demora.
O agora? Bem quisera que o houvesse
E o relógio sem ponteiros estivesse
Sem as batidas fatais da meia noite...
Mas resta-me a ideia do advento,
E o tempo presente é só açoite
A fustigar-me para nada, como o vento...
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07/10/2016
Tela em branco com moldura (de Alma Welt)
Viver, como pintar, é uma aventura
Porque a gente nunca sabe o que vai dar.
Temos uma tela em branco com a moldura
Que é a nossa origem, nosso lar.
Com primeiras pinceladas manchas faço
Para ver se algo ali se configura
Com a energia de um Picasso
E buscando a esmo a forma pura...
Mas logo minha imagem se embadurna *
Em desastrada e vã baconiana
E a esquadria passa a ser a urna
De minha tentativa quase insana
De escapar dos limites da moldura
Dourada, pronta, estática e segura...
.
07/10/2016
Nota
*... imagem se "embadurna" - palavra técnica em espanhol, usada pelo pintor Francis Bacon numa entrevista, designa um estado de embaçamento de pintura suja, irreversível, que quando ocorria em sua pintura gestual em processo, o fazia desistir e destruir a tela imediatamente, jogando-a fora e começando logo outra.
Esse soneto da Alma tem uma nítida conotação alegórico-psicanalítica, ao se referir à nossa "moldura" familiar, rígida, dourada, que herdamos e que nos aprisiona no nosso processo de construir uma auto-imagem própria, que extrapole aquelas formas rígidas que já existem quando ainda somos uma tela em branco...
Porque a gente nunca sabe o que vai dar.
Temos uma tela em branco com a moldura
Que é a nossa origem, nosso lar.
Com primeiras pinceladas manchas faço
Para ver se algo ali se configura
Com a energia de um Picasso
E buscando a esmo a forma pura...
Mas logo minha imagem se embadurna *
Em desastrada e vã baconiana
E a esquadria passa a ser a urna
De minha tentativa quase insana
De escapar dos limites da moldura
Dourada, pronta, estática e segura...
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07/10/2016
Nota
*... imagem se "embadurna" - palavra técnica em espanhol, usada pelo pintor Francis Bacon numa entrevista, designa um estado de embaçamento de pintura suja, irreversível, que quando ocorria em sua pintura gestual em processo, o fazia desistir e destruir a tela imediatamente, jogando-a fora e começando logo outra.
Esse soneto da Alma tem uma nítida conotação alegórico-psicanalítica, ao se referir à nossa "moldura" familiar, rígida, dourada, que herdamos e que nos aprisiona no nosso processo de construir uma auto-imagem própria, que extrapole aquelas formas rígidas que já existem quando ainda somos uma tela em branco...
terça-feira, 4 de outubro de 2016
Através do meu espelho (de Alma Welt)
Através do meu espelho (de Alma Welt)
Jamais direi a alguém o que é a vida,
Somente sobre a minha quis fazê-lo
E se nela eu puder botar meu selo
Sem ser presunçosa ou presumida.
Alguns dizem: faça isso, faça aquilo...
Por que apontas caminhos, prepotente?
A beleza não tem braços e é eloquente
A julgar pela imortal Vênus de Milo...
Se eu puder falar de mim sem intenções
Que não sejam a de tocar os corações
Sem qualquer autopiedade e sem pieguice
E sendo apenas eu, já serei tudo
Para uns, por um segundo, não me iludo,
Através de meu espelho, como Alice...
.
03/10/2016
O orvalho da manhã (de Alma Welt)
O orvalho da manhã - óleo s/ tela de Guilherme de Faria, 2015,
O orvalho da manhã (de Alma Welt)
Que o meu último suspiro na coxilha
Seja sobre este orvalho da manhã
Que sempre me tratou como uma filha
E, pois, nenhuma caminhada era vã...
Vejam como ele cintila perolado
Tornando a superfície acetinada
Na glória da manhãs deste meu prado
Preparando a alegre revoada...
E se o mundo por aí não é assim
Já não quero mais saber, senão de mim,
Tudo é perfeito por aqui, graças ao Céu.
Deixem-me sonhar, tenho direito
Vivi também as dores, de outro jeito,
Se na terra desfrutei do vinho e mel...
.
04/10/2016
O orvalho da manhã (de Alma Welt)
Que o meu último suspiro na coxilha
Seja sobre este orvalho da manhã
Que sempre me tratou como uma filha
E, pois, nenhuma caminhada era vã...
Vejam como ele cintila perolado
Tornando a superfície acetinada
Na glória da manhãs deste meu prado
Preparando a alegre revoada...
E se o mundo por aí não é assim
Já não quero mais saber, senão de mim,
Tudo é perfeito por aqui, graças ao Céu.
Deixem-me sonhar, tenho direito
Vivi também as dores, de outro jeito,
Se na terra desfrutei do vinho e mel...
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04/10/2016
segunda-feira, 3 de outubro de 2016
Sic transit (II) (de Alma Welt) *
Alma na coxilha - óleo s/ tela de Guilherme de Faria, 2014 (coleção do Artista)
Sic transit (II ) (de Alma Welt) *
Construamos nossa vida dia dia
Como se constrói um mundo novo
Ou se repetirá nossa agonia
Dia a dia arguindo nosso corvo.*
Depende de mim o meu destino
Mas somente no caminho, não no fim,
Pois este é um inexorável sino
Dobrando em sua torre só por mim. *
Se perguntas ao corvo sobre os mortos
Receberás a tal resposta crocitada *
E é melhor permaneceres, pois, calada...
Os navios em princípio vão aos portos,
E Deus que traça seus caminhos tortos *
Não traçaria nossa rota rumo ao Nada...
.
03/10/2016
Notas
*Sic transit gloria mundi - (lat.) Assim passa a gloria mundana.
*Dia a dia arguindo nosso corvo - alusão ao famoso poema The Raven ( O Corvo), de Edgar Allan Poe, em que o poeta pergunta sem parar sobre sua amada e seu destino, a um corvo...
*Pois este é um inexorável sino
Dobrando em sua torre só por mim - alusão ao famosos versos do poeta inglês elizabethano John Donne: ..."Nenhum homem é uma ilha"......../ "Por isso não perguntes por quem os sinos dobram/ Eles dobram por ti."
* Receberás a tal resposta crocitada - no poema de Poe, corvo, responde sempre com com a palavra composta "Nevermore" (nunca mais), que em inglês soa onomatopaicamente como um crocitar...
"Mas Deus que traça seus caminhos tortos - alusão à frase popular: " Deus escreve certo por linhas tortas"...
Sic transit (II ) (de Alma Welt) *
Construamos nossa vida dia dia
Como se constrói um mundo novo
Ou se repetirá nossa agonia
Dia a dia arguindo nosso corvo.*
Depende de mim o meu destino
Mas somente no caminho, não no fim,
Pois este é um inexorável sino
Dobrando em sua torre só por mim. *
Se perguntas ao corvo sobre os mortos
Receberás a tal resposta crocitada *
E é melhor permaneceres, pois, calada...
Os navios em princípio vão aos portos,
E Deus que traça seus caminhos tortos *
Não traçaria nossa rota rumo ao Nada...
.
03/10/2016
Notas
*Sic transit gloria mundi - (lat.) Assim passa a gloria mundana.
*Dia a dia arguindo nosso corvo - alusão ao famoso poema The Raven ( O Corvo), de Edgar Allan Poe, em que o poeta pergunta sem parar sobre sua amada e seu destino, a um corvo...
*Pois este é um inexorável sino
Dobrando em sua torre só por mim - alusão ao famosos versos do poeta inglês elizabethano John Donne: ..."Nenhum homem é uma ilha"......../ "Por isso não perguntes por quem os sinos dobram/ Eles dobram por ti."
* Receberás a tal resposta crocitada - no poema de Poe, corvo, responde sempre com com a palavra composta "Nevermore" (nunca mais), que em inglês soa onomatopaicamente como um crocitar...
"Mas Deus que traça seus caminhos tortos - alusão à frase popular: " Deus escreve certo por linhas tortas"...
Pedagogia reversa (de Alma Welt)
"Nossa vida é trágica e fugaz,
Nosso fim já nasce decidido
E como é um avaro contumaz
O homem já nasce corrompido."
"Para estar vivos fazemos papelões
E cada um por si se o barco afunda.
Somente o eterno egoísmo abunda
Como ratos proliferam nos porões."
Assim citava um velho professor
Que nos fazia rir até rolando
Por sua ênfase dramática no horror.
Mas que bem me fez ele sem saber!
Pois a vida em mim fui mais amando,
E mais amando a vida hei de morrer...
,
03/10/2016
Nosso fim já nasce decidido
E como é um avaro contumaz
O homem já nasce corrompido."
"Para estar vivos fazemos papelões
E cada um por si se o barco afunda.
Somente o eterno egoísmo abunda
Como ratos proliferam nos porões."
Assim citava um velho professor
Que nos fazia rir até rolando
Por sua ênfase dramática no horror.
Mas que bem me fez ele sem saber!
Pois a vida em mim fui mais amando,
E mais amando a vida hei de morrer...
,
03/10/2016
domingo, 2 de outubro de 2016
A Escolha da Poesia (de Alma Welt)
Se escolhi viver a vida em verso,
Que é só uma das maneiras de viver,
Ela em mim abarca o universo
E é de certa forma não morrer...
Todavia o mundo me censura
A solidão voluntária que persigo
Que parece uma espécie de tortura
Sem pouso, sem arrimo, sem abrigo.
Alma, não casaste, não tens filhos,
A mulher em ti não está completa,
E já perdeste talvez a hora certa...
Não me peçam respostas para isso,
E aviso: não me esperem ver nos trilhos,
A Poesia nunca foi um trem suíço...
.
02/10/2016
Que é só uma das maneiras de viver,
Ela em mim abarca o universo
E é de certa forma não morrer...
Todavia o mundo me censura
A solidão voluntária que persigo
Que parece uma espécie de tortura
Sem pouso, sem arrimo, sem abrigo.
Alma, não casaste, não tens filhos,
A mulher em ti não está completa,
E já perdeste talvez a hora certa...
Não me peçam respostas para isso,
E aviso: não me esperem ver nos trilhos,
A Poesia nunca foi um trem suíço...
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02/10/2016
Meu corvo (de Alma Welt)
Alma Welt na colina dos Mortos - óleo s/ tela de Guilherme de Faria
Meu corvo (de Alma Welt)
Ariscas que são, as horas voam,
Que fluidas nos escapam pelos dedos;
E as badaladas finalmente soam
De nossa meia noite, auge dos medos.
A vida é um conto de Allan Poe,
Mestre supremo dos horrores
De quem melhor discípula não sou
Mas que é um dos meus amores...
Entretanto tenho um corvo que me segue
E que muitos amigos não duvidam
Que ele os meus sonhos também negue. *
E assim caminho viva sobre os mortos,
Auscultando a terra escura onde lidam,
Como eu talvez sonhando novos portos...
.
02/10/2012
Nota
* Que ele os meus sonhos também negue - Alma alude ao corvo do famoso poema The Raven.(O Corvo) de Edgar Allan Poe ( pronuncia-se Pou) que pousado num busto de Palas Atenas, a cada pergunta do poeta sobre a sua amada, respondia somente: "Nevermore" (Nunca mais!)
Meu corvo (de Alma Welt)
Ariscas que são, as horas voam,
Que fluidas nos escapam pelos dedos;
E as badaladas finalmente soam
De nossa meia noite, auge dos medos.
A vida é um conto de Allan Poe,
Mestre supremo dos horrores
De quem melhor discípula não sou
Mas que é um dos meus amores...
Entretanto tenho um corvo que me segue
E que muitos amigos não duvidam
Que ele os meus sonhos também negue. *
E assim caminho viva sobre os mortos,
Auscultando a terra escura onde lidam,
Como eu talvez sonhando novos portos...
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02/10/2012
Nota
* Que ele os meus sonhos também negue - Alma alude ao corvo do famoso poema The Raven.(O Corvo) de Edgar Allan Poe ( pronuncia-se Pou) que pousado num busto de Palas Atenas, a cada pergunta do poeta sobre a sua amada, respondia somente: "Nevermore" (Nunca mais!)
Guardemos o Domingo (de Alma Welt)
Guardemos o Domingo, meus amigos
Porque Deus parou nele e descansou.
Naqueles tempos de outrora, tão antigos,
Conquanto o Diabo não parou
E foi urdindo a sua trama diabólica
Para logo cooptar o casalzinho.
Eva ainda não tinha a menor cólica
E não pedia casa, nem um ninho...
Assim falava o padre em minha infância,
Pelo menos do jeito que eu me lembro
De uma missa na capela lá da estância.
Mas não tenho certeza, há uma neblina
Que nubla aquelas tardes de Setembro
Do meu próprio paraíso de menina...
.
02/10/2016
Porque Deus parou nele e descansou.
Naqueles tempos de outrora, tão antigos,
Conquanto o Diabo não parou
E foi urdindo a sua trama diabólica
Para logo cooptar o casalzinho.
Eva ainda não tinha a menor cólica
E não pedia casa, nem um ninho...
Assim falava o padre em minha infância,
Pelo menos do jeito que eu me lembro
De uma missa na capela lá da estância.
Mas não tenho certeza, há uma neblina
Que nubla aquelas tardes de Setembro
Do meu próprio paraíso de menina...
.
02/10/2016
sábado, 1 de outubro de 2016
A lição (de Alma Welt)
"O ser humano é movido a arrogância,
Digo isso num plano mais geral
De sua ambição, progresso e ânsia,
Por vezes de uma estupidez fatal"...
Assim dizia um certo professor
Que tive em Rosário, no ginásio,
E que protestava um grande amor
Por nossa adolescência, triste estágio.
Mas um dia, me mandou permanecer
Depois da aula, e que fosse à sua sala
Que queria comentar o meu dever...
Mas da fábula não vou contar o fim
E interrompo aqui a minha fala,
O ser humano era mesmo muito ruim...
.
01/10/2016
Digo isso num plano mais geral
De sua ambição, progresso e ânsia,
Por vezes de uma estupidez fatal"...
Assim dizia um certo professor
Que tive em Rosário, no ginásio,
E que protestava um grande amor
Por nossa adolescência, triste estágio.
Mas um dia, me mandou permanecer
Depois da aula, e que fosse à sua sala
Que queria comentar o meu dever...
Mas da fábula não vou contar o fim
E interrompo aqui a minha fala,
O ser humano era mesmo muito ruim...
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01/10/2016
Mar-coxilha (de Alma Welt)
Alma na colina dos mortos - óleo s/ tela de Guilherme de Faria
Mar-coxilha (de Alma Welt)
Um corvo me segue na campina
E só eu o enxergo, acostumada
Com ele que estou, e que me ensina,
Sobre coisas além de minha alçada.
Sim, sobre o que dizem os mortos
E como não sentem nossa falta,
Atracados que estão em novos portos,
Suas velas já sem a cruz de Malta. *
Mas nós aqui em plena travessia
Precisamos da esperança e do grog, *
Que a seco tanto mar não se aprecia.
Ondas imóveis na neblina como um fog *
Me espera, eu sei, no fim do mar-coxilha
Ao longe no horizonte a minha ilha ...
.
01/10/2016
Notas
*Suas velas já sem a cruz de Malta - Alma se refere dessa maneira metafórica, às lápides brancas dos túmulos, como velas, sem a cruz que as das caravelas portuguesas e espanholas ostentavam.
*Precisamos da esperança e do grog - "grog" era como se chamava a dose de rum distribuída aos marinheiros no fim de cada semana nos navios, sob pena de motim se faltasse...
*Ondas imóveis na neblina como um fog - as ondas imóveis são as ondulações típicas da coxilha gaúcha, e "fog" é a palavra inglesa para neblina, tanto na terra como no mar.
Mar-coxilha (de Alma Welt)
Um corvo me segue na campina
E só eu o enxergo, acostumada
Com ele que estou, e que me ensina,
Sobre coisas além de minha alçada.
Sim, sobre o que dizem os mortos
E como não sentem nossa falta,
Atracados que estão em novos portos,
Suas velas já sem a cruz de Malta. *
Mas nós aqui em plena travessia
Precisamos da esperança e do grog, *
Que a seco tanto mar não se aprecia.
Ondas imóveis na neblina como um fog *
Me espera, eu sei, no fim do mar-coxilha
Ao longe no horizonte a minha ilha ...
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01/10/2016
Notas
*Suas velas já sem a cruz de Malta - Alma se refere dessa maneira metafórica, às lápides brancas dos túmulos, como velas, sem a cruz que as das caravelas portuguesas e espanholas ostentavam.
*Precisamos da esperança e do grog - "grog" era como se chamava a dose de rum distribuída aos marinheiros no fim de cada semana nos navios, sob pena de motim se faltasse...
*Ondas imóveis na neblina como um fog - as ondas imóveis são as ondulações típicas da coxilha gaúcha, e "fog" é a palavra inglesa para neblina, tanto na terra como no mar.
O que me dizem as manhãs (de Alma Welt)
Como é triste o mundo se estou triste!
Mas se o céu é claro e o sol brilha
É como se tivessem o dedo em riste
Como leve censura à sua filha...
Levanta-te daí, sua preguiçosa!
Vai fazer a tua matinal toilette,
Penteia o cabelo, mas não posa,
Que isso é espelho e não tiete.
Depois vai à cozinha, ao santo amaro *
Pois sei que deste santo és devota,
O que por aqui não é nada raro...
Depois de breve culto à cuia e bomba
Voa ao teu jardim como uma pomba
E não aos gritos como doida gaivota...
.
01/10/2016
Nota
* ... ao santo amaro - Alma se refere ao "amargo", isto é, ao mate do chimarrão, "amaro", à maneira italiana.
Mas se o céu é claro e o sol brilha
É como se tivessem o dedo em riste
Como leve censura à sua filha...
Levanta-te daí, sua preguiçosa!
Vai fazer a tua matinal toilette,
Penteia o cabelo, mas não posa,
Que isso é espelho e não tiete.
Depois vai à cozinha, ao santo amaro *
Pois sei que deste santo és devota,
O que por aqui não é nada raro...
Depois de breve culto à cuia e bomba
Voa ao teu jardim como uma pomba
E não aos gritos como doida gaivota...
.
01/10/2016
Nota
* ... ao santo amaro - Alma se refere ao "amargo", isto é, ao mate do chimarrão, "amaro", à maneira italiana.
sexta-feira, 30 de setembro de 2016
Mais humilde (de Alma Welt)
"De livros povoada até a tampa
E os clássicos frescos na memória,
Com espaço para os mitos do meu pampa,
Saí para contar a minha história..."
Assim comecei uma entrevista
Quando, claro, ainda era bem jovem
E portanto a presunçosa e egotista
Cujos versos já não me comovem.
Mas agora, passados tantos anos,
Não tenho certamente aquela empáfia
De filha de chefão da Santa Máfia.
E, bem mais humilde considero
Procurar de novo meus decanos,
Que preciso reler Dante e Homero...
.
30/09/2016
E os clássicos frescos na memória,
Com espaço para os mitos do meu pampa,
Saí para contar a minha história..."
Assim comecei uma entrevista
Quando, claro, ainda era bem jovem
E portanto a presunçosa e egotista
Cujos versos já não me comovem.
Mas agora, passados tantos anos,
Não tenho certamente aquela empáfia
De filha de chefão da Santa Máfia.
E, bem mais humilde considero
Procurar de novo meus decanos,
Que preciso reler Dante e Homero...
.
30/09/2016
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